Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro Biomédico Faculdade de Enfermagem Nádia Regina da Silva Pinto O acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários Rio de Janeiro 2011 Nádia Regina da Silva Pinto O acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários Dissertação apresentada, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração: Enfermagem, Saúde e Sociedade. Orientadora: Prof.ª Dra. Denize Cristina de Oliveira Rio de Janeiro 2011 CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ/REDE SIRIUS/BIBLIOTECA CB/B P659 Pinto, Nádia Regina da Silva. O acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários / Nádia Regina da Silva Pinto. - 2011. 191 f. Orientadora: Denize Cristina de Oliveira. Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Enfermagem. 1. Enfermagem – Pesquisa. 2. Saúde suplementar. 3. Seguro saúde. 4. Exames médicos. 5. Acesso aos serviços de saúde. 6. Satisfação do consumidor. I. Oliveira, Denize Cristina de. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de Enfermagem. III. Título. CDU 614.253.5 Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação, desde que citada a fonte. _________________________ Assinatura _____________________ Data Nádia Regina da Silva Pinto O acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários Dissertação apresentada, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração: Enfermagem, Saúde e Sociedade. Aprovada em 02 de março de 2011. Banca Examinadora: _________________________________________ Prof.a Dra. Denize Cristina de Oliveira (Orientadora) Faculdade de Enfermagem da UERJ _________________________________________ Prof. Dr. Túlio Batista Franco Instituto de Saúde da Comunidade da UFF _________________________________________ Prof. Dr. Luiz Antônio de Castro Santos Instituto de Medicina Social da UERJ Rio de Janeiro 2011 DEDICATÓRIA Para os meus pais, Em memória de minha saudosa mãe Sheila da Silva Pinto (17/09/49 -18/03/07 +) pelas lições de vida e dedicação na minha criação e pelo amor incondicional de mãe neste binômio insubstituível e imensurável. Pela herança de virtudes, como a perseverança e otimismo de acreditar em dias melhores e abençoados por graças divinas. Pela obstinação deste amor segui minha educação dentro de valores morais e religiosos, espelhados por ela e como uma fã órfã deste amor sigo o meu caminho planejado por ela que me deu a vida, seu suor do dia e da noite estudando comigo, me acordando cedo para ir para a escola, me levando no curso de inglês, seus valiosos conselhos em momentos de tristeza, enfim sua persistência e luta que somente mães maravilhosas como ela conseguem passar para seus filhos. E como um anjo sei que ela está perto de mim sempre me protegendo e me amparando em cada passo que dou no meu dia a dia. E como um vento que sopra sei que é ela chegando e pela chuva que cai tenho minha lágrima escorrendo de saudade e a você mãe te amarei para sempre, aonde você estiver, meu coração estará com você também. Sinto muito sua falta. Amo-te eternamente. Para meu pai Nelson Luiz da Fonseca Pinto que me ensinou do jeito dele a provar que eu era capaz de ascender através dos estudos, despertando em mim a vontade de tentar acertar, mesmo que fosse preciso errar quantas vezes fosse necessário até eu chegar aonde cheguei: pós-graduada e com emprego público estável. AGRADECIMENTOS A Deus por ter me mantido firme e forte no enfrentamento de obstáculos no trabalho que apareceram ao longo do mestrado, e pela fortaleza do seu trono que me abrigou com seu escudo contra todas as adversidades que tornam o ser humano perverso, invejoso, egoísta e impiedoso. Para meu marido amado Angelo Antunes Salgado (Anjinho) que me escolheu para ser sua esposa e mãe do seu filho, num elo que transcendeu uma paquera e uma troca de olhares em 2001 - o começo de tudo. Você para sempre vou amar, porque você me faz feliz e me mostrou novos horizontes nas minhas perspectivas. Tornou minha vida mágica, porque melhor do que um sonho você existe e faz parte da minha vida. Torna tudo menos complicado em minha vida, traduz os códigos que para mim são difíceis e inexplicáveis, incentiva meus objetivos profissionais, aposta na minha capacidade, acredita na minha vitória e me revitaliza quando estou melancólica. Mais do que falar, você me escuta e me apoia mesmo, às vezes, discordando das minhas decisões. Para você meu eterno companheiro um brinde, pois te amo intensamente. Obrigada por tudo e por toda sua compreensão. Para meu filho Caio Henrique Silva Salgado, meu pequenininho, minha misturinha, que veio numa hora, onde a mamãe aqui mais precisava de você. E tenho certeza que minha mãe, a sua avó materna, estava junto da gente no dia que você nasceu e não foi à toa que você nasceu na mesma data que eu nasci (23/05/77 & 23/05/07). Você valeu a dor de cada contração e de cada dor do pós-operatório do parto cesariana na Casa de Saúde de Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Você é minha vida que continua e minha alegria que me fortalece a alma. Mamãe te ama muito e quer ver você crescer com saúde e muito feliz. Você é meu superherói bebê que mora no meu coração. Às minhas irmãs Eliane Cristina da Silva Pinto Carneiro e Débora Helena da Silva Pinto por alegrarem a minha vida, reforçando o significado importante de família feliz. A minha avó materna Yara Basílio da Silva pela perseverança e fortalecimento de suas orações cristãs em prol de benção e proteção divina. A minha tia Neide Maria de Fátima da Fonseca Pinto pela solidariedade e companheirismo na jornada de compromissos e enfrentamento das dificuldades. A minha prima Caroline Garcia Pinto e demais parentes que compartilharam momentos de alegria e tristeza ao longo da minha vida pessoal e profissional. A minha cunhada Luciana Antunes Salgado, os meus sogros Roberto da Rocha Salgado e Marlenice Antunes Salgado que estiveram presentes na minha jornada exaustiva de compromissos e responsabilidades. Aos meus sobrinhos Lucas Pinto Dias Carneiro, Daniel Luís Pinto Dias Carneiro e Miguel Salgado Novelino que abreviaram as minhas preocupações nas horas de lazer. A Ana Paula Romão dos Santos pela dedicação no cumprimento dos horários matinais para eu sair cedo para o trabalho todos os dias e na ajuda importante nas fases de desenvolvimento da criação do meu menino. A Luci Ventura dos Santos Silva pelo capricho da limpeza da minha residência e organização dos meus livros e apostilas na estante do meu quarto-escritório. A minha mais nova amiga Vanessa Mendes dos Santos que me concedeu assessoria técnica de excelência nas fases de pré-teste, adequação de instrumentos de coleta de dados e análise descritiva, temática e categorial dos dados da pesquisa, mostrando-se disponível em todos os momentos, principalmente nos mais difíceis, incluindo os de ordem pessoal, fortalecendo-me com sua espiritualidade e fé na vida cristã. A Bluneli Desmon Souza que me ajudou nas digitações intermináveis, vocalizando com música a retórica dos sujeitos entrevistados para a elaboração do dicionário da padronização das falas dos usuários de planos de saúde. A minha amiga Cátia Mantini pela empolgante jornada profissional compartilhada e por todos os sentimentos extremos que pintaram nossa amizade num verdadeiro mosaico de alegria e tristeza, incluindo todas as convergências e divergências que complementaram a afinidade de admiração recíproca. Ao meu amigo Wladimir Eugênio de Souza pelos conselhos profissionais e pessoais, além do apoio em oração e força através de incentivos bibliográficos de profundo bom gosto, assim como foram delicadamente selecionados para a valorização das minhas questões profissionais e universitárias. Às amigas de mestrado Caroline de Deus Lisboa e Vanessa Cristina Mauricio que muito me orientaram nas etapas cruciais da apresentação do projeto de pesquisa para submissão à Comissão de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). A minha orientadora Dra. Denize Cristina de Oliveira pela objetividade e sagacidade no desenvolvimento deste trabalho. Aos pareceristas Dr. Ruben Araújo de Mattos e Dr. Sergio Correa Marques que delinearam novas formas de refletir a pesquisa antes da coleta dos dados no cenário de estudo. Aos examinadores titulares Dr. Túlio Batista Franco e Dr. Luiz Antônio de Castro Santos pela honra enriquecedora do aceite na participação dessa banca de avaliação, além das valiosas contribuições. Aos examinadores suplentes Dr. Sergio Correa Marques e Dra. Márcia Franke Piovesan pelo tão honrado e orgulhoso aceite da presença de ambos nesse exame. Para o Gerente de Recursos Humanos da Agência Nacional de Saúde Suplementar Carlos Alberto Silva Lima que me concedeu a oportunidade de mostrar a qualidade do meu trabalho, vinculado a defesa do interesse público, pautada na perspectiva do usuário de plano de saúde privado. A minha amiga Daniele Michel Soares Neves que fortificou minhas esperanças ao fomentar de forma valiosa minhas expectativas profissionais. À querida Marisa Pittella Oliveira que soube me transmitir indescritível ternura advinda de sua simpatia e doçura sublimes, além da serenidade inequívoca de uma mulher entusiasmante para a prosperidade dos meus conhecimentos. À Gerente de Produção e Análise de Informação da Agência Nacional de Saúde Suplementar Márcia Franke Piovesan e para os servidores dessa gerência Maria Antonieta Almeida Pimenta, Juliana Pires Machado e Carlos Falcão Maranhão pela elucidação de dados dessa pesquisa no Sistema de Informações Gerenciais da ANS. Às inesquecíveis amigas Cristiane Rodrigues Couto, Thaís Sabrine Rosa de Oliveira, Flávia Teixeira Gomes e Aline Furtado de Mendonça que trilharam momentos especiais de parceria e cumplicidade na minha vida pessoal e profissional. Aos meus amigos Teófilo José Machado Rodrigues, Maria das Graças Moreira Lima, Lizzie Karen do Carmo Neri, Simone Fabiano Mendes, Nadja Andreia Silverio da Silva Almeida, Claudete Barbosa da Rocha, Jacqueline Alves Torres, Aparecida Isabel Bressan, Roberto Luiz Pinel Dias, Maria José Miranda Igreja, Raquel Bergaria de Oliveira, Jaqueline Velloso Martins, Ari Corrêa de Jesus e Francisneia Freire da Silva Santos que sempre me confortaram com palavras sábias de incentivo e aqueles que embora não especificados nesse trabalho foram essenciais no meu dia-a-dia de forma direta ou indireta para a execução dessa dissertação de Mestrado. À médica Luiza Alves e ao meu amado esposo Angelo Salgado que intermediaram a autorização para minha entrada no cenário da pesquisa. Aos diretores e gestores técnicos, coordenadores, atendentes, recepcionistas e técnicas de enfermagem do laboratório de medicina diagnóstica dessa pesquisa, uma vez que foram atenciosos e cooperativos desde o primeiro momento da minha apresentação como pesquisadora. Aos usuários de planos de saúde privados que participaram desta pesquisa, considerando que sem eles o trabalho não ficaria tão rico e nem completo. A Maria Celeste Carvalho Couto pelo seu profissionalismo e agilidade nas revisões normativa e ortográfica desta pesquisa. À bibliotecária Adriana Caamaño e às demais profissionais da biblioteca biomédica da UERJ que prestaram orientações e revisões para o cumprimento dos rigores exigidos para apresentação deste feito. Ser Natural Os sonhos vão embora quando deixamos de acreditar em nós mesmos. Ninguém tem o direito de dizer que não seremos capazes de realizar algo. Somos aquilo que acreditamos ser, mas sem a simulação do que sentimos, porque a graça da vida é viver intensamente a “vitrine” do que somos de verdade. Nádia Regina da Silva Pinto RESUMO PINTO, Nádia Regina da Silva. O acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários. Brasil. 2011. 191 f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011. A dissertação trata do acesso aos serviços de alta complexidade, particularmente os exames diagnósticos e complementares, estudado entre usuários de planos de saúde privados que buscam atendimento e diagnóstico especializado. Desde a década de 80 o usuário do sistema público de saúde vem procurando a saúde suplementar. Contudo, afirmar que o acesso é garantido no domínio privado, através da contratação dos planos de saúde, é uma incerteza que rodeia a inspiração para esta pesquisa, que se justifica pela relevância de ações que possibilitem a melhora da qualidade regulatória dos planos de saúde, a partir do controle social de seus usuários. O objetivo geral é analisar as percepções do acesso aos exames de alta complexidade nos serviços de saúde privados entre usuários de planos de saúde. Os objetivos específicos são descrever as percepções dos usuários de planos de saúde acerca do acesso aos exames de alta complexidade; analisar as motivações dos usuários de planos de saúde privados para a realização de exames de alta complexidade através da rede privada de assistência; e analisar o nível de satisfação dos usuários de planos de saúde quanto ao acesso aos exames de alta complexidade. A metodologia é qualitativa-descritiva, onde a amostra foi de trinta usuários de planos de saúde, acima de 18 anos, selecionados no campo de estudo no ano de 2010. O cenário de estudo foi um laboratório privado de medicina diagnóstica no Rio de Janeiro. As técnicas de coleta de dados utilizadas foram formulário e entrevista individual estruturada. A análise do formulário foi realizada através de estatística descritiva, e as entrevistas através da análise de conteúdo temática-categorial. Os usuários de plano de saúde declararam que o acesso é garantido com facilidade para os exames de alta complexidade. Suas principais motivações para a realização desses exames na rede privada de assistência foram caracterizadas pela rapidez de atendimento, flexibilidade e facilidade de marcação pela internet, telefone ou pessoalmente no laboratório estudado, pronta entrega dos resultados, dificuldade e morosidade do atendimento do SUS, localização do prestador credenciado próxima de bairros residenciais ou do trabalho, resolutividade diagnóstica de imagem de excelência, possibilidade de escolha pelo usuário entre as modalidades aberta e fechada de ressonância magnética e tomografia computadorizada, além da densitometria óssea que foram facilmente acessíveis a todos os sujeitos da pesquisa. O nível de satisfação foi correspondido com a rapidez na realização dos exames em caráter eletivo e de urgência quase equiparados na escala de tempo de acordo com os usuários. Contudo, embora as notas de avaliação dos usuários quanto aos seus planos de saúde tenham sido altas, foram abordadas algumas dificuldades, tais como: prazos de validade dos pedidos médicos com datação prévia; solicitações de senhas de autorização pela operadora; burocracia nos procedimentos de agendamento; dificuldades de acesso para tratamentos como implantes, fisioterapia, RPG, pilates, home care, consultas de check up; negação de reembolsos; restrição de materiais cirúrgicos, em especial as próteses e órteses; e restrições específicas de grau para cirurgias de miopia. Conclui-se que o atendimento rápido dos exames de imagem de alto custo na amostra foi descrito como satisfatório, embora a percepção de rapidez possa variar em função do tipo de produto do plano de saúde privado contratado, com necessidade de melhoria regulatória em alguns aspectos pontuais da saúde suplementar. Palavras-chave: Acesso. Exames de alta complexidade. Usuários de planos de saúde privados. ABSTRACT This dissertation deals with access to services of high complexity, particularly diagnostic and complementary exams between users of private health system that seek specialized treatment and diagnosis care. Since the 80's people has being looking for additional health system. However, say that access is guaranteed in the private system, is an uncertainty that leads the inspiration for this research, which is justified by the importance of actions that enable the improvement of regulatory quality of health plans from social control of its users. The overall objective is to analyze the perceptions to access high complexity exams in the health system between users of private health plans. The specific objectives are to describe the perceptions of users of health plans to access high complexity exams; analyze motivations from users of private health plans for the exams of high complexity through the private network; and analyze the level of users satisfaction with health plans regarding access to tests of high complexity. The methodology is qualitative-descriptive, and the sample was thirty users of private health care system greater than 18 years, selected in 2010. The research scenario was a private laboratory of medical diagnostic in Rio de Janeiro. Data collection techniques used were individual interviews and structured form. The analysis was performed by the form of descriptive statistics, and interviews through the analysis of thematic contentcategory. Users of health plan stated that the access is guaranteed with facility for tests of high complexity. Their main motivations for doing exams in private health care services were characterized by quick responsiveness, flexibility and ease of marking their exams by internet, telephone or personally in the laboratory, prompt delivery of results, difficulty and length of service in SUS, location of laboratory near home or work, excellence resolution in diagnostic image, user choice between open and closed methods of magnetic resonance and computed tomography, and bone densitometry were easily accessible to all research subjects. Satisfaction level was reached by quickly resolution of the exams, and performing elective and emergency procedures in almost similar time scale, according to users. However, although evaluation from users with their health plans have been high, some difficulties were pointed such as validity periods for realization of exams; according to the date on the medical application; password requests for authorization by the operator; bureaucracy in procedures for scheduling exams; and poor access to treatments such as implants; physiotherapy; RPG; pilates; homecare; check ups; denied refunds; restricted surgical materials; in particular prosthetics and orthotics; and specifics degree limitation for myopia surgery. We conclude that the quickly response of high complexity exams were described as satisfactory, although the perception of speed may vary depending on the type of private health plans contracted, with the need for regulatory improvement in specific points in privete health system. Keywords: Access. High complexity exams. Private health care system users. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Gráfico 1 - Distribuição percentual dos beneficiários de planos privados de saúde por tipo de contratação segundo cobertura assistencial do plano (Brasil - dezembro/2009). Assistência médica com ou sem odontologia ........... 62 Quadro 1 - Espaço físico do campo de estudo ........................................................... 79 Figura 1 - Sala de espera de resultado de exames no térreo no cenário do estudo .. 79 Figura 2 - Lateral da sala de espera de exames de ressonância magnética e tomografia computadorizada no 1º andar ................................................ Figura 3 - 80 Corredor da sala de espera de exames de ressonância magnética e tomografia computadorizada no 1º andar ................................................ 80 Figura 4 - Sala de espera de exames de densitometria óssea no 2º andar ................ 81 Figura 5 - Aparelho aberto de tomografia computadorizada do cenário de estudo . 104 Figura 6 - Aparelho aberto de ressonância magnética do cenário de estudo ........... 105 Figura 7 - Aparelho fechado de ressonância magnética do cenário de estudo ......... 105 Figura 8 - Aparelho de densitometria óssea do cenário de estudo ........................... 107 Quadro 2- Categorias e pré-categorias com temas de significação da pesquisa ...... 180 Quadro 3 - Categorias 1.0, 2.0 e 3.0 da pesquisa ...................................................... 181 Quadro 4 - Categorias 4.0 e 5.0 da pesquisa ............................................................. 182 Quadro 5 - Pré-categorias da pesquisa ...................................................................... 183 Quadro 6 - Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados da pesquisa ........................................................................ 184 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Prazos máximos de tempo de atendimento em dias úteis, nos planos de saúde privados definidos pela ANS, a serem publicados em Resolução Normativa específica ............................................................................... Tabela 2 – 64 Distribuição dos sujeitos entrevistados por local da coleta de dados no laboratório ............................................................................................... 74 Tabela 3 – Planos de saúde credenciados no laboratório de medicina diagnóstica 76 Tabela 4 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por sexo – Rio de Janeiro, 2010 89 Tabela 5 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por cor étnica autodeclarada Rio de Janeiro, 2010 ................................................................................ Tabela 6 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por naturalidade - Rio de Janeiro, 2010 .......................................................................................... Tabela 7 – 98 Distribuição dos sujeitos entrevistados por cargo ocupacional - Rio de Janeiro, 2010 ........................................................................................... Tabela 15 – 96 Distribuição dos sujeitos entrevistados por atividade laborativa ou inatividade - Rio de Janeiro, 2010 ........................................................... Tabela 14 – 95 Distribuição dos sujeitos entrevistados por nível de escolaridade - Rio de Janeiro, 2010 ....................................................................................... Tabela 13 – 95 Distribuição dos sujeitos entrevistados por situação residencial - Rio de Janeiro, 2010 ........................................................................................... Tabela 12 – 94 Distribuição dos sujeitos entrevistados por residência nas regiões do Município do Rio de Janeiro e Grande Rio - Rio de Janeiro, 2010 ........ Tabela 11 – 93 Distribuição dos sujeitos entrevistados por quantidade de filhos - Rio de Janeiro, 2010 ....................................................................................... Tabela 10 – 92 Distribuição dos sujeitos entrevistados por situação conjugal - Rio de Janeiro, 2010 ........................................................................................... Tabela 9 – 91 Distribuição dos sujeitos entrevistados por faixa etária (em anos) - Rio de Janeiro, 2010 ....................................................................................... Tabela 8 – 90 100 Distribuição dos sujeitos entrevistados de acordo com a faixa de renda familiar mensal total por número de salários mínimos - Rio de Janeiro, 2010 ......................................................................................................... 101 Tabela 16 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por número de residentes em cada família - Rio de Janeiro, 2010 ......................................................... Tabela 17 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de exame de imagem de alta complexidade - Rio de Janeiro, 2010 .......................................... Tabela 18 – 108 Distribuição dos sujeitos entrevistados por caráter da solicitação médica - Rio de Janeiro, 2010 ................................................................. Tabela 20 – 104 Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de indicação médica clínica principal do exame de alta complexidade - Rio de Janeiro, 2010 Tabela 19 – 103 109 Distribuição dos sujeitos entrevistados por quantidade de usuário titular ou dependente de plano de saúde por operadora - Rio de Janeiro, 2010 ......................................................................................................... Tabela 21 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de contratação - Rio de Janeiro, 2010 ........................................................................................... Tabela 22 – 110 111 Distribuição dos sujeitos entrevistados por contratação individual ou familiar de acordo com atividade laborativa ou inatividade - Rio de Janeiro, 2010 ........................................................................................... Tabela 23 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de contratação por operadora de plano de saúde - Rio de Janeiro, 2010 ............................... Tabela 24 – 113 Distribuição dos sujeitos entrevistados por plano de saúde com coparticipação por tipo de contratação - Rio de Janeiro, 2010 ............... Tabela 26 – 112 Distribuição dos sujeitos entrevistados por plano de saúde com coparticipação - Rio de Janeiro, 2010 ..................................................... Tabela 25 – 111 114 Distribuição dos sujeitos entrevistados por tempo de vigência dos planos privados de saúde dos entrevistados por operadora - Rio de Janeiro, 2010 ........................................................................................... Tabela 27 – Distribuição dos sujeitos entrevistados por modalidade de plano de saúde de acordo com a faixa de beneficiários - Rio de Janeiro, 2010 ..... Tabela 28 – 118 Distribuição da quantidade de modalidade de plano de saúde dos sujeitos entrevistados - Rio de Janeiro, 2010 .......................................... Tabela 29 – 115 119 Distribuição da quantidade de sujeitos entrevistados por modalidade de plano de saúde - Rio de Janeiro, 2010 ..................................................... 119 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABET Associação Beneficente dos Empregados em Telecomunicações ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade AGF Assurance Generale de France AIDS Acquired immune deficiency syndrome AIG American International Group AIH Autorização de Internação Hospitalar AIS Ações Integradas de Saúde AMAFRERJ Associação dos Fiscais de Renda do Estado do Rio de Janeiro ANS Agência Nacional de Saúde Suplementar ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária ASSIM Assistência Médica Integrada BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CAAE Certificado de Apresentação para Apreciação Ética CABERJ Caixa de Assistência à Saúde do Rio de Janeiro CABESP Caixa de Assistência à Saúde de São Paulo CAC Caixa de Assistência dos Servidores da CEDAE CEF Caixa Econômica Federal CAMPERJ Caixa de Assistência do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro CAMARJ Caixa de Assistência aos Defensores Públicos do Estado do Rio de Janeiro CAPESESP Caixa de Previdência e Assistência dos Servidores da Fundação Nacional de Saúde CAURJ Caixa Assistencial Universitária Rio de Janeiro CASSI Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil CDC Código de Defesa do Consumidor CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica CFM Conselho Federal de Medicina CID Classificação Internacional de Doenças CMO Conteúdo Mineral Ósseo CNAS Conselho Nacional de Assistência Social CNEN Comissão Nacional de Energia Nuclear COEP Comissão de Ética em Pesquisa da UERJ CONASS Conselho Nacional de Secretários de Saúde CONMEDH Convênio Médico Hospitalares CONSU Conselho Nacional de Saúde Suplementar CRM Conselho Regional de Medicina CVRD Companhia Vale do Rio Doce DIEESE Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos DMO Densidade mineral óssea EMBRATEL Empresa Brasileira de Telecomunicações ENCE Escola Nacional de Ciências Estatísticas FIOPREV Instituto Oswaldo Cruz de Seguridade Social FUNRURAL Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural GEAP Grupo Executivo de Assistência Patronal HIV Human immunodeficiency virus IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDEC Instituto de Defesa do Consumidor HU Hounsfield Unit IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICV Índice de Custo de Vida INAMPS Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social INCA Instituto Nacional do Câncer INPS Instituto Nacional de Previdência Social INSS Instituto Nacional de Seguridade Social IPALERJ Instituto de Previdência da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas IRB Instituto de Resseguros do Brasil MAPA Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial MPF Ministério Público Federal MPT Ministério Público do Trabalho MS Ministério da Saúde NOB Norma Operacional Básica NUCLEP Nuclebrás Equipamentos Pesados OMS Organização Mundial de Saúde OPAS Organização Pan-Americana de Saúde PAC Procedimentos de Alta Complexidade PECS Programas de Extensão de Cobertura PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PIB Produto Interno Bruto PROCON Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor PSF Programa de Saúde da Família RDC Resolução de Diretoria Colegiada RMRJ Região Metropolitana do Rio de Janeiro RN Resolução Normativa RNM Ressonância Nuclear Magnética RPG Reeducação postural global SDD Sistema de Desembolso Direto SEMEG Serviços Médicos Guanabara SIB Sistema de Informação dos Beneficiários SIG Sistema de Informações Gerenciais SIP Sistema de Informação de Produtos STF Supremo Tribunal Federal SUDS Sistema Unificado Descentralizado de Saúde SUS Sistema Único de Saúde TC Tomografia Computadorizada UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro UFF Universidade Federal Fluminense UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRRJ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UNIMED Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro UPA Unidade de Pronto Atendimento UR Unidades de Registro URMES Urgências Médico-Escolares UTI Unidade de Tratamento Intensivo SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................. 19 1 O ACESSO ÀS TECNOLOGIAS E SERVIÇOS DE SAÚDE NO BRASIL 30 1.1 O acesso no Brasil e suas dimensões ………………………………………… 30 1.2 Tecnologia em Saúde …………………………………………………………. 33 2 A SAÚDE SUPLEMENTAR NA POLÍTICA DE SAÚDE BRASILEIRA 42 2.1 Surgimento da saúde suplementar nas políticas de saúde …………………. 42 2.2 A regulação pública do setor privado de saúde ……………………………. 49 2.3 O papel da Agência Nacional de Saúde Suplementar ……………………… 56 3 ABORDAGEM METODOLÓGICA ……………………………………….. 71 3.1 Tipo de estudo ………………………………………………………………… 71 3.2 Sujeitos da pesquisa ………………………………………………………….. 72 3.3 Cenário do estudo …………………………………………………………….. 74 3.4 Técnicas de coleta de dados ………………………………………………….. 81 3.5 Tratamento e análise dos dados ……………………………………………... 84 3.6 Aspectos éticos em pesquisa ………………………………………………….. 88 4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS …….…………………………….. 89 4.1 Caracterização dos sujeitos estudados …………………………….…..……. 89 4.2 Caracterização dos planos de saúde privados contratados e dos exames de alta complexidade dos sujeitos ……………………………………………… 103 4.3 A percepção do acesso aos exames de alta complexidade ………………….. 121 4.3.1 O acesso aos exames de alta complexidade ……………………………………. 122 4.3.2 Os conhecimentos dos direitos contratados nos planos de saúde ……………… 132 4.3.3 Motivações para realizar os exames de alta complexidade nos planos de saúde, ao invés do SUS ………………………………………………………………... 137 4.3.4 Nível de satisfação acerca do plano de saúde ………………………………….. 141 4.3.5 Percepção do atendimento no SUS …………………………….………………. 147 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ………………………………………………… 156 REFERÊNCIAS ………………………………………………………………. 164 APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para os usuários de planos de saúde privados …………………………………………. 176 APÊNDICE B - Formulário de caracterização socioeconômica dos usuários de planos privados da assistência à saúde e dos exames de alta complexidade prescritos ……………………………………………………………………….. 177 APÊNDICE C - Roteiro de entrevista estruturada ……………………………. 178 APÊNDICE D - Resultados de entrevista individual estruturada da pesquisa ... 180 APÊNDICE E - Resultados de entrevista individual estruturada da pesquisa categorias 1.0, 2.0 e 3.0 ………………………………………………............... 181 APÊNDICE F - Resultados de entrevista individual estruturada da pesquisa categorias 4.0 e 5.0 ………………………………………………….................. 182 APÊNDICE G - Pré-categorias de entrevista individual estruturada da pesquisa ............................................................................................................... 183 APÊNDICE H – Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados para análise do acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários .................................. 184 ANEXO – Proposta de Resolução Normativa da ANS sobre a garantia de atendimento dos beneficiários de plano privado de assistência à saúde .............. 189 19 INTRODUÇÃO A dissertação trata do acesso aos serviços de alta complexidade, particularmente aos exames diagnósticos e complementares para os usuários de planos de saúde privados que buscam atendimento e diagnóstico especializado. O interesse em estudar o acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários iniciou-se em 2007 durante a pós-graduação em regulação de saúde suplementar realizada pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, em parceria com o Hospital Sírio Libanês, patrocinada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). O interesse nessa temática intensificou-se no mestrado corrente e há aproximadamente cinco anos como funcionária pública da ANS, a partir da execução de atividades regulatórias e fiscalizatórias, entre operadoras, beneficiários e prestadores de serviços privados de assistência à saúde. Nesta trajetória acadêmica e profissional, deparei com questões reflexivas compartilhadas por muitos brasileiros, perante as iniquidades de acesso aos serviços de saúde que ocorrem em situações de atendimento demorado; às vezes dificultado, e até mesmo negado, presentes nos sistemas de saúde público e privado. O consumidor e usuário do sistema público de saúde vêm procurando a saúde suplementar por inúmeras razões, as quais norteiam o perfil das motivações relevantes na hora de fechar um contrato com a operadora de plano de saúde. Santos, Malta e Merhy (2008) apontam que o aumento dos usuários de planos de saúde privados ocorreu após a década de oitenta mesmo sem legislação que regulamentasse especificamente a saúde suplementar nessa época. A complementaridade das ações em saúde no Brasil pelo setor privado tem raízes históricas, considerando que as operadoras de planos de saúde, [...], ao longo do seu processo de evolução prestaram e prestam um grande serviço a população brasileira, permitindo o seu acesso aos serviços de saúde. Em especial porque ocuparam uma fatia enorme do espaço deixado pela ineficiência, pela ausência efetiva de determinação política e pela incapacidade de financiamento do setor público (SILVA, 2003, p. 3). Contudo, afirmar que o acesso é garantido no domínio privado através da contratação dos planos de saúde é uma incerteza que rodeia a inspiração para esta pesquisa. Todavia, em relação à capacidade de gestão das operadoras de planos de saúde, Silva (2003) aponta que se aceita de forma tão natural a incapacidade de gestão da área pública, sem ao menos lhe conferir o mínimo reconhecimento pelo muito que faz com os poucos recursos provenientes 20 de uma política limitada no setor de saúde pública, mas com a mesma naturalidade se aceita que a área da saúde suplementar é competente para fazer a sua gestão. O referido autor questiona a procedência de tais evidências, indagando as condições de obtenção dessa imagem de competência, o grau de dificuldades para aquisição deste conceito, os bancos de dados, os sistemas de informações epidemiológicas, capacidade interativa junto aos prestadores de serviços em ações de promoção e prevenção à saúde e outros questionamentos pertinentes. A palavra acesso, do Latim accessus ou us, significa aproximação, cuja definição é o “ato ou efeito de ingressar, compreendida como entrada ou possibilidade de chegar, reiterando o sentido de aproximação, concebida também como chegada” (ACESSO, 2007, p. 41). A chegada ou a entrada no serviço de saúde não necessariamente implica em dizer que a demanda do usuário deste serviço foi solucionada ou resolvida, pois a chegada entendida como a presença física do usuário sem a marcação ou sem o agendamento do exame indica perda de tempo ou procura de um serviço em vão, com um sentido de aproximação geográfica do serviço sem resolver o problema da demanda que se procura. A entrada pressupõe um nível de resolutividade maior, pois tem ligação maior com o atendimento específico já que tem sentido mais inclusivo que o da chegada, embora também não se possa afirmar que a entrada resolverá o problema, mas se aproxima mais desta meta do que a chegada, e é dentro desta perspectiva de entrada no serviço que se pretende trabalhar no presente estudo. Silva Junior e Mascarenhas (2004) corroboram que a concepção de entrada potencial ou real de dado grupo populacional em um sistema de prestação de cuidados de saúde é uma das dimensões que definem o acesso no campo da saúde. Segundo Jatene (2007), a acessibilidade da população ao sistema público de saúde envolve decisão política, considerando que esta sempre teve papel central no desenvolvimento do setor da saúde, porque não apenas regimenta as práticas empregadas sob responsabilidade governamental, como determina diretamente a quantificação dos recursos a serem utilizados. A saúde, como política, está alicerçada, muitas vezes, de forma antagônica aos interesses sociais, valorizando, por conseguinte, interesses econômicos nem sempre convergentes com a coletividade. Compreende-se nesta concepção que a saúde, embora seja considerada “questão social e política”, será também tratada dentro da vertente economicista do momento, sendo reforçada como espaço para a acumulação de capital. O estado financia novos espaços de atuação dirigida, criando empreendimentos privados por meio de empréstimos que garantem investimentos sem risco. Assim, amplia a rede de hospitais privados, cuja localização será determinada mais por interesses econômicos que pelas necessidades da população (MESTRINER, 2008, p. 160). 21 De acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (2007, p. 80), “a incorporação de novas tecnologias ao sistema – seja na forma de aquisição de um novo equipamento ou de criação de um novo serviço – dever-se-ia guiar pelo perfil de adoecimento e de necessidades de saúde e de serviços da população”. No contexto do Sistema Único de Saúde (SUS), a definição de procedimentos de alta complexidade envolve “alta tecnologia e alto custo, objetivando propiciar à população acesso a serviços qualificados, integrando-os aos demais níveis de atenção à saúde (atenção básica e de média complexidade” (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007, p. 80). O setor de alta complexidade constitui-se como um dos três níveis de atenção à saúde que apresentava menor integração com os demais, em virtude da inexistência de uma política onde fosse definido a sua posição no SUS. Até 2003, a alta complexidade se destacava pelo predomínio do setor privado contratado responsável pela formulação das diretrizes e de portarias editadas até esta época (BRASIL, 2010). A integralidade dos níveis de atenção da saúde envolve responsabilidades e governabilidade pactuada com vistas a permitir a resolutividade da assistência, tal como é ressaltado que as ações e procedimentos considerados de média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar constituem-se para os gestores um importante elenco de responsabilidades, serviços e procedimentos relevantes para a garantia da resolutividade e integralidade da assistência ao cidadão (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007, p. 11). Quando se tratam de exames diagnósticos e complementares de alta complexidade vêm à tona as associações às tecnologias de ponta mais custosas, presumidamente pouco ofertadas no sistema público e de maior oferta no sistema privado. Entretanto, num pressuposto de desequilíbrio entre a oferta e demanda de usuários que compõe ambos os sistemas, não se verifica empiricamente muita diferença quando se aborda o fator tempo de espera, que superlota serviços de natureza pública, como privada, necessitando certamente de outros estudos para identificar e classificar as demandas das filas, conforme os níveis de atenção de acordo com estes serviços. A marcação tardia de exames de alta complexidade sinaliza reiteradamente a necessidade de melhorar a gestão de tecnologias em saúde, a fim de assegurar um tratamento digno e respeitoso ao paciente que se sente vulnerável e fragilizado em condição de dor e sofrimento, perante a longa espera na incerteza se será atendido ou não. 22 Estudos sobre o tempo médio de espera para o acesso aos serviços médicos de exames diagnósticos e complementares de alta complexidade no sistema de saúde privado apontariam dificuldades ou facilidades em obter o procedimento de alta complexidade prescrito pelo médico assistente. Toda tecnologia empreendida tem uma finalidade e para contextualizá-la na saúde, é importante conceituar que “a tecnologia em saúde é o conhecimento aplicado que permite a prevenção, o diagnóstico e o tratamento das doenças, e a reabilitação de suas consequências” (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007, p. 57). Descobrir o nível de satisfação do usuário e a percepção subjetiva de tempo médio de espera para o acesso aos serviços de alta complexidade no sistema de saúde privado possibilitou conhecer elementos cognitivos reflexivos para este grupo estudado. A descrição do conhecimento quanto à perspectiva conformada ou não da demanda de usuários de plano de saúde, no momento da utilização de um serviço, possibilitou examinar se o tempo de acesso para cobertura do exame de alta complexidade está sendo adequado às necessidades de seus usuários, permitindo explicitar ações de saúde na assistência ambulatorial supletiva que possam estar dificultando ou não tal cobertura. Através da Lei nº 9.961 (BRASIL, 2000), inaugura-se a ação regulatória do Estado com a criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mas antes deste advento institucional regulamentador destaca-se o marco regulatório com a Lei nº 9.656/1998 no campo suplementar da saúde no Brasil que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde. Compreendem entre outras facetas regulatórias da ANS avaliar se a rede de serviços em saúde oferecida pelas operadoras de planos de saúde está atendendo às necessidades de seus beneficiários, fiscalizando o cumprimento de regras e normativos regulatórios, assim como cláusulas contratuais dos direitos de cobertura do consumidor. O Estado se faz presente no exercício da administração pública direta e indireta de seus agentes responsáveis pelo bem a ser regulado. No caso da saúde: no Brasil, o modelo de regulação que vem sendo adotado compreende toda atividade estatal de supervisão e controle de setores privados que prestam serviços públicos ou de interesse público, utilizando-se da elaboração e edição de regras para o seu funcionamento, além de instrumentos de coerção, como o poder de polícia presente no direito administrativo, com o objetivo de influenciar o comportamento dos agentes sociais e de mercado para a melhor prestação dos serviços à sociedade. Entretanto, no caso do mercado brasileiro de assistência suplementar à saúde, não cabe a utilização do enfoque regulatório como sendo apenas a defesa da concorrência e do consumidor tão somente, devendo contemplar o equilíbrio dos valores políticos e sociais que estão relacionados ao serviço público regulado, tendo em vista a natureza do próprio bem sob regulação (ALCOFORADO, 2003, p. 28). 