Conferência: Diversidade como princípio educativo: questões conceituais Conferencistas: Profa. Dra. Geovana Mendonça Lunardi Mendes – PPGE/FAED/UDESC Diferença/diversidade/deficiênci a: do que estamos falando? São conceitos relacionais, só podem ser definidos em relação e pelos seus opostos: Diferença-igualdade Diversidade-uniformidade Diferenciação -homogeneização Conceitos difusos,imprecisos, dada à sobrecarga semântica que lhe atribuímos. Originam discursos confusos e contraditórios do ponto de vista epistemológico que se projeta nas decisões a tomar sobre os objetivos, conteúdos dos currículos, nas instituições escolares e nas políticas educativas. Servem para várias políticas. No plano teórico e na investigação educacional, pode ser lido e apropriado de diversas formas. Diferença: Diferença e igualdade são questões a muito tempo enfrentadas pelas diversas áreas do conhecimento. Tanto os estudos antropológicos, como sociológicos e psicológicos tem buscado sistematicamente explicar como socialmente o homem tem lidado em seu processo de constituição, com essas questões. Igualdade e diferença são constructos sociais. Afirmar isso significa dizer que aquilo que foi sendo definido na sociedade como igualdade ou diferença, só tem sentido e só pode ser compreendido na vida social. Diferença: No conceito de Goffman (1988) a diferença é um conceito que só pode ser definido na relação com o outro. Para se definir o que é diferente temos que definir o que é igual. O sujeito só se constitui como singular na relação com o outro, em relação ao outro e na relação do outro. Ser reconhecido pelo outro é ser constituído como sujeito pelo e com o outro, na medida em que o outro reconhece o sujeito como diferente e o sujeito reconhece o outro como diferente. Se por um lado temos a tendência a reificar os comportamentos das crianças em traços de caráter ou de personalidade, a sociologia deve lembrar, por outro, que esses traços não aparecem em um vazio de relações sociais: são, sim, o produto de uma socialização passada, e também da forma das relações sociais através das quais estes traços se atualizam, são mobilizados. Como explica François Roustang: diríamos, por exemplo, que alguém é dependente, hostil, louco, meticuloso, ansioso, exibicionista etc. No entanto como observa Bateson, esses adjetivos, que deveriam descrever seu caráter, não são aplicáveis de forma alguma ao indivíduo, mas as transações entre ele e seu meio, material e humano. Ninguém é esperto, ou dependente ou fatalista no vazio. Cada traço que atribuímos ao individuo não é seu, mas corresponde mais ao que acontece entre ele e alguma outra coisa( ou alguma outra pessoa). (Lahire, 1997, p.18) Diferença Lógica homogeneizadora internalizada Disposição psíquica para lidar com a diferença. Genipocaca Tumberande Cladiospaco Operações Mentais Estranhamento/desconforto Associação a sentimentos negativos Busca de semelhança com experiências anteriores. Categorização: Incluir em categorias já consolidadas. Lidar a partir da categoria definida. Formas de lidar com a diferença: “ Los discursos médico-psiquiátricos están ahí, entre otras cosas, para que la locura no inquiete a la razón, para darnos la seguridad de que nosotros no estamos locos, para que la locura sea siempre la de los otros, la que ya ha sido capturada por nuestros saberes y nuestras prácticas, la que ya no tiene nada que decir-nos. Los discursos psicopedagógicos están ahí para que la infancia no inquiete a la madurez, para que tengamos la certeza de que nosotros ya no somos niños, para que la infancia no ponga en cuestión lo que somos. Desde ese punto de vista, quizá entonces los discursos multiculturales estén ahí para dar un sentido confortable a nuestra relación con los extranjeros, para que lo extraño no inquiete lo propio, para que no nos extrañemos de nosotros mismos y para que, en el encuentro con el extranjero, no aprendamos que, en realidad, nosotros también somos extranjeros”.