IOSE LUCIANE MACHADO CORRÊA A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO POR OMISSÃO CANOAS, 2007 1 IOSE LUCIANE MACHADO CORRÊA A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO POR OMISSÃO Trabalho de conclusão apresentado para a banca examinadora do curso de Direito do Centro Universitário La Salle - UNILASALLE, como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob Orientação da Professora Dra. Ângela Molin. CANOAS, 2007 TERMO DE APROVAÇÃO IOSE LUCIANE MACHADO CORRÊA A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO POR OMISSÃO Trabalho de conclusão aprovado como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito do Centro Universitário La Salle – UNILASALLE, pela seguinte banca examinadora: Professora Doutora Ângela Molin Centro Universitário La Salle Professor Mestre Darcy Paulo Gonzales de Moraes Centro Universitário La Salle Professor Doutor Luiz Gonzaga Silva Adolfo Centro Universitário La Salle Canoas, 06 de julho de 2007. 6 RESUMO O presente trabalho objetiva apresentar à discussão, na seara da responsabilidade civil extracontratual do Estado por omissão, as modalidades de omissão genérica a específica, trazendo elementos suficientes para estabelecer a distinção entre o dever objetivo de indenizar do ente público independentemente da análise do fator culpa, e aquelas hipóteses em que há, obrigatoriamente, a necessidade de avaliar os critérios subjetivos envolvidos em determinada demanda. Assim serão definidos os casos em que a Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado por Omissão deverá ser imputada mediante a Teoria do Risco Administrativo daqueles em que deve ser aplicada a Teoria Subjetiva, de acordo com o mais recente posicionamento das Cortes brasileiras nesse sentido. Palavras-chave: Responsabilidade. Civil. Extracontratual. Estado. Omissão. Objetiva. Subjetiva. ABSTRACT The present work objective to present to the quarrel, in the area of extracontractual the civil liability of the State for omission, the modalities of generic omission the specific one, bringing elements enough to establish the distinction enters the objective duty to indemnify of the public being independently of the analysis of the factor blames, and those hypotheses where it has, obligatorily, the necessity to evaluate the involved subjective criteria in determined demand. Thus the cases will be defined where the Civil liability Extracontractual of the State for Omission will have to be imputed by means of the Theory of the Administrative Risk of those where the Subjective Theory must be applied, in accordance with the most recent positioning of the Brazilian Cuts in this direction. Key-word: Responsibility. Civilian. Extracontractual. State. Omission. Objective. Subjective. 7 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO..................................................................................................7 2 RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL E SEUS ELEMENTOS.......................................................................................................9 2.1 Culpa...........................................................................................................12 2.2 Dano............................................................................................................16 2.3 Ação e Omissão.........................................................................................18 2.3.1 Omissão Específica..................................................................................22 2.3.2 Omissão Genérica ou Geral.....................................................................23 2.4 Nexo de Causalidade.................................................................................25 2.5 Excludentes de Responsabilização Civil................................................26 3 ESPÉCIES DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL IMPUTÁVEIS AO ESTADO............................................................................................................31 3.1 Evolução histórica da responsabilidade civil do Estado.......................32 3.2 Responsabilidade Civil Objetiva .............................................................37 3.2.1 Teoria do Risco Administrativo.................................................................40 3.3 Resposabilidade Civil Subjetiva...............................................................48 3.3.1Teoria da Responsabilidade Subjetiva (Aquiliana) ou Teoria da Culpa Administrativa por Atos Omissivos....................................................................50 4 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL ACERCA DA RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO.................................................................56 4.1 Decisões judiciais em que a Responsabilidade Civil do Estado por Omissão foi considerada Objetiva.................................................................59 4.1.1 Por Danos Causados a Propriedade Privada...........................................60 4.1.2 Por Danos Causados em Virtude de Acidentes........................................62 4.1.3 Por Danos Causador por Falta de Segurança Pública.............................70 4.1.4 Por Danos Causados ao Meio Ambiente ecológico..................................74 4.1.5 Por Danos Causados pela Demora Legislativa........................................85 4.2 Decisões judiciais em que a Responsabilidade Civil do Estado por 6 Omissão foi considerada Subjetiva...............................................................86 4.2.1 Por Danos Causados a Propriedade Privada...........................................87 4.2.2 Por Danos Causados em Virtude de Acidentes........................................89 4.2.3 Por Danos Causador por Falta de Segurança Pública.............................95 4.2.4 Por Danos Causados por falta do Fornecimento de Medicamentos..................................................................................................107 4.2.5 Por Danos Causados por falta de fiscalização.......................................107 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................116 REFERÊNCIAS...............................................................................................119 ANEXO A – Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento do Recurso Especial n º 2002/0149032-2 pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça..............................................................................................................128 ANEXO B - Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento da Apelação Cível n º 2002.04.01.047232-8 pela Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região..............................................................................................................138 ANEXO C – Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento do Recurso Extraordinário n º 409.203-4/RS pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal.............................................................................................................145 