23 Numa das concepções pressupostas de que o consumidor procura a rede privada para garantia de facilidade de acesso a serviços que não teria na rede pública de assistência, é factível também pensar se ele contrata o plano privado de saúde não necessariamente para ter acesso a exames, consultas ou internações, mas para usufruir de um bem de serviço que inexiste no hospital público. Este bem de serviço poderia ser um procedimento de média a alta complexidade de maior custo e provavelmente com maior risco de estar indisponível na rede pública, como exames de ressonância magnética, tomografia computadorizada, densitometria óssea, tratamento hiperbárico para lesões cutâneas, procedimentos invasivos percutâneos, entre outras suposições. Em relação aos problemas de acesso, Conill et al. (2008) relatam que a segmentação do acesso tem se constituído em uma das questões centrais na análise dos problemas dos sistemas de saúde contemporâneos e em particular àqueles que se referem ao SUS. De acordo com Bahia et al. (2008), o SUS herda a característica do modelo federal, centralizado, que terceiriza serviços, tal como era na época do extinto Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social (INAMPS). Contudo, na atualidade, apresenta preços frequentemente desatualizados, devido à inadequação da valorização dos procedimentos e cuidados de atenção à saúde presentes na “Tabela SUS”. Para tanto, o pagamento de múltiplos da “Tabela SUS”, especialmente para determinados procedimentos de maior custo [...], aponta-se um rebaixamento do SUS à condição de comprador de serviços que elimina quase que automaticamente, quaisquer outras ilações sobre as relações entre o público e o privado no sistema de saúde brasileiro que não aquelas relativas ao uso de procedimentos médicos hospitalares em estabelecimentos da rede pública. Não é por outro motivo que o acento das interfaces entre o sistema público e o privado recai sobre as atividades de alto custo-complexidade e não sobre os subsídios ao financiamento dos planos e seguros (BAHIA et al., 2008, p.1389). O avanço tecnológico constitui marco importante na evolução do amparo à saúde, sendo incorporada de forma constante ao SUS. No imaginário popular, novas tecnologias se caracterizam por maior capacidade diagnóstica e, portanto, maior possibilidade de cura e recuperação, desfocando o aspecto preventivo. Assim, na saúde, a tecnologia assume um papel simbólico importante já que é o conforto e a garantia que o conhecimento humano foi utilizado no máximo de seu potencial atual na solução dos problemas individuais, onde o público demanda e exige que a prática médica seja calcada na “melhor” tecnologia disponível (VIANNA, 2002, p. 380). Contudo, as disparidades econômicas e sociais brasileiras colocam diversos segmentos em desvantagem social, onde o Estado através de suas políticas públicas deveria reduzir o 24 nível de marginalidade das combinações de diversos marcadores sociais que violam majoritariamente os direitos individuais e coletivos. A utilização dos serviços de saúde pela população como afirmação de uma política inclusiva e justa depende do acesso como primeira condição e para transformar a realidade social é preciso explicitar os conflitos que giram em torno da sua efetividade na prática. A procura pelo serviço é orientada a partir da oferta dos sistemas de saúde, por encaminhamento profissional, prioridade da gravidade da demanda e quando é diretamente procurado pelo usuário, de acordo com as necessidades individuais e coletivas. O percurso a ser seguido pelo doente referente ao acesso, diagnóstico e terapêutica está condicionado ao seu recurso e disponibilidade do serviço, tanto no sistema público, como no privado, dependente ou não de agenda médica, distância até a localidade prestadora do serviço, tipo de cobertura de plano de saúde quando contratado, a gravidade ou não da situação clínica de urgência ou emergência, com ou sem risco de morte, intensidade da dor perante a enfermidade entre outras situações. Existe uma tradição típica dos grandes sistemas públicos de saúde pela busca da universalidade, da prestação integral de atenção e da equidade, bem como a organização de uma rede hierarquizada e regionalizada de serviços. Com a criação do SUS passaram a existir no Brasil dois outros princípios inovadores - a democracia direta com gestão participativa, a partir do controle social da ação governamental por segmentos da sociedade civil; e o princípio da descentralização para os municípios quanto à responsabilidade pela organização e gestão dos sistemas locais de saúde (CAMPOS, 2006). O sistema de saúde público é apresentado à população como uma garantia constitucional de um sistema gratuito, amplo e universal sem restrições, sobretudo, àquelas de natureza meritocrática e contributiva do trabalhador, onde durante a época do INAMPS excluíam-se do acesso aos serviços públicos de saúde os cidadãos desempregados e indigentes que não contribuíam com a previdência social brasileira. Desde a constituição de 1988, o Sistema Único de Saúde, portanto, reflete uma política institucional da saúde de ação afirmativa, ampliando consideravelmente as formas de acesso das demandas mais carentes da população, mas ainda com inúmeras iniquidades de acesso concebidas pelos mais otimistas a favor do SUS, como desafios a serem vencidos, ao longo da construção deste novo modelo de saúde que já computa duas décadas de existência. Menezes (2009) corrobora que o SUS, ao ser implementado no Brasil, pode ser considerado como uma das maiores ações de distribuição de renda e acessibilidade a um serviço de saúde no mundo, redirecionando seu foco a alguns membros da sociedade para uma atenção integral e universal da população, sem 25 distinção de classe ou renda, constituindo, para todos, um direito constitucional e inalienável, instituído por uma legislação própria e sólida. Tendo em vista que o pagamento direto por serviço de saúde tem se tornado praticamente incomum diante das formas de acesso ao sistema de saúde privado mais popularmente viáveis, destaca-se a contratação direta ou indireta por meio de plano privado de assistência à saúde, onde é definido como prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preços pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando à assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta da ordem do consumidor (BRASIL, 1998, p. 1). Cabe ressaltar que os custos do plano de saúde ficam a critério do contratante que pode ser uma pessoa física classificada como cidadão titular, podendo ser este o consumidor ou não do plano de saúde; ou a partir da pessoa jurídica que pode ser constituída por empresa familiar, de negócios, classe de operários, sindicalistas, entre outros. Também é importante lembrar que o acesso propriamente dito no âmbito privado depende do cumprimento de algumas exigências pelos contratantes. Seguindo os preceitos da legislação suplementar brasileira, além do pagamento das prestações de boletos ou faturas para usufruir um serviço qualquer, o contratante deverá observar que seu direito líquido e certo está relacionado à cobertura ou segmentação contratada, e também que sejam previamente cumpridos os prazos de carência, quando cabíveis ou os de cobertura parcial temporária, quando existir doença ou lesão pré-existente. A coexistência de sistemas de saúde público e privado, que configuram formas diferenciadas de acesso no Brasil é uma característica da política de saúde brasileira ressaltada pelo modelo de regulação, que executa políticas de governo, monitorando serviços contratados prestados ao público, tratando das preocupações das partes interessadas, e equilibrando o cenário circunscrito entre os entes envolvidos. Barata (2009) condiciona as diferenças no acesso aos determinantes socioeconômicos, configuração dos princípios constituintes da política nacional de saúde, forma de organização dos serviços e as formas de relação que se estabelecem entre clientela e profissionais de saúde. O papel da ANS na regulação dos planos de saúde caracteriza um sistema público que regula o setor de saúde privada. Dada a relevância pública da saúde individual e coletiva, o 26 Estado pode intervir em qualquer hospital privado, credenciado ou referenciado pelas operadoras de plano de saúde, possuindo o poder de regular, ditar normas e fiscalizar as atividades que envolvem a saúde suplementar. Independentemente da lógica de mercado nortear a saúde suplementar; este campo complementar da saúde também está previsto na constituição, ora por convênio, ora por contrato, e desta maneira não se pode distanciar da necessidade da regulação pelo Estado a fim de garantir os direitos dos consumidores de planos que podem também opcionalmente ser usuários do SUS. A pretensão da universalidade do acesso e financiamento público advindo da constituição de 1988 não se destaca da cobertura privada quando o assunto é acesso amplo, equitativo e universal. Embora não se possa afirmar que a contratação de acesso a serviços de saúde, através de planos de saúde acontecerá em todas as situações, acredita-se que a peregrinação do usuário que apenas dispõe da opção da oferta dos serviços públicos de saúde é provavelmente maior. Os fatores de concorrência pela demanda, tempo para usufruir um serviço ou tratamento específico; e a inexistência de um plano B, no caso do usuário do sistema público não ser beneficiário de plano de saúde, em que o referido usuário pudesse recorrer quando lhe fosse dificultado, até mesmo negado o acesso por determinado motivo no Sistema Único de Saúde, são possíveis explicações para a hipótese de que a peregrinação do usuário do SUS até o acesso de um bem ou serviço de saúde seja maior do que a do usuário do sistema de saúde privado. Entretanto, a dificuldade de acesso não é característica somente de quem depende da saúde pública, haja vista as barreiras de acesso no momento da utilização do serviço de quem dispõe de plano de saúde, pelo contingente enorme das demandas, das filas para atendimento tanto ambulatorial, para internações, como para realização de exames complementares e diagnósticos, além dos serviços de urgência e emergência que vem aumentando, da mesma forma, que as filas enfrentadas pelos usuários do Sistema Único de Saúde. Santos, Malta e Merhy (2008) analisaram os principais resultados alcançados na regulação brasileira da saúde suplementar no período de 2000-2006 como inúmeros avanços na estrutura e operação do setor, tais como maior solidez e crescimento neste período, compreendendo um aumento de cerca de 30% do número de beneficiários de planos privados de saúde, correspondendo a 24% da população brasileira beneficiária, ressaltando-se que alguns desses beneficiários têm mais de um plano, podendo estar registrados em mais de uma operadora. Todavia, tais avanços paralelos também à regulação tanto econômica como 27 assistencial exercida pela ANS, não desmerecem os enfrentamentos que permanecem em lacunas no processo regulatório que precisam ser aperfeiçoadas. Gerschman et al. (2007), em pesquisa qualitativa sobre a satisfação de 82 beneficiários de planos de saúde de hospitais filantrópicos nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, constataram que 20 destes participantes já tiveram pelo menos um pedido de procedimento negado pelo plano, listando a demora na marcação de consultas; restrição ao tratamento de doenças cardíacas e outras; restrição no número de consultas e exames e no tempo de internação e de Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) e „mistura‟ com o atendimento do SUS como motivos de insatisfação. Considerando as razões de satisfação com os planos de saúde, os beneficiários estudados por tais autores destacaram as certezas de acesso ao tratamento, à hotelaria e à privacidade, denominados como „privilégios‟ em relação ao SUS. Em muitos casos existem usuários de planos que também não têm um fácil acesso aos serviços assistenciais privados, pelo excesso de burocratização das autorizações para exames, consultas e internações, informações cadastrais eletrônicas erradas do produto do serviço de saúde contratado no site da própria operadora e até mesmo envio de cadastro de informações erradas tanto do plano como de seu beneficiário para a própria ANS, com efeitos em negativas de cobertura on line, marcação tardia de consultas e exames, entre outros motivos. Enquanto as vagas dos leitos hospitalares são insuficientes para a demanda elevada de usuários do SUS, torna-se comum a sobra de vagas nos leitos hospitalares da rede privada de assistência, entre outras razões, pela infinidade de burocracias que os beneficiários de planos de saúde têm que enfrentar para utilizar um serviço qualquer. Já as demandas da rede pública não poderiam ser predominantemente espontâneas e gerenciá-las a partir do aperfeiçoamento dos sistemas de informação reduziria a procura em vão de um serviço e a espera cansativa numa fila. A saúde passa para uma posição política e técnica à medida que a mesma é legitimada na Constituição como um direito fundamental do ser humano e dever do Estado, ampliandose a dimensão dos direitos sociais e da cidadania nacional. Em contrapartida, o tempo de acesso aos serviços públicos e privados pode variar e a marcação é geralmente tardia para exames de diagnósticos e complementares, em especial os de alta complexidade, tornando-se comuns as filas que estão presentes, tanto no sistema público, como no privado. O estudo justifica-se pela relevância das ações em saúde que valorizam o ser humano dentro de uma identidade cívica, parametrizada pelas condições necessárias à sua sobrevivência, respeitando sua subjetividade e opinião num processo de avaliação descritiva do sistema suplementar de saúde, reforçando a importância do controle social nestas ações. 28 A perspectiva do usuário sobre o acesso à saúde privada reflete o valor social que o mesmo atribui a essa modalidade de prestação de serviços, funcionando como um importante instrumento regulatório sentinela do mercado de planos de saúde. Pode refletir, ainda, a polarização entre o direito constitucional, abstrato e universal, e o direito individual, reconhecido e determinado pela subjetividade de cada sujeito. No mesmo raciocínio, neste estudo cabe refletir o direito privado e contratual dos beneficiários de planos de saúde, que no momento de utilizarem um serviço se defrontam com barreiras inerentes aos interesses de mercado, das várias modalidades de operadoras de planos de saúde. O que se assiste frequentemente na mídia é um constante desgaste da população, principalmente a de baixa renda, na tentativa de marcar os seus exames no serviço de saúde público, deparando-se sistematicamente com falta de vagas, inexistência de aparelhos ou existência de aparelhos danificados e sem funcionamento. Com isso, ou não há a marcação do exame, ou o mesmo é marcado para um tempo demasiadamente longo, postergando o diagnóstico e um possível tratamento para a doença em questão. É pertinente refletir se o constante aumento no número de pessoas que procuram a suposta proteção privada do seguro-saúde está, ao menos em parte, embasada na competência do atendimento de alta complexidade comparativamente ao SUS e no acesso facilitado a esses recursos. A partir dessas considerações, delimitou-se como objeto deste estudo o acesso aos exames de alta complexidade na perspectiva dos usuários de planos de saúde privados. O conhecimento da forma como os usuários concebem o acesso aos exames de imagem mais custosos nos planos de saúde poderá servir como contribuição para avaliação dos atributos relevantes de qualidade das ações ofertadas pelos serviços privados de saúde. Poderá contribuir, ainda, para estudos implementadores da regulação das demandas pelas operadoras de planos de saúde, possibilitando a compreensão da temática para a construção de um cenário que contemple a possibilidade de um planejamento mais adequado de distribuição territorial dos equipamentos, segundo as necessidades dos usuários. Além disto, o estudo reiterou o acesso como condição para o aperfeiçoamento da atenção à saúde, servindo como instrumento regulatório da saúde suplementar. Possibilitou, também, a discussão e a compreensão das discrepâncias e defasagens presentes na lacuna entre o direito (público e contratual) dos serviços de saúde e o acesso propriamente dito, refletindo as falhas na organização dos sistemas perante a dicotomia entre o direito e o acesso, na perspectiva do usuário de plano de saúde. 29 O objetivo geral desta pesquisa consiste em analisar as percepções do acesso aos exames de alta complexidade no sistema de saúde privado entre usuários de planos de saúde no Rio de Janeiro. Os objetivos específicos compreendem descrever as percepções dos usuários de planos de saúde acerca do acesso para realização de exames de alta complexidade; analisar as motivações dos usuários de planos de saúde para a realização de exames de alta complexidade através da rede privada de assistência; analisar as motivações dos usuários de planos de saúde para a realização de exames de alta complexidade através da rede privada de assistência e analisar o nível de satisfação dos usuários de planos de saúde quanto ao acesso aos exames de alta complexidade. 30 1 O ACESSO ÀS TECNOLOGIAS E SERVIÇOS DE SAÚDE NO BRASIL 1.1 O acesso no Brasil e suas dimensões O acesso às ações de saúde no Brasil tem um conceito plural e complexo, tendo em vista que representa a facilidade de obtenção de um bem ou serviço que no caso da saúde denota o cidadão em pleno gozo para o exercício de outros direitos, a partir de dimensões diversificadas no contexto sócio, econômico e político implicados para operacionalidade de sua real aquisição. Assim, no Brasil, o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde é uma das exigências instituídas pela Constituição de 1988 (Art.196) para a equidade desejada no preceito de que a saúde é um direito de todos e dever do Estado. As políticas de saúde apresentam, reiteradamente, o acesso do usuário aos serviços como um paradigma básico para planos nacionais e projetos regionais e locais de ampliação da rede de serviços existentes (COHN et al., 2006, p. 26). Estudos de revisão de Acursio e Guimarães (1996) sobre acessibilidade a ações e serviços de saúde em pacientes infectados pelo Human immunodeficiency virus (HIV); exemplificando o acesso a medicamentos profiláticos para o vírus da imunodeficiência humana adquirida; e utilizando-se a base de dados da epidemia desta síndrome, apontam a necessidade de se compreender as implicações das diversas barreiras de acesso aos serviços, considerando os custos sociais e humanos da infecção pelo HIV, as necessidades e demandas dos indivíduos infectados e as consequências que o não-atendimento em tempo hábil pode ter para estes indivíduos. A melhor sobrevida está diretamente relacionada ao acesso aos serviços de saúde, e assim, a acessibilidade é definida como “a capacidade do paciente obter, quando necessitar, cuidado de saúde, de maneira fácil e conveniente” (ACURSIO; GUIMARÃES, 1996, p. 36). Para Unglert (1990), o acesso à saúde envolve aspectos que extrapolam a assistência à saúde, os quais envolvem fatores socioeconômicos e culturais que interagem com características intersetoriais ligadas à própria estrutura política de cada país. De acordo com Silva (2005), a acessibilidade tem conceito próximo ao de cobertura, mas não é equivalente, pois, enquanto, a acessibilidade tem relação com a distribuição geográfica adequada dos centros de saúde e equipamentos necessários à realização de exames complementares; a cobertura poderá ser potencial quando decorrente de uma estrutura de ação 31 educativa relacionada com a promoção da saúde, e real quando o processo é oriundo dessa mesma ação educativa relacionada com a promoção da saúde. Compreende-se, por conseguinte, que a cobertura tem uma estrutura proporcional de planejamento teórico para atingir os benefícios e um processo de efetivação quando se aplica essa estrutura na prática em relação à população alvo. Segundo Unglert (1990) e estudos correlatos da Organização Pan-americana de Saúde (1978a, 1978b), existem dimensões para que a acessibilidade possa ser garantida, considerando aspectos geográficos que preconizam adequado planejamento da localização dos serviços de saúde; econômicos pela remoção de barreiras derivadas do sistema de pagamento ou contribuição pelo usuário; culturais com a adequação das normas e técnicas dos serviços aos hábitos e costumes da população em que se inserem; e funcionais, através de oferta de serviços oportunos e adequados às necessidades da população. A funcionalidade de um sistema de saúde requer além do discurso político a operacionalidade do uso do direito constitucional na sua prática perante a necessidade emergente de todo cidadão que requer o atendimento prestado, seja como contribuinte de impostos, seja como contratante de plano de saúde privado ou como cidadão que sem orçamento depende de assistência direta ou indireta à sua saúde provida pelo Estado, família ou sociedade. Para Barata (2009), condições de vida em determinados espaços geográficos, assim como a posição social ocupada por classes sociais e ocupacionais, incluindo a escolaridade são poderosos determinantes do estado de saúde das populações, atuando sobre o perfil de morbidade e mortalidade, como também sobre o acesso e utilização dos serviços de saúde. Para Medeiros (2003), através de uma síntese das principais pesquisas contemporâneas de estratificação social predominam quatro grandes dimensões da vida em sociedade sobre as quais a estratificação é feita, podendo ser denominadas de ocupação, bens simbólicos, poder político e interesses no conflito distributivo. Em relação à distribuição de renda no Brasil, as disparidades econômicas e sociais remontam de políticas sociais excludentes. Desta forma, 10% dos brasileiros ficam com 75% da riqueza nacional; 1% dos proprietários rurais fica com quase 50% das terras agricultáveis; e de acordo com os últimos dados oficiais existe uma maior concentração da propriedade de terra e uma maior concentração de poder no setor financeiro. Pela lógica do agronegócio ou dos bancos privados, de maximização dos lucros, a polarização continua e a brecha entre ricos e pobres tende a aumentar (BAVA, 2009, p. 3). A atuação do Estado estabelece-se visando a preservar não os interesses da sociedade 32 como um todo (emprego, renda, proteção social, entre outros), mas os interesses de uma parcela específica de agentes, cujos negócios dependem fundamentalmente dessa atuação (PEREIRA; RAMOS, 2006). Assim, corrobora Mestriner (2008) que demonstra que o aumento da desigualdade social e do desemprego funcionam com elementos catalizadores de grupos sociais que perdem, além de acesso aos bens materiais, a possibilidade de inserção social, haja vista que perdem também a possibilidade de encontrar um lugar no mundo do trabalho, no espaço público e nas instituições a ele relacionadas. Para Mestriner (2008), embora o regime democrático tenha se inserido como reconhecimento formal de direitos e garantias civis legalmente no Brasil na década de 90, há uma realidade oposta à justiça que desprestigia pessoas humanas, reiterando diariamente a violência e a violação de direitos humanos. O governo e sociedade vendem uma imagem legal que não se realiza, porque avançam com um planejamento que não é operacionalizado, tamanho é o reconhecimento da cidadania na teoria, não a instituindo como deveria ser na vida prática. A acessibilidade formalizada como direito constitucional deve atender as diferenças nas demandas, independente das condições econômicas, pois todos os cidadãos têm direito equitativo ao atendimento, considerando o direito do livre arbítrio para a duplicidade de acesso, tanto no âmbito público, como no privado. Entretanto, a acessibilidade, no caso brasileiro, vista tecnicamente, leva em conta a disponibilidade dos serviços não só segundo a proximidade, mas também de acordo com o grau de morbidade da demanda, ou seja, o atendimento planejado supõe uma demanda hierarquizada por diferentes tipos de serviços, desde os mais simples até os mais tecnologicamente complexos. Esse modelo projetado pelas políticas de saúde no Brasil tinha por objetivo a montagem de um cenário a ser articulado pelas ações das instâncias governamentais regionais, predominantemente, pelas secretarias de saúde dos estados e municípios. Contudo, por interferência, sobretudo das políticas previdenciárias de nível federal, o cenário pretendido se torna mais complexo, modificando papéis e gerando modos diferenciados de utilização por parte daqueles que conformam à demanda (COHN et al., 2006, p. 69). Nas últimas quatro décadas, os estudos das barreiras de acesso continuam sendo o principal foco de investigação de saúde, tal como se caracterizam as barreiras financeiras, organizacionais, ecológicas, socioculturais e de condutas a cuidados e serviços de saúde, embora não corresponda a realidade no espaço latino-americano, especificamente no Brasil, onde este problema é um dos mais discutidos, e menos analisados nesse campo de investigação (ACURSIO; GUIMARÃES, 1996). Conill et al. (2008), em trabalho que analisou a experiência de saúde, doença e cuidados por usuários do segmento suplementar em situações ou necessidades de saúde nas áreas de cuidado cardiovascular, oncológico, saúde mental e obstétrico, no município de 33 Florianópolis, Santa Catarina, referem que a experiência da doença desvela aspectos tanto sociais como cognitivos, tanto subjetivos (individuais) como objetivos (coletivos), importando conhecer o movimento pelo qual as práxis individuais e a generalidade do social se constituem e reconstituem mutuamente. O sofrimento gerado pela dor e desgaste de todo o enfrentamento destinado à solução do processo patogênico traz implicações na maneira de agir e perceber essas experiências quando a resolutividade do problema distancia-se do foco do cuidar e aproxima-se da fragmentação de tecnologias duras e atendimento sem vínculo, responsabilização profissional e acolhimento. 1.2 Tecnologia em Saúde A incorporação tecnológica constitui demanda do mercado, do SUS e da ANS, onde iniciativas coordenadas pela Secretaria de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde no sentido de propor a incorporação de novas tecnologias baseadas nas necessidades do usuário são pautadas pelas evidências e estudos de custo - efetividade, e não pela demanda do mercado produtor de tecnologias (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). O consumo dos diversos tipos de tecnologias pode ser estabelecido a partir de „tecnologias duras‟, com ênfase na realização de exames, imagens e procedimentos (equipamentos); „leve-duras‟ com a estruturação de saberes em diferentes áreas do conhecimento (clínica-médica, psicanálise, epidemiologia, entre outras) capazes de gerar protocolos e as „tecnologias leves‟ centradas nos saberes que resultam na produção do cuidado em saúde e na capacidade de decisão do profissional (MALTA et al., 2004). Conforme Santos, Malta e Merhy (2008, p.1474) em relação às tecnologias diversas aplicadas “torna-se necessário criar uma cultura institucional e operar em conjunto com as instituições de ensino e pesquisa, visando respostas mais adequadas ao setor saúde, tanto público quanto privado”. A política pública de saúde está orientada para as tecnologias assistivas, que devem ser disciplinadas pelo cuidado humanizado e não pela instrumentalização do cuidado. Entretanto, A transição tecnológica significa um novo padrão de produção do cuidado, que altera não apenas o modo de organização do processo produtivo, mas inverte a composição técnica do trabalho, configurando hegemonia do trabalho vivo nos processos de trabalho, mediada por 34 certas intencionalidades vinculadas ao ato de cuidar. Significa operar na assistência com sentidos diferentes dos que existem no modelo „médico hegemônico, produtor de procedimentos‟, pois tem sua ação voltada ao campo das necessidades dos usuários (FRANCO; MERHY, 2010, p.189). De acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS, 2007), no contexto do SUS, as tecnologias de alta complexidade podem ser compreendidas como um conjunto de procedimentos que envolvem alta tecnologia e alto custo, tendo como objetivo possibilitar o acesso da população a serviços qualificados. No SUS existem várias áreas de alta complexidade, como assistência ao paciente portador de doença renal crônica (diálise), assistência ao paciente oncológico, cirurgia cardiovascular, procedimentos endovasculares invasivos e intervencionistas, procedimentos neurocirúrgicos, entre outros (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007). Tecnologia em saúde, portanto, pode ser entendida como um conceito amplo que reitera sua definição como o conhecimento aplicado que permite a prevenção, o diagnóstico e o tratamento das doenças, além da reabilitação das suas consequências [...], podendo incluir „medicamentos, materiais e procedimentos, sistemas organizacionais, informacionais, educacionais e de suporte, e os programas e protocolos assistenciais, por meio dos quais a atenção e os cuidados da saúde são prestados‟ (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007, p.57). Conforme Vianna et al. (2005 apud Conselho Nacional de Secretários de Saúde, (2007), as tecnologias de alto custo nem sempre são sinônimas de alta complexidade. A caracterização das tecnologias de alta complexidade envolve três características que as diferenciam dos demais tipos de procedimentos. Dentre elas, constituem a incorporação de tecnologia de ponta e/ou existência de pessoal tecnicamente treinado para a sua manipulação (acima dos padrões médios); baixa frequência relativa de utilização em relação aos exames do nível básico de atenção e de média complexidade; e alto custo unitário de utilização, geralmente decorrente da tecnologia em si, ou de tratamento como um todo, como no caso da hemodiálise, e da utilização de medicações crônicas de alto custo e de longo período de utilização (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007). Entre as tecnologias de alta complexidade, no que se refere aos exames de imagem com fins diagnósticos analisados nessa pesquisa, envolvem tecnologia de ponta e alto custo, além de utilizar uma equipe altamente especializada na manipulação da tomografia computadorizada, ressonância magnética e da densitometria óssea. O uso da ressonância magnética e da tomografia computadorizada no diagnóstico das doenças diversas apresentou desenvolvimento tecnológico expressivo recente, o que levou a 35 um aumento na utilização destas tecnologias por parte dos médicos envolvidos no manejo de pacientes. Em relação às tecnologias em saúde, “o conceito de alta complexidade é dinâmico no tempo: o equipamento de raios X já foi tecnologia de ponta; hoje, é a ressonância magnética e a tomografia computadorizada que têm esse status” (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007, p. 57). O órgão Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON) de São Paulo aborda os procedimentos de alta complexidade como custo elevado, condutas e equipamentos de ponta (avanços tecnológicos) e obtenção de resultados satisfatórios, mas ainda não incorporados às rotinas ou práticas comuns. Atualmente são considerados procedimentos de alta complexidade alguns transplantes, tratamento de certos tumores e doenças. As pesquisas, os avanços do segmento médicohospitalar e a obtenção de resultados aliados à aplicação de novos medicamentos, métodos e tecnologias permitem constante revisão desses procedimentos que passam a ser tratados como rotineiros (MARTINS; PAULO, 2010, p. 53). A tecnologia médica aumenta os custos da saúde de forma progressiva, ao passo que o desenvolvimento tecnológico industrial preocupa-se com a diminuição ou otimização dos custos. Os avanços tecnológicos na saúde e a indústria farmacêutica nem sempre têm foco humanitário, com propósito afastado da cura e baseado no lucro de acionistas. Por conseguinte, caso os sistemas públicos de saúde não disponham de critérios técnicos para a incorporação tecnológica não existirão recursos suficientes (SANTOS; ANDRADE, 2009). O foco não humanitário referido corresponde ao modelo médico hegemônico produtor de procedimentos, que para Malta et al. (2004) sumariza a saúde em atos prescritivos, geradores de procedimentos que não consideram os determinantes do processo saúde-doença centrados nas condições sociais, ambientais e fatores relacionados à subjetividade, valorizando apenas o aspecto biológico do ser, elevando custos e diminuindo a eficácia da assistência prestada. Para elucidar a funcionalidade do modelo assistencial, destaca-se que a expressão modelo assistencial ou modelo de atenção à saúde é utilizada na saúde coletiva para caracterizar o conjunto de estruturas, práticas profissionais, conhecimentos e tecnologias disponíveis sobre o cuidado no processo saúde-doença e os modos de organização de serviços e do trabalho em saúde formalmente institucionalizados e legalizados em uma sociedade histórica dada (CONILL et al., 2008, p.1502). O modelo tecno-assistencial que delineia o sistema de saúde como uma pirâmide com fluxos de demandas de atendimento ascendente e descendente de usuários através de acesso nos diferentes níveis de complexidade tecnológica, cujo objetivo seria a garantia da maior 36 eficiência no uso de recursos, universalização e equidade do acesso, não se concretiza na prática dos princípios norteadores do SUS tão desejosos dos técnicos e gerentes do sistema. Apontam-se distorções na aplicabilidade dessa pirâmide que implicam na “prepotência tecnocrática” que responsabiliza a decisão do cidadão, o qual procura o pronto-socorro no lugar do centro de saúde (CECÍLIO, 1997). Para Cecílio (1997, p.472), “as pessoas acessam o sistema por onde é mais fácil ou possível. Não é à toa que a assistência à saúde ocupa um lugar central nas preocupações do „cidadão comum‟”. Como explicações da não aplicabilidade do modelo da pirâmide são inúmeros fatores relacionados, tais como aspectos do financiamento do SUS, relação público e privado, modo de gestão do setor público, modo de controle dos usuários e o próprio modelo tecnoassistencial pensado nos moldes de uma pirâmide hierarquizada de serviços organizados do SUS (CECÍLIO, 1997). Existem especificidades no trabalho em saúde, pois o mesmo está implicado no espaço relacional que envolve o usuário e o produtor de saúde em tecnologias voltadas para o cuidado, através de relação intercessora entre ambos, estabelecida em atos que compreendem subjetividades determinantes do processo de recuperação da saúde (MALTA et al., 2004). Considerando que na saúde o setor privado é abarcado pelo sistema público “[...] o estudo de modelos assistenciais em saúde suplementar não é desvinculado do entendimento global do funcionamento do SUS” (MALTA et al., 2004, p.443). Discutindo a incorporação tecnológica no SUS, de acordo com Cecílio (1997), o sistema de saúde seria mais adequadamente pensado como um círculo, com várias “portas de entrada” situadas em diversos pontos do sistema e não mais em uma suposta “base”. O hospital sairia do “topo” da pirâmide, o que desfaria essa concepção vertical de pirâmide substituindo-a para a lógica horizontal que contempla vários serviços de saúde colocados na superfície plana do círculo, incluindo os de procedimentos de alta densidade tecnológica, garantindo o acesso ao serviço adequado, à tecnologia adequada de forma apropriada e com a responsabilidade intransferível do sistema de saúde. O SUS exemplifica uma grande política pública democrática, mas com características de desumanização nos serviços de saúde estatais e privados (PAIM, 2008). Para Malta et al. (2004, p. 443), “a compreensão e a regulação da assistência supletiva deve considerar as experiências e modelagens produzidas no público, com o objetivo de compará-las e assim estabelecer novos conhecimentos”. 37 Muitos desenvolvimentos tecnológicos ocorreram ao longo da história, o que é corroborado pela afirmação em que “a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 50% de todos os avanços terapêuticos disponíveis na atualidade não existiam há dez anos” (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007, p. 56). Antes da incorporação das novas tecnologias em saúde nas práticas diárias é necessário assegurar que as tecnologias sejam seguras e tragam benefício com o seu uso, havendo relação custo-benefício satisfatório. Durante a fase experimental da nova tecnologia, são conduzidos estudos sobre segurança e eficácia, geralmente realizadas por acadêmicos e pela indústria criadora da tecnologia, sendo um pré-requisito para as fases seguintes. Após esta aprovação inicial, existe a fase de implementação, em que há a análise do custoefetividade da tecnologia. Havendo custo-efetividade satisfatório, tem-se a fase de generalização, em que há liberação para o uso globalizado da tecnologia, de acordo com a sua área de aplicação, havendo monitoramento dos seus efeitos positivos e negativos no curto, médio e longo prazos (CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE, 2007). O acesso referente à distribuição espacial dos equipamentos e serviços é a primeira condição para viabilizar a utilização dos recursos pelos usuários e, certamente, é um elemento fundamental contido no princípio linear de que a oferta produz a demanda (COHN et al., 2006). As barreiras físicas de acesso presumem a distância geográfica entre a residência do usuário e o provedor do serviço que pode oferecer um serviço em menor quantidade que a demanda pretendida para determinada região que às vezes não considera os aportes de outras áreas proximais e até distantes. O impasse da produção de demanda surge da oferta do serviço; em contrapartida a necessidade do usuário que faz buscar este serviço, considerando que ambas são reflexões pertinentes que dividem o primeiro entendimento em voga de que a oferta de serviços em saúde produz a demanda. Como reflexão conceitual de produção de demanda para determinado serviço, de acordo com Franco e Merhy (2010, p.185), “[...] é aquela que se constrói a partir da nãorealização de certas necessidades, por outros serviços”. O não atendimento de uma necessidade menos grave num nível de atenção primário pode exigir uma etapa mais complexa de tratamento nos níveis secundários e terciários, devido ao desdobramento e avanço de doença. Fica evidente, então, que uma necessidade não atendida por um serviço básico pode prejudicar o bem-estar daquele que procura imediatamente uma consulta para primeiro diagnóstico ou prevenção de doença precocemente (FRANCO; MERHY, 2010). No que se refere ao acesso das demandas aos serviços de saúde no Brasil: 38 a distância ou a proximidade entre o local da residência do usuário e o local da prestação do serviço constitui a razão, assim, para orientar a distribuição dos recursos e a ampliação da rede de unidades de serviços de assistência médica. O acesso assim entendido deveria ser, em tese, a base concreta para a viabilização do princípio da articulação funcional que sustenta a concepção de hierarquização da demanda pelos serviços de saúde, condição sine qua non para regionalização e descentralização que a Constituição impõe. Essa concepção se pauta na acessibilidade do usuário ao serviço como mecanismo básico para que, de fato, as propostas se traduzam em resultados observáveis e mensuráveis (COHN et al., 2006, p. 68). Franco e Merhy (2010, p.184) referem que “[...] a busca por assistência parece ser uma das formas de construção da demanda, a partir da percepção do usuário e os sentidos refletidos nas práticas assistenciais implicadas com a produção da saúde”. A relação pressuposta entre o usuário e o serviço de saúde estabelece-se através de fluxos comunicantes, com derivação para o cuidado ou descuidado, perante a instituição de ofertas, demandas, desejos, realizações de expectativas e satisfação de necessidades (FRANCO; MERHY, 2010). A demanda caracterizada pela morbidade retrata uma necessidade que impulsiona a busca por determinado serviço onde é oferecido, portanto, parece aceitável afirmar que tanto a necessidade imperiosa de tratamento à saúde, como a oferta pelo serviço, produzem a demanda. Contudo, existe tensão fruto da contradição entre o modelo de produção do cuidado que se propõe e o outro produtor de procedimentos, como é atualmente (FRANCO; MERHY, 2010). O ideal para controlar as demandas para serviços de saúde transcende níveis organizacionais e políticos, considerando que prevalece uma cultura arraigada de procurar um serviço somente quando precisa em extrema urgência ou emergência, desfocando práticas integrais de promoção e prevenção de doenças que reduziriam desproporções das procuras espontâneas para os níveis secundários e terciários da atenção à saúde. Desta forma, “os usuários associam a solução de seus problemas de saúde a certos produtos realizados pelo serviço, atribuindo ao procedimento em si mesmo a satisfação de suas necessidades” (FRANCO; MERHY, 2010, p.185). Segundo Franco e Merhy (2010, p.185), “[...], observa-se que esta ideia é muito comum – isto é, o usuário forma uma imagem que coloca no procedimento toda a expectativa de ser cuidado e protegido, quando na realidade é um recurso limitado”. Em contrapartida, sabendo-se que a saúde suplementar não dispõe de obrigatoriedade legal de prover todas as ações e serviços em saúde como as que ocorrem no SUS, destaca-se que a atenção básica organizada, articulada e completa não caracteriza os produtos ofertados pelos planos privados de saúde. Ainda que práticas de promoção e prevenção sejam fomentadas pela ANS e outros agentes da academia universitária, buscando mudanças no modelo assistencial da área suplementar de saúde, é um desafio superar a fragmentação da 39 linha do cuidado, garantindo a sua integralidade, visto que para Santos, Malta e Merhy (2008) essa questão necessita de enfrentamento. Pinheiro (2009) refere que existem problemas similares referentes ao acesso nos planos de saúde como os que ocorrem no sistema público, visto que não há valorização de ações como as de atenção básica que ocorrem no SUS. Os segurados também encontram dificuldades para atendimento, com atraso na marcação de exames e consultas, o que provoca filas, faltando médicos pediatras e clínicos nos hospitais privados, já que estas são as duas especialidades pior remuneradas pelos planos. A mistura das demandas de atendimento eletivo com as de maior gravidade nos postos de urgência e emergência dos hospitais públicos e privados vem se tornando comum o que exige cada vez mais a necessidade da regulação dos atendimentos, a partir de consultas de triagem a fim de direcionar a organização do serviço e a satisfação do usuário, evitando filas e superlotações desnecessárias. Existem avanços nas propostas de mudança do modelo de atenção na saúde suplementar, considerando que grande número de projetos de promoção à saúde e prevenção de doenças vem sendo apresentado pelas operadoras de planos privados de saúde para aprovação junto à ANS, impactando de forma positiva na tentativa de efetivação de tal mudança, tendo em vista que passaram a ser incorporadas na prática discursiva e do marketing de diversas operadoras que estão inserindo o lema do cuidado à saúde e da responsabilidade com a promoção da saúde do beneficiário (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). Contudo, para Franco e Merhy (2008, p. 1519), “[...] os movimentos de mudança, mesmo os que inauguram novas práticas de cuidado, não tiveram ainda potência para produzir uma ruptura com o modelo médico”. De acordo com Malta et al. (2004, p. 443), “[...] a saúde suplementar deve trabalhar sob o prisma da prevenção, da promoção, estimulando essa prática em todos os seus prestadores, não como marketing da operadora, mas como prática cotidiana de fato incorporada”. Para Bahia (2008, p.172), “as convicções sobre as possibilidades de aplicar uma „economia da prevenção‟ à implementação de modelos técnico-assistenciais produtores de saúde galvanizaram o debate sobre a assistência suplementar [...]”. É importante destacar que as ações de promoção de saúde incluem atividades informativas com justificativa ética e educativa no sentido de direcionar, principalmente em relação aos adultos. As autoridades sanitárias responsáveis por funções informativas e educativas para a população se não vierem pautadas de um fortalecimento econômico, político, social e cultural dos indivíduos e grupos socialmente marginalizados terão efeito 40 retórico, considerando a natureza de tarefa técnica específica da promoção da saúde e politicamente das mais complexas (LEFEVRE; LEFEVRE, 2004). De acordo com Lima (2005) as sete principais ações propedêuticas voltadas para a comunidade podem ser agrupadas em ações de promoção e proteção da saúde (orientações sobre higiene ambiental, legislação sanitária, preservação das habitações, higiene alimentar, escolar e do trabalho); ações de promoção de saúde (orientações nutricionais, educação sanitária, controle da procriação, padrões de saúde vivencial, escolar, coletiva, assistência aos idosos e aos portadores de limitações físicas e mentais); ações de prevenção das doenças (vacinação, orientações sobre concepção e contracepção, notificação de doenças contagiosas aos setores de saúde pública, prevenção de acidentes e doenças crônicas como câncer, tuberculose, diabetes, doenças cardiovasculares, AIDS, entre outras.); ações curativas (tratamento dos doentes nos domicílios, nos hospitais ou em instituições análogas); ações de reabilitação (reintegração das pessoas à sociedade, nos planos físico, mental, social e vocacional); ações de investigação epidemiológica, sociológica, administrativa e demográfica (participação em estudos para correlacionar a verdade científica com a social e a política) e, finalmente, as ações de ensino que atuam na formação, preparação prática de todas as categorias, considerando no ensino aspectos concretos, conexos, complexos, circunstanciais, criativos e transformadores da realidade. Em relação ao SUS, muito ainda deve ser feito, como um melhor estudo das áreas geográficas de implantação dos serviços de assistência (almejando um atendimento mais completo contra mordedura de cobra em postos rurais do que em urbanos, por exemplo), adequando esta assistência à realidade local, além do melhor aparelhamento de todos os níveis de assistência, salários e condições de trabalho dignas aos profissionais da saúde, bem como a criação de um sistema de referência e contrarreferência eficiente e pouco burocrático. O que se observa no SUS é a presença de pacientes com um nível baixo de complexidade de sua doença ser atendidos em hospitais terciários, rejeitando os postos de saúde por medo de perderem o vinculo com o hospital terciário, mais completo e melhor estruturado, fazendo com que estes fiquem sem vagas para atender os casos realmente complexos. Caso houvesse um sistema de referência e contrarreferência funcionante e que oferecesse ao paciente a certeza de que ele sempre conseguiria assistência ao hospital encaminhado, conforme o desenvolvimento da complexidade de sua doença, estas dúvidas e incertezas seriam sanadas. Dentre as ações de promoção da saúde a busca por adesão ao tratamento também é uma questão importante, pois o paciente também deve ser o protagonista do seu processo de 41 saúde e doença, regulando suas ações e participando da sua terapêutica, aderindo ao tratamento e tirando as suas dúvidas. Entretanto, aderir ao tratamento não depende exclusivamente de determinismo e vontade do paciente que pode estar resignado às suas particularidades sociais e econômicas que o impedem de conseguir não só a medicação prescrita, mas alimentar-se de todas as suas refeições diárias, estar incluído socialmente e não marginalizado sem emprego. A revelação desejável da autopercepção individual, decorrente da necessidade humana de buscar ajuda no sistema público ou privado de saúde é traduzida pelo autocuidado, possibilitando ampliar o acesso às ações e serviços de saúde, destacando que de fato com o SUS houve ampliação do direito ao tratamento das pessoas em sofrimento, incluindo aí a saúde suplementar. 42 2 A SAÚDE SUPLEMENTAR NA POLÍTICA DE SAÚDE BRASILEIRA 2.1 Surgimento da saúde suplementar nas políticas de saúde Em meados da década de 1960 ocorreram mudanças nas relações entre financiadores e provedores de serviços que culminaram no empresariamento da medicina, com redes próprias que se estabeleceram por convênios médicos entre as empresas empregadoras com empresas médicas (cooperativas médicas e empresas de medicina de grupo), mediadas pela Previdência Social (BAHIA, 2001). Por outro lado, o mercado dos planos privados de saúde desenvolveu-se em paralelo à urbanização, à industrialização do país, à renda e ao emprego formal (ALBUQUERQUE et al., 2008). Em relação à visão de mercado ampliada para a saúde, um conjunto de fatores evidencia que: O projeto mercantilista assume a saúde como mercadoria, defendendo o mercado como a melhor opção para a alocação de recursos e para a satisfação das demandas e necessidades dos indivíduos, com base no valor „utilidade‟. Reúne interesses de empresas médicas, seguradoras e operadoras de „planos de saúde‟, indústrias de medicamentos e de equipamentos, parte de entidades médicas e de profissionais de saúde, além da mídia e de empresas de publicidade. Defende que os serviços de saúde devem ser comprados pelos que podem pagar, cabendo ao Estado financiar àqueles que não podem fazê-lo (PAIM, 2008, p.112). De acordo com Bahia (2001), a Previdência Social era um poderoso financiador de serviços organizados em redes assistenciais próprias das empresas médicas, as quais tornaram-se compradoras de serviços, através de credenciamentos de profissionais, laboratórios e hospitais. Enquanto as Unimed‟s complementaram suas redes de atendimento através de credenciamento de hospitais e laboratórios, a medicina de grupo efetivava sua rede por meio de compra de consultas médicas realizadas pelos profissionais em seus próprios consultórios. A expansão da rede de serviços especialmente das medicinas de grupos desenvolveuse tanto devido à imposição das normas da Previdência Social sobre coberturas mínimas, como atendimento ambulatorial em determinadas especialidades, quanto pela necessidade de competir com as cooperativas Unimed‟s que tinham todos os seus associados para o atendimento dos convênios (BAHIA, 2001). Nesse contexto, em relação aos antecedentes do SUS: 43 O „sistema de saúde‟ brasileiro, formado ao longo do século XX, teve como marca a dicotomia entre saúde pública e assistência médico-hospitalar. De um lado, as campanhas sanitárias e, de outro, a filantropia, a medicina liberal, a medicina previdenciária e, posteriormente, as empresas médicas. Antes de 1930, não havia o reconhecimento dos direitos sociais no Brasil. A partir da era Vargas, introduz-se o direito à assistência médica apenas para os trabalhadores urbanos com carteira de trabalho assinada. A extensão de cobertura para os trabalhadores rurais por meio do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), efetuada durante o autoritarismo, apresentava-se mais como concessão do que um direito. O mesmo podia ser dito em relação ao acesso das populações rurais e das periferias urbanas aos Programas de Extensão de Cobertura (PECs) [...] (PAIM, 2008, p.94-95). Para Montone (2009, p.132) “[...] a imagem do SUS ficou marcada como o novo INPS ou o novo Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), enfim a área da assistência à saúde, mas o SUS está longe de ser apenas isso”. Ampliou-se de fato o acesso principalmente às ações de saúde a todos os cidadãos brasileiros, não apenas os que tinham emprego formal com carteira assinada. Em relação à terceirização de serviços privados na saúde que se estabelecia a partir da remuneração por procedimentos executados por prestadores médicos, remonta-se a época em que o INAMPS prestava serviços de assistência médica, hospitalar e ambulatorial aos trabalhadores do regime Geral da Previdência Social. Desses serviços, 30% eram do próprio INAMPS e 70% contratados de terceiros. As tabelas de procedimentos e as AIHs eram formas de pagamento desses serviços, mediante o critério de produção. As NOBs de 1991 e 1992 estabeleceram para os estados e municípios esse mesmo modelo, tratando os entes federativos como se fossem prestadores de serviços do Ministério da Saúde, e não entes responsáveis pela garantia do direito à saúde do cidadão (SANTOS; ANDRADE, 2009, p.43). No que tange aos efeitos da política previdenciária brasileira que mediava predominantemente à terceirização dos serviços de saúde, evidenciam-se que as consequências da política previdenciária que privilegiava o setor privado prestador dos serviços de saúde, por meio do financiamento concedido pela Caixa Econômica Federal (CEF) para criação de uma rede hospitalar privada com um mercado garantido por intermédio da compra de serviços pela Previdência, se manifestaram como crise e propiciaram a entrada do pensamento reformador e crítico na gestão da política previdenciária de saúde. A luta pela democratização da saúde encontra neste espaço de racionalização administrativa do sistema previdenciário um lócus estratégico para avançar na direção da unificação dos dois ministérios responsáveis pela saúde-o da Saúde e o da Previdência - por meio de programas de sucessivas aproximações como o das Ações Integradas de Saúde (AIS) e o do Sistema Unificado Descentralizado de Saúde (SUDS). No entanto, o desafio era transcender a mera racionalização em direção à universalização, à descentralização e à participação, que seriam a expressão política da democratização da saúde (FLEURY, 2008, p.50). Para Paim (2008, p.95), “somente com a Constituição de 1988 a saúde foi reconhecida como um direito social, cabendo ao Estado assegurar o „direito à saúde para todos os cidadãos‟, uma das maiores conquistas do movimento sanitário no Brasil”. A reforma sanitária brasileira pautada na descentralização buscava a mudança do desenho e da lógica de um sistema público, sem a necessidade de ocorrer a privatização da 44 prestação do serviço, ou sem que o Estado renunciasse ao seu papel de ser gestor e prestador direto. Vislumbrava-se, portanto, um sistema que procurasse ser preponderante à lógica do mercado, provendo atenção com base nas necessidades da população, independente das condições financeiras das famílias e as pessoas pagarem pelo atendimento ofertado (CAMPOS, 2006). A Constituição Federal de 1988, no artigo 198, na Lei Orgânica de Saúde nº 8.080/1990, refere que o SUS é organizado segundo algumas diretrizes básicas e essenciais, tais como: a descentralização, o atendimento integral, resolutividade, gratuidade e a participação da comunidade. A criação do SUS, que teve como motivação básica atender às necessidades e aos anseios da população representou um avanço especialmente pelos seus princípios de organização que se traduzem em garantia formal de acesso extensiva a toda a população aos serviços de saúde, participação dos cidadãos no processo de formulação de políticas de saúde e controle da execução das mesmas (FIGUEIREDO, 2005). A caracterização legal do setor de saúde suplementar brasileiro surgiu a partir da Constituição Federal de 1988, que estabeleceu que os serviços de saúde deveriam compor um sistema único e descentralizado, com comando único, no exercício de competências específicas em cada esfera de governo. Reconheceu-se que o modelo de financiamento da saúde era público, da mesma forma que a gestão, porém admitia-se que a produção dos serviços de saúde podia ser pública ou privada, tal como era a realidade brasileira (MONTONE, 2009). Para Santos e Andrade (2009, p.96), “dos serviços públicos, 50% são contratados ou conveniados do setor privado”, prevendo a participação do setor privado de forma complementar. Já segundo, Albuquerque et al. (2008, p.1426), “para a prestação dos serviços públicos, o Sistema Único de Saúde utiliza hospitais próprios e hospitais privados, sendo que 69% dos hospitais privados e 65% dos leitos privados estão contratados ou conveniados ao SUS”. No que se refere aos 35% dos leitos restantes, a disponibilidade destes está vinculada à assistência suplementar ou para serviços financiados pelo desembolso privado direto. Destaca-se que parte dos leitos em hospitais públicos não está disponível para o SUS, tendo em vista que estão integrados aos hospitais militares e instituições de previdência estadual e municipal (ALBUQUERQUE et al., 2008). Segundo Campos (2006, p.419), “reservava-se ao Estado o papel de regular o mercado e a prestação de apenas alguns serviços considerados estratégicos, em geral no campo antes denominado saúde pública, e o SUS avocava a si a busca da integralidade da atenção”. 