(Jorge Larrosa) Formas de lidar com a diferença: Idéia da tolerância Discursos sobre a igualdade Identidade: essência, natureza… não temos natureza nenhuma… “É fácil ser tolerante… Díficil é ser solidário. Díficil é ser “os outros””.Mia Couto. Deficiência Marca distintiva forte, qualificada como intrinsícamente negativa. “Objetivamente, só se pode definir variedades ou diferenças, sem valor vital positivo ou negativo”( p.186). Mesmo no caso de diferenças significativas como as chamadas “deficiências”, não poderíamos destacar um valor negativo intrínseco. Conforme aponta Canguilhem(1995, p.186) “não há patologia objetiva”, ou ainda na perspectiva Vigotskiana(1998), não é o defeito em si que define os caminhos do sujeito, mas as conseqüências sociais dele decorrentes. “a deficiência não é uma questão biológica mas sim uma retórica cultural”(Skliar). “Diversidade é, para a educação, uma narrativa,no sentido de que forma, em torno de si própria, um enfoque para a educação, um modo que permite a sua análise, entender os seus propósitos, abordar os conteúdos curriculares, os métodos pedagógicos, a organização das instituições e a estrutura dos sistemas educativos. Uma narrativa que tem de sintetizar, por um lado, os imperativos éticos da individualização e, por outro, a necessidade de congregar os indivíduos numa rede de interdependências cognitivas, de projectos e de sentimentos que dêem origem a uma comunidade.”(Gimeno Sacristán,2003,p.292,) Discursos sobre a diversidade: Na narrativa da diversidade reina a ambivalência. Homogeneização dos sentidos: deficiência, desigualdade, diferença. Diversidade: retórica que incorpora todos esses discursos Programa defendido pela ótica liberal e democrática. Racionalidade da modernidade lidou com a diversidade de duas formas básicas: exercendo a pressão para tornar o diferente igual, e segregando o que não é normal Escola necessária: • Dar ao mundo ao invés da Nação . Diversificar o que foi normalizado (Conhecimentos e modelos de escolas) • Juntar o que foi separado – Cidade Educadora/Escola expandida/ Desmaterialização das escolas A todos aqueles que hoje atribuem a constituição de bandos unicamente ao fenômeno dos subúrbios, digo: sim, têm razão, sim, o desemprego, sim, a concentração dos excluídos, sim, os reagrupamentos étnicos, sim, a tirania das marcas, a família monoparental, sim, o desenvolvimento de uma economia paralela e os tráficos de toda a ordem, sim, sim, sim... Mas evitemos subestimar a única coisa sobre a qual podemos agir pessoalmente e que, essa, data da noite dos tempos pedagógicos: a solidão e a vergonha do aluno que não compreende, perdido num mundo em que todos os outros compreendem. Só nós podemos tirá-lo dessa prisão, tenhamos ou não formação para o fazer. Os professores que me salvaram – e que fizeram de mim um professor – não tinham recebido nenhuma formação para esse fim. Não se preocuparam com as origens da minha incapacidade escolar. Não perderam tempo a procurar as causas nem tampouco a ralhar comigo. Eram adultos confrontados com adolescentes em perigo. Pensaram que era urgente. Mergulharam de cabeça. Não me apanharam. Mergulharam de novo, dia após dia, mais e mais... Acabaram por me pescar. E muitos outros como eu. Repescaram-nos, literalmente. Devemos-lhes a vida (Pennac, 2010, p. 15). - Não tenho medo. - Não tens medo? - Não. - Não tens medo de não chegar lá? - Não, estou-me nas tintas.. - Como? - Não me interessa, não me importo! - Não te importas de não chegar lá? - Não me importo com isso, é tudo. - E és capaz de escrever no quadro? - O quê, que não me importo com isso? - Sim. Não me impor tucom isso. - O que escreveste foi o verbo impor no infinitivo e não importar no presente. Não me importo com isso. - Bem, e esse "com isso", o que é precisamente esse "isso"? - ... - Esse "isso", o que é? - Não sei... é tudo isso! - Tudo isso o quê? - Tudo o que me aborrece. Passagem do livro "Mágoas da escola", de Daniel Pennac.