45 De acordo com Cecílio (1997), existe um processo de retração progressiva da oferta de serviços para o SUS, porque há um crescimento de serviços ambulatoriais e hospitalares contratados que buscam assegurar sua estabilização financeira através da criação de planos de saúde próprios, oferecidos a grupos populacionais que podem contratá-los. Como consequência aparece a dificuldade, quando não a inviabilidade, de acesso das amplas massas de brasileiros aos cuidados de saúde, ainda que haja capacidade instalada ociosa no setor privado. Para os brasileiros que utilizam o SUS, existe a dependência total desse sistema para os 80% da população que não possui planos de saúde, dependência parcial dos que possuem planos não regulados e a não dependência dos que possuem planos regulados, exceto para transplantes que não sejam de rim, córnea e medula óssea (MONTONE, 2009). Considerando que a saúde suplementar não é responsável legal por prover todas as ações e serviços em saúde mesmo para aqueles que usam diretamente os planos privados de saúde, essa classificação baseia-se no conceito técnico de SUS dependentes, com aplicação ampliada para todos os cidadãos residentes no território brasileiro (MONTONE, 2009). Na década de 90, ocorreu um período de desaceleração do conjunto dos estabelecimentos de saúde, tanto públicos como privados, em que os ajustes no número de estabelecimentos, leitos e a redução das médias de permanência observadas também refletem mudanças nas técnicas de prestação de serviços hospitalares, seja de produto ou de processos. Conforme dados referenciados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) uma pequena parcela dos hospitais privados foi fechada entre 1992 e 1999, além de uma reengenharia redutora de leitos, já que mais de 10% da capacidade instalada em 1992 foi desativada, basicamente, no segmento lucrativo, podendo ser atribuído tanto à redução de financiamento público para seu custeio, através da contenção de repasses do SUS para compra de serviços, mas também a todo um movimento de desospitalização de doenças crônicas, tais como as psiquiátricas (ANDREAZZI; KORNIS, 2003). A universalidade da assistência à saúde como direito público no preceito constitucional não abrange o mercado de planos de saúde que, conforme Malta et al. (2004, p.436), “tem atuado livremente e uma nova prática do estado implica a aquisição de saberes e competências que subsidiem essa nova forma de operar”, onde as operadoras passam a ser gestoras da saúde dos seus beneficiários, estabelecendo ações de promoção e cuidado, garantindo também o acesso e a qualidade da assistência ofertada. Contudo, não se pode afirmar que a saúde suplementar é substitutiva ao SUS, pois 46 [...] não há plano de saúde de combate à dengue ou de garantia de qualidade dos alimentos e medicamentos. Quanto aos medicamentos dependemos do SUS para distribuição gratuita ou subsidiada ou temos que comprar diretamente nas farmácias, pois os planos de saúde não os incluem (MONTONE, 2009, p.3-4). Porém, em relação ao SUS, o princípio constitucional da universalidade é reinterpretado de forma não inclusiva na prática social, focando mais o universalismo excludente, com oferta de serviços limitantes e de baixa resolubilidade, do que o universalismo inclusivo, como direito de cidadania (ASSIS; VILLA; NASCIMENTO, 2003). O sistema de saúde brasileiro constitui paradoxalmente um mosaico inserido na dualidade público e privado, com preceitos de universalidade e gratuidade de acesso e liberdade no poder de compra para iniciativa privada que constitucionalmente pode atuar de forma complementar aos serviços e ações de saúde, apresentando, contudo, diferença na estratificação social de quem o usufrui, e também nas atribuições de cada esfera assistencial. Ressalva-se, porém, que a universalidade assistencial não é atributo da saúde suplementar, o que inclui a não comparação da atenção básica do SUS com as ações pontuais de promoção, prevenção, gestão de cuidado, e programas de atenção domiciliar praticados por algumas operadoras de planos privados de saúde. Conforme Santos, Malta e Merhy (2008) existe projeto de qualificação das operadoras que avalia as suas diversas dimensões, assistencial, econômica, estrutura e operação e a satisfação dos beneficiários quanto ao funcionamento do setor. Inúmeras operadoras têm buscado melhorar o desempenho e como efeito afetar suas pontuações no ranking. Com essa iniciativa, o beneficiário que deseja optar por um plano de saúde poderá fazer uso dessa consulta avaliativa, além de estabelecer melhoras contínuas para o setor e competição positiva entre as operadoras pelo melhor desempenho global. Em estudo qualitativo de Martins et al. (2009), a experiência do modo de produção do cuidado, vinculado ao maior programa de atenção domiciliar desenvolvido por uma cooperativa médica composta por 3.330 beneficiários em 2006, trouxe após análise de dados a revelação da satisfação dos beneficiários com os resultados obtidos através do programa, a diminuição dos custos operados pela cooperativa e a transferência de gastos para a família. As condições para o acesso no setor privado não se apresentam privilegiadas, pois, de acordo com Costa e Amora (2009), são comuns as longas filas de espera, recepções lotadas, pacientes nervosos, médicos sobrecarregados e muita reclamação. Diferentemente da rede pública, onde há falta de investimentos, organização e profissionais, na rede particular houve incremento no número de pessoas, modernização de aparelhos e construção de novos hospitais. Entretanto, todo este incremento não foi suficiente 47 para suportar o aumento cada vez maior de pacientes com planos de saúde. Hoje, os beneficiários de planos de saúde já são maioria no município do Rio: 51,1%. Em 2000, eram 42, 2%. Nesses oito anos, os planos de saúde receberam 1,1 milhão de novos usuários na Região Metropolitana do Rio, sendo 677 mil só na capital (COSTA; AMORA, 2009). Segundo Pinheiro (2009), a saúde suplementar está caminhando para o mesmo problema da saúde pública de não redirecionar as demandas de atenção hospitalar que lotam as emergências privadas para ações de atenção básica em saúde. Os planos restringem a entrada de novos médicos que atendem em consultório para privilegiar o atendimento em sua própria rede ao invés de investirem na atenção básica. Ocorre problema estratégico das operadoras de planos de saúde semelhante ao cometido pelos gestores da saúde pública, destacando a superlotação típica de hospitais públicos, oriunda da não ênfase da atenção básica das consultas (PINHEIRO, 2009). Entre as causas da superlotação das emergências privadas está a dificuldade de acesso dos usuários de planos de saúde ao atendimento primário. Ou seja, faltam consultórios e ambulatórios para prevenção e os pacientes têm dificuldades de marcar consultas. O problema na rede privada de assistência, traçando um paralelo com a rede pública, equivale à precariedade de atendimento nos postos de saúde (COSTA; AMORA, 2009). O Estado, através da formulação de políticas de viabilidade, tem como função garantir o acesso da população à rede de serviços de saúde. Em contraposição, a utilização efetiva do sistema de saúde realizada pelos usuários é resultado do confronto que se estabelece entre os serviços disponíveis e a demanda conformada (COHN et al., 2006). A falta de equidade no acesso aos bens e serviços de saúde torna-se preocupante, porque problematiza o processo de transformação social dos sujeitos e seu completo bem estar. Para tanto, no Brasil, as diferentes formulações das políticas de saúde, levando em consideração a existência de uma rede sempre insuficiente para uma demanda cada vez maior e mais diversificada, vêm apresentando reiteradamente, o critério de acesso como pressuposto da disponibilidade de serviços para prover o necessário atendimento às populações carentes. São inúmeras as desigualdades em que se desdobra a qualidade de vida nas diferentes regiões do país, e conforme a concentração demográfica e os níveis de renda correspondentes, onde o critério de acesso faz parte intrínseca do modelo paradigmático da regionalização e hierarquização do binômio demanda/atendimento, prevalecente no ideário da saúde pública, introduzido no país nos anos 20 (COHN et al., 2006, p. 68). A lei que regula o dever do Estado no atendimento da população, garantindo a saúde como obrigação constitucional, nos termos dos artigos 197 e 199, parágrafo primeiro, reitera a presença de um sistema único, constituído por uma rede hierarquizada, regionalizada e 48 organizada por serviços públicos e ações, com complementação da sua assistência por meio da iniciativa privada (COHN et al., 2006). O acesso e a resolutividade dos problemas de saúde encontrados devem ser efetivos nos dois setores que presta serviços de saúde no Brasil, tanto no público como no privado. No entanto, o mercado de planos de saúde oferece um acesso muitas vezes enganoso e não resolutivo, não respondendo às necessidades ou respondendo de forma restrita. Observa-se, portanto, no setor privado, a grande dificuldade de conciliar a segmentação contratual de um plano de saúde com um tratamento integral e resolutivo, residindo a importância de se valorizar a atenção primária de base comunitária para garantia do acesso responsável do paciente nos dois setores de saúde. O acesso à rede de serviços na saúde suplementar também pode estar comprometido, principalmente quanto ao excesso de burocratização, “glosas” por parte das operadoras, negativas de cobertura, entre outras dificuldades. Portanto, torna-se importante considerar o papel da subjetividade no cuidar, como papel revolucionador do sistema de saúde, que tem importância estabelecida. Assim, para o desenvolvimento dos processos de mudança do modelo assistencial, a identificação do papel central da subjetividade nos traz um novo desafio: reconhecer que o protagonismo dos sujeitos trabalhadores e usuários para a mudança no funcionamento dos serviços de saúde não vai se dar apenas pela excelência técnica, isto é, processos cognitivos que dizem respeito ao modo de fazer saúde. Será necessário também investir em processos de subjetivação, para que os mesmos se coloquem como portadores de projetos que recuperem a utopia ativa de um serviço de saúde centrado no usuário, produtor do cuidado, no sentido de acolher e se responsabilizar por sua clientela (FRANCO; MERHY, 2010, p. 191). Existem estratégias de melhoria do acesso a serviços e medicamentos, assim como o desenvolvimento de práticas integrais do cuidado às populações consideradas especiais e de riscos de saúde, associadas à incorporação de tecnologias computacionais (criação de softwares e sistemas informacionais), destinadas à modernização da relação entre profissionais e serviços, e entre estes e os usuários. Mas todas elas estão relacionadas com a promoção e a gestão do cuidado em saúde, mediante a valorização do profissional e do usuário, garantindo sua autonomia, de modo a estabelecer uma relação democrática entre demanda e oferta, com ações integrais na atenção (PINHEIRO; MATTOS, 2006). Dentro deste contexto de integralidade para melhoria do acesso, Campos, Barros e Castro (2004) sugerem que o investimento em modos de organização dos serviços de saúde reduziria as filas e o tempo de espera baseados na adoção de critérios de risco e no acolhimento. Para Bahia (2001, p.339), “a regulação pública dos planos privados de saúde requer a construção de novas relações de compartilhamento de riscos à saúde entre Estado, empresas empregadoras e famílias”. 49 2.2 A regulação pública do setor privado de saúde Para Menicucci (2007), a implantação do sistema de saúde público e universal e o estabelecimento de uma política regulatória da assistência privada ocorreram de forma independente, envolvendo atores privados e agências governamentais distintas e significando que esta regulação não se deu no sentido de definir a inserção de mecanismos de mercado na estrutura da assistência de responsabilidade estatal e de caráter universal, mas de consolidar o sistema privado de forma independente do sistema público. A relação pública e privada é heterogênea na natureza do direito transversal parametrizado por regras regulatórias pautadas na soberania do interesse público sobre os interesses globalizantes adstritos somente ao lucro do mercado privado. Na parcimônia constitucional do acesso à saúde sobressaem formas diferenciadas quando se dicotomiza a oferta de bens e serviços, de acordo com o poder aquisitivo do cidadão. A ideia de um sistema nacional de saúde público, complementado pelo setor privado, ainda necessita de definição de regras claras de atuação, principalmente quando se concebe que [...] a regulação do setor privado não ocorreu no sentido de definir sua articulação com o setor público ou de determinar espaços e regras de atuação, o resultado da política de saúde no final da década - e apenas dez anos após as mudanças constitucionais - tornou evidente a existência de duas formas radicalmente distintas, não apenas de acesso, financiamento e produção das ações e dos serviços de saúde, mas também de atuação governamental. Por um lado, a atuação estatal se dá no sentido de garantir o acesso universal às ações e aos serviços de saúde como elemento que integra a noção de direito à saúde. Por outro lado, a política de saúde passa, formalmente, a incorporar a assistência privada ao escopo da intervenção governamental na forma de regulação do mercado privado de assistência, com vistas a desenvolver esse mercado, garantindo os direitos do consumidor. Ao fazer isso, a própria política consagra e legitima o caráter dual da assistência. Nessa perspectiva, a ação governamental orienta-se por duas lógicas distintas: a lógica da assistência como um direito de cidadania, que traz implícitas as ideias de universalidade e igualdade; e a lógica da assistência como um bem oferecido e adquirido em um mercado que, por sua vez, remete à diferenciação por segmentos e produtos, definida com base no poder de compra ou em condições privilegiadas de acesso ao consumo de serviços de saúde (MENICUCCI, 2007, p. 16). A forma de organização da intervenção do Estado na saúde suplementar suscita polêmicas e encerra várias limitações e contradições. As limitações são identificadas nas seguintes situações. A ANS praticamente não regula o segmento de planos coletivos, que representa mais de 70% do total de planos, além de uma série de problemas que requerem enfrentamento (TEIXEIRA et al., 2002 apud MACHADO, 2007); existem questões operacionais, visto que várias estratégias propostas esbarram em dificuldades para sua implementação; há problemas relativos à eficácia e efetividade, dado que não se sabe em que medida alguns dos objetivos da regulamentação propostos e traduzidos em estratégias têm sido alcançados na prática, como a ampliação da cobertura e o controle dos preços; existem problemas de legitimidade social, tendo em vista os frequentes questionamentos de cunho jurídico-legal das operadoras 50 relativos à atuação da ANS, decisões judiciais contrárias à agência e a persistente insatisfação dos consumidores com os planos (MACHADO, 2007, p.288). As contradições da organização da intervenção do Estado na saúde suplementar são insuficiência na clareza quanto aos propósitos e à direcionalidade da regulação do mercado de planos e seguros de saúde, a exemplo o risco da maior concentração de mercado, particularmente pelas grandes empresas do ramo financeiro, devido às exigências econômica-financeiras impostas pela ANS para a entrada e a operação de empresas. As ações da ANS, refletidas nestas exigências, podem beneficiar estas grandes empresas, em que a regulação do mercado de planos e seguros privados podem favorecer a formação de oligopólios, com repercussões potencialmente negativas sobre os preços e o bem-estar dos consumidores. Questões estruturais importantes nas relações público-privadas na saúde-as isenções fiscais, as implicações do interesse do grande capital financeiro na área-nunca teriam entrado efetivamente na agenda de debates, permanecendo restrita a estratégias com baixa possibilidade de repercussão nas distorções estruturais nessas relações, como o ressarcimento ao SUS (MACHADO, 2007, p. 288). A atuação do Estado, embora importante, fundamenta-se em uma perspectiva de proteção aos consumidores do mercado privado, de certa forma antagônica à noção da saúde como direito de cidadania expressa na Constituição brasileira. Assim, as ideias de Menicucci (2007) convergem para as de Machado (2007) que afirma que a atuação estatal é processada por lógicas, estratégias e lugares institucionais diferenciados, sedimentando a fragmentação na condução da política nacional de saúde, quando o assunto é a atuação do Estado na relação público e privado. Retrata-se a existência de um mercado de planos e seguros de saúde que envolve milhões de usuários, e também a segmentação entre dois subsistemas, o SUS e a assistência médica suplementar, complementando a ideia das lógicas distintas da atuação estatal, conforme relata Machado (2007). De acordo com a legislação suplementar brasileira, as operadoras de plano de assistência à saúde constituem pessoa jurídica sob a modalidade de sociedade civil ou comercial, cooperativa ou entidade de autogestão, que opere produto, serviço ou contrato de que trata plano privado de assistência à saúde, sendo vedada às pessoas físicas a operação dos produtos desta natureza (BRASIL, 1998). Conforme Malta et al. (2004) a saúde suplementar compreende as autogestões, medicinas de grupo, seguradoras e cooperativas. A legislação suplementar inclui ainda as filantropias, as administradoras e as odontologias de grupo. As cooperativas de trabalho médico, cooperativas odontológicas, as medicinas de grupo, as filantropias e as seguradoras constituem o ramo comercial. As seguradoras podem ser vinculadas ou não a bancos, representando a modalidade empresarial com 16% dos 51 beneficiários cobertos por planos de saúde (MALTA et al., 2004). Em relação ao ramo comercial direcionado às modalidades de operadoras de planos privados de saúde: O subsegmento comercial está integrado por aproximadamente 1.200 empresas-800 empresas de medicina de grupo, 360 cooperativas médicas e 30 seguradoras-e responde pela cobertura de 2/3 do total de clientes do mercado de planos de saúde. As medicinas de grupo, constituídas inicialmente por grupos médicos aliados ao empresariado paulista, são atualmente responsáveis por quase 40% dos beneficiários da assistência médica supletiva. As Unimed‟s possuem 25% dos clientes de planos de saúde e se organizaram a partir da iniciativa de médicos, em oposição às ameaças de perda da autonomia da prática médica e mercantilização da medicina, que optaram por se associar a entidades mais afeitas a preservação dos cânones liberais. E às seguradoras, vinculadas ou não a bancos, que representam a modalidade empresarial mais recente no mercado de assistência médica suplementar, competem os planos de 10% do contingente [...] (BAHIA, 2001, p.335). As autogestões que totalizam cerca de 300 empresas heterogêneas (sindicatos, indústrias, empresas públicas, empresas com pequeno número de associados, dentre outras) são os planos próprios patrocinados ou não pelas empresas empregadoras, compondo o ramo não comercial do mercado de planos e seguros (MALTA et al., 2004). As cooperativas de trabalho médico (Unimed‟s) que se organizaram a partir da iniciativa de médicos contestadores da perda de autonomia da prática médica no contexto da mercantilização da medicina possuem 25% de beneficiários de planos de saúde (MALTA et al., 2004). As medicinas de grupo que se desenvolveram na década de 1960 são empresas médicas que realizavam convênio-empresa com a empresa empregadora que na época era fomentado pela Previdência Social, a qual repassava subsídios per capita por cada serviço prestado. Foram inicialmente formadas por grupos médicos vinculados ao empresariado paulista, envolvendo quase 40% dos beneficiários de planos de saúde, em que a organização de proprietários e acionistas de hospitais se estabeleceu pelo surgimento de redes de serviços e credenciamento de hospitais e laboratórios perante a existência de um comprador de serviços que garantia um mercado seguro (MALTA et al., 2004). Comparando-se os dados de Bahia (2001) com os de Malta et al.(2004) observa-se que apenas as seguradoras especializadas em saúde aumentaram seu percentual de beneficiários de planos privados de saúde nesse período. A explicação desse aumento nas seguradoras entre 2000 e 2006 para Albuquerque et al. (2008, p.1426) relaciona-se ao fato de que “nas seguradoras de saúde, o aumento de beneficiários em planos coletivos foi associado à sua redução nos planos individuais”. Percebe-se a prática da não comercialização de planos individuais e familiares pelas seguradoras especializadas em saúde e aumento dos planos coletivos. De acordo com 52 Albuquerque et al. (2008) seria pertinente a realização de estudos para avaliar esse fenômeno e sua relação com o emprego formal e a renda, assim como as formas de contratação, se empresarial ou por adesão, e a possibilidade dessa expansão de planos coletivos, em detrimento dos individuais, estar relacionada à migração dos beneficiários de planos individuais. Para Santos, Malta e Merhy (2008), o crescimento dos planos coletivos ocorreu em função da precificação excessiva dos planos individuais novos pelas empresas de planos privados de saúde com a alegação do “risco regulatório”, o qual envolveria a não interrupção unilateral do contrato, limitação do reajuste por mudança de faixa etária e controle do reajuste anual, além do risco individual ficar mais diluído em uma “massa” maior de indivíduos, considerando o crescimento dos planos coletivos por adesão. Montone (2009) refere que a política de regulamentação da ANS reforça o pólo com menor capacidade de reação e negociação no sistema - o usuário de planos individuais. De certa forma, a ANS vem preservando os direitos contratuais e legais, mas esta autarquia também estabelece obrigações aos consumidores, como carências, prazos e limites, responsabilidade na declaração de saúde, entre outras. Vieira e Vilarinho (2004) afirmam que com o alastramento do sistema de planos de saúde, os altos custos e preços têm afastado amplos segmentos da classe média do acesso a esse tipo de atenção à saúde e reduzido a qualidade dos serviços prestados, evidenciando o retorno do modelo elitista, de privilégios, voltados às restritas pessoas que dispõem de elevados recursos próprios ou pertencentes a níveis hierárquicos elevados em organizações que financiem planos individuais que atendam aos custos da moderna tecnologia e sofisticação dos exames diagnósticos e das terapêuticas. Estes autores chamam atenção também para a proliferação de planos coletivos que evidenciam a escassez de recursos da população nos planos individuais e familiares, fazendo com que seja postergado um problema social de elevadas proporções, posto que os planos coletivos existem, na medida em que as pessoas encontram-se empregadas. De acordo com Bahia (2005), a universalização, embora formalmente amparada pela legislação, vem sendo desafiada pela preservação e reorganização da segmentação do sistema de saúde. A convivência entre o sistema público e os esquemas assistenciais privados adquiriu visibilidade gerando conflitos, na esfera econômica, relativos à competição entre as empresas privadas e, na área de defesa do consumidor, atinentes às garantias de cobertura. Segundo Machado (2007), as limitações e contradições da atuação estatal na regulação da saúde suplementar devem ser vistas como grandes desafios a serem enfrentados pelo Ministério da Saúde nessa ainda recente e complexa área de atuação federal, demandando uma 53 abordagem mais integrada da política de saúde, que transcenda o insulamento administrativo, frente às distorções estruturais nas relações público-privado em saúde e esteja orientada principalmente pela lógica do direito e da justiça social. Entretanto, embora o cenário atual apresente grandes desafios na saúde suplementar, a regulação econômica praticada pela ANS, a partir da exigência de provisão em volume de recursos e das reservas financeiras, além do uso de indicadores para acompanhar a evolução da receita das operadoras, permitiu maior solidez ao mercado, visto que as empresas que operam planos privados de saúde estão se tornando mais capitalizadas, aumentando o grau de segurança dos beneficiários e dos prestadores de serviços (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). A regulação assistencial, também objeto de melhoria regulatória desse cenário de mercado de planos de saúde, através do Sistema de Informação de Produtos (SIP), desde 2002 vem permitindo a avaliação dos seus resultados, a partir de indicadores dos serviços prestados, tais como materno-infantil, oncologia, odontologia, atenção a doenças crônicas, dentre outros (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). O SUS, que também apresenta limitações e contradições, ainda encontra-se em processo de construção, embora já compute mais de duas décadas de existência, o que acirra a impaciência e sofrimento do usuário frente à morosidade das mudanças e às dificuldades no acesso, particularmente porque a saúde é vital e essencial, portanto a população necessita de suporte rápido e atendimento urgente nesta área. O SUS já apresentou importantes vitórias na área de prevenção e assistência à saúde, com o crescimento expressivo no número de postos e centros de atendimento primário à saúde, com a criação e expansão de atendimentos ambulatoriais em áreas básicas (clínica médica, pediatria, ginecologia/obstetrícia), bem como a elaboração de campanhas de controle de endemias, culminando com a erradicação do vírus da poliomielite no território nacional. Além disto, é importante recordar das campanhas de combate à desidratação infantil, prevenção à transmissão do HIV e de outras doenças transmissíveis sexualmente, campanhas de incentivo ao aleitamento materno, entre outras. A abrangência de atuação do SUS implica no atendimento universal, independente do poder aquisitivo para o consumo de ações e serviços em saúde, enquanto que na saúde suplementar torna-se um requisito básico para exercer um direito na esfera privada de atendimento assistencial em saúde. Através dos estudos de estratificação social como procedimentos úteis e também como uma das opções metodológicas viáveis pode-se compreender a formação de grupos quando 54 existem indivíduos com características similares e quando nesses grupos as pessoas comungam interesses semelhantes ou têm um provável comportamento comum. A diferenciação dos estratos ou classes tem limites hierárquicos e apresentam atributos individuais relacionados a posições nos diferentes estratos (MEDEIROS, 2003). Barata (2009) retrata as evidências empíricas produzidas pelas investigações das relações entre desigualdades sociais e saúde, sugerindo que a situação de saúde é afetada pela posição social dos indivíduos e também pelas diferenças socioeconômicas da estratificação social. O Brasil é um país com níveis extremamente elevados de desigualdade social, onde a concentração de renda brasileira está entre as piores do mundo. As teorias de estratificação modernas são identificadas na economia política clássica, a partir de concepções de Smith (1988 apud MEDEIROS, 2003) e Ricardo (1978 apud MEDEIROS, 2003), em que ambos utilizam os tipos de rendimento como critério de distinção das classes, onde a fonte de rendimentos é tratada como um indicador da função de cada indivíduo na sociedade, em que essa função é usada como elemento explicativo da dinâmica econômica da sociedade. Após análise das concepções de Medeiros (2003) e teorias de estratificação social, é compreensível que a saúde por ser um bem essencial tenha a capacidade de classificar o indivíduo numa escala de valores para ascensão social, definindo o papel e a posição deste para si e para os outros. Assumindo que existe um indicador de função social de acordo com seu rendimento, o sujeito passa a ter existência simbólica social e a partir desta perspectiva torna-se importante o seu reconhecimento, enquanto presença física, tornando-o visível nas políticas públicas de saúde, a fim de estabelecer sua cidadania. A constituição e reconhecimento enquanto ser visível se dá a partir do olhar do outro no próprio vínculo social, na forma como se sociabiliza, onde o Estado determina a identidade deste ser. A invisibilidade está direcionada à falta de valor social do sujeito, diretamente ligada à saúde de caráter mensurável que irá definir sua visibilidade ou não na escala de valores da sociedade, ou seja, o sujeito apresenta visibilidade pelo físico, a partir do quanto ele vale no aspecto simbólico social à medida que tem ou não saúde para produzir economicamente. A ausência de visibilidade nos serviços prestadores de saúde equivale à dignidade humana prejudicada que em algumas ocasiões torna-se difícil a reparação. Existe uma evidente lacuna entre aquilo que é efetivo de Direito, alimentado na forma da Lei e a prática comum da invisibilidade do sujeito que é excluído socialmente, conforme o quanto ele tem de saúde na escala de valores que lhe permita ascender socialmente ou não. E quanto menos leis valem em termos efetivos, resulta-se em mais leis, sejam a partir de emendas ou medidas provisórias 55 que vetam, revogam ou acrescentam normas que beneficiam ou não o sujeito até mesmo a matriz violenta do direito que exclui direitos dos indivíduos com a justificativa fundamental de proporcionar o bem-estar da coletividade. No Brasil, na década de 1960, uma parcela de 20 a 30% das pessoas que buscavam atendimento médico apresentava doenças crônicas e atualmente tal cenário nosológico se inverteu para cerca de 80% das consultas médicas que tratam de processos crônicos ou agudização de processos crônicos (ALMEIDA; PEAZÊ, 2007). O baixo acesso aos serviços vigora no modelo de atenção hospitalocêntrico, e o sistema de saúde público, através do SUS, adquire ampliação da cobertura ambulatorial na rede de base comunitária. A triagem e consulta dos primeiros sintomas com a premissa da detecção precoce assume uma perspectiva maior de garantia de acesso ao tratamento. Embora exista bastante gente que carece de acesso ao tratamento de saúde necessário, é indiscutível que a demanda e frequência da necessidade de atendimento é alta para o pouco orçamento e recurso financeiro disponíveis. No SUS, a universalidade de acesso a todos os serviços de saúde é ainda um grande desafio para plena garantia constitucional na sua prática. O atendimento resolutivo das necessidades de saúde brasileiras pode ser solucionado nas unidades básicas ou por meio de agentes comunitários, enfatizando-se as medidas preventivas e o aperfeiçoamento das estratégias do programa de Saúde da Família, na medida em que se consiga resolver mais situações na atenção básica e contribuindo para o direcionamento e reordenamento especializado para as demandas específicas e prioritárias, assim como as de urgência e emergência. A pretensão de implantação de um modelo de acesso universal e financiamento público que emerge da Constituição de 1988 não modifica o quadro de acesso diferenciado e cobertura privada que vinha se configurando ao longo do tempo. Trata-se de uma dualidade, não apenas em termos da cobertura público/privado, como também em termos de clientela atendida: os setores menos favorecidos de um lado, aglutinados na assistência pública, e os mais privilegiados, no âmbito privado (MENICUCCI, 2007). 56 2.3 O papel da Agência Nacional de Saúde Suplementar A saúde, que é um bem fundamental, mereceu especial atenção como objeto de regulação pelo Estado, considerando as práticas abusivas e arbitrárias do mercado de planos de saúde que ditavam as regras de negócios antes da regulamentação pelo marco legal da Lei 9.656/1998. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é uma autarquia pública, vinculada ao Ministério da Saúde, instituída em 2000 pela Lei 9.961, como advento institucional regulatório estabilizador do mercado de planos de saúde e da política pública de saúde brasileira. Como resultado da criação da ANS ressalta-se que [...] as operadoras foram obrigadas a informar periodicamente dados econômico-financeiros; características dos planos comercializados: serviços cobertos, rede prestadora, tipo de contratação, abrangência geográfica, segmentação assistencial e utilização de serviços, bem como dados dos beneficiários que possibilitam conhecer o perfil de idade, sexo e local de residência (ALBUQUERQUE et al., 2008, p. 1424). Na vigência da lei, foram estabelecidas regras, definidos padrões de oferta de serviços, medidas de saneamento dos planos, definidas regras de ressarcimento ao SUS, dentre outras. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) foi instituída como instância de regulação de setor, com autonomia financeira e decisória e assemelhando-se às demais agências reguladoras, quanto à estrutura organizacional.Sua criação significou um passo importante na regulação do mercado, possibilitando estender o papel de regulação para o controle da assistência no setor e para as condições financeiras das empresas (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008, p. 1464). O setor de planos privados de saúde registrou, em dezembro de 2009, 42,9 milhões de vínculos de beneficiários de planos de assistência médica e 13,2 milhões de vínculos de beneficiários de planos exclusivamente odontológicos, em 1.502 operadoras de planos privados de saúde, o que justifica a existência de uma agência regulatória (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010a). O corpo funcional da ANS é composto por quadro técnico específico, como especialistas e técnicos em regulação, analistas e técnicos administrativos, além de servidores redistribuídos, descentralizados da União, cedidos, aqueles com e sem vínculo com o Regime Jurídico Único, dentre outros. As atividades da ANS são parametrizadas por regimento próprio que define as competências dos órgãos internos, atribuições funcionais e dos cargos ocupados. Os preceitos de universalidade do Sistema Único de Saúde que caracterizam o acesso gratuito dos cidadãos brasileiros dividem o cenário da saúde brasileira com a saúde 57 suplementar que tem previsão constitucional na complementaridade das ações e serviços de saúde no Brasil. A criação dos serviços de seguro-saúde, como complementação ao SUS, ocorreu secundariamente à necessidade de estruturar maneiras de financiar a saúde durante uma fase de acentuada industrialização no país. As áreas de maior concentração industrial, principalmente com a implementação das indústrias automotivas, como no ABC Paulista (Santo André, São Bernardo e São Caetano) iniciaram esta nova fase do sistema de saúde brasileiro, com início no final da década de 1950. Através de vantagens fiscais, buscam-se atrair os trabalhadores e, para diminuir o absenteísmo, algumas empresas passaram a ter planos de saúde próprios (LOTTENBERG, 2007). Os contratos novos assinados após janeiro de 1999 estão totalmente amparados pelo marco legal da Lei 9.656/1998, tendo que oferecer todas as garantias previstas nesta Lei quanto à cobertura assistencial, cobertura geográfica, rede de serviços, prazos de carência e aumento de mensalidade, entre outras (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010b). Os planos antigos (individuais ou familiares) não têm registro na ANS e estão proibidos de serem comercializados desde janeiro de 1999, sendo também intransferíveis, sob qualquer pretexto. Somente o titular e seus dependentes inscritos antes da entrada em vigor da nova lei têm a garantia de permanência no plano. Quando previsto no contrato, é possível a inscrição apenas de novos cônjuges e filhos (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010b). A ANS publicou na edição de 4 de novembro de 2010, seu entendimento sobre a situação de dependentes em planos de saúde após a morte do titular do contrato, sendo comum em alguns contratos de planos de saúde – tanto anteriores à regulamentação do setor, quanto posteriores – constarem cláusulas sobre remissão, que é a continuidade do atendimento aos dependentes após a morte do titular, por períodos que variam entre 3 e 5 anos, sem cobrança de mensalidades. Passado esse prazo, algumas operadoras cancelam o plano e os dependentes ficam sem assistência. Para impedir esta prática, a ANS publicou a Súmula Normativa nº 13, que dá o entendimento de que o término do período de remissão não extingue o contrato de plano familiar. Ou seja, os dependentes assumem o pagamento das mensalidades e têm garantido o direito de manutenção do plano nas mesmas condições contratuais. A extinção desses contratos é considerada infração, passível de multa (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010d). 58 Antes da regulamentação da área suplementar de saúde, os beneficiários de planos de saúde estavam suscetíveis desde a negociação inicial para adesão contratual à seleção de risco praticada pelas operadoras para doenças específicas e incuráveis como a AIDS e câncer, rescisão unilateral de contrato por parte da operadora toda vez que esta verificasse o aumento dos custos com despesas decorrentes de morbidades crônicas, principalmente para os idosos, aumentos exorbitantes nas mensalidades, carências longas e desproporcionais, negativas de cobertura, limites para dias de internação, restrição de consultas, entre outros problemas. Dentre as condutas mais abusivas das operadoras de planos de saúde antes da regulamentação elucidam-se que [...] o sistema de carências permitia ajustar o custo de cada usuário ao longo do tempo. Ao ingressar num plano de saúde, o pagamento era imediato, mas a utilização estava fortemente condicionada às carências e ao pagamento pontual. Em geral, as consultas e exames mais simples podiam ser utilizados depois de 30 ou 60 dias, mas a partir daí os prazos cresciam. Exames de maior complexidade e custo raramente eram possíveis antes de 120 a 180 dias. O mesmo acontecia com internações e cirurgias que chegavam a ter 24 meses de carência. Na prática, o usuário pagava mensalmente, esperando não utilizar os serviços e, quando precisava, tinha fortes restrições de utilização. As internações, por exemplo, tinham limites de “dias de internação por ano”, raramente superiores a 30 dias/ano. Eram usuais as situações em que o hospital informava ao paciente ou aos seus familiares que a cobertura do plano havia terminado e que a partir de então a internação teria de ser “particular”, ou seja, paga diretamente pelo usuário, ou que ele teria de procurar atendimento público. As internações em UTI eram ainda mais reduzidas (MONTONE, 2009, p. 23). A efetividade da regulação, embora assuma vários desafios promissores no aprimoramento desse foco, consistiu em inúmeros avanços pela normatização de direitos e deveres entre operadoras de planos privados de assistência à saúde, prestadores de serviços e consumidores desses planos. A ANS como órgão regulador opera de forma sistemática entre todos os seus agentes e torna-se importante o cumprimento da finalidade institucional de defender o interesse público da sociedade brasileira contra os interesses abusivos do mercado heterogêneo que opera planos privados de assistência à saúde. A ANS, entre outras atividades, acompanha a evolução das carteiras de beneficiários das operadoras, monitorando as variações bruscas de registros de beneficiários em operadoras, dispersão e concentração dos beneficiários nas operadoras em períodos distintos, operando um balanço das demandas e seus deslocamentos, assim como a mediação de conflitos entre os atores da saúde suplementar-operadoras, beneficiários e prestadores de serviços, vinculados aos planos de saúde privados. Durante muito tempo, segundo Lottenberg (2007), a ANS não permitiu que os planos individuais tivessem reajustes acima dos índices da inflação, e, por conseguinte, a venda de 59 planos individuais deixou de ser priorizada e comercializada pelas empresas de seguro-saúde. O prejuízo à população é bastante claro, visto que, uma vez desempregado, o trabalhador perde o seu direito ao plano empresa e, mesmo em caso de profissionais autônomos, com recursos suficientes para contratar planos individuais, não há uma oferta/qualidade de produtos à disposição no mercado. Assim, cria-se uma situação que para ter acesso à saúde privada, você tem de pertencer a uma empresa. Quem está fora não entra e quem está dentro acaba sendo tratado de maneira insatisfatória. Montone (2009) relata que era no segmento de planos individuais e familiares que o mercado obtinha sua lucratividade. A partir de edição normativa de regras de funcionamento pela ANS, operadoras importantes do mercado como as seguradoras, vêm deixando de comercializar planos individuais com contratação direta e incentivando as contratações empresariais e por adesão coletiva. Dessa forma, o ente vulnerável da contratação empresarial ou coletiva por adesão é o beneficiário que fica refém das rescisões unilaterais entre as pessoas jurídicas contratantes e operadoras de planos de saúde privados contratados, ainda que a empresa seja familiar, onde os membros aderidos ao plano ficam suscetíveis à vontade da operadora querer permanecer ou não como contratada. A verificação da escolha mais ou menos correta do plano de saúde acontecerá quando, devido a problemas de saúde, o segurado precisar utilizar o plano, dando-se conta que alguns benefícios não cobertos pelo seu seguro-saúde são necessários e que há necessidade de um plano de melhor qualidade, com maior abrangência do contrato. Como consequência, cada vez mais pessoas ficam sem assistência médica, além comprometer uma parcela substancial do seu salário ao pagamento do seguro-saúde, gerando menor número de segurados e maior procura de atendimento pelo SUS (LOTTENBERG, 2007). Daí, de acordo com Lottenberg (2007), é urgente a realização de um planejamento estruturante feito por especialistas e setores com o conhecimento profundo da dinâmica de funcionamento e de financiamento, ainda que a ANS mantenha os reajustes em patamares aceitáveis, pois não se exige por parte da fonte pagadora um comprometimento sistemático que aprimore a qualidade dos produtos que oferece. Assim, mantém-se um sistema em que aumentos remuneram os custos, mas não se vinculam a um aperfeiçoamento da qualidade com uma visão da saúde centrada em custos e não em indicadores. Os contratos anteriores à Lei nº 9.656/1998 e os não adaptados à legislação suplementar vigente oferecem maiores restrições de cobertura assistencial, vigorando praticamente os direitos assegurados em cláusulas contratuais, salvo ações abusivas das operadoras que são também reguladas pela ANS, como a questão da proibição da rescisão 60 unilateral de contrato e o limite de dias de internação pelo usuário de plano de saúde anterior a essa regulamentação. Como vitórias importantes na saúde suplementar destaca-se a criação do plano de referência com cobertura integral ao consumidor; proibição das limitações de consultas, exames e dias de internação; garantia de fornecimento dos medicamentos e insumos necessários nos procedimentos hospitalares e ambulatoriais, criação do conceito jurídico de doença e lesão pré-existente pró-consumidor; renovação automática dos contratos, sem recontagem de carências e com proibição de rompimento unilateral; obrigatoriedade de fornecer o cadastro de beneficiários e o ressarcimento ao SUS dos atendimentos da rede pública a usuários de planos de saúde com cobertura contratual (MONTONE, 2009). Os usuários de planos anteriores à Lei nº 9.656/1998 e que buscam a solução judicial para as suas ações impetradas contra as operadoras de planos de saúde encontram jurisprudências favoráveis para seus pleitos, haja vista que a maioria dos juízes toma uma decisão social, desvirtuando o que deveria ser baseada por uma perspectiva de estrutura e financiamento do sistema: “no país, 80% das ações contra os planos de saúde são concedidas pela justiça, especialmente no que concerne a tratamento de câncer e Aids” (LOTTENBERG, 2007, p. 70). Ao contratar um plano de saúde não parece ser desejável ao consumidor o aparecimento de algum sinal ou sintoma de doença para poder usufruir o benefício na frequência mensal que financia a prestação de seus planos. Paga-se a suposta proteção à saúde contratada pelo consumidor diante da possibilidade de existir o risco da doença ou agravo, mas a reserva de capital acumulado derivada das mensalidades do planos de saúde pagas pelos consumidores garantirão a solidez das operadoras para a sustentabilidade financeira destas. Em relação ao custo da assistência médica contratada no mercado de planos, de acordo com Montone (2009, p.25), “se o contrato apresentasse uma sinistralidade considerada alta, simplesmente não era renovado. Sinistralidade é a relação entre receita e despesa operacional, o que representa a prestação de serviço contratada sem as despesas administrativas da empresa”. Segundo Lottenberg (2007), as empresas de planos e seguros-saúde estão apresentando nos seus planos individuais sinistralidades acima de 100%, isto é, lucro zero e custo muito elevado. Nos planos empresariais, como os acordos são firmados com flexibilidade para renegociação a cada período de tempo previsto em contrato, essas fontes pagadoras (dos serviços médicos) estão conseguindo gerir os seus recursos porque reajustam 61 valores de acordo com a taxa de utilização dos planos pelos seus associados. Com isso, a empresa contratante, objetivando manter o patamar de pagamento do seguro-saúde dos seus empregados em patamares aceitáveis para a saúde econômica das suas empresas, inclui serviços, retira produtos e altera a composição dos benefícios. Já nos planos individuais essa margem de negociação não existe, o que diminui cada vez mais a disponibilidade deste tipo de plano no mercado, não sendo de grande interesse comercial para as empresas de planos e seguros-saúde. De forma prejudicial ao usuário, a sinistralidade era usada como base para os reajustes de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, permitido e amplamente praticado, principalmente antes do Plano Real. Além dos reajustes de reposição inflacionária e dos reajustes por faixa etária, e lembrando-se de que esses eram anuais a partir de certa idade, o usuário ainda sofria com os reajustes para reequilíbrio. Na maioria dos contratos havia apenas a previsão dessa possibilidade. Em alguns casos ele estava definido por algum tipo de equação ou indicador, porém sempre apurado pela própria empresa e não disponível ao usuário. Mesmo depois do CDC (MONTONE, 2009, p. 25). O mercado de planos além de preferir a contratação empresarial por inúmeras razões incentiva a formação da empresa familiar para contratação jurídica na funcionalidade de como seria numa empresa, mas com menos beneficiários, que neste caso seriam os parentes ou agregados. Pressupõe-se que a contratação individual como a segunda mais contratada (Gráfico 1) assume uma tendência a diminuir perante as práticas de não comercialização de produtos dessa natureza individual ou familiar pelas operadoras, sobretudo as seguradoras. 62 Gráfico 1 - Distribuição percentual dos beneficiários de planos privados de saúde por tipo de contratação segundo cobertura assistencial do plano (Brasil - dezembro/2009). Assistência médica com ou sem odontologia. Fonte: Dados referentes ao período de dezembro de 2009, adaptado do Sistema de Informação dos Beneficiários (SIB) da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010a. Ceschin (2010) acredita que a natureza representada pela empresa dos planos coletivos na verificação dos custos e a quantidade de informação que esses planos detêm para negociar interesses não é a mesma em relação ao consumidor direto com a operadora de planos privados de assistência à saúde, considerando que o consumidor de plano individual ou familiar não teria as mesmas condições de defesa de seus interesses, quando comparado aos planos coletivos. Acredita-se que existe uma cultura popular favorável e relacionada às práticas médicas vinculadas aos procedimentos tecnológicos que torna o usuário dependente do modelo assistencial fragmentado e mecanicista centrado no procedimento. Nesse modelo estar “bem cuidado” significa a realização de exames complementares, não considerando que o verdadeiro cuidado passa por um atendimento técnico responsável, qualificado e com vínculo prestador-usuário, a fim de que possibilite nortear a melhor conduta clínica terapêutica de opção preferencialmente não intervencionista. Os paradoxos entre a solicitação e a realização dos exames ilustram que os efeitos de um imaginário que associa qualidade do cuidado ao procedimento são muito conhecidos pelos paradoxos que produzem junto aos serviços de saúde, tais como excesso de pedidos de exame e ao mesmo tempo grande absenteísmo, ou seja, usuários deixam de 63 comparecer para fazer o exame em função da demora em se realizar, ou mesmo porque, quando estão para fazê-lo, seu problema já foi sanado; excessiva demanda de exames em contraposição à incapacidade de os serviços de diagnóstico conseguirem absorver toda a necessidade; tensão entre usuários e profissionais de saúde, pela divergência entre a construção imaginária da demanda e a percepção de necessidade tecnicamente orientada pelo profissional, a partir de uma escuta qualificada e responsabilização por seu problema de saúde Esses paradoxos indicam as fontes de conflito existentes nos serviços de saúde, que ao mesmo tempo são reveladores do seu funcionamento, da capacidade de se produzir cuidado centrado nos procedimentos ou um cuidado centrado nos usuários e o modo como se pode desconstruir o imaginário “senso comum”, que associa procedimento ao cuidado desejado (FRANCO; MERHY, 2010, p. 187). Os parâmetros normativos acerca de tempo para delimitar prazo máximo de atendimento nos planos de saúde foram publicados em 30 de setembro de 2010, a partir dos resultados obtidos em consulta pública através de dois questionários disponibilizados em pesquisa pioneira de participação voluntária das operadoras de planos de saúde, realizada pela ANS no período de 21.06.10 a 05.07.2010 no seu sítio eletrônico www.ans.gov.br. De 1.162 operadoras que receberam o ofício da ANS sobre pesquisa de tempo máximo para o atendimento de beneficiários para agendar consulta, exames e cirurgia nos planos de saúde, 840 participaram, o que significa 72,3% do total. Dessas, 415 responderam ao primeiro questionário que abordava o prazo de tempo praticado e 425 responderam o segundo questionário que tratava do prazo considerado razoável. As operadoras que responderam atenderam a pouco mais daqueles 42 milhões de beneficiários descritos anteriormente, correspondendo a 89% do total existente no país (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010g). Os procedimentos selecionados para a pesquisa foram: consultas em clínicas básicas (clínica médica, clínica cirúrgica, ginecologia e obstetrícia, pediatria, ortopedia e traumatologia); consultas em outras especialidades; exames básicos (hemograma, glicose, ureia, creatinina, eletrólitos, radiografias e ultrassonografias simples); exames de maior complexidade; cirurgias eletivas sem implantes e cirurgias eletivas com implantes-órteses, próteses e materiais especiais (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010g). 64 Tabela 1- Prazos máximos de tempo de atendimento em dias úteis, nos planos de saúde privados definidos pela ANS, a serem publicados em Resolução Normativa específica. Tempos máximos para atendimento nos planos de saúde privados Consulta básica (pediatria, clínica médica, cirurgia geral, ginecologia e obstetrícia, cardiologia e ortopedia e traumatologia) 07 dias Consulta nas demais especialidades médicas 14 dias Consulta de Fonoaudiologia 10 dias Consulta de Nutrição 10 dias Consulta de Psicologia 10 dias Sessão de Terapia ocupacional 10 dias Sessão de Fisioterapia 10 dias Serviços de diagnóstico por laboratório clínico e radiografias 03 dias Serviços de diagnóstico por imagem, exceto radiografias 10 dias Procedimentos de alta complexidade (PAC) 21 dias Internações eletivas 21 dias Urgência e Emergência 24h Imediato Consulta de Odontologia 7 dias Fonte: Adaptação de AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010g. Segundo Leite (2010), este estudo realizado pela ANS apontou que mais da metade das operadoras considera razoável um usuário de plano esperar de 8 a 30 dias para realizar uma cirurgia eletiva (não emergencial) que necessite de um implante (como uma prótese), em que quase a metade das operadoras de planos de saúde afirma praticar esses prazos; 7% das empresas disseram considerar razoável deixar o paciente esperar mais de dois meses e 5% admitiu ter essa longa espera em seus serviços. Nas consultas básicas como as de clínica-geral, a maioria acha razoável e diz deixar o paciente esperar de quatro a sete dias para conseguir o atendimento. Mas em torno de 9% realizam e acham razoável um prazo de mais de 16 dias, também não aceitável pela ANS. Nas consultas e especialidades, a maioria pratica e acha razoável esperar até 15 dias, mas 25% praticam e acham correto um prazo de mais de 16 dias, situação que terá de mudar com a norma (LEITE, 2010). O estudo demonstrou ainda que as empresas de grande porte (com mais de 100 mil beneficiários) são as que têm maiores dificuldades de realizar consultas básicas no prazo de até 7 dias e as de especialidades em até 15 dias. Por outro lado, elas têm maior facilidade para garantir procedimentos mais complexos, cujos motivos têm de ser melhor investigados (LEITE, 2010). O governo levou em conta prazos praticados e considerados razoáveis pelas operadoras, mas os consumidores criticam. A regra visa a garantir o atendimento com 65 qualquer médico ou serviço no prazo máximo, não apenas no médico ou hospital desejado (LEITE, 2010). Não obstante, a ANS noticiou em 28.01.2011, a disponibilidade em seu sítio eletrônico acerca de nova consulta pública para que a sociedade civil envie suas contribuições no período de 03.02.2011 a 04.03.2011, que leva em consideração a proposta da Resolução Normativa (ANEXO) que trata sobre a garantia de atendimento de beneficiários de plano privado de assistência à saúde (Tabela 1). Nesta proposta de Resolução Normativa ainda não publicada, os prazos máximos de atendimento compreendem o período compreendido entre a data da demanda do beneficiário pelo serviço ou procedimento e a data da sua efetiva realização (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2011). Faz parte desta proposta de Resolução Normativa o reembolso integral pelo serviço ou procedimento prestado no prazo máximo de 30 (trinta) dias, a partir da data da solicitação de reembolso pelo beneficiário que for obrigado a pagar os custos do atendimento, na hipótese de descumprimento do disposto nos arts. 4º e 5º desta resolução ainda não publicada pela ANS. Nestes artigos, incluem-se, respectivamente, a ausência ou inexistência de prestador credenciado, que ofereça o serviço ou procedimento no município pertencente à área geográfica de abrangência do plano, onde a operadora deverá garantir o atendimento em prestador não credenciado no mesmo município e, finalmente, na hipótese de ausência ou inexistência de prestador credenciado ou não, que ofereça o serviço ou procedimento demandado no mesmo município pertencente à área geográfica de abrangência do plano, a operadora deverá garantir o transporte do beneficiário até o prestador credenciado para o atendimento, assim como seu retorno à localidade de origem (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2011). É facultada às operadoras de planos privados de saúde a informação de tempos para atendimento menores que os determinados (Tabela 1), que no caso de prática de tempos maiores em relação aos prazos máximos de atendimento normatizados pela ANS, estarão sujeitas às penalidades administrativas cabíveis (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2011). De acordo com Lottenberg (2007), os planos de saúde apresentam regras confusas para os consumidores, apresentando, porém, uma lógica interna clara baseada na interface despesa/receita. Os consumidores deste tipo de serviço adquirem o produto sem real compreensão das suas restrições e coberturas, e se sentem enganados em face da necessidade da sua utilização. Reitera-se que aquelas empresas que operam planos de saúde privados que não conseguirem garantir os atendimentos nos prazos estabelecidos pela ANS incorrerão em 66 desvio contratual e terão de prestar explicações à agência, onde os atrasos na liberação das autorizações prévia aos serviços, por exemplo, serão aceitos se houver uma limitação causada por excesso de demanda, como após uma epidemia (LEITE, 2010). A ANS não tem a finalidade de substituir o Instituto de Defesa de Consumidor (IDEC) através da defesa exclusiva dos interesses dos consumidores, até porque sua preponderância é manter o equilíbrio regulatório entre as operadoras, prestadores e beneficiários de planos de saúde. Segundo Montone (2009, p. 83), “às agências reguladoras é concedido o poder de impor multas crescentes e que podem culminar com a liquidação extrajudicial das operadoras, no caso da saúde suplementar”. A saúde coletiva é o bem maior que torna o Estado soberano para intervir em nome do interesse público que deverá estar sempre acima do interesse privado focado no mercado. As formas efetivas para o Estado consolidar a sua soberania perante os conflitos e assimetrias de informação do mercado e seus entes é atuar a partir da fiscalização indireta e direta. De acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada nº 24 da ANS de 13 de junho de 2000, as penalidades que podem ser aplicadas às operadoras de planos privados de assistência à saúde no âmbito das atribuições regulatórias desta autarquia são advertência, multa pecuniária, suspensão de exercício dos cargos, inabilitação temporária para o exercício dos cargos, cancelamento da autorização de funcionamento e alienação da carteira da operadora mediante leilão (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2000a). As multas pecuniárias decorrentes da lavratura dos autos de infração, resguardados os direitos contraditórios e os de ampla defesa da operadora de planos de saúde variam de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) até o limite de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) por infração, acrescidas de fatores decimais multiplicadores para o cálculo do valor das multas, com base no número de beneficiários das operadoras, constante no cadastro de beneficiários efetivamente fornecido à ANS. O fator multiplicador I (dois décimos) corresponde a 1 (um) a 1.000 (mil) beneficiários; o fator II (quatro décimos) equivale a uma carteira de 1.001 (mil e um) a 10.000 (dez mil) beneficiários; o fator III (seis décimos) corresponde à faixa de 10.001 (dez mil e um) a 100.000 (cem mil) beneficiários; o fator IV (oito décimos) equivale a faixa de 100.001 (cem mil e um) a 200.000 (duzentos mil) beneficiários e o fator V (um) corresponde a um total a partir de 200.001 (duzentos mil e um) beneficiários de planos de saúde (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2000a). A reincidência é a repetição da mesma infração da operadora de plano de saúde quando verificada em decisão administrativa irrecorrível que para efeito da aplicação da penalidade de competência da ANS, a constatação dessa reincidência ocorrerá entre a data do 67 trânsito em julgado e a data da prática da infração posterior tiver decorrido período de tempo não superior a cinco anos (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2000a). As circunstâncias agravantes para aplicação das penalidades contra as operadoras de planos privados de assistência à saúde acrescentam R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais) nos valores da multa, as quais envolvem a reincidência da infração, o nexo causal da prática infrativa que tenha culminado em risco ou consequências danosas à saúde do consumidor, a não tomada de providências para atenuar ou evitar as consequências danosas do ato lesivo perante a resignação do infrator após conhecimento desse ato e descumprimento das formalidades previstas no art. 9º da Lei 9.656/1998. Em contrapartida, as circunstâncias atenuantes implicam na redução de R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais) no valor da multa, as quais se limitam a infrações descritas nos artigos 2º e 3º da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº 24 sem reincidência da infração contida nesses artigos, providências espontâneas pela operadora que sejam suficientes para reparar a tempo os efeitos danosos da infração, quando a infração for provocada por lapso do autor, e não lhe trazer nenhum benefício ou ter o infrator incorrido na errada compreensão dos normativos regulatórios para a prestação dos serviços na saúde suplementar, com a devida demonstração evidenciada em processo administrativo (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2000a). A título de curiosidade para o leitor desse trabalho as especificações dos normativos regulatórios quanto aos dispositivos que tratam das formalidades exigidas pela Lei 9.656/1998 e infrações primárias incorridas nos artigos 2º e 3º da RDC nº 24/2000, passíveis das circunstâncias atenuantes para a aplicação de penalidades às operadoras de planos privados de assistência à saúde, podem ser detalhadamente encontradas no sítio eletrônico www.ans.gov.br, indicadas nas referências. O papel controlador direto e indireto é importante para o efetivo controle regulatório. Entretanto, no âmbito das fiscalizações direta e indireta existem peculiaridades: a fiscalização indireta, resultado do cruzamento dos diversos sistemas de informação disponíveis, gera resultados com maior governabilidade da agência. Pode levar à decretação de um processo de direção fiscal ou técnica e esses, por sua vez, podem levar à exigência de um plano de recuperação, ou termo de ajuste de conduta, a uma transferência compulsória de carteira ou até à liquidação extrajudicial.[...] Na fiscalização direta, a realidade é outra. As agências fiscalizam e multam a partir da constatação de infrações aos seus respectivos regulamentos, mas em relação entre as multas aplicadas e os valores efetivamente pagos é muito ruim em todos os setores regulados (MONTONE, 2009, p. 83). No dia 1º de setembro de 2010 foi publicado pela ANS o boletim de serviço nº 64 com a finalidade de retificação de problemas relacionados às dificuldades fiscalizatórias, em que o atual Diretor Presidente da ANS - Maurício Ceschin, pela Portaria nº 3.891, de 31 de agosto 68 de 2010, aprovou a criação do Grupo de Trabalho Intersetorial para tratar da melhoria do processo de apuração de infrações e aplicação de sanções e da cobrança de multas pecuniárias no âmbito da saúde suplementar (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010e). Reconhece-se o senso comum de base legal para aplicação dos princípios de direitos constitucionais contraditórios e os da ampla defesa das operadoras e demais entes regulatórios. Contudo, no caso das operadoras, admite-se que é importante rediscutir o conceito aberto sem definição conceitual normativa de cumprimento útil da obrigação da operadora de plano de saúde, atualmente sem restrição no tempo e prazo para operadora reparar sua conduta irregular com o devido reconhecimento da Agência Nacional de Saúde Suplementar (2010f). Portanto, “prazos e exigências de notificação que não deveriam aplicarse a um universo conhecido poderiam ser reduzidos e simplificados sem prejuízo algum para o legítimo direito de defesa das operadoras, gerando maior efetividade da ação punitiva” (MONTONE, 2009, p. 84). Perante a possibilidade da operadora de plano de saúde adequar-se à aplicação do instituto da reparação voluntária e eficaz, e somado ao tempo de tramitação dos processos administrativos, a rediscussão dos critérios para aplicação desse mecanismo de reparação de conduta antes do lavramento dos autos de infração, justifica-se pelo propósito de evitar eventual impunidade ou insatisfação do usuário de plano de saúde que reclama seu direito tolhido pela operadora ou prestador junto à Agência Nacional de Saúde Suplementar (2010f). Em caso de dúvidas ou denúncias, os beneficiários de planos de saúde devem procurar a Agência por meio dos seguintes canais de atendimento: Disque-ANS: 0800 701 9656, Fale Conosco em www.ans.gov.br, ou dirigindo-se pessoalmente a um dos 12 Núcleos da ANS existentes no país (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010b). A sede da ANS fica no Rio de Janeiro e suas sucursais estão presentes em Ribeirão Preto e nos Estados de São Paulo (capital), Bahia, Pará, Pernambuco, Ceará, Minas Gerais (Belo Horizonte), Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso e Brasília. Retomando a concepção de que a oferta de um serviço produz a demanda, o usuário busca o que lhe é oferecido a partir do que ele imagina atender sua necessidade, ainda que tenha que aguardar autorização prévia da operadora para usufruir o procedimento prescrito pelo seu médico assistente. Dessa forma, a busca pelo serviço de saúde se dá através da percepção que o usuário tem do que é ofertado por esse serviço. E esta percepção que nem sempre é objetiva, porque ela se forma a partir, 69 também, de um campo simbólico que o usuário utiliza para formar certa ideia do que o serviço tem a lhe ofertar e resolver seu problema (FRANCO; MERHY, 2010, p. 184). O usuário não atendido no seu plano de saúde poderá desistir de reclamar quando desconhecer a quem recorrer para orientar-se de algum direito não coberto. As queixas contra planos de saúde podem estar sendo subnotificadas quando se presume desconhecimento do consumidor perante a existência de órgãos como a ANS. A tomada de conhecimento de volume cada vez maior de reclamações dos usuários de planos de saúde permite aperfeiçoar instrumentos regulatórios, principalmente quanto às cláusulas contratuais não atendidas ou diante de algum ato abusivo ou lesivo por parte da operadora. Reflete-se a necessidade de ampliar através da mídia e meios de comunicação o papel da ANS e suas atribuições regulatórias do mercado de planos privados de saúde, estimulando a procura de consumidores mais leigos no exercício de seus direitos, dirimindo dúvidas de todos os atores e diminuindo a assimetria de informações nessa área. Assim, algumas ideologias sobre as agências reguladoras tornam-se importantes nas seguintes passagens: Quando a gente fala do relacionamento das agências com o Judiciário é necessário partir da seguinte constatação: que as agências, o Poder Público em geral, são vistos com desconfiança pelo Judiciário. E daí vem grande parte das resistências que se fazem sentir na prática judiciária. Quer dizer, existem duas questões. Uma é a questão, talvez, do ranço ou da má imagem que o Poder Público passa ter na história da prática administrativa recente, ou talvez não tão recente, no país. E a segunda questão é um sentimento de onipotência judiciária, de que o juiz acha que tudo sabe e tudo pode com relação à aplicação de normas jurídicas. Então essas duas coisas juntas provocam um ativismo judicial com relação à atuação das autoridades administrativas em geral, não somente com relação a agências reguladoras (BRUNA, 2009, p.64). [...] Só queria chamar a atenção que, a rigor, toda a doutrina da boa governança regulatória é muito recente. E ela é construída em cima da análise crítica da má experiência norteamericana do processo regulatório que deu origem ao conceito de captura, para só ficar nisso, e a gente não se estender muito. Quando se fala em independência, em excelência técnica, em transparência, prestação de contas, a gente está falando de um conjunto doutrinário de boa governança, que foi construído não tem duas décadas. Então, isto tudo é uma construção na linha do que a gente chama de engenharia institucional, que eu acho que é de certa forma, amparada na experiência norte-americana, mas justamente amparada a partir da má experiência do que foi a má regulação (SALGADO, 2009, p.72). [...] Eu acho que no Brasil, a gente precisa exercer um controle sobre essas agências, saber quem vai ser colocado lá, e a sociedade tem de exercer um controle sobre elas. Porque não existe na democracia nenhum órgão sobre o qual não se tenha controle. Não existem pessoas perfeitas e muito menos instituições perfeitas. Agora, elas existem em função da privatização dos serviços, porque quando o Estado está prestando o próprio serviço, essas agências são absolutamente desnecessárias. Agora, a gente não pode esquecer que o que foi privatizado foi construído pelo Estado. Não foi construído pela iniciativa privada. O Estado construiu e explorou, e regulou. O modelo faz sentido a partir de o Estado passar a conceder os serviços para a iniciativa privada. Eu não sou contra as agências. Eu sou contra essa sublimação dessa independência e achar que o poder político é uma coisa ruim. A sociedade é política. A sociedade não vota em técnicos, ela vota em políticos. E ela quer soluções para os seus problemas. Agora, o que se pergunta é o seguinte: um órgão técnico tem capacidade de resolver os problemas da sociedade? [...] (MALARD, 2009, p.75-76). 70 Na análise destas concepções ideológicas acredita-se que a boa regulação requer o controle social que necessita da maior aproximação deste segmento com os órgãos reguladores, dinamizando a defesa do interesse público sem que haja necessidade de recorrer ao âmbito judiciário quanto às questões técnicas que pela autonomia das agências reguladoras poderiam ser sanadas com maior independência e eficácia pública, seja em respostas mais resolutivas entre os atores envolvidos na regulação, seja de forma mais satisfatória para a sociedade. A percepção da sociedade sobre a atuação do órgão regulatório é importante para avaliar se o objeto da regulação está sendo adequadamente regulado, que no caso da saúde suplementar torna a saúde o maior bem essencial e preponderante sobre o mercado de planos privados de saúde, cujo patrimônio vital coletivo deve ser assegurado pelo Estado na sua maior eficácia e transparência pública. Desta forma, fomentar o trabalho da ANS para a sociedade viabiliza ações para aumentar o bem-estar social e exercício da cidadania. 71 3 ABORDAGEM METODOLÓGICA 3.1 Tipo de estudo Trata-se de estudo qualitativo-descritivo que tem como eixo central o acesso, na dimensão funcional, aos serviços de saúde no contexto do sistema de saúde privado, na percepção dos usuários dos planos de saúde no Rio de Janeiro. Para Schocair (2009, p. 42), “a modalidade descritiva caracteriza-se pela estaticidade, pois quase não há movimento, onde as cenas não transcorrem de forma dinâmica, como num filme, mas são imóveis como numa foto”. O delineamento para o estudo qualitativo foi adequado para esta pesquisa, por se tratar de uma abordagem psicossocial do objeto norteada pela perspectiva do usuário que relatou suas vivências e experiências humanas compartilhadas. Pope e Mays (2009) relatam que a pesquisa qualitativa procura desenvolver categorias analíticas para descrever e explicar fenômenos sociais. Víctora, Knauth e Hassen (2000) acrescentam que os métodos qualitativos de pesquisa não são úteis na mensuração de fenômenos em grandes grupos, sendo basicamente úteis para o entendimento do contexto, onde algum fenômeno ocorre, permitindo a observação de vários elementos simultaneamente em um pequeno grupo, propiciando um conhecimento aprofundado de um evento, assim como possibilitando a explicação de comportamentos. “As experiências primordiais da própria pessoa que as têm e das que têm dos outros nos seus estados de consciência ocorrem naquilo que é chamado de autopercepção ou percepção interna” (MARTINS; BICUDO, 2005, p. 53). Segundo Martins e Bicudo (2005), só é viável perceber os outros através da contemplação das experiências vividas. Adotando-se essa concepção de compreensão humanizada delineou-se o foco descritivo na perspectiva do usuário de plano de saúde que experimentou vivências de atendimento na rede privada de assistência, contemplando-se os exames de imagem mais complexos para direcionamento ou complemento de dado diagnóstico para a saúde. Pretendeu-se com este estudo por meio dos formulários e entrevistas subsidiados pelo referencial teórico de literatura intermediar o significado das palavras dos entrevistados, 72 possibilitando compreender o objeto deste estudo paralelo à transversalidade contextual dos sujeitos usuários de planos de saúde privados. A pesquisa qualitativa constitui um recurso metodológico que inclui a conversa e o diálogo com os respondentes, cuja finalidade é a obtenção de informações úteis e importantes, de relevância tanto para o pesquisador, como para o entrevistado, sendo impossível o seguimento de regras e o rigor encontrado em outros tipos de pesquisa que tratam a entrevista como „método‟ (MARTINS; BICUDO, 2005). Os métodos disponíveis são importantes pela utilidade aos tipos de informações necessárias para o desenvolvimento de uma proposta de investigação e até mesmo para o desenrolar das etapas de uma pesquisa, mas quando se trata de qualquer pesquisa social que se pretenda um aprofundamento maior da realidade, não se pode ficar restrita ao referencial apenas quantitativo (MINAYO, 2000). A “pesquisa social é um processo que utiliza metodologia científica, por meio da qual se pode obter novos conhecimentos no campo da realidade social” (MARCONI; LAKATOS, 2009, p.4). A diferença entre abordagem quantitativa e qualitativa da realidade social é de natureza e não de escala hierárquica, pois enquanto os cientistas sociais que trabalham com estatística visam a criar modelos abstratos ou a descrever e explicar fenômenos que produzem regularidades recorrentes e exteriores aos sujeitos, a abordagem qualitativa se aprofunda no mundo dos significados (DESLANDES; GOMES; MINAYO, 2008). No que se refere a sua definição, a metodologia de pesquisa pode ser vista como o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade, é composta pelo método entendido como teoria da abordagem, as técnicas compreendidas como os instrumentos de operacionalização do conhecimento e, finalmente, a capacidade do pesquisador que traduz a sua experiência, sua capacidade pessoal e sua sensibilidade (DESLANDES; GOMES; MINAYO, 2008). 3.2 Sujeitos da pesquisa Os sujeitos da pesquisa constituíram uma amostra de trinta usuários de planos de saúde privados, selecionados, aleatoriamente, quando estavam agendando, buscando seus resultados de exames ou quando aguardavam na sala de espera antes e após a realização de 73 seus exames diagnósticos e/ou complementares de alta complexidade. Envolveram sujeitos acima de 18 anos de idade que tinham agendado pelo menos um exame de alta complexidade, compreendendo ressonância magnética, tomografia computadorizada, densitometria óssea ou outro desta natureza. Os sujeitos selecionados da pesquisa estavam em sua posse da carteira de beneficiário do convênio com o plano de saúde, comprovante de pagamento (plano particular), identidade, prescrição médica ou guia própria do convênio de requisição para o exame, com ou sem a data da solicitação de um desses exames. No laboratório cenário desta pesquisa, tais documentações eram informações anunciadas em placas no corredor da sala de espera dos exames, como medidas adotadas pelos convênios como os documentos necessários para a realização de exames. Caso o usuário de plano de saúde tivesse usado concomitantemente os sistemas de saúde público e privado, através de livre escolha do mesmo, no caso de verificação de duplicidade de acesso, teria sido considerado o cenário da sua natureza privada no momento da realização da entrevista. A coleta de dados foi realizada nos meses de junho a julho de 2010. Foram considerados aptos para realização da pesquisa os sujeitos usuários de planos de saúde privados submetidos aos exames de alta complexidade, que estavam disponíveis para a realização da pesquisa durante o agendamento no laboratório estudado, no rol do saguão de entrega de resultados de exames e aqueles que aguardavam na sala de espera do campo escolhido antes e após a realização dos exames de imagem, os quais concordaram em participar da pesquisa e em assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, assim como os que concordaram em gravar seus relatos. As dificuldades para realização desta pesquisa estiveram relacionadas à demora de três meses e oito dias para liberação do parecer de aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), pendência exigida desse comitê para adequação de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido com linguagem menos técnica; e os relacionados à coleta no campo de pesquisa, considerando que muitos entrevistados recrutados recusaram-se a participar devido à pressa expressa, relatos de compromissos agendados e inadiáveis, convalescença anunciada, debilidades comuns da idade avançada, mal estar na hora do exame, desmotivação em participar, mau humor e motivos pessoais desconhecidos, não compatíveis com o cronograma inicial do projeto. Outra grande dificuldade foi que a maioria dos sujeitos que comparecia ao laboratório para buscar os resultados dos exames analisados não eram os titulares dos exames de alta complexidade, e 74 sim, parentes ou empregadas domésticas. Daí, majoritariamente, os entrevistados selecionados foram aqueles que aguardavam na sala de espera dos exames e que cumpriram os critérios de inclusão na pesquisa, inclusive com a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE A). Tabela 2 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por local da coleta de dados no laboratório - Rio de Janeiro, 2010. Quantidade de usuário de plano Situação dos sujeitos entrevistados no cenário de de saúde por local da coleta de pesquisa dados no laboratório Disponíveis no agendamento dos exames no térreo Disponível no rol de saguão da entrega dos exames no térreo % 1 3,33 2 6,67 Disponíveis na sala de espera antes e após o exame no 1º/ 2º andares 27 90,00 Total 30 100,00 A necessidade de adequação dos instrumentos de coleta de dados durante a fase de pré-teste das entrevistas, nos meses de abril e maio de 2010, transformando questionário em formulário consolidado, também postergaram o início da coleta de dados, após a aprovação do Comitê de Ética em questão; assim como o roteiro das entrevistas que de semi-estruturado passou a ser estruturado para garantir a objetividade das perguntas, diante da pressa relatada dos entrevistados que tinham outros compromissos após os exames (APÊNDICES B e C). 3.3 Cenário do estudo O cenário de estudo foi um Laboratório de Medicina diagnóstica e saúde preventiva da rede privada de assistência à saúde, localizado no bairro de Copacabana, na zona sul da cidade do Rio de Janeiro, que atende clientes de planos de saúde privados na realização de exames diagnósticos e complementares de alta complexidade. Apresenta além de Copacabana, unidades de atendimento em Ipanema, Leblon, Botafogo, Jardim Botânico, Catete, Centro, São Cristóvão, Vila Isabel, Tijuca, Méier, Cachambi, Del Castilho, Jardim América, Madureira, Vila Valqueire, Penha, Bonsucesso, 75 Irajá, Ilha do Governador, Jacarepaguá, Bangu, Barra, Campo Grande, Santa Cruz, Duque de Caxias, Itaguaí, Macaé, Nilópolis, Niterói, Nova Iguaçu, Teresópolis e Volta Redonda. Atende uma grande variedade de planos de saúde do Rio de Janeiro, constituído como uma das megaunidades de Copacabana na cidade do Rio de Janeiro, com ampla oferta de serviços, tais como análises clínicas, anatomia patológica, biologia molecular, citopatologia, provas funcionais e exames de diagnósticos por imagem, como colonoscopia, densitometria óssea, ecocardiograma, eletroencefalograma, endoscopia - retossigmoidoscopia, ergometria, monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA), holter 24 horas, mamografia, prova de função pulmonar, raios X, ressonância magnética, tomografia computadorizada e ultrassonografia. Presente há quase 60 anos, com 43 unidades de atendimento estrategicamente localizadas, a instituição selecionada formalizou a prerrogativa do anonimato para não ser identificada. No laboratório pesquisado, caso o plano de saúde não fornecesse a opção de atendimento, o consumidor poderia contar com uma Tabela de preços populares para realizar os exames em condições particulares muito especiais. Contudo, esse consumidor de pagamento monetário direto não estava presente no critério de inclusão desta pesquisa que focava o usuário de plano de saúde privado. Os horários de funcionamento da Megaunidade de Copacabana eram de segunda a sexta-feira das 6h30 às 22h, sábado das 6h30 às 19h e de 7h às 13h nos feriados. Além dessas opções, existia atendimento domiciliar para exames laboratoriais mais simples e aos domingos. Caso o cliente não pudesse comparecer ao exame de imagem na data agendada, poderia reagendá-lo na central de atendimento. 76 Tabela 3 – Planos de saúde credenciados no laboratório de medicina diagnóstica. Exemplos de convênios aceitos pelo laboratório de medicina diagnóstica em megaunidade de Copacabana no Rio de Janeiro em 2010 Associação Beneficente dos Empregados em Telecomunicações (ABET) Garantia de Saúde Assurance Generale de France (AGF) do Brasil Grupo Executivo de Assistência Patronal (GEAP) Aliança Navegação e Logística Associação dos Fiscais de Renda do Estado do Rio de Janeiro (AMAFRERJ) Golden Cross Indústrias Nucleares do Brasil Assistência Médica Integrada (ASSIM) Banco Central do Brasil Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) Instituto de Previdência da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (IPALERJ) Banco do Brasil Lincx Serviços de Saúde Blue Life Marítima Bradesco Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Caixa de Assistência à Saúde do Rio de Janeiro (CABERJ) Medial Saúde Mediservice Mútua dos Magistrados do RJ Notre Dame Caixa de Assistência à Saúde de São Paulo (CABESP) Núcleos Instituto de Resseguridade Social Caixa de Assistência dos Servidores da CEDAE (CAC) Caixa Econômica Federal Caixa de Assistência aos Defensores Públicos do Estado do Rio de Janeiro (CAMARJ) Caixa de Assistência do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (CAMPERJ) Caixa de Previdência e Assistência dos Servidores da Fundação Nacional de Saúde (CAPESESP) Núcleos Saúde Nuclebrás Equipamentos Pesados (NUCLEP) Care Plus Caixa Assistencial Universitária Rio de Janeiro (CAURJ) Petrobrás Distribuidora Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) Petrobrás Petróleo Brasileiro Periódico Programa de Saúde e Assistência Social Plan Assiste/Ministério Público Federal (MPF) Programa de Saúde e Assistência Social Plan Assiste/Ministério Público do Trabalho (MPT) Convênio Médico Hospitalares (CONMEDH) Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) Omint Petrobrás Petrobrás Petróleo Brasileiro-AMS Eletros Saúde Empresa Brasileira de Telecomunicações (EMBRATEL) Porto Seguro Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos Instituto Oswaldo Cruz de Seguridade Social (FIOPREV) São Bernardo Saúde Serviços Médicos Guanabara (SEMEG) Saúde Furnas Centrais Elétricas Sul América Gama Gama Aeronáutica Unibanco American International Group (AIG) Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico (UNIMED) Gama Fit Urgências Médico-Escolares (URMES) Saúde Bradesco Individual e Empresarial Fonte: Adaptado de folder do laboratório da pesquisa, em relação às unidades credenciadas e referenciadas de operadoras de planos de saúde privados. 77 O agendamento dos exames de alta complexidade poderia ser feito pessoalmente no laboratório em horários específicos, na central de atendimento on line ou ao telefone, de segunda a sexta-feira, sábado e feriados para algumas unidades laboratoriais. Os atendentes do laboratório de medicina diagnóstica intermediavam a marcação do exame de imagem entre o usuário de plano de saúde com a atendente do plano que liberava ou não a autorização para realizar o exame. Contudo, em alguns casos, o próprio paciente se deslocava para pegar a senha de autorização com a operadora de plano de saúde, transferindo-a para a atendente do laboratório proceder ao agendamento, a exceção da operadora GEAP, não vislumbrada nos sujeitos entrevistados. A confirmação do agendamento era feita pela atendente do laboratório estudado. Para a maioria dos exames de análises clínicas como sangue e urina, não era necessário agendamento prévio. No agendamento on line o cliente deveria preencher seus dados pessoais, informações de assistência médica, em que deveria marcar se o atendimento seria particular ou por plano de saúde, denominando seu plano. Durante este atendimento eletrônico, era solicitado caso o cliente tivesse dificuldade para ler seu pedido médico, para escaneá-lo e anexá-lo como arquivo ao formulário eletrônico. O cliente deveria preencher qual o exame de imagem a ser realizado, data pretendida, horário e unidade pretendidos. No agendamento telefônico que visava à marcação do exame mais complexo, eram perguntados o nome da operadora do plano de saúde privado antes do nome do cliente, tipo do exame e dados da carteira do convênio, como números do cadastro e produto do plano de saúde contratado do usuário, e pessoalmente o atendimento para marcação requeria ainda a apresentação da identidade e do pedido médico, além da carteira do plano. A atendente do laboratório perguntava ao telefone se o pedido médico tinha data ou não, contudo no agendamento on line não havia esse questionamento. O usuário do plano, ao dizer que o pedido tinha data, a atendente ao telefone perguntava o nome da operadora do plano de saúde e verificava no sistema do laboratório a data da validade do exame, informando que dependendo da operadora, os tempos das validades dos pedidos médicos com datas eram distintos, variando da isenção de autorização prévia ao exame (Ex: Operadora Mútua dos Magistrados do RJ e CABERJ), autorização imediata em dias, semanas e em meses, incluindo um mês (Ex: Operadora GEAP Família) a até três meses de validade (Ex: Operadora Sul América). Foi informado através da central telefônica de atendimento do laboratório desse estudo que as validades eram automáticas quando se cadastravam os dados do usuário do plano, porque o manual do convênio de cada tipo de plano de saúde era digitalizado no sistema do laboratório, indicando as validades específicas quando o pedido ou guia médica 78 tinham data. A própria atendente sugeria que era melhor que o pedido e guias médicos do convênio não tivessem data, considerando que os pedidos e guias médicos sem data não implicavam em problemas de validade de data de exame médico. No agendamento pessoal no laboratório, a variável fila de espera, perante a quantidade de pessoas, poderia determinar que o agendamento prévio do exame fosse feito exclusivamente ao telefone pelo próprio cliente, através da telefonista da central de marcação desse laboratório ou central de relacionamento, ao invés de marcação no próprio laboratório. Após o agendamento on line, ou telefônico, o usuário comparecia no laboratório para apresentar os documentos exigidos por ora já descritos, e aguardava na sala de espera do exame de imagem prescrito. Antes de apresentar os documentos para as atendentes do laboratório, o cliente deveria pegar uma senha de atendimento que poderia ser preferencial para idosos, gestantes e deficientes, em conformidade com as legislações de prioridade de atendimento ao público. Assim que a senha da vez aparecia no painel eletrônico, o beneficiário do plano de saúde privado entregava os documentos exigidos para conferência da atendente do laboratório e procedia ao preenchimento da confirmação de guia de declaração, autorização e confirmação de atendimento pelo prestador laboratorial credenciado do plano de saúde privado antes da realização do exame requerido pelo médico assistente desse beneficiário. O pedido médico tinha que ter a indicação clínica do exame de alta complexidade, número do registro do Conselho Regional de Medicina (CRM) e nome do médico solicitante, assim como as guias do convênio. A entrega dos resultados podia ser feita no laboratório ou on line através do número e senha eletrônica de identificação do cliente, garantindo a privacidade, sigilo absoluto e segurança no sistema. Porém, na entrega dos resultados no laboratório do estudo em voga não foi observada exigência de documento de identidade e nem procuração ou autorização manuscrita do titular do exame para parente ou empregada doméstica que iam buscar o resultado do exame do interessado. O laboratório tinha quatro grandes compartimentos físicos, divididos em subsolo, térreo, primeiro andar e segundo andar, havendo elevadores, escadas e adaptação estrutural (elevador) para deficientes cadeirantes ou com dificuldade de locomoção, além de boa sinalização para repartições (setores de atendimento), sanitários e extintores de incêndios. 79 Setores do espaço físico do laboratório de medicina diagnóstica em megauninade de Copacabana no Rio de Janeiro em 2010 Subsolo Térreo 1º Andar 2º Andar Análises clínicas Acesso de ambulância Sala de coleta de sangue para crianças Boulevard do forte Estacionamento Audiologia Auditório Curva glicêmica Densitometria óssea Ecocardiografia Café Eletrencefalografia Eletrocardiografia Colposcopia Entrega dos resultados Informações Recepção Endoscopia Função pulmonar Provas funcionais Ressonância magnética Vacinas Tomografia Ergometria Holter Mamografia Mapa Raio X Ultrassonografia Colonoscopia Quadro 1 – Espaço físico do campo de estudo. Fonte: Adaptação de mapa físico visual do laboratório de medicina diagnóstica estudado. Figura 1 – Sala de espera de resultado de exames no térreo no cenário do estudo. Fonte: A autora, 2010. 80 Figura 2 - Lateral da sala de espera de exames de ressonância magnética e tomografia computadorizada no 1º andar. Fonte: A autora, 2010. Figura 3 - Corredor da sala de espera de exames de ressonância magnética e tomografia computadorizada no 1º andar. Fonte: A autora, 2010. 81 Figura 4 - Sala de espera de exames de densitometria óssea no 2º andar. Fonte: A autora, 2010. 3.4 Técnicas de coleta de dados Os dados foram coletados a partir da aplicação de formulários e entrevistas individuais estruturadas realizadas entre usuários de planos de saúde de quaisquer tipos de contrataçõesindividual, familiar, adesão ou empresarial. De acordo com Deslandes, Gomes e Minayo (2008), a entrevista tem como matéria-prima a fala de alguns interlocutores, onde o campo da pesquisa social não é transparente e tanto o pesquisador como os seus interlocutores e observadores interferem no conhecimento da realidade, ou seja, a natureza da pesquisa social nunca é neutra. Pope e Mays (2009) identificam significados subjetivos e elaboração de teorias explicativas presentes nos métodos qualitativos como a entrevista e a observação, o que significa para estes autores que frequentemente a coleta de dados continuará até que um ponto de saturação tenha sido atingido e que nenhuma categoria nova tenha sido criada por dados adicionais, em vez de ser estatisticamente representativa. 82 A seleção da técnica de entrevista é justificada pela possibilidade privilegiada da interação entre o pesquisador e o sujeito pesquisado. Além de aumentar a busca de informações que norteiem o objeto a ser investigado, permite entender o conteúdo não familiar e o senso comum do grupo de sujeitos pesquisados. A entrevista pode ser conceituada como um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional. É um procedimento utilizado na investigação social, para a coleta de dados ou para ajudar no diagnóstico ou no tratamento de um problema social (MARCONI; LAKATOS, 2009, p. 80). Para muito além da oportunidade de recolher ideias, opiniões, depoimentos e testemunhos, um contrito e devotado mergulho no outro. É o nó do enlace com que o pesquisador se encanta e se entremete, pela vida do discurso, nas circunstâncias da vida cifradas nos códigos de percepção, no mapa do indiciário da memória e da afetividade dos depoentes (PAREDES, 2005, p. 132). A interação pesquisador e pesquisado é uma estratégia privilegiada para a coleta de informações já que permite o surgimento na fala de conteúdos reveladores das condições de vida, dos sistemas de valores e crenças e, ao mesmo tempo, do pensamento do grupo dentro das mesmas condições históricas, socioeconômicas e culturais que o interlocutor (DESLANDES; GOMES; MINAYO, 2008). Segundo Marconi e Lakatos (2009), a entrevista como técnica de coleta de dados oferece várias vantagens, tais como: poder ser utilizada em todos os segmentos da população (analfabetos ou alfabetizados); fornece uma amostragem muito melhor da população geral (o entrevistado não precisa saber ler ou escrever); há maior flexibilidade (o entrevistador pode repetir ou esclarecer perguntas, formulá-las de maneira diferente; especificando algum significado, como garantia de estar sendo compreendido); oferece maior oportunidade para avaliar atitudes, condutas, podendo o entrevistado ser observado naquilo que diz; há oportunidade para a obtenção de dados que não se encontram em fontes documentais e que sejam relevantes e significativos; há também a possibilidade de conseguir informações mais precisas, podendo ser comprovadas, de imediato, as discordâncias; permite que os dados sejam quantificados e submetidos a tratamento estatístico. Contudo, de acordo com Marconi e Lakatos (2009), a entrevista oferece também limitações, como: dificuldade de expressão e comunicação de ambas as partes; incompreensão, por parte do informante, do significado das perguntas da pesquisa, que pode levar a uma falsa interpretação; possibilidade de o entrevistado ser influenciado, consciente ou inconscientemente, pelo questionador, pelo seu aspecto físico, suas atitudes, ideias, opiniões 83 etc.; disposição do entrevistado em dar as informações necessárias; retenção de alguns dados importantes, receando que sua identidade seja revelada; pequeno grau de controle sobre uma situação de coleta de dados e ocupação de muito tempo, sendo difícil de ser realizada. Para Marconi e Lakatos (2009), a preparação da entrevista exige algumas medidas como planejamento da entrevista (destaque para o objetivo a ser alcançado); conhecimento prévio do entrevistado (enfatiza o grau de familiaridade dele com o assunto); oportunidade da entrevista (marcação prévia da hora e local para assegurar-se de que será recebido); condições favoráveis (garantia de sigilo para a identidade do entrevistado quanto às suas declarações); contato com líderes (espera-se maior entrosamento com o entrevistado para maior variabilidade de informações) e preparação específica (organização do roteiro ou formulário com as questões importantes). Existem diferentes tipos de entrevista que, segundo Silverman (2009), requerem diferentes habilidades para realização, tais como, acenar com a cabeça, rir, brincar, sorrir, franzir o cenho, permitir o resgate de alguns termos fundamentais através de perguntas de encadeamento quanto à motivação particular do entrevistado para com a temática da pesquisa, além da escuta atenta das respostas do entrevistado para as perguntas subsequentes do entrevistador e para o acompanhamento temático. Silverman (2009) recomenda que enquanto o entrevistador ouve a resposta do entrevistado é válido, simultaneamente, dizer „e‟, „mm‟, „sei‟, „certo‟, entre outros vocábulos que não influenciem na resposta do entrevistado, mas que também não deixem o pesquisador invisível. Marconi e Lakatos (2009) informam que os diferentes tipos de entrevistas variam de acordo com o propósito do entrevistador, podendo ser padronizada ou estruturada, e despadronizada ou não estruturada: Na entrevista padronizada ou estruturada, o entrevistador segue um roteiro de perguntas predeterminadas, realizando-se de acordo com um formulário elaborado, efetuandose preferencialmente com pessoas selecionadas de acordo com um plano. O motivo da padronização é obter, dos entrevistados, respostas às mesmas perguntas, permitindo que todas elas sejam comparadas com o mesmo conjunto de perguntas, e que as variações possam refletir diferenças entre os respondentes e não diferenças quanto às perguntas (LODI, 1974 apud MARCONI; LAKATOS, 2009). Na condução despadronizada ou não estruturada, o entrevistado tem liberdade para desenvolver cada situação em qualquer direção que considere adequada. É uma forma de poder explorar mais amplamente uma questão, em que, geralmente, as perguntas são abertas e podem ser respondidas dentro de uma conversação informal. Neste tipo de entrevista, Ander- 84 Egg (1978 apud MARCONI; LAKATOS, 2009) apresentam três modalidades, que são a entrevista focalizada ou semi-estruturada, entrevista clínica e entrevista não dirigida. Para efeito deste estudo será adotada a entrevista individual padronizada ou estruturada que requer a presença de um roteiro de questões específicas e dirigidas previamente estabelecidas ao problema que se pretende estudar, onde o entrevistador, segundo Marconi e Lakatos (2009) não tem a liberdade de adaptar as perguntas a determinada situação, obedecendo, a rigor, a uma estrutura formal. Pope e Mays (2009) referem que as entrevistas estruturadas consistem na aplicação de questionários estruturados de uma maneira padronizada, e embora, frequentemente as entrevistas qualitativas sejam descritas como nãoestruturadas a fim de compará-las com as entrevistas definidas como estruturadas, projetada para produzir dados quantitativos, o termo „não-estruturado‟ é enganador, já que nenhuma entrevista é completamente livre de estrutura. Para tanto, corrobora-se que “se não houvesse estrutura, não haveria nenhuma garantia de que os dados coletados são adequados à questão da pesquisa” (POPE; MAYS, 2009, p. 4). A escolha pela entrevista padronizada ou estruturada também se justifica pela sua aplicação, que de acordo com Rizzini, Castro e Sartor (1999) se dá a partir de questões e tópicos pré-determinados sobre um tema específico, para facilitar a sistematização e codificação, listando as respostas propostas com a indicação da frequência de cada uma delas. Os instrumentos de coleta de dados consistiram em um formulário para caracterização social e econômica dos sujeitos, assim como a caracterização dos planos de saúde privados desses usuários e um roteiro de entrevista, focando o objeto e o problema de estudo (APÊNDICES B e C). 3.5 Tratamento e análise dos dados Na perspectiva de melhor compreensão do objeto de estudo e em coerência com os pressupostos referenciais teóricos, pretendeu-se explorar o conjunto de percepções subjetivas e consensuais dos usuários do sistema de saúde privado sobre o acesso aos serviços oferecidos nesta rede, particularmente aos exames de alta complexidade. Para Deslandes, Gomes e Minayo (2008) a análise e a interpretação dentro de uma perspectiva qualitativa baseiam-se no fato de não terem como finalidade contar opiniões ou pessoas, considerando os muitos pontos em comum das falas e expressões de grupos que 85 compartilham as mesmas características e que, ao mesmo tempo, consideram também as singularidades próprias da biografia de cada interlocutor. A pesquisa qualitativa procura desenvolver categorias analíticas para descrever e explicar fenômenos sociais, as quais podem ser indutivamente derivadas quando obtidas gradualmente a partir dos dados ou dedutivamente no início ou no decorrer da análise, como uma forma de abordar os dados (POPE; MAYS, 2009). Processos de inferência ou interpretação têm relação com o raciocínio indutivo quando parte do âmbito do particular para o geral, tal como na escrita por indução, em que o propósito nessa perspectiva é convencer de que o que se escreve (particular) é uma verdade para o mundo (geral), induzindo a sua compreensão individual para a coletividade. No raciocínio dedutivo, de forma oposta ao raciocínio indutivo, faz-se a interpretação deduzindo-se pela lógica do conhecimento geral para o particular, ao passo que enquanto se escreve por indução se interpreta um texto por dedução (SCHOCAIR, 2009). De acordo com Víctora, Knauth e Hassen (2000) torna-se difícil a utilização da estatística para analisar os dados qualitativos gerados, a partir do registro detalhado de observações e entrevistas, considerando que a análise dos dados assume as características de uma interpretação dos eventos pesquisados. A técnica de pesquisa utilizada para o tratamento das informações das entrevistas foi a análise de conteúdo-temática categorial de Bardin (1977), sistematizada por Oliveira (2008). A análise de conteúdo é definida como “um conjunto de técnicas de análise das comunicações” (BARDIN, 1977, p. 31). De acordo com Bardin (1977), a análise de conteúdo é usada como um instrumento de diagnóstico, pautada nas inferências específicas ou interpretações causais sobre um dado aspecto da orientação comportamental do locutor, não sendo obrigatoriamente quantitativa. Bardin (1977) ressalta que a abordagem quantitativa funda-se na frequência de aparição de certos elementos da mensagem, enquanto a abordagem não quantitativa recorre a indicadores não frequenciais suscetíveis de permitir inferências, como a presença ou ausência de dado elemento que pode se constituir em um índice tanto ou mais frutífero que a frequência de aparição. Contudo, a característica da análise qualitativa é o fato da inferência, sempre que é realizada, ser fundada na presença do índice (tema, palavra, personagem, entre outros), e não sobre a frequência da sua aparição, em cada comunicação individual (BARDIN, 1977). Para Bardin (1977), a análise temática consiste na contagem de um ou vários temas ou itens de significação, através de uma unidade de codificação previamente determinada, 86 permitindo a facilidade da escolha da frase dentro de um discurso a partir de dois sinais de pontuação como unidade de codificação. Bardin (1977, p.117) relata que “a categorização é uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com os critérios previamente definidos”. As categorias são as classes que reúnem um grupo de elementos, tais como as unidades de registro (UR), no caso da análise de conteúdo, sob um título genérico de agrupamento efetuado em razão dos caracteres comuns destes elementos (BARDIN, 1977). Contagens simples podem ser úteis em estudos qualitativos, embora na pesquisa qualitativa não se busque quantificar os dados qualitativos textuais, estes podem ser analisados quantitativamente através de um sistema de codificação inequívoco e predefinido, produzindo contagens ou frequências dos conteúdos dos discursos que podem ser tabuladas e analisadas usando técnicas estatísticas padronizadas (POPE; MAYS, 2009). Segundo Bardin (1977), as etapas para organização da análise são a pré-análise (escolha dos documentos, formulação das hipóteses e dos objetivos, e a elaboração de indicadores fundamentadores da interpretação final); a exploração do material (operações de codificação, desconto ou enumeração, em função de regras previamente formuladas) e tratamento dos resultados obtidos, a inferência e a interpretação (tratamento dos resultados brutos de maneira a serem significativos e válidos, utilizando-se operações estatísticas simples como as percentagens ou mais complexas como a análise fatorial, propondo-se inferências e adiantando interpretações a propósito dos objetivos previstos, ou que se relacionem a outras descobertas inesperadas). Bardin (2000 apud OLIVEIRA, 2008) reitera a definição das etapas da análise de conteúdo como de pré-análise; exploração do material ou codificação; tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Tais etapas, para Oliveira (2008), podem ser desenvolvidas através de sistematização de procedimentos exigidos pela análise de conteúdo temático-categorial, as quais a referida autora sintetiza como: leitura flutuante, intuitiva, ou parcialmente orientada do texto, a qual requer uma leitura impressionista e atenta ao texto para buscar a familiarização do conteúdo da entrevista e ao conteúdo de outros métodos e técnicas de investigação empírica; definição de hipóteses provisórias sobre o objeto estudado e o texto analisado, antecipando prováveis respostas quando necessárias acerca das questões norteadoras da pesquisa; 87 determinação das unidades de registro (UR) ou de codificação, que representa uma palavra ou frase do texto que surgem da segmentação do conjunto do texto para análise, formando as unidades de segmentação ou de corte. A partir da seleção das partes de interesse do texto consegue-se separar os conteúdos relacionados ao objeto de estudo, marcando no texto analisado o início e o final de cada UR que pode ser padronizada na forma de uma palavra, frase, parágrafo, tema, personagem, documento entre outros termos que estejam vinculados aos objetivos da pesquisa; definição das unidades de significação ou temas, onde as unidades de registro previamente identificadas e selecionadas serão associadas aos temas ou unidades de significação similar, sobre o assunto abordado em cada UR; análise temática das unidades de registro, onde cada tema será composto por um conjunto de unidades de registro. A análise temática baseia-se na frequência de cada temática apresentada nos discursos, permitindo a quantificação dos temas em número de unidades de registro para cada entrevista. O tema focaliza a fala das pessoas com o mesmo objeto e sentido, sendo fundamental para compreensão, revelação de novas facetas e dimensão do referencial teórico adotado acerca deste objeto; análise categorial do texto que reflete a totalidade textual e agrupamento em categorias a partir da determinação, e quantificação dos temas, onde devem ser definidas as dimensões nas quais os temas aparecem, agrupando-se os temas segundo critérios. tratamento e apresentação dos resultados, em que unidades de registro com assuntos e falas similares são dirigidas para uma mesma categoria, sendo apresentados dados que podem expressar implicação política nos discursos, representações sociais consensuadas por um grupo de sujeitos que compartilham características em comum nas comunicações cotidianas, retrato de uma cultura e a moralidade de uma época, entre outras ilações; discussão dos resultados e retorno ao objeto de estudo, destacando-se as inferências de conhecimentos relativas às condições de produção ou recepção do discurso manifesto dos sujeitos que possibilitam a utilização ou não de recursos indicadores quantitativos, não descrevendo apenas o conteúdo do texto, mas efetuando inferências com base numa lógica de discurso explicitado sobre as mensagens ditas e faladas, cujas características 88 podem ser inventariadas e sistematizadas, particularmente em textos, de modo que após o tratamento analítico possibilitem a revelação de outros aspectos relevantes, admitindo-se também proposições com conteúdos já aceitos e tidos como verdadeiros. A análise do formulário de caracterização socioeconômica e caracterização dos planos de saúde privados dos usuários foi realizada através de estatística descritiva dos seus atributos, apresentados em tabelas. Nesta pesquisa, utilizaram-se “recortes”, procedendo-se à seleção das unidades de registro das falas dos entrevistados (as), as quais foram classificadas dentro das pré-categorias pré-determinadas, e somente na última etapa descreveram-se as categorias finais, conforme padronizada em quadro especificado por dicionário de significados subsidiador das falas consensuadas por um mesmo significado (APÊNDICE H). 3.6 Aspectos éticos em pesquisa O projeto de pesquisa desta dissertação foi recebido no Comitê de Ética e Pesquisa da UERJ em 06.01.2010, sob registro no Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 0002. 0.325.000-10. Foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UERJ em 14.04.2010 pelo parecer da Comissão de Ética em Pesquisa da UERJ (COEP) nº 019/2010, protocolo nº 006.3.2010. O projeto seguiu critérios exigidos pela instituição selecionada para o estudo. Foram cumpridas as exigências da Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde (1996) do Ministério da Saúde. Todos os sujeitos participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, no qual foi concedida garantia de sigilo das informações, anonimato, direito de desistir da pesquisa e ciência do resultado final do trabalho desenvolvido (APÊNDICE A). 89 4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 4. 1 Caracterização dos sujeitos estudados A descrição das características das informações extraídas nos formulários e entrevistas aplicados aos sujeitos permitiu, em conjunto com o referencial teórico e metodológico de base desta pesquisa, construir inferências e impressões de traços transversais ao pensamento compartilhado do grupo de usuários de planos de saúde sobre as percepções do acesso aos exames de alta complexidade no sistema de saúde privado, descrevendo o seu conteúdo, assim como os níveis de satisfação, quanto ao acesso a estes exames de maior complexidade. Estão elencados abaixo os resultados relativos aos dados coletados nos formulários de caracterização socioeconômica dos usuários de planos privados de assistência à saúde. Tabela 4 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por sexo - Rio de Janeiro, 2010. Sexo f % Masculino 15 50,00 Feminino 15 50,00 Total 30 100,00 Dos 30 entrevistados, 15 (50%) eram homens e 15 (50%) eram mulheres, selecionados aleatoriamente, sendo todos maiores que 18 anos, a partir da faixa etária de 20 até 89 anos. Conforme Lima (2005, p. 88), “a percepção da perspectiva de gênero nas relações entre os sexos fornece meios de decodificar o significado culturalmente atribuído ao varão e à mulher e de compreender as complexas conexões entre as várias formas de interação humana”. Não houve variação significativa dos relatos descritos em função do gênero quanto ao objeto de estudo. Porém, os sujeitos do sexo masculino eram mais objetivos e pontuais nas questões levantadas ao longo das entrevistas, as quais foram mais rápidas com os homens do que com as mulheres. A riqueza dos relatos foi recíproca em ambos os gêneros, independente do tempo de duração das entrevistas. 90 Ressalta-se, todavia, a importância da compreensão dos grupos de gênero no passado histórico, com o propósito de identificar os papéis e simbolismos sexuais presentes nas diferentes sociedades e períodos, descobrindo-se a maneira como eles operavam para a manutenção ou mudança da ordem social (LIMA, 2005). Tabela 5 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por cor étnica autodeclarada - Rio de Janeiro, 2010. Cor étnica f % Brancos/ Morenos Negros/ Pardos Total 26 4 30 86,67 13,33 100,00 Quanto à cor étnica autodeclarada, 26 (86,67%) entrevistados se declararam brancos ou morenos e 4 (13,33%) se declararam negros ou pardos. Estes dados demonstram a maioria branca que realizou os exames dessa pesquisa, em percentual maior para cor étnica do que o de pessoas que se autodeclararam brancas (55,80%) no Rio de Janeiro pela Pesquisa Nacional de Amostras de Domicílios (IBGE, 2009). Percebe-se que os usuários de planos de saúde da amostra do estudo constituem a elite não negra da sociedade fluminense, em contraposição com a minoria negra que presumidamente não detém de recursos monetários suficientes para a aquisição desses benefícios para contratação direta ou talvez indicando que esteja desempregada ou subempregada na sua maioria e marginalizada socialmente. De acordo com o IBGE (2009), o percentual de negros e pardos no Rio de Janeiro foi de 43,70%, com paralelismo de 13,33% da amostra pesquisada (Tabela 5). Entretanto, a história é bastante clara e simples. Até o início dos anos 1990, a população negra vinha aumentando de modo relativamente lento e vegetativo via uma taxa de fecundidade um pouco mais alta para pretos e pardos, e o fato de que filhos de casais mistos têm maior probabilidade de ter filhos pardos. Em algum momento, entre 1996 e 2001, há o início de um processo de mudança em como as pessoas se vêem. Passam a ter menos vergonha de dizer que são negras; passam a não precisar se branquear para se legitimarem socialmente. Essa mudança é um processo surpreendentemente linear, surpreendentemente claro e, ao que tudo indica, ainda não terminou (SOARES, 2008a, p.120). Não obstante, a forma como o negro se visualiza para si e para sociedade não está ainda em equivalência com a renda da elite não negra, tendo em vista que 91 é fato conhecido no panorama das desigualdades brasileiras que há uma desigualdade racial considerável no país. Pretos e pardos, doravante denominados negros, têm menos que a metade da renda domiciliar per capita de brancos (SOARES, 2008b, p. 123). Tabela 6 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por naturalidade - Rio de Janeiro, 2010. Cidade / País Rio de Janeiro/ Brasil São Paulo/ Brasil Espírito Santo/ Brasil Pernambuco/ Brasil Bahia/ Brasil Pará/ Brasil Bad Elster/ Alemanha Total f 24 1 1 1 1 1 1 30 % 80,00 3,33 3,33 3,33 3,33 3,33 3,33 100,00 A maioria dos sujeitos entrevistados é natural da cidade do Rio de Janeiro (80%), onde o restante computa um entrevistado cada (3,33%), respectivamente, para as cidades de São Paulo, Espírito Santo, Pernambuco, Bahia, Pará, apresentando um entrevistado natural da cidade de Bad Elster, na Alemanha. A rede credenciada dos planos de saúde dos sujeitos do estudo permitiu a acessibilidade (geográfica e funcional) a várias unidades e megaunidades do laboratório de medicina diagnóstica para os usuários naturais e não naturais residentes ou não na cidade do Rio de Janeiro, facilitando a busca do serviço dos residentes das proximidades do local do exame e deslocamento dos usuários, conforme opção e preferência de cada um para os que moravam em outras localidades distantes. O Rio de Janeiro apresentou crescimento contingencial direta e indiretamente relacionado ao padrão de vida das faixas abastadas da população e por ser o espaço predileto de gasto público, através de circuito valorativo dado à riqueza e ao consumo das elites (LESSA, 2000). Quanto ao crescimento explosivo da região metropolitana entre o Rio de Janeiro e demais municípios da região ocorre a desigualdade socioespacial, tendo em vista que em 1940, 1.764 mil cariocas eram cerca de 80% dos moradores da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ). Em 1996, a região tinha 10.192 mil habitantes. A participação demográfica do Rio estava reduzida a 55% da RMRJ, ou seja, eram 5.551 mil cariocas. As diferenças de padrões de urbanização, de cobertura de serviços públicos, são mais acentuadas e descontínuas no interior da RMRJ do que em qualquer outra região metropolitana do país (LESSA, 2005, p. 294-295). 92 As grandes transformações na distribuição socioespacial da população do Rio de Janeiro ocorreram no final do século XIX, onde os ricos deslocaram-se dos altos para a orla marítima, retratando as frações de pobreza vinculadas à logística da cidade, haja vista a permanência desse grupo pauperizado nos prédios degradados do Centro do Rio, com notável decadência acelerada dos bairros periféricos (LESSA, 2005). A rede de relações sociais da cidade do Rio de Janeiro obteve nova dimensão na medida em que, foram multiplicados os estabelecimentos industriais perto dos transportes ferroviários, em que se desenvolveram nessa proximidade bairros organizados e algumas favelas, pela periferia industrial (LESSA, 2005). Copacabana é um bairro nobre da orla marítima da cidade do Rio de Janeiro, com vasta rede de transportes e integrações por transportes aquaviários (barcas) e ferroviários (trens e metrôs) , assim como outros veículos como ônibus, vans, carros de passeio, dentre outros. Todas essas vias de transporte somadas a várias localidades desse laboratório do campo de estudo favoreceram os deslocamentos dos residentes de bairros cariocas afastados de Copacabana na busca pelos exames de alta complexidade. Todos os sujeitos não cariocas moravam nos bairros da cidade do Rio de Janeiro e Baixada Fluminense (Tabela 10). Tabela 7 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por faixa etária em anos - Rio de Janeiro, 2010. Faixa etária f % 20-29 30-39 40-49 50-59 60-69 ≥ a 70 Total 4 7 7 4 5 3 30 13,33 23,33 23,33 13,33 16,67 10,00 100,00 A maior parte dos entrevistados compreendeu as faixas etárias de 30-39 (23,33%) e 40-49 (23,33%) anos, cuja representatividade da amostra é a mais economicamente ativa com maior vínculo empregatício. O menor número de entrevistados compreendeu a faixa etária maior ou igual a 70 anos, embora na faixa etária de 60-69 anos tenha tido resultado expressivo com 16,67% de entrevistados (Tabela 7). 93 Estes percentuais são expressivamente maiores do que o percentual de habitantes entre 30-39 anos (14,90%) e 40-49 anos (14,30%) do Rio de Janeiro, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2009 (IBGE, 2009), demonstrando que a população economicamente ativa é que detém maior poder aquisitivo para a aquisição e manutenção de planos privados de saúde, haja vista relação da classe média filiada a planos empresariais ou a empregos mantenedores de renda suficiente para contratação direta de planos de saúde. A amostra maior de adultos jovens que realizaram os exames de alta complexidade nesse estudo reforça a ideia que existe a valorização da carteira de composição saudável de beneficiários de planos de saúde e sua relação com vínculos ativos empregadores, tendo em vista que os contratos empresariais prevaleceram, seguindo a tendência da amostra ( Tabela 21) e Gráfico 1. Paradoxalmente, a amostra menor de idosos que também tem direitos ampliados após a regulamentação dos planos de saúde assume característica peculiar na contratação empresarial, considerando que “os aposentados e desempregados ganharam direito a tratamento diferenciado, podendo manter seu vínculo com os planos de saúde empresariais, assumindo o pagamento da parcela patronal” (MONTONE, 2009, p. 37). Contudo, a receita menor de um aposentado presumidamente não corresponde na prática à manutenção de custos elevados com planos de saúde, mesmo com os avanços regulatórios de que “também foram reforçadas as restrições aos reajustes de mensalidades e aos reajustes por faixa etária, proibidos para os usuários com mais de 60 anos e mais de 10 anos de planos” (MONTONE, 2009, p. 37). Além disso, os atendimentos vinculados, sobretudo, aos adoecimentos crônicos e relacionados ao envelhecimento devido à fase avançada de tratamento geram mais impactos degenerativos de alto custo ao sistema de saúde. Tabela 8 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por situação conjugal - Rio de Janeiro, 2010. Estado civil f % Casado (a) 13 43,33 Solteiro (a) 10 33,33 Divorciado (a) 4 13,33 Viúvo (a) 1 3,33 Vida em comum 2 6,67 Total 30 100,00 94 A predominância do estado civil dos entrevistados em ordem decrescente foi casada (43,33%), solteira (33,33%), divorciada (13,33%), vida em comum (6,67%) e viúva (3,33%). Tabela 9 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por quantidade de filhos - Rio de Janeiro, 2010. Número de filhos f % Nenhum 1 2 3 Total 13 11 4 2 30 43,33 36,67 13,33 6,67 100,00 Em relação à prole, a maioria não tinha filhos (43,33%), seguido de um filho apenas (36,67%), posteriormente 2 (13,33%) e 3 (6,67%) filhos, também em ordem decrescente. Em um dos perfis de análise de dados referentes à pesquisa “Perfil da juventude brasileira”, também parte do Projeto Juventude (2004), sobre comportamento sexual, prevenção da AIDS e ao comportamento reprodutivo entre jovens de 15 a 24 anos, a gravidez e a parentalidade foram identificadas como um fenômeno predominantemente feminino, porque nas faixas etárias inferiores a 15 anos é ainda maior a proporção de jovens mães em relação aos jovens pais. Assim, observou-se que na faixa etária de 15 a 17 anos, a razão entre mulher/homem foi de 8,2/1, na faixa de 18 a 20 anos foi de 4,4/1 e entre os 21 e os 24 anos foi de 1,99/1. Porém, foi identificado nesse estudo que em ambos os sexos a tendência à estabilização dos relacionamentos ocorre com o aumento da idade, de 50% entre os jovens de 15 a 17 anos para 69% entre os de 21 a 24 anos (CALAZANS, 2005). No contexto da pesquisa sobre o acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários, os sujeitos entrevistados tinham mais de 20 anos de idade e declararam situação conjugal estável, seja por casamento, namoro ou vida em comum (Tabela 8) com proles inexistentes e reduzidas até no máximo 3 filhos (Tabela 9). Denotam-se, portanto, famílias em grande parte com situação conjugal estável, reduzidas a poucos dependentes que traçam os perfis sociais dos entrevistados que usam planos de saúde para realizarem seus exames de imagens mais custosos. 95 Tabela 10 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por residência nas regiões do Município do Rio de Janeiro e Grande Rio - Rio de Janeiro, 2010. Áreas da cidade do Estado do Rio de Janeiro f % Zona Sul Zona Norte Centro Baixada Fluminense Zona Oeste Total 18 7 2 2 1 30 60,00 23,33 6,67 6,67 3,33 100,00 Quanto ao local de residência, 18 entrevistados (60%) moravam na zona sul do Rio de Janeiro, sendo 10 deles residentes em Copacabana, bairro onde se constituiu a coleta de dados. Os demais se distribuíram na zona norte (23,33%), Baixada Fluminense (6,67%), Centro (6,67%), e zona oeste do Rio de Janeiro (3,33). Esses relataram ter realizado os exames na zona sul pela proximidade ao trabalho e outros pela disponibilidade de só ter na unidade laboratorial de Copacabana a oferta de equipamentos abertos de ressonância magnética e tomografia computadorizada, afirmando terem receio de equipamentos fechados e claustrofóbicos. A necessidade de suprir o medo da tomografia computadorizada e ressonância magnética ambas de compartimento fechado nas outras unidades do laboratório de Medicina Diagnóstica mobilizou a procura dos sujeitos entrevistados residentes em regiões afastadas de Copacabana a procura por esse serviço opcional para o compartimento aberto nesse local, que permitisse a comunicação com os profissionais treinados que manipulavam o aparelho, além da segurança visível da presença do médico. Os acompanhantes também expressavam essa preferência da mesma forma que os usuários. Tabela 11 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por situação residencial - Rio de Janeiro, 2010. . Situação residencial f % Própria quitada Alugada Mora com parentes Brancos/ nulos Total 16 8 4 2 30 53,33 26,6 13,3 6,6 100,0 96 Grande parte mora em residência própria quitada (53,33%), seguida de alugada (26,6%) e moradia com parentes (13,3%). A situação residencial demonstra outro perfil social sobressalente de quem usufrui de planos de saúde tem residência fixa e própria, o que sugere que não havendo gastos com prestações de imóveis “sobra” renda para gasto extra com plano de saúde, considerando a contratação individual em que o sujeito se onera integralmente para adquirir seu plano. Os residentes de aluguel tinham, a maioria, planos empresariais, o que não lhes confeririam tamanha folga no orçamento, caso quisessem adquirir um plano de saúde de contratação direta sem o intermédio da empresa, na qual estivessem vinculados, a exceção daqueles que independente de residirem em casas alugadas tinham renda suficiente para terem seus planos de saúde e de forma independente do fornecimento pela empresa dos seus postos de trabalhos. Dos oito entrevistados residentes de aluguel seis tinham vínculo empresarial com grandes empresas como a Rede Globo de televisão, Colégio Curso PH, Dannemann Siemsen B & I Moreira empresa de advocacia, Philip Morris Brasil indústria de tabaco, Banco Bradesco e Prodasal sistema de informática da prefeitura da Bahia. Os demais que moravam de aluguel e tinham planos de saúde empresariais eram profissionais liberais e autônomos. Os entrevistados que moravam com parentes eram- mãe aposentada e do lar, estudante de advocacia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), assistente administrativo da empresa de advocacia Momsen Leonardos e advogada atuante na empresa Ernst Young de auditoria e consultoria de planejamento tributário, a qual era dependente do plano de titular parental, apresentando-se nesse grupo as diversas contratações de planos de saúde, sejam individual ou familiar, sejam empresarial ou coletiva por adesão. Tabela 12 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por nível de escolaridade - Rio de Janeiro, 2010. Nível de escolaridade f % 18 60,00 3º Grau completo 9 30,00 2º Grau completo ou 3º Grau Incompleto 3 10,00 1º Grau completo /incompleto ou 2º Grau incompleto Total de escolaridade por participante 30 100,00 Dos 30 entrevistados, 18 (60%) tinham nível superior ou 3o grau completo. Destes, 7 apresentavam pós-graduação Lato sensu ou Stricto sensu, o equivalente a 38,89% do total de 97 entrevistados que têm nível superior. Nove (30%) tinham 2º grau completo ou 3o grau incompleto e 3 (10%) tinham 1º grau completo ou incompleto ou 2º grau incompleto. Conforme o IBGE (2009), em relação aos dados da PNAD 2009, o número de pessoas da população fluminense que tem 3º grau completo (52,80%) apresenta uma representatividade aproximada comparada com a amostra no que se refere à obtenção do nível máximo de escolaridade, sendo o mesmo observado nos demais níveis. Assim, esta semelhança se destaca entre aqueles que tinham 2º grau completo ou 3 o grau incompleto (30%) da amostra, em relação a 33,5% da população fluminense. Da mesma forma, os sujeitos da amostra com 2º grau incompleto (10%), perfazem comparativamente um total de 7,7% da população fluminense. Portanto, infere-se que há maior acesso aos meios de assistência médica privada à população de menor grau de escolaridade, possivelmente através de planos empresas, quando empregadas formalmente com vínculo trabalhista. O nível da escolaridade é outro marcador social importante para os que usufruem de planos de saúde privados, porque a obtenção de um bem ou serviço privado está relacionada à ascensão social no mercado de trabalho pelos estudos e aprendizado qualificado em longo prazo. Dentro de uma perspectiva relevante sobre os estudos e seus reflexos aponta-se que a importância dos estudos sobre cultura política está nas evidências que eles podem proporcionar a respeito da disposição das pessoas a apoiarem o regime democrático, apesar das eventuais desilusões acerca deste ou daquele partido ou governante de turno-além de outras circunstâncias e condições que podem (ou não) afetar sua adesão à democracia. Infelizmente, muitas vezes há certo determinismo ou linearidade nesses estudos sobre a cultura política, pretendendo, por exemplo, que os processos de democratização sejam inexoráveis ou irreversíveis-como se lhes coubesse seguir a mesma trajetória de modernização (hoje diríamos “globalização”) trilhada pelos países centrais do Ocidente (KRISCHKE, 2005, p. 323). A situação socioeconômica e política brasileira refletem os efeitos antagônicos do capitalismo global que não acompanha a integração homogênea da sociedade na economia. A desigual distribuição de renda e a falta de investimentos políticos na educação pública brasileira em plena era da informática ainda permitem o retrato da marginalidade social pela exclusão digital de muitos jovens e até mesmo crianças que se incluem como constituintes complementares da renda familiar. Nessa pesquisa observa-se o quadro social oposto ao descrito acima, já que a escolaridade elevada é fator decisivo para aquisição de recursos na educação e na saúde. Observa-se que cada vez mais o plano de saúde deixa de ser privilégio dos ricos, tendo em vista que existem entrevistados com baixa escolaridade (Tabela 12, f.96) e baixa renda (Tabela 15, f. 101) que dispõem de planos de saúde privados. 98 Tabela 13 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por atividade laborativa ou inatividade - Rio de Janeiro, 2010. Aposentados Não Sim Total f 22 8 30 % 73,33 26,67 100,00 Vinte e dois entrevistados (73,33%) eram não aposentados e 8 eram aposentados (26,67%). Para equalizar o peso das despesas previdenciárias e assistenciais no valor de um salário mínimo, Giambiagi e Garcia (2007) concluem que aumentar mais o investimento público ou reduzir a carga tributária seria importante, a médio e longo prazos, a partir de revisão do dispositivo proposto de aumentar duas de cada três aposentadorias de acordo com o Produto Interno Bruto (PIB), considerando que este tende a determinar um viés aceleracionista na evolução da relação despesa do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) /PIB. As revisões das aposentadorias seriam de fato a solução para os que têm suas despesas aumentadas com os processos crônicos deletérios da saúde, decorrentes de invalidez por doença crônica ou acidente pessoal, envelhecimento natural, sedentarismo ou comportamentos de risco. A previdência privada pode ser a solução para quem tem maior poder aquisitivo ou ganha de presente esse financiamento vindouro de um ente querido. Contudo, um acompanhante de uma das entrevistadas sugeriu um projeto de Lei federal que repensasse a questão das mensalidades dos planos de saúde que poderia subsidiar os custos dos planos de saúde, a partir de determinada idade avançada, como ocorre na previdência privada e com a previdência social, em que o cidadão contribuiria enquanto tem saúde para produzir economicamente e após sua aposentadoria estaria coberto pelo que contribuiu ao longo de toda a sua juventude. Revela-se na passagem transcrita: “é um sonho meu com relação ao plano de saúde já que ele tem que existir - era que algum político, ou, os políticos desse país, criassem algum dispositivo, que após o pagamento, uma contribuição de 30 anos, seja no mesmo plano, que as pessoas tivessem migrado pra outra empresa,em que tenha contribuído por 30 anos, acho que teria que ser um direito adquirido, é como aposentadoria, a pessoa parava de pagar e teria direito a qualquer exame, qualquer atendimento de graça, né? Porque justamente na hora, que a pessoa fica velha, a pessoa envelhece, se aposenta, a renda cai, em função da idade, o valor da contribuição aumenta, a pessoa não consegue mais pagar, quer dizer na hora que a pessoa mais precisa, ela vai morrer na UPA, porque não tem dinheiro pra pagar, isso era um sonho meu que os políticos pensassem nisso, não só de congelar valor não, era gratuidade, porque as pessoas contribuíram muitas vezes, por exemplo, eu gasto por mês cerca de R$ 1.600,00, quer dizer, em dez meses eu pago R$ 16.000,00 de plano de saúde e eu não usufruo de quase nada, então 99 quer dizer, contribuo muito e usei pouco, depois de trinta anos pagando um valor desse, eu acho que eu merecia no plano, ou seja, eu parar de pagar e ter direito a qualquer atendimento, isso é um sonho meu, os políticos desse país poderiam fazer isso por nós”. (marido da E 24 professor de Química em curso pré-vestibular e professor da Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro). Nas aposentadorias de regime de previdência pública de caráter contributivo, asseguradas pela constituição brasileira, destinada aos servidores públicos titulares de cargo efetivos, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, respectivas autarquias e fundações podem ser com proventos integrais (art. 40, §3º), salvo as hipóteses contempladas no § 1º, incisos I, II e III, letra b, que caracterizarão as situações onde os proventos serão proporcionais (MELLO, 2003). Conforme Mello (2003), os proventos proporcionais são estabelecidos quando o servidor que venha a ser aposentado não cumprir cumulativamente 10 anos de serviço público, dos quais cinco no cargo efetivo em que ocorrerá a aposentadoria, ao menos 60 anos de idade, se homem e 55, se mulher e 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, se mulher. Fora dessas situações específicas, isto é, quando atendidos esses quatro requisitos, a aposentadoria será estabelecida com proventos integrais. Os casos em que não se cumpram os critérios cumulativos descritos anteriormente para a aposentadoria poderão ocorrer compulsoriamente se o servidor atingir setenta anos de idade ou vier a ser vitimado por invalidez permanente não oriunda de acidente em serviço, nem de moléstia grave ou incurável especificada em lei e voluntariamente, se tiver sessenta e cinco anos de idade, quando homem, ou sessenta quando mulher (MELLO, 2003). Analisando-se a passagem da entrevista transcrita anteriormente, a contribuição individual no estilo da previdência pública ou privada, em „substituição‟ ao tempo de pagamento das mensalidades dos planos de saúde sugerido pelo acompanhante da entrevistada nº 24 (servidor do Estado e da rede privada de ensino) presume-se que não resolveria as situações em que houvesse necessidade eletiva, urgente ou emergente de uso dos produtos contratados nos planos antes das reservas financeiras das empresas que operam planos privados de saúde serem suficientes para equilibrarem as despesas com tratamento da saúde e ainda de seus dependentes. As reservas financeiras possibilitam garantir a sustentabilidade econômica das operadoras previamente a cada uso da carteira de beneficiário, tal como ocorre com os períodos de cumprimento de carência ou cobertura parcial temporária para doenças e lesões pré-existentes. O pagamento das mensalidades dos planos de saúde corresponde ao pagamento do risco da sinistralidade envolvida para uso do serviço contratado e não é compreensível na ótica empírica da pesquisa uma comparação similar a uma contribuição 100 previdenciária não vinculada à cobertura de doenças ou agravos e não extensível aos demais dependentes, salvo exceções no caso dos segurados das pensões pós- morte do titular, por exemplo. Quando nessa mesma passagem de entrevista se revela uma história de vida de alguém que paga e não usufrui do serviço do plano de saúde incorre a tendência supostamente generalizada dos beneficiários de planos que usam frequentemente o serviço contratado sem necessidade para fazer jus à mensalidade, em função do ônus de algum pagante específico. Nessa concepção de usar o plano porque se paga ou porque a empresa paga promove o risco moral, que também pode estar relacionado à maioria dos sujeitos da amostra que não lia as guias de confirmação de atendimento no laboratório do estudo. Tamanha pressuposição pode ser refletida se esses mesmos sujeitos assinariam promissórias de natureza diversificada em letras pequenas ou em branco sem lerem antes. Provavelmente, o descuido não seria o mesmo. O risco moral (moral hazard) ocorre por parte de clientes que consomem mais serviços de saúde devido às coberturas contratadas dos planos privados de saúde (BAHIA, 2001). A seleção adversa é outra falha do mercado que motiva a obtenção de planos privados de saúde pelos clientes que tendem a adquirir seus planos ou seguros, em função de já apresentarem alguma manifestação da doença. Por parte das operadoras há maior propensão para seleção de riscos ao adotarem mecanismos de escolhas para os „bons riscos‟ (BAHIA, 2001). Tabela 14 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por cargo ocupacional - Rio de Janeiro, 2010. Cargos Ocupacionais Administrativos Operacionais (auxiliar administrativo, atendente de serviços médicos, almoxarife) Administrativos de Nível Superior (analista de sistemas ou de planejamento, ressecuritário, administrador, gestor de RH) Comerciais (vendedor, bancário, taxista) Técnicos de Nível Superior (advogado, jornalista, coordenador de marketing, professor, psicóloga, engenheiro) Outros (do lar, estudante, babá) f % 5 16,13 7 22,58 6 19,35 9 29,03 4 12,90 * Total 31 100,00 Nota: Um dos entrevistados apresentava duas graduações, com dois cargos ocupados em empresa pública e particular. * 101 Dentre as profissões dos entrevistados variaram entre empresária, professora, atendente de serviços médicos, jornalista, assistente operacional, analista de sistemas, psicóloga, auxiliar administrativo, engenheiro, estudante, advogado, vendedor, administrador, coordenador de marketing, babá, gestor de recursos humanos, bancário, do lar, taxista, almoxarife, ressecuritário e analista de planejamento. O maior grupo de entrevistados foi o de técnicos de nível superior (29,03%), seguido dos administrativos de nível superior (22,58%), comerciais (19,35%), administrativos operacionais (16,13%) e outros com 12,90% (Tabela 14, f.100). De acordo com Medeiros (2003, p.21), “é provável que para um estudo dos ricos seja mais apropriado, na dimensão ocupacional, tratar de elites (intra) ocupacionais [...]”. Embora nesse estudo algumas ocupações laborativas não vislumbrem grandes remunerações no mercado de trabalho, alguns dos entrevistados eram herdeiros de posses (rendas), dependentes de pensionistas de parentes que tinham remuneração na maior escala hierárquica militar, funcionários de empresas de destaque, como a Petrobrás e rede Globo de televisão, e funcionários públicos de órgãos com remuneração acima da média da Administração Pública Federal. Tabela 15 - Distribuição dos sujeitos entrevistados de acordo com a faixa de renda familiar mensal total por número de salários mínimos - Rio de Janeiro, 2010. f Faixa de renda familiar % ≤3 2 6,67 3 5 4 13,33 5 10 10 33,33 10 15 5 16,67 15 20 6 20,00 > 20 3 10,00 Total 30 100,00 Em relação à quantidade de salários mínimos mensais totais por cada família dos 30 entrevistados, a maioria dos entrevistados declarou renda maior que 5 até 10 salários mínimos (33,33%). 20% apresentavam renda maior que 15 até 20 salários mínimos, enquanto 16,67% apresentavam renda maior que 10 até 15 salários mínimos. 13,33% apresentavam ganhos mensais maiores que 3 até 5 salários mínimos. 10% apresentavam ganhos maiores que 20 salários mínimos. Já 6,67% apresentavam rendimentos menores ou iguais a 3 salários mínimos. 102 O rendimento médio mensal familiar, de acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009, do IBGE (2009), corresponde a 6,56 salários mínimos, demonstrando que, mais da metade da população entrevistada apresentava rendimento familiar igual ou maior que a média de rendimento familiar fluminense. Isto demonstra ainda o predomínio da população da amostra de maior poder aquisitivo para obtenção dos planos de saúde privados. Para Albuquerque et al. (2008, p.1425), “a cobertura por planos de saúde, seja público ou privado, está associada à renda da população”. A partir das concepções de Bahia et al. (2006 apud ALBUQUERQUE et al., 2008), a relação entre renda e cobertura da população com plano está associada ao status ocupacional e ao número de anos de estudo. Bahia (2001, p.334) evidencia que “a estratificação das demandas em torno dos planos de saúde molda sub-redes limitadas ao atendimento de clientes de um determinado status sócio-ocupacional”. É perceptível que os níveis de escolaridade têm relação direta na escala hierárquica dos melhores salários compatíveis com os melhores cargos ocupacionais preenchidos pela população, estendendo-se para amostra desse estudo. Existe uma seleção social estabelecida entre os preços dos serviços e a capacidade de compra do cliente ou empresa, verificando-se que o consumidor fica na dependência da autoridade dos empresários da saúde para determinar quanto e aquilo que deve ser consumido (ASSIS; VILLA; NASCIMENTO, 2003). Nessa pesquisa estão presentes as diferenças sociais nas estratificações de renda familiar na aquisição de plano de saúde que embora tivessem um alto padrão de serviços contratados obtiveram apontamentos satisfatórios e contraditórios em alguns discursos. Observa-se que o próprio mercado de planos de saúde possibilita diversificar seus produtos e segmentos nas diversas modalidades assistenciais para popularizar formas de acesso aos planos, ainda que a rede credenciada seja insuficiente, deixando a desejar quanto ao atendimento das necessidades de saúde dos contratantes que não são capitalizados para adquirir um plano melhor. Nessa assertiva, Freire (2002, p.94) diz que “[...] estas elites, assustadas, na proporção em que se encontram na vigência de seu poder, tendem a fazer silenciar as massas populares, domesticando-as com a força ou soluções paternalistas”. Dando ênfase nessa temática pode-se observar que a renda nacional relaciona-se sempre com os valores políticos e o estilo de vida da classe dominante. Tanto mais pobre seja uma nação, e mais baixos os padrões de vida das classes inferiores, maior será a pressão dos estratos superiores sobre elas, então consideradas desprezíveis, inatamente inferiores, na forma de uma casta de nenhum valor. As diferenças acentuadas no estilo de vida entre aquelas de cima e as de baixo apresentam-se como 103 psicologicamente necessárias. Consequentemente, os mais altos estratos tendem a encarar os direitos políticos dos mais baixos, particularmente o de interferir no poder, como coisa absurda e imoral (FREIRE, 2002, p. 94). As classes são posições ao longo de uma distribuição contínua e, portanto, o que posiciona os indivíduos nas classes não é apenas apresentar ou não uma determinada característica (por exemplo, ser ou não proprietário de meios de produção), mas também a quantidade possuída dessa característica (MEDEIROS, 2003, p. 23). Tabela 16 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por número de residentes em cada família - Rio de Janeiro, 2010. Número de pessoas residentes em cada família, incluindo os entrevistados f % 3 2 4 1 Total 11 9 6 4 30 36,67 30,00 20,00 13,33 100,00 Em relação ao número de pessoas residentes em cada família, incluindo os entrevistados, 4 entrevistados residiam sozinhos (13,33%), enquanto 6 (20%) com mais 3 pessoas, 9 (30%) com mais 1 pessoa e 11 (36,67%) habitavam com mais 2 pessoas. A renda familiar total foi aparentemente compatível com o número de residentes em cada família, pois grande parte relatou que os membros familiares também trabalhavam, embora muitos fossem também estudantes dependentes e parentes que não trabalhavam. 4.2 Caracterização dos planos de saúde privados contratados e dos exames de alta complexidade dos sujeitos Estão elencados abaixo os resultados relativos aos dados coletados nos formulários dos usuários de planos privados de assistência à saúde quanto às características dos planos de saúde contratados e dos exames de alta complexidade buscados. 104 Tabela 17 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de exame de imagem de alta complexidade - Rio de Janeiro, 2010. Tipo de exame de imagem de alta complexidade f % Ressonância magnética Tomografia computadorizada Densitometria óssea Total 16 12 3 31 51,61 38,71 9,68 100,00 Dos 30 entrevistados, foram realizados um total de 31 exames, sendo que 1 realizou, simultaneamente, ressonância nuclear magnética e tomografia computadorizada. 51,61% realizaram ressonância magnética, enquanto 38,71% realizaram tomografia. Apenas 9,68% dos entrevistados fizeram densitometria óssea. Os aparelhos de alta complexidade do campo de estudo eram novos e apresentavam as modalidades abertas e fechadas como opção entre os usuários de planos de saúde entrevistados. Para ilustrá-los: Figura 5 - Aparelho aberto de tomografia computadorizada do cenário de estudo. Fonte: A autora, 2010. 105 Figura 6 - Aparelho aberto de ressonância magnética do cenário de estudo. Fonte: A autora, 2010. Figura 7 - Aparelho fechado de ressonância magnética do cenário de estudo. Fonte: A autora, 2010. De acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia (2006), a técnica da ressonância magnética é datada de 1938 e utiliza ondas de radiofrequência para adquirir informações a 106 partir dos íons de hidrogênio, não utilizando radiação ionizante. Uma vez dentro do aparelho de ressonância, os núcleos dos átomos de hidrogênio se alinham em relação ao campo magnético gerado e são estimulados temporariamente por ondas de radiofrequência, modificando seu vetor de magnetização e refletindo a energia recebida. Esta é captada por antenas de radiofrequência e transformada em sinais que compõem a imagem (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2006). Os estudos de ressonância magnética são realizados em apneias expiratórias, em geral facilmente tolerados pelos pacientes, sendo cada vez mais curtas devido à melhora da tecnologia (podendo ser tão curtas como cinco segundos). Claustrofobia pode ser um problema para uma pequena parcela dos pacientes (menor que 2.0% em estudos clínicos), mas usualmente é contornado com orientações pré-procedimento ou medidas simples como a utilização de ansiolíticos (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2006). A Tomografia Computadorizada (TC) utiliza emissões de feixes de raio-X que cruzam o corpo do indivíduo. Os raios-X são captados por múltiplas colunas de detectores no lado oposto da abertura do gerador. Isto gera dados que são reconstruídos em imagens axiais do coração do paciente. As imagens digitais apresentam variações de atenuações, conforme a densidade dos tecidos, sendo medidas em unidades denominadas Hounsfield (HU). Atualmente, os aparelhos de TC estão sendo substituídos pelos aparelhos de múltiplas colunas de detectores, que apresentam como característica principal o maior número de detectores (4 a 64) na captação do feixe de raio-X. Estes equipamentos podem gerar imagens de alta resolução espacial e também de alta resolução temporal, devido à alta velocidade de rotação. Como a TC é baseada na emissão de raios-X, a preocupação com a exposição do paciente à radiação ionizante deve ser lembrada, sendo contraindicada a sua realização em mulheres grávidas (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA, 2006). Tanto a Ressonância Nuclear Magnética (RNM) quanto a TC podem ser divididas, de acordo com a sua estrutura física, em abertas ou fechadas. A primeira possui a vantagem de ser mais cômoda para o paciente, com diminuição da sensação claustrofóbica, apresentando, porém um custo muito superior e possuindo campo magnético de menor intensidade, com menor resolução da imagem. No aparelho de densitometria óssea por se tratar de exame radiológico havia sinalização para advertir mulheres quanto à necessidade de informação de gravidez ou suspeita de gravidez para o médico e técnico antes do exame de imagem. As vestimentas plumbíferas para proteção eram necessárias durante o exame para o usuário, e salvo quando 107 estritamente necessário e autorizado, tais vestimentas se faziam necessárias também para os acompanhantes que estavam na sala desse exame. Figura 8 - Aparelho de densitometria óssea do cenário de estudo. Fonte: A autora, 2010. A racionalidade para o uso da densitometria óssea ou outro instrumento diagnóstico em uma estratégia de intervenção para o problema da osteoporose é a de que a identificação de um subgrupo de mulheres com baixa densidade óssea, e com risco aumentado de fraturas, serviria de base a uma terapia efetiva (prevenção secundária), resultando em menos fraturas no futuro. Blake e Fogelman (2010) referem que a densitometria óssea pode fornecer valores precisos e reprodutíveis para o conteúdo mineral ósseo (CMO) e densidade mineral óssea (DMO) na coluna lombar, fêmur proximal, rádio distal e em todas as estruturas ósseas corporais. A densitometria óssea tem muitas vantagens. A exposição à radiação é mínima, e tempo de varredura é curta (5 a 20 minutos) e a variabilidade das leituras repetidas é menos de 2% para a coluna lombar e menos de 3% para o fêmur proximal. Entre as principais desvantagens da densitometria óssea se destacam o custo relativamente caro do teste e as medidas ântero-posteriores da coluna lombar em pacientes mais velhos estão sujeitos a erros causados por calcificação aórtica e alterações osteoartríticas. A densitometria óssea é usada para diagnosticar a osteoporose ou baixa densidade mineral óssea, a estimativa do risco futuro 108 de fratura, e para monitorar as mudanças da DMO ao longo do tempo. A densitometria óssea não deve ser feito em mulheres grávidas ou que possam estar grávidas, porque a radiação ionizante, ainda que em doses muito pequenas, pode ser deletéria para o concepto (BLAKE; FOGELMAN, 2010). Tabela 18 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de indicação médica clínica principal do exame de alta complexidade - Rio de Janeiro, 2010. Indicação médica clínica principal do exame de alta complexidade f % Dor em parte do corpo Doenças osteomusculares (Osteopenia, Acidente, Hérnia discal, Dormência de membro superior, confirmação diagnóstica de lesão) Distúrbios respiratórios (Pneumonia, Tosse, Obstrução nasal) Doenças degenerativas (Atrofia de membro inferior, Condromalácia patelar) Pós-Cirurgia e controle quimioterápico 7 23,33 6 20,00 5 16,67 3 10,00 3 2 2 2 30 10,00 6,67 6,67 6,67 100,00 Pré-Operatório Prevenção Outras patologias (Hipertensão arterial, Ovário micropolicístico) Total As indicações médicas clínicas dos exames dos entrevistados variaram entre osteopenia, prevenção, hérnia discal, hipertensão arterial, atrofia de membro inferior, dor em parte diversa do corpo, pneumonia, confirmação diagnóstica de lesão, obstrução nasal, doença degenerativa, tosse, pós-cirurgia e controle quimioterápico, pré-operatório, acidente, dormência de membro superior, ovário micropolicístico e condromalácia patelar. Nesta análise sobressaiu a indicação médica de dor em parte do corpo com 23,33%; seguidas de doenças osteomusculares, com 20%; distúrbios respiratórios com 16,67%; doenças degenerativas com 10%; pós-cirurgia e controle quimioterápico; pré-operatório; prevenção e outras patologias com 6,67% cada. Considerando que o objeto desse estudo foi o acesso aos exames de alta complexidade na perspectivas dos usuários, cabe ressaltar que não existem dados suficientes nessa pesquisa para deduzir risco moral de prestadores médicos de serviços que poderiam estar prescrevendo exames de alta complexidade para sintomas inespecíficos como dor, antes da consolidação do diagnóstico por anamneses e exames clínicos em um primeiro atendimento no consultório. 109 Tabela 19 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por caráter da solicitação médica - Rio de Janeiro, 2010. Caráter da solicitação médica Eletivo Urgência / Emergência Branco / Nulo Total f % 17 11 2 30 56,67 36,67 6,67 100,00 O caráter de solicitação médica predominante foi o eletivo, o que mesmo não sendo considerado de urgência e emergência médica pré-exame de alta complexidade, foi contemplado com rapidez na avaliação descritiva dos entrevistados (Tabela 18, f.108). A quantidade total de entrevistados por operadora de plano privado de assistência à saúde foi em ordem decrescente: 7 (23,33%) para a Bradesco Saúde, 6 (20%) para a Sul América Seguro Saúde, 4 (13,33%) para Caixa de Assistência dos funcionários do Banco do Brasil (CASSI), 3 (10%) para Golden Cross Assistência Internacional de Saúde, seguidos de um entrevistado cada para as outras operadoras (3,33%), como a Garantia de Saúde- Operadora Unieste de Planos de Saúde; Gama Saúde; Instituto Oswaldo Cruz de Seguridade Social (FIOPREV); Associação dos Fiscais de Rendas do Estado do Rio de Janeiro (AMAFRERJ); Caixa Assistencial Universitária do Rio de Janeiro (CAURJ); Mediservice Administradora de Planos de Saúde; Caixa de Assistência à Saúde (CABERJ); São Bernardo Saúde-Casa de Saúde São Bernardo, IRB-Brasil RE-IRB Brasil Resseguros e Medial Saúde Rio de Janeiro (Tabela 19). Observou-se que a maioria dos planos dos entrevistados pertencia a uma classe top de linha, o que caracteriza um plano de alto padrão, bem como os produtos comercializados pelas operadoras variaram conforme a quantidade e qualidade da rede credenciada. Portanto, infere-se que independente do caráter da solicitação do pedido de exame médico, seja ele eletivo ou urgência/emergência, prepondera para a garantia do acesso na saúde suplementar o tipo de produto do plano de saúde privado contratado pelo usuário. 110 Tabela 20 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por quantidade de usuário titular ou dependente de plano de saúde por operadora - Rio de Janeiro, 2010. Operadoras dos planos privados de assistência à saúde Bradesco Saúde Sul América Seguro Saúde Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI) Golden Cross Assistência Internacional de Saúde Garantia de Saúde - Operadora Unieste de Planos de Saúde Gama Saúde Instituto Oswaldo Cruz de Seguridade Social (FIOPREV) Associação dos Fiscais de Rendas do Estado do Rio de Janeiro (AMAFRERJ) Caixa Assistencial Universitária do Rio de Janeiro (CAURJ) Mediservice Administradora de Planos de Saúde Caixa de Assistência à Saúde (CABERJ) São Bernardo Saúde-Casa de Saúde São Bernardo Brasil RE-IRB Brasil Resseguros (IRB) Medial Saúde Rio de Janeiro Total Classificação quanto à quantidade de usuário de plano de saúde por operadora Geral por Operadora do Titulares Dependentes Plano Privado de Assistência a Saúde f % f % f % 6 20 1 3,33 7 23,33 5 16,67 1 3,33 6 20,00 3 10 1 3,33 4 13,33 2 6,67 1 3,33 3 10,00 1 3,33 0 0 1 3,33 1 3,33 0 0 1 3,33 0 0 1 3,33 1 3,33 1 3,33 0 0 1 3,33 1 3,33 0 0 1 3,33 1 3,33 0 0 1 3,33 1 3,33 0 0 1 3,33 1 3,33 0 0 1 3,33 1 3,33 0 0 1 3,33 1 25 3,33 83,33 0 5 0 16,67 1 30 3,33 100,00 De acordo com os dados coletados, embora o laboratório analisado contemplasse mais de 60 planos de saúde credenciados, apenas 14 operadoras distintas dos 30 sujeitos entrevistados apareceram no estudo. Dentre as 14, as seguradoras Bradesco Saúde e Sul América Seguro Saúde foram as que mais apareceram para sujeitos titulares na sua predominância, sendo 20% para a operadora Bradesco e 16,67% para Sul América. A autogestão CASSI apresentou 10% de frequência, enquanto a Golden Cross Assistência Internacional de Saúde foi a 4ª operadora que apresentou mais entrevistados nessa pesquisa. As demais operadoras tiveram uma representatividade equivalente a um. 111 Tabela 21 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de contratação - Rio de Janeiro, 2010. Tipo de contratação dos planos privados de assistência à Saúde Coletivo Empresarial Individual/ Familiar Coletivo por Adesão Total f % 17 7 6 30 56,67 23,33 20,00 100,00 Tabela 22 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por contratação individual ou familiar de acordo com atividade laborativa ou inatividade - Rio de Janeiro, 2010. Entrevistados com plano de saúde individual ou familiar f % Aposentados 4 57,14 Não Aposentados 3 42,86 Total 7 100,00 Dos 30 entrevistados 17 apresentaram contratação coletivo empresarial (56,67%), 7 individual ou familiar (23,33%) e 6 (20%) têm contratação coletiva por adesão. A maioria tem contratação empresarial que está associada ao vinculo empregatício e não aposentado, o que caracteriza que os planos de saúde empresariais representam uma importante parcela de contratação dos planos privados de assistência à saúde, o que é ilustrado na correspondência com os dados do Sistema de Informação dos Beneficiários (SIB) da ANS, com referência ao período de dezembro de 2009 (Gráfico 1, f. 62). Pessoto et al. (2007) referem que os planos de saúde são obtidos predominantemente pelas empresas empregadoras, cujos beneficiários são trabalhadores formais na faixa etária de 18 a 50 anos, com forte proeminência para a faixa de 31 a 50 anos (54,5%). Na amostra deste estudo, percebeu-se, também, que dos 23,33% dos entrevistados que tinham plano individual, 57,14% eram aposentados e os outros 42,86% correspondiam às pessoas que a empresa, na qual trabalhavam, não oferecia plano de saúde como benefício (Tabelas 21 e 22). A cobertura contratada no plano privado de saúde foi a global, algumas com odontologia e outras sem, mas vigorando a segmentação completa ambulatorial e internações hospitalares com obstetrícia. 112 Tabela 23 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por tipo de contratação por operadora de plano de saúde - Rio de Janeiro, 2010. Operadoras dos planos privados de assistência à saúde Quantidade de Usuário de Plano Saúde por tipo de contratação por operadora Individual/ Empresarial Adesão Familiar f % f % f % Bradesco Saúde 5 16,67 2 6,67 0 0,00 Sul América Seguro Saúde 4 13,33 1 3,33 1 3,33 Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI) 2 6,67 0 0,00 2 6,67 1 3,33 2 6,67 0 0,00 0 0,00 1 3,33 0 0,00 1 3,33 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 1 3,33 Associação dos Fiscais de Rendas do Estado do Rio de Janeiro (AMAFRERJ) 0 0,00 0 0,00 1 3,33 Caixa Assistencial Universitária do Rio de Janeiro (CAURJ) 0 0,00 0 0,00 1 3,33 Mediservice Administradora de Planos de Saúde 1 3,33 0 0,00 0 0,00 Caixa de Assistência à Saúde (CABERJ) 1 3,33 0 0,00 0 0,00 0 0,00 1 3,33 0 0,00 1 1 17 3,33 3,33 56,67 0 0 7 0,00 0,00 23,33 0 0 6 0,00 0,00 20,00 Golden Cross Assistência Internacional de Saúde Garantia de Saúde-Operadora Unieste de Planos de Saúde Gama Saúde Instituto Oswaldo Cruz de Seguridade Social (FIOPREV) São Bernardo Saúde-Casa de Saúde São Bernardo Brasil RE-IRB Brasil Resseguros (IRB) Medial Saúde Rio De Janeiro Total Total percentual geral 100,00% As operadoras Bradesco Saúde (16,67%) e Sul América Seguro Saúde (13,33%) concentram na contratação empresarial a maior quantidade de entrevistados que realizaram os exames de alta complexidade. A CASSI tem uma representatividade empresarial igual à contratação coletiva por adesão (6,67%), o que também corrobora que para essa operadora todos os usuários que realizaram exames de alta complexidade tinham vínculo empregatício com a empresa ou era dependente do usuário que tinha o vínculo. Em contraposição, a Golden Cross Assistência Internacional de Saúde na contratação individual ou familiar apresentou uma frequência de usuários de exames de alta complexidade de (6,67%), contra (3,33%) para a contratação empresarial. Garantia de Saúde - Operadora Unieste de Planos de Saúde e São 113 Bernardo Saúde-Casa de Saúde São Bernardo tiveram representatividade absoluta na contratação individual ou familiar (3,33%). FIOPREV, AMAFRERJ e CAURJ tiveram representatividade absoluta na contratação coletiva por adesão (3,33%). A Gama Saúde, Mediservice Administradora de Planos de Saúde, CABERJ, IRB-Brasil Resseguros e a Medial Saúde Rio de Janeiro contemplaram todos os seus usuários na contratação empresarial (3,33%). Tabela 24 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por plano de saúde com coparticipação - Rio de Janeiro, 2010. Planos Privados de Saúde com coparticipação Não Sim Branco/ Nulo Total f % 18 7 5 30 60,00 23,33 16,67 100,00 Alguns planos de saúde dos entrevistados tinham coparticipação, ou seja, acréscimos nas mensalidades nos planos de saúde cada vez que usufruíam de algum serviço na sua condição ambulatorial. Dezoito entrevistados relataram não ter coparticipação (60%), em detrimento de 7 que apresentavam (23,33%). A coparticipação é uma medida utilizada pelas operadoras para controlar gastos de saúde e funciona como um fator moderador de uso dos serviços pelo beneficiário, por que [...] as operadoras e prestadores têm desenvolvido mecanismos microrregulatórios para sobreviver ao mercado e à regulação da ANS. Alguns desses mecanismos são conhecidos, como a instituição de protocolos, de mecanismos de referência e fluxos que dificultam a solicitação de alguns procedimentos, o co-pagamento, fatores moderadores, dentre outros. A existência desses mecanismos de microrregulação resulta na fragmentação do cuidado, que se torna centrado na lógica da demanda e da oferta do que foi contratado e não na lógica da produção da saúde, do cuidado (MALTA et al., 2004, p.436-437). Como efeito desse entendimento, os mecanismos microrregulatórios de racionamento dos gastos com saúde dos beneficiários pelas operadoras de planos privados de saúde comprometem a qualidade da assistência prestada com base na lógica excludente do mercado. A redução de custos é uma prática microrregulatória que está presente também em situações em que a operadora de planos privados de saúde investe na ampliação da rede própria, na redução de rede de serviços, nos mecanismos de direcionamento para redes de 114 menor custo e na adaptação ao mercado local, oferecendo planos de menor custo e de mais fácil comercialização (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). Tabela 25 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por plano de saúde com coparticipação por tipo de contratação - Rio de Janeiro, 2010. Planos com coparticipação por tipo de contratação Coletivo Empresarial Coletivo por Adesão Total Quantidade de entrevistados com plano com coparticipação por tipo de contratação 6 1 7 % 85,71 24,29 100,00 Dos 30 entrevistados, 7 declararam existir coparticipação. Dos que declararam ter plano com coparticipação, 6 (85,71%) deles pertenciam a planos empresariais, em detrimento de 1 pessoa, com plano de saúde por adesão (24,29%). 115 Tabela 26 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por tempo de vigência dos planos privados de saúde dos entrevistados por operadora - Rio de Janeiro, 2010. Operadoras dos planos privados de assistência à saúde Bradesco Saúde Sul América Seguro Saúde Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI) Golden Cross Assistência Internacional de Saúde Garantia de Saúde - Operadora Unieste de Planos de Saúde Gama Saúde Instituto Oswaldo Cruz de Seguridade Social (FIOPREV) AMAFRERJ - Associação dos Fiscais de Rendas do Estado do Rio de Janeiro Caixa Assistencial Universitária do Rio de Janeiro (CAURJ) Mediservice Administradora de Planos de Saúde Caixa de Assistência à Saúde (CABERJ) São Bernardo Saúde - Casa de Saúde São Bernardo Brasil RE-IRB Brasil Resseguros (IRB) Medial Saúde Rio de Janeiro Total Total percentual geral Tempo de vigência dos planos privados de saúde dos entrevistados por operadora Posterior à Lei 9.656/1998 f % 4 13,33 6 20,00 Anterior à Lei 9.656/1998 f % 3 10,00 0 0,00 Branco / Nulo f 0 0 % 0,00 0,00 1 3,33 3 10,00 0 0,00 2 6,67 1 3,33 0 0,00 0 0,00 1 3,33 0 0,00 0 0,00 0 0,00 1 3,33 0 0,00 0 0,00 1 3,33 0 0,00 0 0,00 1 3,33 1 3,33 0 0,00 0 0,00 1 3,33 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 1 3,33 1 3,33 0 0,00 0 0,00 0 1 17 0,00 3,33 56,67 1 0 9 3,33 0,00 30,00 0 0 4 0,00 0,00 13,33 100,00% A maioria dos entrevistados apresentou planos novos, posteriores à Lei nº 9.656/1998 (56,67%), enquanto (30%) apresentaram planos tradicionais anteriores a esta Lei. Antes da regulamentação pela lei 9.656/1998 existiam vários mecanismos de controle de custos com as despesas da saúde de seus beneficiários, permitindo manter o número de expostos sob controle, reduzindo as possibilidades de acesso à utilização dos serviços, negando cobertura ou excluindo o usuário (MONTONE, 2009). Percebeu-se que a frequência maior dos usuários de planos antigos envolveu as operadoras Bradesco Saúde e CASSI. No grupo de usuários de planos antigos não foi relatada barreira para os exames de alta complexidade desse estudo. Contudo, em relação à abusividade nos contratos antigos, destaca-se que 116 a decisão do STF reforçando a plena vigência dos contratos antigos e as dificuldades do processo de sua adequação à regulamentação colocam na agenda da ANS a necessidade de uma articulação com o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e ajustes no poder regulatório da agência, de maneira a permitir que ela desenvolva e implante uma sistemática ágil e eficaz de declarar a abusividade de cláusulas dos contratos antigos (MONTONE, 2009, p.119). Segundo Santos, Malta e Merhy (2008), as operadoras de planos privados de saúde impetraram Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) nº 1931-98 no Supremo Tribunal Federal para evitar a retroatividade dos efeitos regulatórios da Lei nº 9.656/1998, e com a decisão baseada no „ato jurídico perfeito‟, a regulação de planos antigos se concentrou às questões mais gerais da regulação, não especificadas em contratos anteriores à lei supra. A permanência de planos anteriores paralelos aos posteriores à Lei nº 9.656/98 caracteriza a maior fonte de conflitos no processo regulatório, visto que as regras contratuais são distintas, evidenciando-se uma atuação regulatória também distinta. Não se inclui na regulação dos planos antigos a fixação de reajustes de mensalidades, o rol obrigatório de procedimentos, dentre outras exceções que não são reguladas nos planos antigos, acirrando conflitos cotidianos entre operadoras, judiciário e órgão de defesa do consumidor (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). De acordo com Bahia (2001, p.336), “os conflitos só se manifestam quando se discute qual é o objeto e a intensidade da regulamentação”. Conforme Bahia (2001), o Ministério da Saúde desistiu da exigência da adaptação dos contratos antigos às inclusões das coberturas previstas pela legislação (Medida Provisória 1908-17), devido a pressões por grandes seguradoras e entidades de defesa do consumidor. Pelo risco de elevação abrupta das mensalidades dos planos de saúde, devido à ampliação requerida para maior cobertura de procedimentos, exclusivamente para beneficiários de planos individuais do tipo executivo, legitimou-se na prática, o direito do consumidor de escolher manter-se a um plano mais barato, porém com maiores restrições de cobertura em serviços de saúde. Montone (2009) corrobora com Bahia (2001) quando reitera que a adaptação foi transformada em um direito do usuário para solicitação deste processo a qualquer tempo. Embora a ANS tenha fomentado programa de incentivo à adaptação dos contratos anteriores à Lei nº 9.656/1998 tal ação não teve o êxito esperado. A desvantagem para usuários de planos antigos é a cobertura assistencial reduzida com exclusão de procedimentos (MONTONE, 2009). Ao analisar esta questão ainda que aparentemente os custos dos planos antigos sejam menores que os dos planos novos não há compensação positiva para o beneficiário de plano 117 antigo pela maior restrição de cobertura assistencial, principalmente para doenças crônicasdegenerativas e de maior gravidade prognóstica. 118 Tabela 27 - Distribuição dos sujeitos entrevistados por modalidade de plano de saúde, de acordo com a faixa de beneficiários - Rio de Janeiro, 2010. Operadoras dos planos privados de assistência à saúde Bradesco Saúde Sul América Seguro Saúde Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI) Golden Cross Assistência Internacional de Saúde Garantia de Saúde Operadora Unieste de Planos de Saúde Gama Saúde Instituto Oswaldo Cruz de Seguridade Social (FIOPREV) Associação dos Fiscais de Rendas do Estado do Rio de Janeiro (AMAFRERJ) Caixa Assistencial Universitária do Rio de Janeiro (CAURJ) Mediservice Administradora de Planos de Saúde Caixa de Assistência à Saúde (CABERJ) São Bernardo Saúde - Casa de Saúde São Bernardo Brasil RE-IRB Brasil Resseguros (IRB) Medial Saúde Rio de Janeiro Total de entrevistados por operadora Faixa de beneficiários * (Lei 9656/98) 7 Faixa de beneficiários* (RDC 24) Porte* (RN 26) maior ou igual a 20.000 A partir de 200.001 Grande 6 maior ou igual a 20.000 A partir de 200.001 Grande Autogestão 4 maior ou igual a 20.000 A partir de 200.001 Grande Medicina de grupo 3 maior ou igual a 20.000 A partir de 200.001 Grande Medicina de grupo 1 menor que 20.000 De 10.001 a 100.000 Pequeno Medicina de grupo 1 maior ou igual a 20.000 De 10.001 a 100.000 Médio Autogestão 1 menor que 20.000 De 10.001 a 100.000 Pequeno Autogestão 1 menor que 20.000 De 1.001 a 10.000 Pequeno Autogestão 1 menor que 20.000 De 1.001 a 10.000 Pequeno Medicina de grupo 1 maior ou igual a 20.000 A partir de 200.001 Grande Medicina de grupo 1 maior ou igual a 20.000 De 10.001 a 100.000 Médio Medicina de grupo 1 maior ou igual a 20.000 De 100.001 a 200.000 Grande Autogestão 1 menor que 20.000 De 1.001 a 10.000 Pequeno Medicina de grupo 1 menor que 20.000 Sem beneficiários ativos Pequeno Modalidade* Seguradora especializada em saúde Seguradora especializada em saúde Fonte: AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010h. Legenda: Resolução Normativa (RN); Resolução de Diretoria Colegiada (RDC). 119 Tabela 28 - Distribuição da quantidade de modalidade de plano de saúde dos sujeitos entrevistados - Rio de Janeiro, 2010. Tipo de Modalidade da Operadora de Plano de Quantidade de % Saúde Modalidade Seguradora Especializada em Saúde 2 14,29 Autogestão 5 35,71 Medicina de Grupo 7 50,00 Total 14 100,00 Tabela 29 - Distribuição da quantidade de sujeitos entrevistados por modalidade de plano de saúde - Rio de Janeiro, 2010. Tipo de Modalidade da Operadora de Plano de Quantidade de % Saúde entrevistados Seguradora Especializada em Saúde 13 43,33 Autogestão 8 26,66 Medicina de Grupo 9 30,00 Total 30 100,00 Reitera-se que a maior concentração de sujeitos entrevistados eram beneficiários das seguradoras especializadas em saúde (43,33%), embora tivesse sido a modalidade de plano de saúde com menor percentual no estudo (14,29%). Em contrapartida, a modalidade de plano de saúde predominante no estudo foram as Medicinas de Grupo (50%), porém com 9 entrevistados ao todo (30%). Já as autogestões apresentaram 8 entrevistados (26.66%), com uma distribuição de modalidade representada por 35,71% (Tabelas 28 e 29). A Medial Saúde Rio de Janeiro está sem beneficiários ativos (Tabela 27), pois foi incorporada a outra operadora de plano privado de assistência à saúde, de acordo com o Sistema de Informações Gerenciais da Agência Nacional de Saúde Suplementar (2010h). Quanto à faixa de beneficiários, existem normativos na saúde suplementar que classificam as operadoras de planos privados de assistência à saúde em portes, a partir de número de beneficiários e outros critérios. A Resolução Normativa nº 26 da ANS, de 1 de abril de 2003 considera pequeno porte as operadoras com número de beneficiários inferior a 20.000; médio porte com número de beneficiários entre 20.000 e 100.000; e grande porte as operadoras com número de beneficiários superior a 100.000 (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2003). 120 De acordo com o porte das operadoras de planos de saúde, com base no número de beneficiários cadastrado na ANS é feito o cálculo do valor das multas após lavratura dos autos de infração dessas operadoras, o que paralelo a esse estudo, caso os sujeitos entrevistados não tivessem realizado os exames de alta complexidade no laboratório da pesquisa em prazo menor ou igual a 21(vinte e um) dias caberiam multas pecuniárias, conforme a quantidade de beneficiários ou sob análise de caso específico para verificar se a multa seria estendida com base na carteira integral de beneficiários da operadora. Cada prazo máximo de atendimento não praticado pelas operadoras ensejariam multas em função da demora da liberação das autorizações, pois as consequências da demora poderiam implicar em atos lesivos para o beneficiário (Tabela 1, f. 64). Assim, torna-se importante a não resiliência do beneficiário que quando procura um serviço contratado do seu plano de saúde às vezes aceita passivamente negativas de cobertura ou prazos de atendimento exageradamente longos. De acordo com a Resolução de Diretoria Colegiada nº 39 da ANS, de 27 de outubro de 2000, as operadoras podem ser classificadas em administradora; cooperativa médica; cooperativa odontológica; autogestão; medicina de grupo; odontologia de grupo ou filantropia. Para tais definições, assim, denominam-se na legislação da saúde suplementar: As administradoras são [...] as empresas que administram planos ou serviços de assistência à saúde, sendo que, no caso de administração de planos, são financiados por operadora, não assumem o risco decorrente da operação desses planos e não possuem rede própria, credenciada ou referenciada de serviços médico-hospitalares ou odontológicos; as cooperativas médicas são [...] as sociedades de pessoas sem fins lucrativos, constituídas conforme o disposto na Lei n.º 5.764, de 16 de dezembro de 1971, que operam Planos Privados de Assistência à Saúde; as cooperativas odontológicas são [...] as sociedades de pessoas sem fins lucrativos, constituídas conforme o disposto na Lei n.º 5.764, de 16 de dezembro de 1971, que operam exclusivamente Planos Odontológicos; as autogestões são as [...] que operam serviços de assistência à saúde ou empresas que, por intermédio de seu departamento de recursos humanos ou órgão assemelhado, responsabilizam-se pelo Plano Privado de Assistência à Saúde destinado, exclusivamente, a oferecer cobertura aos empregados ativos, aposentados, pensionistas ou ex-empregados, bem como a seus respectivos grupos familiares definidos, limitado ao terceiro grau de parentesco consanguíneo ou afim, de uma ou mais empresas, ou ainda a participantes e dependentes de associações de pessoas físicas ou jurídicas, fundações, sindicatos, entidades de classes profissionais ou assemelhados; as medicinas de grupo são [...] as empresas ou entidades que operam Planos Privados de Assistência à Saúde, excetuando-se aquelas classificadas nas modalidades contidas nas Seções I, II, IV e VII desta Resolução, as odontologias de grupo são as [...] empresas ou entidades que operam exclusivamente Planos Odontológicos, excetuando-se aquelas classificadas na modalidade contida na Seção III desta Resolução;as filantropias são as entidades sem fins lucrativos que operam Planos Privados de Assistência à Saúde e tenham obtido certificado de entidade filantrópica junto ao Conselho Nacional de Assistência SocialCNAS e declaração de utilidade pública federal junto ao Ministério da Justiça ou declaração de utilidade pública estadual ou municipal junto aos Órgãos dos Governos Estaduais e Municipais (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2000b, p.4). As seguradoras especializadas em saúde, de acordo com Albuquerque et al. (2008, p.1423), são “sociedades seguradoras autorizadas a operar planos de saúde”. Para Montone 121 (2009), nessas modalidades, além dos prestadores serem referenciados, pode ocorrer o reembolso de despesas ao segurado ou pagamento direto a esses prestadores. O maior número de entrevistados da amostra da pesquisa identificado como pertencente às seguradoras especializadas em saúde possivelmente foi devido ao maior porte de sua classificação na ANS, em relação ao número de beneficiários. Não foram identificadas na pesquisa as administradoras, cooperativas médicas e filantropias. O segmento odontológico das cooperativas odontológicas e odontologias de grupo por não estar relacionado ao objeto do estudo não foi identificado na pesquisa, embora a segmentação odontológica pudesse estar incluída em contrato de assistência global que assegurasse todas as segmentações das operadoras de planos privados de saúde, dependendo da composição contratual do plano de cada sujeito entrevistado. 4. 3 A percepção do acesso aos exames de alta complexidade A percepção é influenciada pela experiência prévia imediata ou longínqua, onde na maioria das vezes, é difícil explicar o seu modo de atuação e pouco se sabe sobre os mecanismos neurais que estariam relacionados neste processo. O ambiente possibilita desenvolver capacidades perceptivas específicas a partir da aprendizagem da identificação de certas características em determinados estímulos (SIMÕES; TIEDEMANN; RAPPAPORT, 1985). O bom atendimento durante a realização de exames de imagem de alto custo e complexidade nos planos privados de saúde parece funcionar como um estímulo importante na aprendizagem experimentada pelos sujeitos da pesquisa. Destacam-se para Simões, Tiedemann e Rappaport (1985, p.92), que “os conhecimentos de percepção têm inúmeras aplicações, algumas indiretas, como informações complementares, outras diretas”. Trazer à tona os conhecimentos percebidos pelos usuários de planos de saúde permite decodificar significados implícitos na subjetividade contextual de cada entrevistado para o objeto desse estudo. De acordo com Simões, Tiedemann e Rappaport (1985), fenômenos perceptivos ajudam a revelar o funcionamento cerebral, o que, em última análise, significa conhecer o ser humano e o seu comportamento. Foram analisadas as respostas dos 30 sujeitos entrevistados sobre a percepção do acesso aos exames de alta complexidade, adotando-se a técnica de análise de conteúdo- 122 temática categorial de Bardin (1977), sistematizada por Oliveira (2008), com adaptações próprias, de forma a explorar os conhecimentos descritivos na ótica dos usuários de planos de saúde. Para essa análise foram identificadas 1387 unidades de registro (UR), subdivididas em pré-categorias, as quais foram contidas em 5 categorias distribuídas da seguinte forma: o acesso aos exames de alta complexidade; os conhecimentos dos direitos contratados nos planos de saúde; motivações para realizar os exames de complexidade nos planos de saúde, ao invés do SUS; nível de satisfação acerca do plano de saúde; percepção de atendimento no SUS; 4.3.1 O acesso aos exames de alta complexidade A institucionalização de saberes e práticas possibilitam maior efetivação do direito à saúde, que se relaciona também com a postura do usuário voltada também para a política pública, para que se possa atuar na sua formulação, execução e fiscalização (ASENSI, 2010). Para Assis, Villa e Nascimento (2003, p.820), “os usuários delimitam o acesso à sua condição socioeconômica, pois consideram que a oferta dos serviços públicos fica na dependência de intervenção do Estado na organização da rede de atendimento”. A categoria “Acesso aos exames de alta complexidade”, representada por 44,20% do total percentual de unidades de registro das falas dos entrevistados, contém as seguintes précategorias: Percepção do acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde; Barreiras de acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde; Facilidade de acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde; Conhecimento sobre a rede credenciada ou própria do plano de saúde e sobre o número e qualidade de outros laboratórios; Percepção do tempo sobre a data do pedido médico do exame; Percepção sobre a data do agendamento do pedido médico do exame; Percepção do tempo sobre a data de autorização do exame de alta complexidade pelo plano de saúde; Percepção do tempo na sala de espera antes da realização do exame; Conhecimento sobre conteúdo das confirmações de atendimentos médicos das operadoras para os exames, conforme pode ser observado nos apêndices D e E. 123 A pré-categoria 1.1, denominada “Percepção do acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde” traduz a vivência experimentada pelo usuário de plano de saúde durante a etapa de realização do exame de imagem prescrito no cenário da pesquisa. Essa vivência descrita apresentou a dimensão de um acesso fácil, sem problemas e rápido. As falas nesta categoria foram afirmativas diretas como os exemplos abaixo: Fácil, acesso até pela Internet, acesso com facilidade. (E8) Não tive nenhum problema para marcar. (E29) Uma rapidez de 100%. (E22) Nesse sentido, observou-se que todos os usuários entrevistados consideram o acesso funcionante para os exames de alta complexidade, referindo-se, sobretudo ao agendamento e a realização dos exames. A pré-categoria 1.2, denominada “Barreiras de acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde” retrata as principais barreiras enfrentadas pelos usuários nos planos de saúde, porém não relacionadas às barreiras para os exames de complexidade desse estudo, tal como é evidenciado nas seguintes falas: Não, no meu plano não. (E2) Não tenho tido nenhuma barreira. (E7) Não encontrei barreira. (E14) As barreiras citadas em ocasiões diversas foram as relacionadas com a idade avançada, assim como se verifica na fala: Quando chega a certa idade, as pessoas têm muito preconceito. (E1) Uma segunda barreira descrita nas entrevistas foram as ligadas aos planos anteriores à Lei 9.656/1998 e às pessoas com deficiência, como: Alguns planos de saúde criam resistência com planos antigos. (E9) As barreiras maiores são do próprio local que não são locais apropriados para a pessoa com deficiência ou dificuldade de locomoção. (E10) Foram descritas barreiras de acesso relacionadas à liberação de material e autorização para procedimento cirúrgico: 124 Meu marido teve um acidente e botou 6 pinos e meia placa, foi meio complicado em relação à liberação desse material. (E5) Eu tive uma só cirurgia de miopia, tinha restrição de grau e a partir de tal grau, o plano não cobre. (E6) Ainda sobre as barreiras da categoria 1.0, uma parcela de usuários de planos de saúde relatou dificuldades com a rede credenciada e com a sua própria agenda de compromissos: A única barreira é por causa do laboratório que a gente tem que ficar só com ele. (E23) A maior dificuldade é encontrar um horário que se encaixe no meu dia a dia. (E25) Nessa pré-categoria 1.2 para o objeto de estudo em voga não houve barreira evidenciada para a efetiva realização do exame de alta complexidade, porque todos os usuários entrevistados tiveram suas necessidades atendidas prontamente. De qualquer forma, foi espontânea a listagem de entraves elencados em vários discursos que correspondiam a contextos distintos sobre uso de planos, a partir dos quais se elucidaram histórias de fatos vividos e compartilhados pelos próprios usuários, parentes, amigos e empregados, incluindo dificuldades para realização de programa home care, tratamentos fisioterápicos, reeducação postural global (RPG), exercícios de Pilates para proteção do sistema locomotor e para condicionamento postural, reembolsos parciais, demorados e negados de procedimentos. Entre os que mencionaram tais entraves, notam-se nas falas: Barreiras de acesso são só para atendimentos, exemplo, fazer Pilates e RPG. (E15) Home Care que nunca teve, eles negaram 7 meses. (E17) Na pré-categoria 1.3, designada “Facilidades de acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde” foram analisados dois temas por unidade de significação, divididos em atendimento burocrático e não burocrático do prestador de serviços e operadora. Daí observou-se que a maioria dos entrevistados considerou não burocrático o atendimento recebido pela rede privada de assistência, de tal modo como foram reportados: Para esse exame não tenho tido nenhum empecilho, nenhuma restrição. (E25) É fácil encontrar laboratórios que façam exames. (E29) Eu preciso fazer muitos exames e sempre são autorizados. (E30) 125 No aspecto burocrático desse atendimento apenas um entrevistado pronunciou-se afirmando que não encontrava facilidade: Facilidade nenhuma. (E27) Portanto, evidencia-se praticamente nenhuma burocracia que dificultasse a aquisição desses exames de imagem analisados no estudo. Na pré-categoria 1.4 “Conhecimento sobre a rede credenciada ou própria do plano e sobre número e qualidade de outros laboratórios” existem qualidades descritas pelos sujeitos entrevistados como positivas e características negativas vinculadas aos planos de saúde. Quanto às qualidades positivas da rede atreladas a quantidade de prestadores credenciados e equipamentos, a maior referência anunciada pelos entrevistados foi a variedade para escolha de prestadores com alto padrão de qualidade e quantidade de laboratórios renomados, ilustradas pelas seguintes falas: Procurei ver os laboratórios grandes. (E6) Tem um monte de locais que eu posso fazer todos esses exames do mesmo porte e da mesma qualidade. (E10) Tem uma boa quantidade e qualidade boa. (E13) Eles são muito bons. (E30) De acordo com a concepção dos entrevistados, a maioria descreveu como significado similar de quantidade e qualidade de serviços privados de saúde a ampla oferta de rede de prestadores de serviços e equipamentos de alta tecnologia disponíveis. O aspecto negativo não foi relevante na amostra analisada de entrevistados, uma vez que apenas um desses relatou ter uma rede credenciada insuficiente e com grandes dificuldades para liberação para o prestador desejado. Na pré-categoria 1.5 “Percepção do tempo sobre a data do pedido médico do exame” observou-se nos relatos dos entrevistados que a maioria dos pedidos médicos para os exames de alta complexidade estavam sem data. Ao serem questionados sobre os motivos que implicariam na não datação dos pedidos ou guias de requisição dos exames pelos médicos foram apontados o esquecimento do médico, deliberação do profissional médico para facilitar a agenda de compromissos do usuário, bem como sua autonomia e recomendação médica de prescrever tratamento prévio ao exame. Assim, essas falas são denotadas, respectivamente em: 126 Pode ser esquecimento do médico, acredito em esquecimento. (E6) O próprio médico para facilitar a vida do paciente já não coloca a data, é para dar flexibilidade. (E9) Dá um tempo para o antibiótico fazer efeito e não fazer o exame agora. (E14) Dependendo da urgência poderia ter data. (E18) Desse modo, considerando a questão do tempo subjetivo percebido pelo usuário parece ser frequente existir uma validade para os pedidos médicos, variando de quinze dias, um mês até três meses, dependendo da operadora do plano de saúde contratado, conforme relatos: Pedido tem uma validade, se não me engano de dois meses. (E14) Receio não fazer no prazo e perder a validade, às vezes é um mês, às vezes são três meses. (E16) Guia vale até trinta dias e guia de internação vale quinze dias. (E27) Alguns dos entrevistados não se atentaram em observar se a guia ou pedido médico estavam datados, outros, embora, não tivessem definido com precisão os motivos, pelos quais não existiria datação das requisições dos exames pelos médicos oscilaram sugestões entre o esquecimento e deliberação do médico por qualquer motivo, a exemplo das falas: Não lembro se tinha data, mas acho que os médicos deixam sem data justamente para não terem problemas com o tempo de marcação e realização do exame. (E12) Um fator importante encontrado nos relatos dos entrevistados nessa pré-categoria foi a existência de prazo de validade do pedido médico, conforme o tipo de operadora, a qual estaria diretamente relacionada à determinação da variação desse prazo máximo de atendimento dos usuários de planos de saúde na rede privada de serviços. Os pedidos sem data mascaram o tempo subjetivo real de atendimento descrito pelo usuário, já que quando não vem com a data, ao invés do médico, é o usuário ou atendente do laboratório que acaba datando o pedido ou a guia no dia do exame. A pré-categoria 1.6 “Percepção do tempo sobre a data do agendamento do pedido médico do exame” compreendeu os atributos de período de agendamento menor ou igual a sete dias e maior que sete dias, além de agendamentos rápido e tardio pelo usuário. Assim, observou-se que a maioria dos entrevistados agendou seus exames num tempo inferior a sete dias, configurando um agendamento rápido por parte do usuário: 127 Eu fiz a consulta médica ontem e ontem mesmo solicitei o exame. (E9) Dessa vez eu fui à consulta e agendei no mesmo dia. (E10) Levei três dias para marcar. (E14). Para àqueles que agendaram tardiamente seus exames de alta complexidade num período maior que sete dias foi observado que não tinham pressa, ou estavam tomando algum tipo de medicamento ou tinham pouco tempo de adesão no plano de saúde, aguardando o término do período de carência para usufruir o serviço do plano de saúde: Eu levei acho que uns 20 dias, a minha carência só poderia começar a fazer o exame no fim do mês passado. (E11) Tive que marcar o exame após o término do remédio, tava tomando o medicamento. (E13) Não tinha pressa, era uma questão de agendamento. (E15) Na pré-categoria 1.7 “A percepção do tempo sobre a data de autorização do exame de complexidade pelo plano de saúde” a maior parte dos entrevistados respondeu que em média a operadora leva até vinte e quatro horas para autorizá-los: Foi imediato”. (E4) Foi rápido, eu liguei no mesmo dia, ela confirmou para mim. (E6) A autorização é no ato. (E21) Para as autorizações realizadas em um prazo superior a vinte e quatro horas as falas representativas foram: Eu acho que uns três dias. (E14) Tem dois dias. (E29) Quanto à pré-categoria 1.8 “Percepção do tempo na sala de espera” constatou-se que na maior parte das entrevistas a espera no dia do exame passou dos quinze minutos: Esperei cerca de uma hora e meia. (E10) Esperei vinte minutos. (E27) Esperei trinta minutos. (E29) Em contrapartida, um considerável grupo de entrevistados relatou que a espera antes do exame foi mínima: 128 Já fui direto para o exame, não esperei praticamente nada. (E10) Uns dez minutos. (E16) Uns quinze minutos. (E22) Dessa forma, ainda que o tempo maior que 15 minutos tenha ocorrido não implicou na insatisfação dos usuários que aguardavam na sala de espera antes do exame de alta complexidade prescrito. Em estudo de Pessoto et al. (2007) sobre estudos de casos realizados em cinco municípios da Região Metropolitana de São Paulo (Guarulhos, São Paulo, Santo André, Osasco e Franco da Rocha), no que se referia ao tempo médio de espera e tipo de serviço procurado, demonstrou-se acesso diferenciado entre beneficiários e não beneficiários de planos de saúde que usavam o SUS. Neste estudo observou-se uma distinção evidente entre os não possuidores de planos que suportavam maior espera, cerca de 81 minutos, em detrimento aos possuidores de planos de saúde que esperavam 32 minutos, em média até o atendimento. Para a pré-categoria 1.9 “Conhecimento sobre o conteúdo das confirmações de atendimento médico das operadoras para o exame de complexidade” indicou que a maioria lembrou das quantidades de guias médicas de requisição de exames assinadas, porém grande parte não observou ou não leu o conteúdo dessas guias ou declarações de confirmação de atendimento pelo prestador de serviços credenciado da operadora de plano de saúde privado. Não se lembraram se existia pergunta da operadora, solicitando autorização do beneficiário para auditar prontuário clínico após submissão do exame: Foi uma só, eu não vi se tinha essa pergunta de auditar prontuário. (E10) Uma guia, não lembro se tinha essa pergunta de auditar. (E14) Uma guia, não, eu acho que não teve essa pergunta de auditar prontuário, não reparei. (E30) Percebeu-se que é comum o hábito de muitos entrevistados não lerem os documentos emitidos pelas operadoras, por não terem prestado atenção no conteúdo que assinaram, considerando que não sabiam informar o que estariam assinando, através do intermédio do atendente do laboratório da pesquisa: Se tinha essa pergunta de auditar prontuário, ninguém me mostrou, eu não vi. (E 12) Na grande maioria, as barreiras do acesso aos planos de saúde para exames de alta complexidade não foram representadas no grupo de sujeitos entrevistados. As autorizações 129 das operadoras de planos privados de assistência para os exames de alta complexidade não foram consideradas tardias, porque atenderam a essas necessidades para um prazo de tempo subjetivo relatado como imediato, rápido e fácil, não passando de uma semana entre a data de agendamento pelo usuário até a autorização pelo plano de saúde. Embora a pressuposição do largo intervalo de tempo entre a data da solicitação médica até a realização do exame específico não tenha se configurado para o objeto de estudo, permitiu-se descobrir através das descrições dos relatos dos entrevistados que existem prazos de validade para realização de exames que variam, conforme a operadora, sendo verificado durante a marcação pela atendente do laboratório prestador de serviços ao telefone posteriormente à coleta de dados. Alguns entrevistados relataram vivências de terem tido que retornar a seus prestadores médicos para refazerem as prescrições dos exames, em outra ocasião, quando passava de validade, em geral, de 30 dias da data de solicitação médica; outros relataram que a informação da validade seria obtida no próprio laboratório, alguns relataram que teriam ouvido falar de validade de pedido médico pela própria operadora e prestadores médicos; onde os demais entrevistados não teriam certeza da fonte desta informação, mas já teriam ouvido falar sobre isso. Questionados sobre os motivos que fariam o médico não por a data na prescrição ou na guia de requisição de exame do contrato com o plano de saúde, alguns falaram que poderia ser esquecimento do (a) médico (a) e outros falaram que o (a) médico (a) sabendo desta validade de pedido médico imposto pelo plano de saúde já deixaria sem data para não fazer o paciente perder tempo ao retornar ao consultório deste para substituir o pedido de exame por um mais recente. Outros disseram que o não registro da data seria para favorecer a agenda do paciente, que poderia ter outros impedimentos de ordem pessoal. E também alguns relataram que os médicos poderiam não colocar a data no pedido de exame para indicar o tempo determinado numa agenda pontual temporal de prioridade médica, a qual teria como objetivo favorecer a necessidade de outros tratamentos médicos prévios recomendados. Estes poderiam ser critérios adotados pelos médicos, a fim de prescrever a frequência mensal ou anual de exames que o paciente deveria seguir para controle, visando prevenção ou acompanhamento do avanço de doenças já instaladas, que não exigiriam uma marcação de exame imediata à consulta médica, postergando, assim, a realização do exame a critério médico; daí, não seria necessário por a data nesse pedido, seguindo esta concepção de alguns dos entrevistados. Quanto às guias de confirmação de exame emitidas pela operadora de plano de saúde, a maioria dos sujeitos entrevistados referiu não ler o teor na sua íntegra, não lembrando, do que estavam assinando; e nem se haveria alguma informação além de apenas comprovar a 130 realização de procedimento deles, como solicitação de autorização por parte da operadora acessar, auditar ou analisar as “despesas médicas” no prontuário médico-hospitalar e demais documentos pertinentes ao(s) procedimentos(s) realizados(s). Considerando esse possível risco de seleção adversa prévia das operadoras de planos de saúde a novas autorizações, a operadora que usasse deste artifício ficaria de posse de todos os dados sigilosos da saúde dos beneficiários com a autorização expressa desses, possibilitando-a traçar um perfil epidemiológico quanto às morbidades destes para futuras negativas de cobertura e, em último caso, glosa nas faturas de cobrança dos prestadores. Em relação ao tempo de espera no dia do exame, a maioria relatou ter esperado um pouco mais de 15 minutos, a exceção daqueles que chegaram com antecedência do horário agendado e um que ficou chateado por estar tendo que repetir o exame inconclusivo de outra ocasião. Outras barreiras de acesso diferentes do objeto de estudo foram marcadamente ressaltadas nos discursos dos entrevistados, principalmente quanto aos materiais cirúrgicos (órteses, próteses ou insumos específicos), negativas de cobertura cirúrgica para determinados graus de miopia, dificuldade para serem atendidos em consultas ambulatoriais de check up e de especialidades médicas, negativas para tratamentos fisioterápicos, RPG e Pilates. Segundo Martins e Paulo (2010), apesar da posição contrária representada pelas entidades médicas da oftalmologia, a norma criada pela ANS válida para os contratos novos, a partir de janeiro de 1999, assegura a cobertura da cirurgia de miopia, exclusivamente para grau igual ou superior a sete. Assim, explicita-se o entendimento para cirurgias que requerem material cirúrgico específico na saúde suplementar: As órteses e próteses, cuja colocação exija a realização de procedimento cirúrgico, tem cobertura obrigatória nos planos regulamentados pela Lei 9.656/1998. Cabe ao médico assistente a prerrogativa de determinar as características do implante a ser utilizadodimensões, material de fabricação (aço, titânio, cerâmica, entre outros) e tipo (cimentado, não cimentado, por exemplo)-, e a escolher a marca e a procedência do implante a ser coberto, desde que este atenda as especificações determinadas pelo médico assistente. Ressalta-se que o entendimento ANS está em consonância com o Parecer CFM 16/08, no qual se afirma que “não há justificativa para o médico excluir marca comercial de produtos e/ou instrumentos para procedimentos, sendo garantido a ele o conhecimento antecipado de cadastro destes no âmbito de seu trabalho”. Materiais de origem estrangeira que possuem registro válido na ANVISA são considerados nacionalizados e, por este motivo, contam com cobertura pelos planos de saúde. Nas situações em que a operadora discorde da indicação do médico assistente (por exemplo, quanto ao tipo de material a ser utilizado), deve ser aplicado o procedimento definido no art.4º, Inciso V, da Res. Consu 8/98 (MARTINS; PAULO, 2010, p. 68-69). Antagonicamente quanto à escolha da marca comercial do implante a ser coberto nas cirurgias de colocação de órteses e próteses foi divulgado em 2010 que 131 o CFM aprovou em outubro resolução que veda aos médicos a indicação expressa de marca comercial quando da requisição de órteses, próteses e materiais implantáveis em benefício de pacientes. De acordo com a norma, cabe ao médico determinar as características dos produtos, mas as opções devem ser justificadas clinicamente. “O objetivo do conselho é reduzir conflitos entre médicos e planos de saúde, e também com instituições públicas, quando da indicação de uso desses materiais. Outro princípio é evitar que médicos requisitem produtos de determinadas marcas em troca de benefícios eventualmente oferecidos por fabricantes (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2010, p. 9). O procedimento de RPG muito reivindicado pelos usuários da entrevista por ser uma técnica cinesioterápica específica não foi incluído como procedimento obrigatório pela ANS (MARTINS; PAULO, 2010). Ainda que o serviço de atenção domiciliar por home care seja um benefício prestado pelas operadoras aos contratantes, “nos casos em que a assistência domiciliar não se dê em substituição à internação hospitalar, esta deverá obedecer à previsão contratual ou à negociação entre as partes” (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010c, p.1). Esta previsão constitui-se de forma complementar, não sendo um serviço de cobertura obrigatória pelas operadoras. A assistência domiciliar na saúde suplementar está voltada para atenção ou assistência domiciliar (homecare) que vem sendo oferecida como alternativa à internação hospitalar, em especial para casos crônicos e de alta demanda aos serviços emergenciais, tendo em vista a redução de custos que representa para as operadoras e o maior conforto - desde que a residência possa acomodar a estrutura necessária para tal assistência - e segurança - inclusive pela redução de ocorrência de infecções por germes hospitalares resistentes - para os pacientes e familiares. Mesmo não sendo de cobertura obrigatória no setor suplementar, a atenção domiciliar poderá ser prestada pelas operadoras quando constar de aditivo contratual ou por meio de acordo extra-contratual. Em ambos os casos, no entanto, a oferta do serviço está subordinada à indicação do médico assistente, à concordância do beneficiário e/ou seu responsável e às disposições da RDC ANVISA nº 11/2006, que regulamenta este tipo de assistência. Quando se tratar de alternativa à internação hospitalar, a atenção domiciliar (homecare) oferecida pelas operadoras deverá obedecer às exigências mínimas previstas na Lei nº 9.656/98 para os planos de segmentação hospitalar, em especial o disposto nas alíneas “c”, “d” e “e” do inciso II do artigo 12 da referida Lei. Desta forma, não se deve confundir medicamento prescrito para tratamento domiciliar com medicação administrada (seja qual for a via de administração) a pacientes em regime de homecare: no primeiro caso, não há obrigatoriedade de cobertura de acordo com o inciso VI, artigo 10 da Lei nº 9.656/98; no segundo, quando a assistência domiciliar substituir a internação hospitalar, não só os medicamentos mas também os honorários dos profissionais de saúde, equipamentos, materiais e atendimentos com equipe multiprofissional prescritos pelo médico assistente deverão ser cobertos pela operadora (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010c, p. 2). Existe um paradoxo evidente em relação ao programa de atenção domiciliar, pois, embora não integrante no rol de procedimentos regulamentados pela ANS para obrigatoriedade de prestação de serviços a serem ofertados pelos planos de saúde, é amplamente oferecido para os consumidores. E sem existência legal, considerando que não é contratualizado, é reconhecido no âmbito judiciário quando o beneficiário reivindica judicialmente o direito de permanência nesse programa (FRANCO; MERHY, 2008). 132 É comum a resistência das famílias para a alta do programa de atenção domiciliar entre outras questões pela cômoda posição de ter uma equipe cuidando do familiar no domicílio, portanto o recurso que mais utilizam tem sido as ações judiciais para impedir a alta, considerando que o beneficiário que contratualiza um plano de saúde com a operadora percebe o direito de ter o serviço de atenção domiciliar, mesmo que este programa não esteja inscrito no contrato (FRANCO; MERHY, 2008). De acordo com Franco e Merhy (2008, p.1518), “seria conveniente regular sobre alguns aspectos mais críticos do Programa, como a transferência de alguns custos para a família e a alta”. De qualquer forma, ainda que tais barreiras tenham sido descritas pelos entrevistados, na categoria acesso aos exames de alta complexidade existe para essa clientela analisada um atendimento rápido e acessível com poucas barreiras, na sua maioria sem burocracia, e com grande „leque‟ de opções entre prestadores de serviços, tanto em quantidade como em qualidade. 4.3.2 Os conhecimentos dos direitos contratados nos planos de saúde Uma sociedade do conhecimento preservada requer um ensino de saúde que privilegie a perspectiva liberal-privatista em análise sobre as relações entre o público e o privado no ordenamento do SUS, contribuindo para a compreensão e apropriação de cidadania, com sentidos de equidade e solidariedade entre as classes sociais no direito à saúde como dever do Estado e com associações de mérito acadêmico para pautas de relevância pública (CECCIM et al., 2008). Para Pessoto et al. (2007, p.360), “questões relativas ao setor suplementar e de como a atuação das operadoras afeta o SUS devem ser incorporadas na pauta de discussão dos conselhos gestores”. Segundo Ceccim et al. (2008), abordar os imaginários na formação em saúde não implica em selecionar conteúdos, incluir estágios, optar por métodos didático-pedagógicos ou apresentar propostas de ensino-aprendizagem, mas vincular razões, interesses e efeitos públicos aos imaginários do que seja trabalhar em saúde. Razões Públicas voltadas para o interesse público trabalhariam uma nova autoridade profissional de universitários, resgatando-lhes a alteridade para inclusão de usuários das ações 133 em saúde ou de colegas de outras profissões nas redes sociais, com desvinculo do pensamento de obtenção de vantagem, prestígio, conforto econômico e dos símbolos de status de destaque e sucesso na carreira (CECCIM et al., 2008). Segundo Pessoto et al. (2007, p.360), “a defesa do direito universal à saúde e sua relevância pública devem estar acima dos interesses econômicos das operadoras de planos e seguros de saúde”. Pressupõe-se que o conhecimento ampliado potencializa reivindicações que nem sempre ou nunca são bem-vindas pela elite ou mercado dominantes de um cenário globalizante heterogêneo e desigual para a sociedade. Notadamente, o conhecimento em prol dessa sociedade é adjacente aos anseios e orientações conjugadas ao interesse público coletivo. Comumente é natural o grau de defesa conforme o „ataque‟ de uma urgência ou emergência que possa surgir de repente e que precisa ser atendido sem restrições. Não se planeja o agir diante das dificuldades e espera-se acontecer para verificar se tem jeito e o que poderá ser feito. Reage-se, acomoda-se ou recorre-se ao atendimento no SUS, quando o problema de saúde se remete às dificuldades que quiçá possam surgir para os usuários de planos privados de saúde. As possíveis dificuldades inerentes ao uso dos serviços na rede privada de assistência que podem acontecer com um ritmo de se convencer a argumentação contrária da operadora ou atendente do prestador de serviços, convenceu bem, porque o usuário demandante foi embora estão relacionadas, presumidamente, a um protocolo de induções de desistências de direitos contratados nos planos privados de saúde, a começar pelas exaustivas cirandas telefônicas de longas músicas de espera de chamada até a expectativa retardada da primeira comunicação do usuário com o primeiro, segundo, terceiro e quarto atendente, e, assim sucessivamente, além dos ecos solitários dos demandantes dos serviços quando caem as ligações telefônicas, traduzindo o monólogo do verdadeiro descaso e abuso contra os beneficiários de planos de saúde. Desta forma, centralizam-se nos usuários todas as responsabilidades para solucionarem os seus problemas, embora tal comportamento não tenha ocorrido nesta pesquisa perante a inexistência de relatos descritivos de barreiras de acesso para os exames de alta complexidade realizados. Segundo Gershman et al. (2007), parece existir o avesso cruel das relações de proximidade entre beneficiários e a administração do plano, prevalecendo o desconhecimento do contrato e das leis de amparo para defesa dos seus problemas com os planos privados de saúde, assim como não há acesso a qualquer funcionário da administração do plano. 134 Na pesquisa de Gershman et al. (2007), para identificar a satisfação dos usuários com planos de saúde dos hospitais filantrópicos, descobriu-se outros perfis de beneficiários de planos privados de saúde que em situações de conflitos com as operadoras recorrem ao contrato, aos órgãos de defesa do consumidor e à justiça. Em contrapartida, percebeu-se nesse estudo que havia um grande desconhecimento da ANS entre os participantes (GERSHMAN et al., 2007). As tentativas de imposição de barreiras para usuários de planos privados de saúde estão presentes mesmo com a vigência da Lei nº 9.656/1998, porque os seguros e planos privados tendem a restringir o acesso dos seus beneficiários aos procedimentos de média e alta complexidade, em seus próprios serviços, devido aos custos relacionados (PESSOTO et al., 2007). Pensando em formas viáveis para evitar problemas de barreiras em qualquer tipo de contratação de plano privado de saúde seria útil a regulação por conduta, a qual [...] deve estabelecer claramente que todas as formas de intermediação de ações e serviços de saúde que se caracterizem como relações de consumo, direta ou indiretamente, são consideradas como parte do setor de saúde suplementar e, portanto, subordinadas à regulamentação da agência (MONTONE, 2009, p.76). Porém, na prática, esquivam-se quase sempre dessa regulação, condutas bilaterais nos planos coletivos entre pessoas jurídicas que tratam direitos dos usuários como „negócios‟ ou benefícios negados intermediados pelas próprias empresas empregadoras, desmerecendo-os do conhecimento contratual entre as partes contratantes e contratadas. Nesta situação é incomum o usuário de plano coletivo por adesão ou empresarial tomar conhecimento do que está escrito no contrato entre a empresa e a operadora de plano privado de saúde, ficando a mercê do porta-voz da empresa de RH que gerencia seu plano empresa. A categoria “O conhecimento sobre os direitos contratados nos planos de saúde” representada por 15,65% do total percentual de unidades de registros das falas contém duas pré-categorias-uma de nome similar e a outra denominada conhecimentos sobre fonte de informação ou reclamação para eventuais dificuldades com os direitos contratados nos planos, conforme pode ser observado nos apêndices D e E. A categoria 2.1 “O conhecimento sobre os direitos contratados nos planos de saúde” constituiu-se por dados verbais que se baseiam em direitos básicos, tais como direitos a consultas, exames e internações: Tenho direito a todos os exames. (E21) 135 Direitos normais que todos os associados da CASSI têm. (E28) Alguns entrevistados não sabiam detalhar seus direitos: Nunca pensei nisso. (E17) Não sei. (E18) Pôde-se perceber que o conhecimento para aquisição desses direitos é procurado, conforme a necessidade de usufruir de um bem ou serviço do plano de saúde ou quando interessa o usuário desse plano. Na pré-categoria 2.2 “O conhecimento sobre fonte de informação ou reclamação para dificuldade com os direitos contratados” estabeleceu-se na figura de instituições públicas de direito, esfera judicial de direito, as empresas, família, conselhos e amigos. As empresas referem-se não somente ao setor de recursos humanos das empresas empregadoras no caso de planos empresariais, mas também às operadoras dos planos de saúde que foram muito divulgadas. A maior frequência de relatos de procura dos consumidores de planos de saúde para reclamar os direitos contratados tolhidos direcionou-se às instituições públicas de direito, tal como o órgão de defesa do consumidor e a ANS. Não obstante, os usuários de planos em caso de algum problema de cobertura ou similar se reportariam primeiramente à operadora: Procuraria a operadora imediatamente e depois o órgão PROCON. (E2) Para defender os meus direitos procuraria o instituto de defesa do consumidor. (E4) Eu recorro à própria ANS. (E10) Em último caso, os entrevistados informaram que procurariam a esfera judicial ou empresa: O último caso seria o meio judicial. (E12) Reclamo na empresa, se eu não resolver, a empresa resolve. (E18) Eu ligo para minha empresa, e a empresa que faz convênio com essas operadoras. (E26) No que se refere à proteção dos direitos contratuais, reitera-se que a maioria procuraria imediatamente a operadora e num segundo momento as instituições públicas de direito, seguidamente os plantões judiciários ou advogados. 136 O papel da ANS é mediar justamente tais divergências que o mercado têm, identificando formas de sustentabilidade, apoiando-se em indicadores de qualidade (LOTTENBERG, 2007). Quanto à capacidade avaliativa do usuário salienta-se que a avaliação pode produzir informação tanto para a melhoria das intervenções em saúde como para o julgamento acerca de sua cobertura, acesso, equidade, qualidade técnica, efetividade, eficiência e percepção dos usuários a seu respeito. Com essa finalidade pode e deve mobilizar as estratégias e técnicas necessárias da epidemiologia e das ciências humanas, sem preconceitos e sem interdições (SILVA, 2005, p.30). A mediação de conflitos entre os atores setoriais que constituem a saúde suplementar é uma das atribuições concretas por parte da ANS, mas observou-se que alguns entrevistados desconhecem sua existência e missão institucional, preferindo recorrer às próprias operadoras num primeiro momento, além do setor de recursos humanos da empresa, família, amigos, advogados, PROCONS e plantões judiciários. Para Montone (2009, p.82), “a agência multa, mas tem grande dificuldade em efetivar a punição, reduzindo a credibilidade do sistema”. A redução da credibilidade nas agências reguladoras quanto às dificuldades inerentes à aplicação de penalidade pode estar relacionada à procura isolada pelo usuário até a esfera judicial ou de outro mecanismo de defesa, até mesmo à procura concomitante ao papel regulatório dessas agências. Um fator primordial é que se deveria fomentar e divulgar mais as tarefas fiscalizatórias da ANS focada no usuário, considerando que este será o avaliador mais próximo da realidade e mais indicado por usar o serviço contratado pela operadora. A percepção do usuário é muito importante na avaliação de um serviço de saúde prestado ou não prestado. Os conhecimentos sobre os direitos contratados com o plano de saúde foram incompreendidos inicialmente, mas através de reformulação da questão abordaram que não sabiam muito, porque não tinham o hábito de ler o contrato, alguns faziam referências aos direitos de cobertura às consultas, exames e internações; outros relataram que efetuavam pesquisas on line, caso necessitassem ou outros meios. Em suma, como fonte para consulta ou reclamação, em caso de se sentirem tolhidos de alguns desses direitos contratados com as operadoras de plano de saúde recorreriam à grande maioria às operadoras de planos de saúde, às PROCONS, advogados, plantões judiciários, ANS, a família e as empresas do trabalho, em caso destas últimas de o plano ser coletivo empresarial ou adesão imediatamente na frente das operadoras. 137 4.3.3 Motivações para realizar os exames de alta complexidade nos planos de saúde, ao invés do SUS Os beneficiários de planos de saúde demandam mais os serviços em todos os níveis de renda quando comparados com os que não têm planos de saúde no estudo realizado por Pessoto et al. (2007) no conjunto de municípios-caso, como na cidade de São Paulo e na Região Metropolitana de São Paulo, ressaltando que a população usuária exclusiva do SUS nesse estudo buscou atendimento de saúde em menor proporção. Ainda no estudo realizado por Pessoto et al. (2007), observou-se também que tanto os que tinham plano, como os que não tinham plano privado de saúde, nos níveis de renda inferiores a procura por serviços em saúde foi maior do que aquela apresentada pelo nível de renda superior, com escala decrescente da demanda da renda financeira inferior (até R$ 605,00) para a superior (mais de R$ 3.540,00). Tais valores foram descritos em reais de agosto de 2003, atualizados pelo ICV-Dieese (PESSOTO et al., 2007). A motivação e o estado emocional do ser humano influenciam decisivamente a percepção, que ao ser estudada é delineada em grupos homogêneos com instruções altamente padronizadas para que o pesquisador tente eliminar as ,diferenças individuais entre os sujeitos (SIMÕES, TIEDEMANN; RAPPAPORT, 1985). Nesse contexto acredita-se que a motivação direciona a opção do usuário de plano de saúde que decide com base na sua preferência ou experiência prévia qual rede lhe atenderá melhor, tal como percebe ser esta rede de prestadores de serviços na saúde privada selecionada pela amostra desta pesquisa. Para Simões, Tiedemann e Rappaport (1985, p.84), “[...] modificações da percepção podem, no entanto, ser tão sutis e diversificadas que fica difícil medi-las, uma vez que as regularidades que ocorrem na percepção são muito mais proeminentes”. Na categoria “Motivações para realizar os exames de complexidade nos planos de saúde ao invés do SUS” representada por 3,60% do total percentual de unidades de registro das falas contém a pré-categoria equivalente quanto às motivações para realização do exame de complexidade no plano de saúde em lugar do SUS, conforme pode ser observado nos Apêndices D e E. Os usuários relataram como maior motivação à realização dos exames de alta complexidade pelo plano de saúde, a rapidez na marcação (autorização), pronta realização e entrega rápida dos resultados dos exames. Além desses motivos expressaram o fato de terem 138 um plano empresarial ou porque já se encontram na situação de pagantes dos seus planos de saúde. A principal alegação de não usarem o SUS estava pautada na morosidade do atendimento, se assim conseguissem o atendimento perante a perspectiva negativa desses usuários de planos privados de saúde. Exemplificam-se por esses relatos: Pagando é melhor. (E1) Porque é mais rápido e mais prático. (E4) Pela rapidez. (E5) Se eu esperar o exame pelo SUS, meu problema pode se agravar. (E10) O atendimento privado de saúde em relação ao atendimento oferecido pelo SUS foi melhor avaliado, tendo em vista que as demandas dos exames de alta complexidade foram rapidamente atendidas nos planos de saúde, segundo os usuários entrevistados. As motivações dos sujeitos entrevistados para a realização de exames de alta complexidade através da rede privada de assistência, ao invés do SUS, oscilaram dentre as principais, como acesso rápido, marcação fácil com a atendente do laboratório prestador do exame ou através de uma ligação telefônica, através do intermédio desta atendente; flexibilidade de horário de agendamento e para realização do exame, tendo sido citado o horário do almoço e horário noturno após o expediente do trabalho; entrega rápida do resultado; conforto da hotelaria do prestador de serviço; organização; qualidade na execução do serviço, como garantia e resolutividade de um diagnóstico de imagem de excelência, dentre outros. A exceção de uma entrevistada que dizia estar em fase de mudança para outra operadora, foi relatado que não teve facilidade na marcação do exame de alta complexidade, pois a autorização era na sede da empresa distante do trabalho e do laboratório, cuja rede credenciada só apresentava este laboratório para o exame de alta complexidade prescrito. O SUS constitui o maior sistema público de saúde do mundo, organizado com orientações de atendimento integral, com destaque às ações preventivas sem prejuízo das ações assistenciais, participação da comunidade e, finalmente, à descentralização, com direção única em cada esfera do governo (PAIM, 2008). De fato com o SUS houve ampliação das formas de acesso da população, mas a falta de equidade ainda é um problema que persiste. No entanto, o SUS como sistema nacional de saúde brasileiro é compreendido como [...] uma forma de articular e produzir ações e serviços de saúde, de acordo com princípios, diretrizes e dispositivos no ordenamento jurídico, ou seja, estabelecidos pela Constituição da 139 República, Leis 8.080/90 e 8.142/90 e outros instrumentos jurídicos-normativos (PAIM, 2008, p.96). Para quem define o SUS como um plano de saúde gratuito restrito aos cidadãos carentes e pobres deve-se ter em mente que [...] o SUS não é um mero meio de financiamento e de repasse de recursos federais para estados, municípios, hospitais, profissionais e serviços de saúde. Não é um programa de saúde pública, nem um „plano de saúde‟ para pobres. Também „não é‟ um sistema de serviços de saúde destinado apenas aos pobres e „indigentes‟. Não se reduz a uma política de governofederal, estadual ou municipal-, muito menos a uma proposta política exclusiva desse ou daquele partido. Enfim, não é caridade de instituição beneficente, organização governamental, prefeito, vereador, deputado, governador, senador ou presidente (PAIM, 2008, p. 96). As dissonâncias refletidas na percepção dos entrevistados trazem a ideia de que pagando pelo serviço de saúde é melhor, pois subentende a segurança trazida por um serviço extra contratado que estaria sempre à disposição. Uma sensação percebida que precisa de comprovação, já que nesse estudo, embora, não tivessem existido barreiras de acesso para os exames de alta complexidade, não desmerece a preocupação com as lacunas regulatórias no âmbito da saúde suplementar. Para quem tem pressa, logicamente, o tempo é uma variável importante que merece ser evidenciada. São inúmeros problemas de saúde que emergem e a dor é peculiar, e não podendo ser comparada requer atenção devida para que a resolutividade deles prepondere. A comodidade que surge da facilidade de agendar um exame mais caro, além da presença física no laboratório evocada nos discursos dos depoentes traduziu a praticidade elencada em outras maneiras de marcar o exame, tal como a internet e o telefone, relatados como meios de agendamento inexistentes numa transversalidade comparada com o SUS. De qualquer forma, parecem existir problemas de agenda de vagas na saúde suplementar. Não se conhecem os critérios utilizados pelos prestadores que priorizam a marcação do exame pelo tipo de plano de saúde ou segmentação de seu produto, o que pode estar relacionado com a variação dos tempos de autorização para os procedimentos que necessitam de autorização prévia das operadoras de planos privados de saúde entre as diversas operadoras. Algumas operadoras liberam a autorização mais rapidamente do que outras, enquanto algumas não utilizam essa medida de controle de custos que não tem previsão legal. Assim, além das imposições descritas nos contratos, as operadoras adotam diversos mecanismos “administrativos” que visam limitar procedimentos e exames solicitados, o que atinge os consumidores e também os médicos, que são cerceados em sua autonomia e atuação 140 profissional. A autorização prévia é uma dessas medidas de controle (MARTINS; PAULO, 2010, p. 60). A ANS em quase dez anos de existência não regulamentou prazos máximos para atendimento em planos de saúde para saber se o tempo que o beneficiário de plano de saúde leva para agendar consultas, exames e cirurgia eram considerados razoáveis. Contudo, realizou pesquisa inédita no ano de 2010 entre os dias 21 de junho e 05 de julho para publicação de norma que regulamentasse essa temática. Não obstante, foram objeto desta primeira consulta pública, as operadoras de planos privados de assistência, não contemplando a opinião dos usuários desse sistema. Ainda que se proponha a regulamentação através de norma para direcionar parâmetros de tempo hábil para atendimento que não seja prejudicial a quem usa e depende do serviço de saúde contratado, é pertinente envolver os demais entes regulatórios nessa discussão e formulação de ditames legais, sendo relevante ouvir a categoria médica e, principalmente, o beneficiário de plano de saúde privado. Contudo, a sociedade civil poderá participar da nova consulta pública nº 37/2011 para enviar contribuições no prazo de 30 dias, a partir de 03/02/2011 até 04/03/2011 para avaliar a proposta de Resolução Normativa, a ser publicada pela ANS (ANEXO). Além dos prazos máximos de atendimento nos planos privados de saúde (Tabela 1, f. 64), esta Resolução compreenderá, sobre a garantia de atendimento em prestador não credenciado no mesmo município; ou garantia do transporte do beneficiário até o prestador credenciado para o atendimento, assim como seu retorno à localidade de origem; ou sobre o reembolso, integralmente, quando os custos com as despesas com a saúde pelo serviço ou procedimento realizado forem pagos pelo beneficiário (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2011). A categoria médica poderá participar desta consulta pública como sociedade civil, avaliando os critérios da proposta normativa (ANEXO) (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2011). Os limites máximos de espera para consultas básicas e especializadas, além de cirurgias e procedimentos mais complexos foram parametrizados por prazos máximos de atendimento, os quais foram definidos e regulamentados pela primeira vez na ANS, depois de mais de uma década da promulgação da lei que rege o setor suplementar (LEITE, 2010). Segundo Franzen (2010), o Conselho Federal de Medicina criticou a normativa da ANS que estabeleceu prazos máximos de atendimento, alegando que as regras mobilizam respostas das operadoras às demandas dos usuários de planos de saúde no intervalo de três a vinte e um dias, dependendo da especialidade. Dessa forma, esse normativo estaria 141 interferindo na autonomia do prestador médico, principalmente quanto ao déficit de horários para atendimento na agenda, e que a baixa remuneração dos serviços pelas operadoras vem gerando descredenciamento de muitos profissionais, aumentando a demanda do atendimento para aqueles prestadores que não se descredenciaram, além da prerrogativa que o médico tem de definir seu cronograma de acordo com sua avaliação de diagnóstico e riscos (FRANZEN, 2010). Dentro dos normativos para os prazos máximos de atendimento nos planos de saúde observou-se que os entrevistados conseguiram realizar seus exames de alta complexidade em tempo menor que os 21 dias determinados pela ANS (Tabela 1, f. 64). 4.3.4 Nível de satisfação acerca do plano de saúde De acordo com Ferraz (2008, p.79), “é absolutamente impossível obter a satisfação das expectativas de todos; embora desejável e possível, o atendimento às expectativas de uma determinada maioria já se caracteriza num considerável desafio”. Acredita-se que de acordo com a facilidade para realização de certo procedimento necessário à manutenção das condições vitais do indivíduo e a variação na qualidade do seu plano de saúde contratado, o atendimento das expectativas no tempo desejado poderá indicar se os usuários de planos privados de saúde estão satisfeitos. Segundo Pessoto et al. (2007), existem desigualdades do mercado de planos privados de saúde baseadas em diferenças socieconômicas que irão definir se o produto contratado terá mais ou menos opções de assistência. A categoria “Nível de satisfação acerca do plano de saúde” representada por 23,22% do total percentual de unidades de registro das falas subdivide-se nas pré-categorias „Nível de satisfação acerca do plano de saúde contratado em relação a outros planos privados de saúde‟, „Nível de satisfação acerca do plano de saúde em relação ao SUS‟, „Julgamentos positivos sobre os planos de saúde‟ e „Julgamentos negativos sobre os planos de saúde‟, conforme podem ser observados nos Apêndices D e F. A pré-categoria 4.1 “Nível de satisfação acerca do plano de saúde contratado em relação aos planos privados de saúde” indicou-se a satisfação dos usuários de planos com o atendimento privado contratado, embora quatro entrevistados tivessem informado que migrariam para outro plano de saúde. Quando indagados sobre qual nota de zero a dez dariam 142 aos seus planos, a maioria concedeu uma nota maior que sete, o que corrobora a satisfação enunciada dos entrevistados com seus planos de saúde. Assim, na concepção avaliativa dos usuários de planos, denotam-se nas falas: Eu tô demais satisfeita, dou dez para o meu plano, eu adoro meu plano. (E3) Com meu plano estou satisfeita, porque até hoje não me desatendeu em nada, daria 9,0. (E7) Estou muito satisfeita, eu daria 8,0. (E14) A satisfação dos usuários nos planos de saúde tem relação com as avaliações descritivas de notas indicadas pelos entrevistados. Para Stenzel, Misoczky e Oliveira (2004, p. 87), “a utilização da satisfação dos usuários como indicador de qualidade dos serviços de saúde é uma tentativa de incorporar a perspectiva do usuário nos processos de avaliação”. A avaliação do usuário é importante não somente para sua satisfação pessoal, mas direciona o alvo de mudanças governamentais, porque ele é o mais apto a diagnosticar sua percepção, porque como contratante de plano de saúde usa o serviço que lhe é ofertado, e, portanto, qualquer problema enfrentado pressupõe se o que está a sua disposição é realmente adequado às suas necessidades. Para Silva (2005, p. 22), “a seleção das características ou atributos das práticas, serviços, programas, estabelecimentos ou do sistema de saúde a serem avaliados contribui para o aprofundamento no processo de definição do foco de avaliação”. Na pré-categoria 4.2 “Nível de satisfação acerca do plano de saúde em relação ao SUS” houve predomínio de relatos que afirmavam a não migração dos planos de saúde para o SUS. A alegação que fundamentava a não migração para o SUS era a de que o serviço na rede privada era mais bem prestado do que o do público. Porém levantando-se a pressuposição de inexistência de demora do atendimento no SUS, ainda que sem o luxo da hotelaria vinculada ao serviço privado, e sem as comodidades extras desse serviço como quarto particular e suítes, no lugar de enfermarias, apenas oito entrevistados disseram que migrariam para o SUS. Os demais desiludidos com o sistema de saúde público não manifestaram nem que tamanha pressuposição pudesse ser comprovada. As falas que apontam a migração para o SUS são: Se eu conseguisse comprovar isso, com certeza. (E9) Claro eu pago imposto para isso. (E11) 143 Em antagonismo com as falas dos usuários dos planos de saúde migrantes para o SUS, transcreveram-se os relatos: Você sair do certo para o duvidoso...? (E13) Não desistiria do meu plano, não vou desistir, eu não vou largar meu plano de jeito nenhum. (E26) Verificou-se que a desilusão com o atendimento do SUS é generalizada pela expressão de relatos como falta de agilidade e imprevisão de atendimento no SUS, o que gera a insatisfação dos entrevistados para com o sistema público de saúde. Na pré-categoria 4.3 “Julgamentos positivos sobre os planos de saúde”, muitas vantagens desde a infraestrutura, como também a qualidade dos serviços prestados na rede privada de assistência, foram colocados em pauta pelos entrevistados, evidenciadas nas falas: Eu tenho mais conforto. (E1) Eu acho tudo positivo, tem vários hospitais, muito bom lá, o atendimento, as enfermarias, os médicos, tudo. (E3) O atendimento rápido, a facilidade de marcação, leque de opções. (E12) A comodidade, o atendimento, a qualidade. (E14) A pesquisa mostrou um alto nível de satisfação dos usuários entrevistados em relação aos planos de saúde, tendo como grande destaque a variedade de prestadores, a qualidade da rede de atendimento, a rapidez e a localização de médicos, hospitais e laboratórios. Para corroborar esse resultado, em pesquisa de opinião com amostra representativa, realizada nos meses de setembro a dezembro de 2005 pela ANS por meio de 1688 entrevistas com beneficiários de planos de saúde domiciliares em todos os estados brasileiros, e a partir das bases de dados disponíveis na ANS, e nos bancos de dados públicos do setor saúde foram constatados em relação ao componente “satisfação com os planos e prestadores”, um percentual significativo de beneficiários que se declararam satisfeitos, principalmente no que se refere à agilidade de agendamento de procedimentos e cobertura da rede assistencial (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2005). Na pré-categoria 4.4 “Julgamento negativo sobre o plano de saúde” o custo das mensalidades, reajustes de preços por idade, demora na marcação, despesas com material cirúrgico e as medidas de controle das operadoras como autorizações, solicitações de senhas e fatores de moderação como a cobrança de coparticipações prévias aos exames de alta 144 complexidade foram as características negativas mais sobressalentes no grupo dos entrevistados: O custo é muito caro por causa da idade, a idade vai avançando e vai onerando mais o bolso. (E1) Tá esse problema de médicos demorando para marcar. (E2) A gente arcou com o material que foram as placas e os pinos, a parte que caberia o plano cobrir. (E5) O preço dos planos, principalmente para quem tem mais de 60 anos. (E7) Você tem que pagar novamente o plano para poder ter qualidade e dignidade, porque senão você fica esperando. (E10) Esta pesquisa demonstrou a existência de aspectos negativos dos planos de saúde, tais como os elevados custos das mensalidades e as solicitações de senhas às autorizações prévias de atendimento, em especial para os exames de alta complexidade, considerando que os exames mais simples como hemograma, cultura de urina e parasitológico de fezes não tinham necessidade de solicitação de autorização prévia pela operadora. Além disso, os relatos de insatisfação convergiram para os problemas das altas mensalidades oriundas das mudanças das faixas etárias, as quais acabavam pesando mais no orçamento do idoso que aposentado tinha sua remuneração reduzida. Os processos dinâmicos trazidos ao longo do ciclo natural de envelhecimento da vida e as experiências compartilhadas consagram interesses, crenças, ideias, sensos, perspectivas, frustrações e atitudes importantes na avaliação coletiva sobre a transversalidade de determinado tema. A viabilização do acesso à saúde suplementar, principalmente para o idoso é um requisito importante para a consolidação da cidadania plena, satisfação dos assistidos e a melhora na qualidade de vida, embora a maior parte dos sujeitos desse estudo tenham se configurado mais frequencialmente nas faixas etárias de 30 a 49 anos. Quanto aos reajustes de mensalidades nos planos de saúde existe uma diferenciação entre os planos individuais e coletivos. Nos planos individuais, os índices de reajustes são definidos pela ANS, ao passo que nos coletivos há livre negociação entre as partes que posteriormente é informada à ANS. Essa diferença, embora regulamentada pela ANS, implica em poderes de negociação distintos entre os planos individuais com baixo poder de negociação em virtude de sua representatividade reduzida, em detrimento ao alto poder de negociação dos planos coletivos representados pelas pessoas jurídicas (empresas, associações e sindicatos), em função do número maior de beneficiários vinculados aos planos desta natureza (ALBUQUERQUE et al., 2008). 145 Segundo Santos, Malta e Merhy (2008), antes da regulação dos planos de saúde os reajustes eram praticados livremente pelas empresas por faixas etárias, onde algumas dessas empresas que operavam planos privados de saúde praticavam até 32 faixas de reajustes entre os mais novos e os mais idosos. Após a regulação dos planos de saúde medidas regulatórias foram utilizadas para definirem reajustes máximos entre as faixas etárias, a partir da resolução do Conselho Nacional de Saúde Suplementar (CONSU) nº 6 de 04 de novembro de 1998 e da RN nº 63 de 22 de dezembro de 2003 da ANS, as quais definiram reajustes de, no máximo, seis vezes entre os mais jovens e os mais idosos, subsidiando o “pacto intergeracional” no momento em que os mais jovens “auxiliam” no custeio dos planos dos mais idosos (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). Assim, o aumento do custeio dos planos para os mais jovens implicou na redução proporcional das crianças e jovens de 19 anos na população de beneficiários de planos, e aumento da participação proporcional das faixas acima de 20 anos, provavelmente decorrente da expansão dos planos coletivos (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). Analisando a questão dos reajustes dos planos de saúde, ainda que seja significativo o „pacto intergeracional‟ para os jovens produtivos no mercado de trabalho alçarem os valores maiores com as despesas de planos de saúde, considerando a baixa probabilidade do risco numa carteira de composição saudável, os preços das mensalidades dos planos, conforme o avançar na faixa etária continua desproporcional para a renda familiar reduzida de um aposentado que tem que custear outros dividendos extras à saúde. Há que se pensar também em formas de revisão das aposentadorias para restabelecer ou aproximar a liquidez real de seus salários como quando eram ativos no mercado de trabalho. Programas de reinserção de aposentados no mercado de trabalho com jornada reduzida poderia restabelecer essa liquidez ou revisão monetária baseada em critérios dignos para cidadania plena na terceira idade. Sobre o nível de satisfação dos usuários de planos de saúde da amostra há uma relação direta com a realização do exame de forma efetiva no tempo esperado. Ao passo que são atendidos, a satisfação é efeito do que foi requisitado pelo médico assistente. O controle social regulatório ocorre a partir da satisfação desse grupo que traduz a efetividade dos produtos comercializados e contratados pelas operadoras de planos de saúde. Os resultados desta pesquisa apontam que os planos de saúde dos entrevistados autorizam prontamente a realização de exames, em especial, os mais custosos como os de alta complexidade. Por outro lado, foram experimentadas pela amostra do estudo negativas prévias para exames desta natureza em situações temporais distintas, os quais seriam de 146 direito contratual. Alguns entrevistados referiram que as operadoras exigiam justificativa do médico assistente para o exame requerido no lugar de outro procedimento diagnóstico mais barato. Foi revelado que algumas operadoras contestavam a solicitação médica para determinado diagnóstico. Alguns entrevistados disseram que para autorização de outros procedimentos cirúrgicos que não os exames de alta complexidade tiveram problemas, da mesma forma que para determinado material cirúrgico necessário. Um sujeito entrevistado relatou que foi negada uma cirurgia de miopia para o grau 5,0, visto que só era autorizado este tipo de intervenção, a partir do grau 7.0, conforme o rol de procedimentos obrigatórios regulamentados pela ANS naquela ocasião. Para Montone (2009), o rol de procedimentos obrigatórios materializa a cobertura mínima dos planos, incluindo todas as doenças. A atualização do rol pela ANS permite a inclusão de novas coberturas de procedimentos para restabelecimento da saúde, como o transplante de medula, revisão de parâmetros em outras, como a cirurgia a laser para correção de miopia, que era obrigatória para miopia superior a sete graus e atualmente com garantia acima de cinco graus. O Rol de procedimentos e eventos se baseia na lista de procedimentos médicos da Classificação Internacional de Doenças (CID) -10 da OMS que deve ser disponibilizada como cobertura mínima obrigatória para cada segmentação de planos de saúde (ambulatorial, hospitalar com ou sem obstetrícia e plano referência) contratados pelos consumidores, a partir de 02 de janeiro de 1999. Os contratos antigos assinados anteriormente à vigência da Lei 9.656/1998 têm cobertura estabelecida pelo contrato (MARTINS; PAULO, 2010). A atualização do rol de procedimentos e eventos na saúde suplementar permite que os contratos novos regulados desde 1999 acompanhem o desenvolvimento de novas tecnologias de prevenção, diagnóstico e tratamento (MONTONE, 2009). Porém, Bahia (2001) ressalta a importância de se desenvolverem pesquisas acerca da assistência médica supletiva para aprofundar o conhecimento sobre o sistema de saúde brasileiro de forma a ampliar o significado da saúde, que no âmbito da saúde suplementar, foi reduzido a um rol de procedimentos e eventos médico-hospitalares. Perceberam-se diferentes reações perante as negativas de autorização prévia aos procedimentos em outras ocasiões que não a realização dos exames de imagem dessa pesquisa, incluindo recursos ao judiciário, pagamento direto do procedimento ou até desistência da realização de tais procedimentos, em virtude do custo. 147 4.3.5 Percepção do atendimento no SUS A perspectiva de problema de saúde entendida como pedido do usuário, ora como um favor, ora como uma demanda, na qual se implica um dever, mantém a lógica de afastamento entre o Estado e a sociedade civil, o que revela o desafio para maior participação cidadã nesse processo de reivindicação de serviço público em prol da saúde (ASENSI, 2010). Para Lacerda e Valla (2010, p.287), “as necessidades em saúde ou demanda de cuidados médicos fazem parte do imaginário social e, portanto, estão permeadas de conteúdos simbólicos”. O SUS como o maior sistema nacional público traz simbolismos e significados para usuários e não usuários desse sistema. Existem diferenças entre a porta de entrada no sistema de saúde pelos usuários do SUS e aqueles que são beneficiários de planos privados de saúde. Enquanto os dependentes do SUS procuram mais os serviços de urgência e emergência, os beneficiários de planos buscam mais as clínicas e consultórios, do que os prontos-socorros ou hospitais, com utilização de serviços de postos ou centros de saúde em apenas 3,9% dos casos. Tal situação ocorre devido à possibilidade da menor oferta ou acesso aos serviços de saúde da rede de unidades básicas no SUS, paralelo ao padrão diferenciado de consumo dos diversos tipos de serviços nos planos de saúde, principalmente para os detentores de rendas superiores (PESSOTO et al., 2007). A utilização residual de postos de saúde pelos beneficiários de planos de saúde (3,9%) pode ser explicada pela utilização de serviços exclusivos oferecidos pelo SUS, a exemplo das vacinas e medicamentos que não são fornecidos pelos planos privados de saúde (PESSOTO et al., 2007). Compreendem-se como hipóteses explicativas para a reduzida procura dos clientes aos serviços de urgência e emergência dos planos privados de saúde: a maior oferta e facilidade de acesso aos demais serviços (clínicas e consultórios); tipo de plano ou seguro de saúde que pode levar usuários de planos de saúde com menor renda e menor disposição de oferta de serviços privados a buscarem atendimento nos prontos-socorros ou hospitais do SUS; barreiras de acesso aos serviços de urgência e emergência dos planos embora numerosos, conforme o tipo de produto contratado do plano; percepção diferenciada sobre a morbidade do quadro entre beneficiários de planos de saúde e usuários do SUS e diferenças perceptivas para usuários exclusivos do SUS em relação ao conjunto dos beneficiários de planos (PESSOTO et al., 2007). 148 A categoria “Percepção do atendimento no SUS”, está representada por 13,34% do total percentual de unidades de registro das falas que se subdivide nas pré-categorias „Julgamentos positivos sobre o SUS‟ e „Julgamentos negativos sobre o SUS‟, conforme pode ser observado nos apêndices D e F. Na pré-categoria 5.1, apesar dos entrevistados não simbolizarem muitas características positivas no SUS, muitos deles apontaram como excelente os atributos de qualidade vinculados aos recursos humanos do SUS, hospitais de referência e contrarreferência, o programa de saúde da família, gratuidade de medicamentos, vacinas, serviços de emergências, acesso para as pessoas de baixa renda, entre outros. São aparentes nas falas: Eu to gostando de pegar só dois remédios lá no posto. (E3) Acho que a gente tem bons hospitais, bons médicos, e gente tem hospitais de referência no país. (E4) O serviço de emergência é positivo. (E5) O médico de família, o programa de saúde da família, o PSF, é um coisa que efetivamente funciona. (E6) De positivo, eu citaria aquele hospital de Laranjeiras, que é um hospital de referência, eu conheço, inclusive, o médico de lá, o próprio INCA é uma referência. (E9) Um acidente que eu tiver primeiro vou para o Souza Aguiar, depois eu vou para o particular, os profissionais para mim da rede pública são os melhores do mundo. (E13) Eu entrei com um pedido de um aparelho auditivo no governo, deve ser pelo SUS, é assim, demorou um ano para conseguir, mas eu consegui. (E30) Percebe-se que a descrição dos serviços do SUS mais valorizados é os de natureza humana no atendimento, identificada pelos usuários como processo necessário para a formação dos profissionais de alta qualidade pela diversidade da demanda e de referência para casos de urgência e emergência. Para infraestrutura, os hospitais públicos de grande porte foram os mais elogiados quanto às especialidades cardiológicas, oncológicas e de pronto atendimento para as situações que envolvem risco iminente de morte - afogamentos, traumas, queimaduras, ferimentos por arma de fogo, acidentes pessoais. A atenção domiciliar centrada no modelo do cuidado foi valorizada a partir da atuação dos médicos de família e suas equipes de trabalho como uma experiência que deu certo no SUS. Na pré-categoria 5.2 sobressai a insatisfação em relação ao SUS, entretanto baseada em vivências e informações compartilhadas por parentes, amigos e empregados próximos, e àquelas que são provenientes de televisão, jornais de grande circulação, rádios e revistas. Na análise da percepção negativa do atendimento no SUS destacam-se as deficiências apresentadas pelos serviços de saúde, falta de médicos e equipamentos, demora no 149 atendimento, sobressaindo as falhas de gestão da verba pública destinada à saúde e improbidades administrativas, conforme os relatos: Desinteresse da Administração Pública. (E14) A gente chega ao pronto-socorro do SUS e a gente mofa na fila. (E16) O sistema tá doente, esse sistema do SUS é doente. (E17) Deviam abrir mais concurso para mais profissionais. (E19) O problema do SUS é a má gestão do dinheiro público, o SUS é um susto. (E20) A forma, o mecanismo não funciona. (E21) A espera, o acúmulo de gente. (E23) O descaso das autoridades que deixam os hospitais em caso de abandono. (E24) Tem muita corrupção, muita coisa errada, muito ruim não tem médico para atender. (E26) Observou-se que o destaque nos relatos dos entrevistados foi maior para o aspecto negativo do SUS, ressaltando predominantemente a incompetência da gestão das autoridades administrativas, mau uso da verba pública, a corrupção e o desvio do dinheiro destinado à saúde pública. Bertolli Filho (2008) ressalta que desde 1980 a política de saúde brasileira pouco fez para modificar o quadro sanitário vigente nas décadas anteriores, evidenciando a persistência de um cenário marcado por epidemias evitáveis, como os surtos de cólera e dengue, índices crescentes de tuberculose, tracoma, doença de Chagas e doenças mentais. Portanto, segundo alguns dos principais administradores da saúde pública brasileira, o setor sofre sobretudo da ausência de planejamento e da descontinuidade dos programas.Tal situação permite não só o alastramento da corrupção, mas também a ineficiência dos serviços de atendimento às necessidades básicas da população (BERTOLLI FILHO, 2008, p.61). Sobre a transparência na gestão existem elementos similares que impedem a atuação mais qualificada dos conselhos de saúde que inibem o exercício da cidadania quanto ao controle dos gastos e dos resultados da ação pública (SANTOS; ANDRADE, 2009). De acordo com Campos (2006), os conselhos de saúde foram criados em cada uma das três instâncias de governo para atuar como mecanismo de controle social na instituição de um sistema de gestão compartilhada. Suas funções estão relacionadas ao poder de fiscalizar, acompanhar e a avaliar a gestão do sistema, cuja composição e funcionamento devem ser determinadas por normas nacionais, das quais a definição é de que a metade de seus membros 150 deve ser escolhida diretamente por usuários e a outra entre governantes, prestadores de serviços e trabalhadores de saúde. Na VIII Conferência Nacional de Saúde realizada em 1986 foi requisitada e defendida a inserção das deliberações dos conselhos no núcleo decisório das políticas, contudo embora existam afirmações sobre o caráter deliberativo dos conselhos a política de saúde é produzida de forma centralizada no Poder Executivo. A este poder caberia a proposição e apresentação aos conselhos, cuja função seria a „aprovação ou deliberação‟ das propostas assim colocadas (GUIZARDI et al., 2004). Não obstante embora tivessem criado milhares de conselhos com funções relevantes para o bom funcionamento da Administração Pública, terem realizado centenas de conferências e reuniões diversas sobre temas específicos na saúde percebe-se um grau importante de desligamento do movimento interno ao SUS em relação à sociedade que deveria representar, tal como a efetivação dos representantes dos usuários, evidenciada pela pequena taxa de renovação, onde as mesmas pessoas representam os mesmos segmentos há anos (CAMPOS, 2006). Conforme Campos (2006, p.435), “torna-se cada vez mais frequente a indicação de dirigentes do SUS principalmente em função de suas ligações orgânicas com partidos ou grupos políticos”. Analisando a problemática da interferência política partidária na indicação dos dirigentes e gestores nas diferentes esferas de comando único do SUS e em seus órgãos públicos vinculados, a escolha dos dirigentes poderia ser substituída por concursos seletivos específicos elaborados por instituições públicas universitárias neutras, que tivessem imparcialidade e isenção de conflitos de interesse. Desta forma, prevalecer-se-ia a defesa maior do interesse público e não os interesses antagônicos descompromissados de qualquer interesse social. Para Campos (2006, p. 435), “[...] a gestão do SUS ainda é excessivamente atravessada pela lógica partidária e pela racionalidade decorrente do simples jogo pela manutenção do poder”. Por outra vertente dessa análise, observa-se uma lacuna enorme entre o conhecimento da operacionalidade da Administração Pública com atividades vinculadas ao ensino e a pesquisa, sendo econômico, oportuno e conveniente aproveitar o próprio quadro técnico específico em parcerias interinstitucionais no aprimoramento das competências técnicas do corpo funcional, incluindo o treinamento em serviço de futuros gestores desse sistema de saúde, no lugar de „importação política‟ de agentes externos, os quais muitas vezes podem 151 não ter o mérito e capacidade técnica dos agentes operacionais que lidam mais diretamente com as questões prioritárias „efervescentes‟ da saúde pública. No aspecto do comportamento humano relacionado aos profissionais que atendem nos hospitais públicos, a espera parece ser organizada por triagem baseada em critérios subjetivos de avaliação desses profissionais que às vezes não consideram uma anamnese e um exame clínico bem apurados, passando a priorizar dores tradicionais de enfarte ou acidentes, e a subestimar qualquer problema diferente desses, os quais se tornam desclassificados de situações de urgência e emergência, desmerecendo nessa lógica desumanizada, a atenção devida daqueles profissionais de saúde. Percebe-se tal situação na passagem: entre as dores, uma é figura de exceção, pois é geralmente levada muito à sério pelos médicos, sobretudo se é recente: a „dor no peito‟.Ela confere ao paciente um valor mobilizador alto que se traduz por um atendimento rápido,pois pode ser o sinal de um enfarte que, entre os ditos „casos clínicos‟, é considerado como a emergência por excelência.Nos exemplos de emergências que dão os médicos, o enfarte é o único problema de saúde não decorrente de um trauma físico, sistematicamente citado ao lado dos acidentes.Assim, é considerado também pelos seguranças e atendentes de centrais.Segundo bombeiros que atuam na central do 193, o enfarte é o único „caso clínico‟ que resgatam sistematicamente, como o fazem com os problemas resultantes de acidentes, pois, como estes, é uma emergência (GIGLIOJACQUEMOT, 2005, p. 69). Por outro lado, o comportamento do paciente tende comumente a classificar sua dor como urgência e emergência para conseguir resgate, atendimento rápido e desviar-se das filas no SUS, assim como se observa a seguir: certos pacientes sabem do valor dado à „dor no peito‟ e assinalam quando querem a vinda do Regate ou de uma ambulância. É comum os solicitantes se referirem a esse sintoma no telefone, e os motoristas do 192 descobrirem, uma vez no lugar, que a pessoa a ser atendida nunca sentiu essa dor,mas está sofrendo de outra coisa, por exemplo, de coma alcoólico, para o qual se teme não conseguir a assistência da ajuda móvel de urgência.A mesma observação pode ser feita no pronto-socorro.A importância dada pela equipe médica à dor no peito é facilmente perceptível e certos pacientes se queixam desse sintoma no intuito de apressar o atendimento (GIGLIO-JACQUEMOT, 2005, p. 69). Os julgamentos negativos do SUS podem ser remetidos na literatura por algumas respostas que talvez possam designar o caos descrito pela quase grande maioria dos entrevistados, a saber: [...] não obstante todos esses valores, princípios, diretrizes e inovações, o SUS é apenas uma das respostas sociais aos problemas e necessidades de saúde. Outras respostas significativas dizem respeito às políticas econômicas, sociais, ambientais, culturais que incidem sobre determinantes e condicionantes de saúde. Apesar da existência do SUS, o sistema de saúde no Brasil ainda não é único, continua segmentado, tendo em vista o fortalecimento do Sistema de Assistência de Desembolso Direto (SDD), representado por consultórios, clínicas e hospitais particulares nos quais o pagamento é realizado após a prestação de serviços (PAIM, 2008, p.97). 152 Para Campos (2006, p. 425), “a descentralização supõe distribuição de poder e ampliação dos mecanismos de participação e de controle da sociedade sobre o Estado, sobre governos e sistemas públicos - um efeito desejado e buscado pelo espírito democrático”. Contudo, a descentralização que seria um modo de conseguir maior êxito de funcionalidade no SUS não atua na sua amplitude de ação, por que [...] esse é exatamente o caso da descentralização, que é um meio de conseguir que o SUS funcione com mais eficiência e eficácia. O critério para avaliar programas ou projetos não poderia ser, principalmente, sinal ou sintoma de que o sistema estaria funcionando de modo mais descentralizado. A avaliação deveria considerar centralmente a ampliação da capacidade de produzir saúde em função de novos arranjos descentralizados eventualmente adotados. Assim, a potência ou os limites dessa diretriz devem ser verificados mediante resultados sanitários e não apenas em função de sua capacidade de se produzir a si mesma; ou seja, descentralização (CAMPOS, 2006, p. 425). Para Campos (2006, p.420), “[...] optou-se por descentralizar para os municípios a responsabilidade pela organização e gestão dos sistemas locais de saúde”. De acordo com Santos e Andrade (2009), essa descentralização mesmo que 100% dos municípios e estados brasileiros cuidassem diretamente da saúde da população, seguem-se regras determinadas pelo Ministério da Saúde com pouca liberdade de gestão, com sinais de centralismo imposto pelo financiamento dos programas. Tal situação é corroborada por Campos (2006), ao passo que na descentralização de recursos federais para os demais entes federativos, pratica-se uma indução à gestão estadual e municipal, na medida em que a União condiciona o repasse de importante parcela de recursos à adesão ao planejado e definido no nível central. Para Montone (2009, p. 148), “a desconstrução do poder centralizado na Constituinte priorizou, num certo sentido, o combate ao seu autoritarismo, subordinando o sistema de gerenciamento ao processo de construção da cidadania por meio da saúde”. O municipalismo no Brasil foi um dos componentes do movimento que lutou pelo término da ditadura militar, fortalecido por reação de vários segmentos ao grau excessivo de centralização ocorrida durante o período ditatorial, onde o movimento democrático e o pensamento de esquerda incluíram a descentralização como elemento primordial à democratização do país (CAMPOS, 2006). Segundo Paim (2008), existem representações acerca do SUS que constituem interesses baseados na „indústria da saúde‟, em governos e corporações profissionais, além de ideais de mudança social. Dentre elas, o „SUS para pobres‟, resultado do modelo institucionalizado de saúde pública, de políticas específicas influenciadas por entes internacionais e de restrições à expansão do financiamento público. O „SUS real‟ formatado pelas políticas econômicas monetaristas e de ajuste macroestrutural, pelo clientelismo, 153 patrimonialismo e partidarização na saúde. O „SUS formal‟ de base normativa (Constituição de 1988, Leis nºs 8.080/1990, 8.142/1990, normas e pactos) e, finalmente o „SUS democrático‟ integrado a Reforma Sanitária Brasileira na sua dimensão institucional através da universalidade, equidade, humanização e qualificação da assistência. Tantas representações sobre o SUS que é complementado pelo setor privado trazem mais expectativas na concepção do „SUS democrático‟ para um atendimento humanizado e responsável, com mudanças no modelo assistencial médico hegemônico vigente, que traga à tona o compromisso para construção de um sistema unificado e integrado na perspectiva da linha do cuidado de modo que proporcione a resolutividade pelo projeto terapêutico personificado e não instrumentalizado, sem prejuízo às outras ações e serviços de atenção secundária e terciária. Existe um sistema contraditório de relações dos diferentes grupos sociais que constituem os perfis epidemiológicos de classe, ao passo que enquanto uns conseguem manter saúde beneficamente, outros vivenciam processos deletérios produtores de doenças. Este sistema de reprodução social dos diferentes grupos inclui os padrões de trabalho e consumo, as atividades práticas da vida cotidiana, as formas organizativas ou de participação social, a política e a cultura (BARATA, 2009). Dentro desse sistema de contradições, Bahia et al. (2008) referem pragmaticamente as assimetrias de acesso, as quais reiteram a segmentação do sistema de saúde brasileiro que se aplica aos SUS dependentes e SUS não dependentes. Desta forma, embora também exista a dicotomia entre os cidadãos “pagantes” e “não pagantes” de hospitais públicos esta divisão não deve ser um antônimo, por que [...] ambos referem-se a atendimentos remunerados. Na prática, “não pagante” quer dizer um menor valor de pagamento do procedimento-o valor pago pela Tabela do Ministério da Saúdee o vocábulo “pagante” significa que o atendimento será remunerado pela Tabela utilizada pelas empresas de planos e seguros de saúde (BAHIA et al., 2008, p.1389). Os serviços privados podem ser conveniados ao SUS e os leitos de hospitais públicos podem ser ocupados por clientela da saúde suplementar, e vice-versa.Os tipos de convênio relacionam-se à forma de remuneração de um determinado atendimento ou serviço prestado pelo estabelecimento de saúde, onde os convênios podem ser SUS, particular, plano de saúde público e plano de saúde privado (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2010a). Conforme Ceschin (2010), é importante rediscutir a percepção suplementar, complementar ou substitutiva da saúde suplementar, principalmente quanto ao anseio que o 154 consumidor tem sobre o caráter substitutivo da saúde suplementar em relação ao SUS, haja vista que não se contempla nesse impasse a integração entre a saúde suplementar e pública. O modelo de remuneração no sistema de saúde suplementar não é suportável, porque passou a ser baseado no consumo e quanto mais exames, procedimentos e internações se geram, mais o sistema, com exceção das operadoras, ganha. Há que se propor um novo modelo de remuneração da saúde suplementar, que recupere a remuneração dos honorários e serviços, tendo em vista o resultado e não o consumo de insumos, já que os recursos financeiros não são infinitos (CESCHIN, 2010). Dependendo da concepção adotada pelo usuário quanto à denominação da interface SUS e planos de saúde percebeu-se que os entrevistados designaram consensualmente um caráter predominantemente substitutivo da saúde suplementar em relação ao SUS, considerando que embora pudessem usar o SUS, e eventualmente o setor privado, na maior parte em referência ao direito de duplicidade de acesso em ambos os sistemas, a revelação foi amplamente generalizada para o foco da substituição por terem relatado maior frequência de acesso às ações e serviços de saúde privados. Na realidade dos SUS dependentes, a interface com o setor privado pode ser designada como complementar, porque existem serviços no SUS que são prestados à população por intermédio com o setor privado, como hemodiálise e diálise peritoneal no setor de alta complexidade, entre outros. Nesse contexto, para se entender melhor a extensão dos prejuízos ao SUS é preciso conhecer um pouco melhor outra característica do sistema de saúde brasileiro. Somos um país em que a saúde é um direito constitucional do cidadão e deve ser garantido pelo Estado de forma universal, integral e gratuita. Porém, a produção de serviços de saúde é majoritariamente privada, principalmente nos procedimentos hospitalares e de média e alta complexidade, ou seja, para atender gratuitamente o cidadão, o SUS tem serviços próprios, mas também contrata serviços privados. Ao ser internado para uma cirurgia, o cidadão pode estar usando um hospital público ou um hospital privado contratado pelo SUS. Esse hospital pode ser filantrópico, sem fins lucrativos, mas ainda assim privado (MONTONE, 2009, p.27). Para reforçar a complexidade da interface SUS e planos de saúde, verifica-se que um cidadão com direito ao SUS, como todo cidadão, “preferiu” comprar um plano ou seguro privado. Paga sua mensalidade e reclama todo mês que “ainda por cima tem que pagar imposto”. Por infelicidade, seu médico do plano descobre que ele tem um problema grave de insuficiência renal e que vai precisar de hemodiálise, um procedimento caro e que terá de ser realizado 2 a 3 vezes por semana pelo resto de sua vida ou até que consiga um transplante de rim.A hemodiálise não é coberta por seu plano de saúde.Então seu médico, que também é do SUS, faz um encaminhamento para hemodiálise numa clínica privada que tem convênio com o SUS, e então indica-se o tratamento, que é pago pelo SUS e continua sendo acompanhado por seu médico do plano de saúde, que também é do SUS (MONTONE, 2009, p. 29). 155 Tantas designações e rediscussões são factíveis, porque refletem a heterogeneidade da sociedade que avalia o que é melhor para si, o que é mais satisfatório e mais completo, trazendo o resultado pautado na qualidade do enfrentamento dos seus problemas de saúde. Porém, pode ocorrer a necessidade de ressarcir os cofres públicos perante o flagrante enriquecimento ilícito das operadoras quando têm seus beneficiários usando o SUS em serviços que estariam cobertos pelos seus planos de saúde. Torna-se, assim, imperiosa a atuação regulatória da ANS nesse sentido, independente da dualidade de cobertura pública e privada nortear a opção do usuário, o qual é livre para escolher o âmbito de seu tratamento de saúde em qualquer rede assistencial - seja quando concebe a saúde pública como um direito público- seja quando concebe a saúde suplementar como um direito privado. 156 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A percepção dos usuários de planos de saúde que, por inúmeras razões, optam por serem consumidores exclusivos da saúde suplementar permitiu a análise da efetividade do acesso aos produtos comercializados pelas operadoras, bem como da sua real disponibilidade aos usuários, expressando as facilidades e dificuldades verificadas, dentre outros aspectos, pelo tempo entre a solicitação médica e a marcação para realização do exame. A convivência ligada aos problemas de saúde aproximada da realidade social dos brasileiros usuários da saúde suplementar torna esses consumidores os mais aptos dentro de um certo grupo social homogêneo estudado a descreverem a percepção de acesso aos exames de alta complexidade diagnóstica e nível de satisfação voltados para a qualidade do atendimento contratado. As perspectivas dos 30 usuários entrevistados para análise do objeto de estudo podem ser tomadas como instrumentos regulatórios sentinelas, quando as experiências e vivências compartilhadas são explicitadas na sua magnitude de significados relevantes para a defesa do interesse público. Os achados decorrentes tanto do formulário, quanto das entrevistas permitiram reconhecer um cenário caracterizado por impressões e pensamentos coletivos dos entrevistados, os quais não podem ser generalizados através de relação causa-efeito na contemplação dos resultados. Assumem-se, portanto, inferências para o entendimento de um contexto compartilhado por um grupo homogêneo de beneficiários de planos de saúde, onde praticamente todos descreveram o acesso aos exames de alta complexidade como rápidos, fáceis e sem problemas, garantidos no sistema privado de saúde. O acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados, na perspectiva dos usuários, firma a eficácia descritiva pontual e temporal subjetiva do atendimento dos planos de saúde, que se traduz pela rápida liberação das autorizações dos planos de saúde para os exames de ressonância magnética, tomografia computadorizada e densitometria óssea, que foi inferior ao período normatizado recentemente pela ANS (Tabela 1, f. 64). Embora as autorizações prévias às requisições de exames e procedimentos não tenham previsão legal em normativo discriminado por número pela ANS, percebeu-se no contexto desta pesquisa uma diferenciação de tempos de validade dos pedidos médicos, quando 157 datados, variando em função da razão social da operadora, produto e segmentação dos planos de saúde contratados. A proposta de Resolução Normativa que tratará dentre outras peculiaridades sobre os prazos máximos de atendimento nos planos privados de saúde está sendo submetida à nova consulta pública nº 37/2011, com a participação da sociedade civil, destacando-se nesta atuação regulatória uma maior preocupação com a perspectiva do usuário que está mais próximo das condições de avaliadores, do que os demais entes regulatórios-prestadores de serviços e operadoras de planos privados de assistência à saúde. Nessa perspectiva, outros estudos seriam importantes para investigar as relações de negócios entre diversos atores da saúde suplementar, para aprimorar o processo regulatório equitativo de forma a ampliar seu escopo de atuação a todos os segmentos, sobretudo o social que tange ao bem maior coletivo, independente da rentabilidade e sustentabilidade a ser garantida do segmento privado ou pessoa jurídica de renome envolvida (tipo de operadora) ou produto do plano de saúde contratado. Como proposta, os prazos máximos de atendimento normatizados ineditamente em 2010 pela ANS, poderiam ser acrescentados como informações obrigatórias no manual de contratação de planos de saúde para que se intensificasse, através de maior disponibilidade de informação ao usuário, a mobilização deste ator social, que ao se sentir prejudicado passasse a procurar imediatamente o canal institucional de diálogo com o agente regulador. A mobilização social está relacionada ao conhecimento prévio da sociedade sobre as metodologias temáticas da saúde suplementar, diretamente ligada à transparência do órgão regulador, o qual deve estar disponível e preparado para receber a maior pressão de suas demandas, a partir da participação de todos os atores da saúde suplementar - operadoras, prestadores e usuários de planos de saúde. Para tanto, é fundamental ter transparência nessas metodologias para que a participação social se viabilize de fato, sendo a divulgação de critérios técnicos das consultas públicas permeáveis ao conhecimento da funcionalidade do sistema de saúde suplementar, garantindo a credibilidade desse sistema, através da participação equilibrada para negociação entre todos os atores descritos anteriormente. A consulta pública sobre prazos máximos de atendimento realizada pela ANS considerou, para elaboração de normativo disciplinador dessa matéria, somente a opinião das operadoras de planos de saúde. Antagonicamente, evocou-se uma contrariedade do segmento médico de prestadores de serviços pelos conselhos federais corporativos a tais prazos de atendimento, principalmente pela questão da baixa remuneração dos honorários médicos na saúde suplementar, que estaria motivando o descredenciamento de alguns prestadores e, 158 consequentemente, aumentando a demanda de atendimentos para os credenciados remanescentes em prazos de tempo de atendimento inexequíveis. Convém aqui refletir se a não datação dos pedidos por alguns médicos observada neste estudo estaria relacionada à convicção desses profissionais de que as operadoras demorariam um tempo demasiadamente longo para liberar as autorizações para a realização de consultas, exames e procedimentos ou se estaria relacionada ao temor médico de superlotação de suas agendas, considerando a baixa remuneração dos seus honorários. Nessa discussão de interesses antagônicos, o ente que menos se percebe manifestar são os usuários de planos de saúde, porque comumente presume-se que desconhecem seus direitos contratuais e normativos regulatórios. A partir da observação não sistemática realizada durante a coleta de dados percebeu-se que os atendentes do laboratório de medicina diagnóstica estudado tinham manuais de regras de operação digitalizados nos sistemas computacionais, no que se refere à contratualização, possivelmente para os 60 planos de saúdes credenciados, incluindo os diferentes prazos de validade das requisições médicas por razão social da operadora de plano de saúde e produtos dos segmentos contratados. Embora o acesso aos exames de imagem de alto custo tenha sido descrito como rápido pelos sujeitos deste estudo, não se pode afirmar que todos os produtos de planos de saúde funcionam dessa maneira. A maioria dos sujeitos estudados encontra-se muito satisfeita com os planos de saúde, avaliando-o como bom, excelente, ótimo e necessário. Poucos entrevistados relataram ter vontade de migrar para um outro plano de saúde ou para o SUS. A saúde é tratada consensualmente considerando pelo menos uma característica em comum entre indivíduos de um grupo. O grupo de beneficiários ou usuários de planos de saúde traz imediatamente a ideia e requisito de inclusão de sujeitos pesquisados que todos os indivíduos entrevistados deste grupo apresentem vínculo com a assistência à saúde privada. Porém, não somente esta característica pode ser considerada determinante para traçar a opinião do grupo de usuários de planos de saúde sobre o acesso descritivo aos exames mais caros, pois existem diferenças no poder aquisitivo para determinado produto contratado nesses planos, os quais podem ser piores, ou melhores. Piores diferenças de um plano de saúde para outro podem significar uma rede própria ou credenciada de prestadores com número insuficiente, lentidão nas autorizações para consultas, procedimentos e exames, demora no atendimento, falta de conforto, grande distância geográfica, entre outras desvantagens. E melhores diferenças dentre eles significando o oposto, sobretudo representando fartura de prestadores, várias opções de escolha, e com acesso rápido. A 159 satisfação do beneficiário de plano privado de saúde traz analogia com a melhor experiência do uso de um serviço, portanto sua vivência certamente definirá sua posição pelo que experimentou de melhor, não podendo ser uma opinião generalizada para todos os usuários de planos de saúde, considerando que existem aqueles com padrões de vida e de trabalho diferenciados e, às vezes, antagônicos, condicionados aos que podem ter ou àqueles que se oneram mais para ter determinado plano, o qual pode apresentar produtos dos níveis básico ao standard, dentro de uma mesma operadora. Usuários de categorias básicas de rede de prestadores de serviços privados de saúde podem não contemplar a mesma opinião, quando comparados àqueles que dispõem de uma categoria melhor, como standard, executivo, especial, entre outras consideradas topes de linhas que aportam oferta maior de prestadores, equipamentos e conforto. A maior parte dos entrevistados afirmou que não utilizaria os serviços do SUS, mesmo que esses fossem acessíveis e qualitativamente bons. Isto porque a avaliação do SUS, a priori, apresenta-se negativa no grupo estudado, pautada em relatos de insucesso de utilização do SUS por terceiros, que não têm acesso aos planos de saúde. Um segundo elemento determinante desta avaliação negativa eram impressões reveladas pela insatisfação proveniente da vivência testemunhada por empregados que usavam o SUS, onde se retratavam experiências compartilhadas de marcações tardias para exames, consultas e internações, falta de especialidades médicas, imagens de longas filas divulgadas pela mídia e meios de comunicação em massa, entre outras dificuldades como infraestrutura precária, má gestão de recursos financeiros, humanos e materiais. Os exames eletivos foram autorizados num tempo subjetivo considerado rápido para os entrevistados, da mesma forma que os de urgência e emergência. Analisando esses procedimentos no SUS muitos sujeitos disseram que para marcar demora, no dia do exame demora e para pegar o resultado pronto também demora, sendo verificado o oposto nos planos de saúde, na opinião dos entrevistados nesta pesquisa. Reitera-se que a característica de atendimento contratado no plano de saúde varia e a percepção do usuário também pode variar, conforme o produto seja melhor ou pior, principalmente em relação à rede credenciada que pode ter ampla cobertura de prestadores de serviços, inclusive interferindo na velocidade de autorizações prévias dos exames de alta complexidade em questão. Foi percebido que quase todos os entrevistados não leem as guias de confirmação de comparecimento dos seus exames, o que aponta um descuido grave dos beneficiários que podem estar autorizando análises de despesas médicas em seus prontuários clínicos, 160 fornecendo dados sigilosos às operadoras que podem traçar perfil de morbidade para dificultarem, e até mesmo negarem, coberturas para exames, consultas e até internações. Resta uma análise documental apurada dessas guias em outros estudos para melhor conhecimento da situação e fortalecimento da regulação da saúde suplementar. Após a análise dos dados verbais dessa pesquisa, verificou-se que os usuários de plano de saúde declararam que o acesso é garantido com facilidade para os exames de alta complexidade, após terem experimentado vivências de atendimento com rapidez e ausência de problemas para o laboratório de medicina diagnóstica credenciado aos planos de saúde contratados. Suas principais motivações para a realização desses exames na rede privada de assistência à saúde foram confirmadas nos relatos pela rapidez de atendimento, facilidade de marcação pela internet, telefone e pessoalmente no laboratório, dificuldade e morosidade do atendimento do SUS, localização próxima de bairros residenciais ou do trabalho e possibilidade de escolha pelo usuário entre as modalidades abertas e fechadas de ressonâncias magnética e tomografia computadorizada, além da densitometria óssea. O nível de satisfação foi correspondido com a realização dos exames prescritos, reiterando o pronto atendimento destes em caráter eletivo e de urgência, quase equiparados na escala de tempo descrito. Contudo, cabe ressaltar que embora as notas de avaliação dos usuários aos seus planos de saúde tenham variado, localizando-se majoritariamente no intervalo de sete a dez, acrescida da avaliação positiva, de um modo geral, foram abordados problemas de barreiras de acesso, em face às distorções regulatórias de medidas de controle de acesso exercidas pelas operadoras. Essas medidas de controle podem ser exemplificadas como supostos prazos de validade aos pedidos médicos com data e condutas inadequadas de alguns prestadores médicos, que deixam de datar os pedidos de exames, deixando tal tarefa a encargo das atendentes de laboratório credenciado do plano de saúde, para o próprio paciente ou até mesmo a operadora, mascarando o prazo máximo de tempo para o atendimento real das demandas. Letras pequenas nas declarações de confirmação de atendimento ou procedimento, emitidas pela operadora podem estar correlacionadas ao hábito já conhecido da não leitura pelos usuários dos planos de saúde durante o preenchimento das guias de confirmação de atendimento, em convergência com outras medidas de controle de acesso aos serviços privados, tais como solicitações de senhas de autorização pelas operadoras. Procedimentos burocratizados dificultam o acesso para tratamentos como implantes, fisioterapia, RPG, pilates, home care; reembolsos parciais ou quando são negados; restrição de materiais cirúrgicos, em especial as próteses e órteses, e restrições de graus específicos para cirurgias de miopia. 161 A oferta dos serviços de saúde é diferenciada por particularidades, principalmente devido à heterogeneidade dos serviços, recursos oferecidos pelo provedor, preferências do consumidor, renda financeira maior ou menor, entre outras especificidades. A oferta pelo provedor passa a ter grande poder de mercado para servir a um produto altamente especializado e a saúde é esse produto especializado na estrutura do mercado da saúde suplementar, pois diferente da educação, em que se espera a satisfação do sujeito na trajetória escolar e acadêmica com a aquisição de um bom emprego e auto-realização profissional; espera-se que a saúde seja um bem público insaciável devido à demanda por este bem ser presumidamente maior, já que a necessidade fisiológica alterada requer reparação imediata. Enquanto a educação pode ser satisfeita individualmente em diferentes níveis escolares, dependendo do desejo e mérito de cada um, e não somente a partir da oferta do Estado ou sociedade perante as boas oportunidades sócio, econômica e políticas para aperfeiçoamento educacional, é pertinente pensar que a saúde não pode adquirir o mesmo grau de satisfação, considerando as colocações anteriores. A atenção centrada no cuidado reflete melhores diferenças na qualidade da assistência prestada. No âmbito da saúde suplementar algumas iniciativas que podem evidenciar um certo tipo de cuidado, tal como práticas de programas de promoção e prevenção para fortalecimento da saúde de beneficiários ainda não são suficientes para desvincular-se do modelo assistencial biomédico centrado em procedimentos. O enfoque do modelo de atenção centrada no cuidado, formas de prevenção e promoção à saúde continuam sendo os pilares norteadores para rediscussão do modelo biomédico hospitalocêntrico centrado no procedimento. Entretanto, “a baixa efetividade da atenção básica leva à sobrecarga das demais instâncias, com aumento da tensão entre os níveis de complexidade da atenção, implicando a persistência de mecanismos de seletividade e iniquidade social” (PAIM, 2008, p.99). As formas estatais e privadas de assistência à saúde participam do Sistema Nacional de Atenção à Saúde, segmentado pela diferença entre a atuação estatal que representa a saúde como um bem público e gratuito; e pelo mercado de planos e seguros privados regulados pelo Estado como um bem adquirido. Resta ainda a comprovação da necessidade de ambos para consolidar os direitos à saúde com qualidade ou se somente o SUS resolveria os problemas apresentados sem interdependência com o sistema privado. De certa forma, para os sujeitos do estudo a imagem traduzida nos relatos implica na percepção substitutiva do SUS pela da saúde suplementar, haja vista a sensação manifesta de maior segurança advinda da cobertura pelos planos de saúde. Ocorre que a saúde suplementar 162 não contempla a diretriz de direito à universalidade da assistência à saúde, da mesma forma que no SUS. Práticas de mercado não têm a responsabilidade legal de garantir a universalidade das ações e serviços de saúde como exigência proveniente de direito fundamental previsto na constituição brasileira. Portanto, como não há estratificação de atendimento na saúde suplementar, não há atenção primária de forma organizada e articulada a ponto de garantir a universalidade, equidade e integralidade do acesso a todas as ações e serviços de saúde nesse setor. Embora existam programas de promoção e prevenção, assim como a oferta de programas de atenção domiciliar como opção contratual por algumas operadoras de planos de saúde, tais iniciativas não caracterizam uma categoria de atenção primária na saúde suplementar, porque a lógica é de mercado. Por outro lado, sabe-se também que o SUS não é provedor suficiente de todas as ações e serviços de saúde, de forma a garantir a equidade e integralidade do acesso na sua práxis resolutiva a todas às demandas espontâneas e as de urgência e emergência. Os serviços de nefrologia no setor de alta complexidade tecnológica no SUS é um exemplo claro da necessidade da complementaridade pelo setor privado, seja em hospital público ou privado conveniado ao SUS, assim como no segmento ambulatorial de clínicas privadas de diálise. Como destaque deste estudo, menciona-se a contribuição dos seus resultados para as tarefas inerentes às atribuições regulatórias da ANS, destacando a regulação como política pública, integrando a inserção da saúde suplementar na política nacional de saúde, intensificando as ações regulatórias sobre a rede e utilização de serviços de natureza privada. Uma importante iniciativa seria aproximar os conhecimentos da área de saúde suplementar na educação de nível superior para os alunos que ingressam no vestibular nas carreiras de Enfermagem, Medicina, Odontologia, Nutrição, Serviço Social, Psicologia, Fisioterapia, Farmácia, principalmente para as carreiras da saúde que não dispõem nos seus currículos de disciplinas específicas da saúde suplementar, que poderiam ensinar os ditames da regulação e importância do papel do Estado na fiscalização dos serviços de saúde suplementar prestados à população brasileira, onerada com gastos extras na saúde, educação e segurança. Uma outra iniciativa positiva para o desenvolvimento de pesquisas na saúde suplementar seria oferecer programas de treinamento em serviço, como residência ou estágio trainee para desenvolvimento profissional em saúde suplementar, em parceria com universidades públicas, com vistas ao desenvolvimento de propostas para novas estratégias de atuação, no cumprimento da missão da ANS. Como efeito benéfico dessas iniciativas, é 163 promissor o aperfeiçoamento na capacitação técnica do próprio quadro de servidores da agência, em sinergismo com futuros profissionais em fase de treinamento, que tivessem motivação pela pesquisa direcionada à pauta da regulação pública em saúde. Da mesma forma para as carreiras das ciências exatas e humanas, focando também aspectos da regulação econômica e assistencial das operadoras de planos privados de assistência à saúde. Aproximar-se das pesquisas acadêmicas e de pós-graduação pouparia gastos públicos da ANS com consultorias externas pagas, aproveitando o vínculo com universidades renomadas, como a UERJ, Universidade Federal Fluminense (UFF), UFRJ, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET), Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE), entre outras dos demais Estados do Brasil. Não somente no Rio de Janeiro, onde se encontra a sede da ANS, mas as pesquisas universitárias em sinergismo com a ANS seriam de extrema importância para ações regulatórias que equilibrem os conflitos entre prestadores de serviços, consumidores e operadoras de planos privados de assistência à saúde. Desta forma, muitas implicações positivas podem ser resultantes deste trabalho, incentivando futuros alunos formandos a ingressarem na carreira pública de regulação fiscalizatória dos planos de saúde. Assim, somando forças com a ANS no cumprimento de sua missão institucional de defender os interesses públicos dos interesses privados abusivos, globalizantes e excludentes da contemporaneidade. 164 REFERÊNCIAS ACESSO. In: LAROUSSE, Pierre. Dicionário enciclopédico ilustrado Larrousse. São Paulo: Larrousse, 2007. p. 41. ACURSIO, Francisco de Assis; GUIMARÃES, Mark Drew Crosland. Acessibilidade de indivíduos infectados pelo HIV aos serviços de saúde: uma revisão de literatura. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.12, n.2, p.233-242, abr./jun. 1996. AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR (Brasil). Caderno de Informação da Saúde Suplementar: beneficiários, operadoras e planos. Rio de Janeiro: ANS, 2010a. 60p. ______. Consumidores: planos novos, planos antigos. Disponível em: <http://www.ans.gov.br/main.jsp?lumPageId=8A9588D425C1ACB20125DA8FDC847E8F& lumItemId=8A9588D425E4D53D0125FAF6C47E1A30>.Acesso em: 06 nov. 2010b. ______. 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A participação nesta pesquisa não interferirá no atendimento recebido por você nos serviços de saúde, não causará desconfortos, não custará nada para você. Você poderá solicitar qualquer esclarecimento quando sentir necessidade e poderá interromper sua participação na pesquisa a qualquer momento. Tudo o que você informar será respeitosamente utilizado apenas para a realização de um trabalho científico, sem a identificação do seu nome e será mantido o sigilo das informações dadas por você. Sua participação é de fundamental importância para a realização deste estudo, de forma a buscar a melhoria dos serviços oferecidos pelos planos de saúde privados. Desde já agradeço a sua colaboração. Rio de Janeiro, _____ /____/_____. ______________________________________ Nádia Regina da Silva Pinto Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Eu, ______________________________________concordo em participar da pesquisa intitulada“ O acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários”, e autorizo o registro das informações prestadas por mim, em forma escrita e oral, para que sejam utilizadas integralmente ou em partes, a qualquer tempo, a partir da presente data. Da mesma forma, autorizo que as informações dadas por mim sejam usadas por outros pesquisadores, ficando o controle e a guarda dos formulários e relatos da entrevista sob a responsabilidade de Nádia Regina da Silva Pinto, aluna do programa de Pós-graduação da Faculdade de Enfermagem da UERJ, sob orientação da Prof.ª Dra.Denize Cristina de Oliveira. Rio de Janeiro, ______/______/______. ______________________________ Assinatura do entrevistado Telefone de contato: 55-021-2587-6335 / 55-021-2568-8175/55 -021-9216-5738-Nádia Regina da Silva Pinto Endereço de contato: Boulevard 28 de Setembro, 157, 7º andar, Vila Isabel, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, CEP: 20551-030/ e-mail: [email protected] “Caso você tenha dificuldade em entrar em contato com o pesquisador responsável, comunique o fato à Comissão de Ética em pesquisa da UERJ: Rua São Francisco Xavier, 524, sala 3020, bloco E, 3º andar, Maracanã, Rio de Janeiro, RJ, e-mail: [email protected]: (021)2334-2180.” 177 APÊNDICE B – Formulário de caracterização socioeconômica dos usuários de planos privados da assistência à saúde e dos exames de alta complexidade prescritos 178 APÊNDICE C – Roteiro de entrevista estruturada Tema 1: Acesso aos exames de alta complexidade Como você percebe o acesso aos exames diagnósticos sofisticados mais caros no seu plano de saúde? A rede credenciada do seu plano oferta o serviço que procura em quantidade e qualidade que lhe permita escolher entre opções para mais de um prestador (laboratório)? Quais barreiras de acesso você tem enfrentado para realizar esses exames? Quais facilidades de acesso você tem encontrado para usufruir desses exames? Tem algum relato de experiência prévia bem sucedida para obter tais exames?Qual? Seu pedido médico tinha data?No caso de não ter data a que você atribui a inexistência deste dado pelo prestador médico assistente conveniado a seu plano? Quanto tempo (dias ou meses) você levou para agendar seu exame? Por quê? Quanto tempo (dias ou meses) seu plano levou para liberar a autorização para realizar seu exame? Quantas guias (documentos emitidos e timbrados da operadora) de confirmação de comparecimento você assinou com a atendente do laboratório antes da realização do seu exame?Lembra se em alguma delas havia solicitação de autorização por parte da operadora auditar seu prontuário clínico? Após autorização do seu plano você esperou quanto tempo aproximadamente na sala de espera antes do exame? Tema 2: Conhecimentos adquiridos sobre os direitos associados à contratação individual/familiar, coletivo sem patrocinador ou coletivo com patrocinador Quais conhecimentos você tem sobre seus direitos contratados com seu plano de saúde? Quais fontes de informação você utiliza para consulta ou reclamação, em caso de se sentir tolhido de algum desses direitos contratados com sua operadora de plano de saúde? 179 Tema 3: Motivações para a realização de exames de alta complexidade na rede privada de assistência em detrimento ao uso de serviços desta natureza no SUS Quais suas motivações para a realização de exames de alta complexidade através da rede privada de assistência ao invés do SUS? Tema 4: Nível de satisfação do usuário acerca do plano de saúde Você está satisfeito com seu plano de saúde? Em uma escala de zero a dez que nota você daria para seu plano de saúde como um todo?Por quê? Você migraria para outro plano de saúde? Você desistiria de seu plano de saúde se em dada situação hipotética no SUS você tivesse garantia de qualidade no atendimento, porém sem luxo nem comodidades extras(sem apartamento com acompanhante,p.ex.), mas nos ambulatórios existindo atendimento competente(com fila de espera razoável)? Quais suas aspirações positivas e negativas do seu plano de saúde e no SUS? 180 APÊNDICE D - Resultados de entrevista individual estruturada da pesquisa Quadro 2 - Categorias e pré-categorias com temas de significação da pesquisa 181 APÊNDICE E - Resultados de entrevista individual estruturada da pesquisa categorias 1.0, 2.0 e 3.0 Quadro 3 - Categorias 1.0, 2.0 e 3.0 da pesquisa 182 APÊNDICE F - Resultados de entrevista individual estruturada da pesquisa categorias 4.0 e 5.0 Quadro 4 - Categorias 4.0 e 5.0 da pesquisa 183 APÊNDICE G - Pré-categorias de entrevista individual estruturada da pesquisa Quadro 5 - Pré-categorias da pesquisa 184 APÊNDICE H – Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados para análise do acesso aos exames de alta complexidade nos planos de saúde privados na perspectiva dos usuários Quadro 6 - Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados da pesquisa (continua) 185 Quadro 6 - Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados da pesquisa (continuação) 186 Quadro 6 - Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados da pesquisa (continuação) 187 Quadro 6 - Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados da pesquisa (continuação) 188 Quadro 6 - Dicionário de significações padronizadas das falas dos sujeitos entrevistados da pesquisa (conclusão) 189 ANEXO – Proposta de Resolução Normativa da ANS sobre a garantia de atendimento dos beneficiários de plano privado de assistência à saúde RESOLUÇÃO NORMATIVA - RN EM FASE DE CONSULTA PÚBLICA. Dispõe sobre a garantia de atendimento dos beneficiários de plano privado de assistência à saúde. A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelos arts. 4º, incisos II, XXIV, XXVIII e XXXVII, e 10, inciso II, da Lei nº 9.961, de 28 de janeiro de 2000; pelo art. 9º, inciso III, do Anexo I ao Decreto nº 3.327, de 5 de janeiro de 2000;e pelo art. 86, inciso II, alínea “a”, da Resolução Normativa - RN nº 197, de 16 de julho de 2009; em reunião realizada em XX de XX de XXXX adota a seguinte resolução normativa e eu, Diretor Presidente,determino a sua publicação. CAPÍTULO I DA DISPOSIÇÃO PRELIMINAR Art. 1º Esta Resolução Normativa dispõe sobre a garantia de atendimento dos beneficiários de plano privado de assistência à saúde. CAPÍTULO II DAS GARANTIAS DE ATENDIMENTO AO BENEFICIÁRIO Art. 2º A operadora deverá garantir a existência de prestadores para os serviços ou procedimentos definidos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS para atendimento integral das coberturas previstas nos arts. 10, 10-A e 12 da Lei n° 9.656, de 3 de junho de 1998, no município onde o beneficiário os demandar, desde que sejam integrantes da área de atuação do plano. Art. 3º A operadora deverá garantir o atendimento integral das coberturas referidas no artigo 2º nos seguintes prazos máximos: I – consulta básica - pediatria, clínica médica, cirurgia geral, ginecologia e obstetrícia, cardiologia e ortopedia e traumatologia: 7 (sete) dias úteis; II – consulta nas demais especialidades médicas: 14 (quatorze) dias úteis; III – consulta de fonoaudiologia: 10 (dez) dias úteis; IV – consulta de nutrição: 10 (dez) dias úteis; V – consulta de psicologia: 10 (dez) dias úteis; VI – sessão de terapia ocupacional: 10 (dez) dias úteis; VII – sessão de fisioterapia: 10 (dez) dias úteis; VIII – serviços de diagnóstico por laboratório clínico e radiografias: 3 (três) dias úteis; 190 IX – serviços de diagnóstico por imagem, exceto radiografias: 10 (dez) dias úteis; X – procedimentos de alta complexidade (PAC): 21 (vinte e um) dias úteis; XI – internações eletivas: 21 (vinte e um) dias úteis; XII – urgência e emergência: imediato; e XIII – consulta de odontologia: 7 (sete) dia úteis. § 1º Os prazos máximos para atendimento consistem no período compreendido entre a data da demanda do beneficiário pelo serviço ou procedimento e a data de sua efetiva realização. § 2º As radiografias e os procedimentos de alta complexidade de que tratam os incisos VIII e X são aqueles elencados no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS. § 3º Os procedimentos que se enquadram nos incisos VIII e IX e estão classificados no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS como procedimentos de alta complexidade obedecem ao prazo definido no item X. Art. 4º Na hipótese de ausência ou inexistência de prestador credenciado, que ofereça o serviço ou procedimento no município pertencente à área geográfica de abrangência do plano, a operadora deverá garantir o atendimento em prestador não credenciado no mesmo município. § 1º O pagamento do serviço ou procedimento realizado pelo prestador não credenciado será efetuado diretamente pela operadora. § 2º O disposto no caput e no § 1º se aplica ao serviço de urgência e emergência, sem necessidade de autorização prévia. Art. 5º Na hipótese de ausência ou inexistência de prestador credenciado ou não, que ofereça o serviço ou procedimento demandado no mesmo município pertencente à área geográfica de abrangência do plano, a operadora deverá garantir o transporte do beneficiário até o prestador credenciado para o atendimento, assim como seu retorno à localidade de origem. § 1º O disposto no caput não se aplica aos serviços ou procedimentos previstos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS que contenham diretrizes de utilização que desobriguem a cobertura de remoção ou transporte. § 2º O disposto no caput se aplica ao serviço de urgência e emergência, sem necessidade de autorização prévia. Art. 6º Se o beneficiário for obrigado a pagar os custos do atendimento, na hipótese de descumprimento do disposto nos arts. 4º e 5º, a operadora deverá reembolsá-lo integralmente pelo serviço ou procedimento prestado no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contado da data da solicitação de reembolso. 191 CAPÍTULO III DAS DISPOSIÇÕES FINAIS Art. 7º A autorização para realização do serviço ou procedimento, quando necessária, deverá ocorrer de forma a viabilizar o cumprimento do disposto no art. 3º. Art. 8º A operadora deverá informar no Planejamento Assistencial do Produto, de que trata art. 7º-A da Instrução Normativa – IN nº 23, de 1º de dezembro de 2009, e suas alterações posteriores, da Diretoria de Normas e Habilitação dos Produtos – DIPRO, os prazos máximos para atendimento, que não poderão ser superiores aos previstos no art. 3º. Art. 9º O descumprimento do disposto nesta Resolução sujeitará a operadora às sanções administrativas cabíveis previstas na regulamentação em vigor. Art. 10. Ficam revogados os §§ 1º ao 5º do art. 7º da IN nº 23, de 1º de dezembro de 2009, da DIPRO. Art. 11. Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação. MAURICIO CESCHIN Diretor-Presidente