ANEXO D – Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento da Apelação Cível n º 2003.04.01.029648-8 pela Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região..............................................................................................................187 ANEXO E – Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento da Apelação Cível n º 2005.71.00.016129-0 pela Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.........................................................................................................199 ANEXO F – Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento da Apelação Cível n º 70018624692 pela Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul...........................................................................................214 ANEXO G – Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento do Recurso Especial n º 2004/0096291-4 pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça..............................................................................................................230 ANEXO H – Inteiro teor do acórdão referente ao julgamento da Apelação Cível n º 2002.04.01.035946-9 pela Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.........................................................................................................242 7 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objetivo fazer uma análise quanto às proposições doutrinárias e jurisprudenciais relativas à responsabilização civil extracontratual do Estado nos casos em que há omissão, relacionando-as ao mais recente posicionamento adotado pelas Cortes Superiores. A regra geral da responsabilidade civil do Estado está insculpida no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, que determina que as pessoas jurídicas de Direito Público responderão objetivamente pelos danos que os seu agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, bastando para configurar tal responsabilidade somente que se demonstre o nexo de causalidade entre a conduta da administração e o dano causado, sendo desnecesária a prova de culpa ou dolo. No entanto, por muito tempo perdurou a noção de que, quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado, a responsabilização civil do ente público deveria ser analisada impreterívelmente sob o manto subjetivo, com base nas normas infraconstitucionais que regulam esse tema, sendo necessária, nessa hipótese, a comprovação inequívoca, além da efetividade do dano e o nexo de causalidade deste com determinada conduta, também a ocorrência de culpa “lato sensu”. Atualmente, os mais recentes julgados, admitem a idéia de que há dois tipos de omissão, quais sejam, a omissão geral ou genérica e a omissão específica, que ocorrem quando determinado serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente, em que há uma espécie de culpa anônima da Administração Pública, adotando-se uma teoria mista de responsabilização, que, dependendo do caso específico poderá ser subjetiva ou objetiva. Tal entendimento leva à discussão acerca do que vem a ser omissão genérica 8 e específica. Demonstrar quando ocorre cada uma delas é o obejtivo da presente monografia. A fim de enquadrar o ponto principal da pesquisa num ambiente propício, buscou-se fornecer, num primeiro momento, noções basilares de responsabilidade civil e de cada um de seus elementos. Com isso, especializando o tema, incluiu-se dados históricos acerca da evolução da responsabilização civil do Estado. A partir do estabelecimento do liame apresentado pela evolução da relação entre Estado e administrado ao longo da história, passa-se a abordar casos práticos específicos relativamente a este conteúdo, vez que imprescindível ao entendimento do exposto acerca da problemática apresentada. A contrução teórica presente no tema central da pesquisa foi realizada por meio de análise de doutrinas e jurisprudência tanto no âmbito civilista quanto administrativista, sempre com o intuito de adequar o recente posicionamento das Cortes brasileiras ao conhecimento jurídico usual já incorporado pelo nosso sistema, tendo em vista que, talvez por ser muito recente a aplicação prática do tema em tela, poucos autores o abordam diretamente e, aqueles que o fazem deixam lacunas, havendo efetiva precariedade de materiais brasileiros nesse sentido. Nesse ponto, a doutrina francesa apresenta-se muito mais completa, já que a falta do serviço público figura como objeto amplamente discutido naquele país. Assim, da análise do material colhido, o intuito foi aclarar a respeito do que seja e demonstrar quando ocorrem omissão genérica e específica, bem como relativamente à teoria a ser adotada quando verificadas cada uma delas. 2 RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL E SEUS ELEMENTOS A palavra responsabilidade indica “a posição daquele que não executou seu dever1”. Rui Stoco afirma que a responsabilidade encontra seu fundamento no princípio milenar de que "deve reparar o dano àquele que causá-lo" 2. No âmbito jurídico, a responsabilidade apresenta-se em três esferas independentes: Civil, Administrativa e Criminal, sempre apontando na direção da “idéia de fazer com que se atribua a alguém, em razão da prática de determinado comportamento, um dever3”. Depreende-se daí que, responsabilidade, é situação de todo o indivíduo a quem, por qualquer título, incumbem as conseqüências de um fato danoso, assim como a própria obrigação que decorre dessa situação, o que, no caso da Responsabilidade Civil, corresponde ao ressarcimento econômico dos danos produzidos. Tecendo comentários acerca da responsabilidade civil e sua independência das demais modalidades de responsabilização juridicamente reconhecidas, Hely Lopes Meirelles alinha que: a responsabilidade civil independe da criminal e da administrativa, com as quais pode coexistir, sem, todavia, se confundir. Responsabilidade civil da Administração é, pois, a que impõe à Fazenda Pública a obrigação de compor o dano causado a terceiros, por agentes públicos, no desempenho _____________ 1 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 6. STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 50. 3 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 5. 2 10 de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las. É distinta da 4 responsabilidade contratual e da legal . Rui Stoco afirma que: "responsabilidade civil significa o dever de reparar o prejuízo" 5. Silvio Rodrigues complementa o raciocínio ao desenvolver a noção de responsabilidade civil como a "obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam" 6. Maria Helena Diniz, ao definir o instituto da responsabilidade civil, assevera que: Poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, 7 ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva) . Nesse sentido, Caio Mário da Silva Pereira ensina que: A responsabilidade civil consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito passivo da relação jurídica que se forma. Reparação e sujeito passivo compõem o binômio da responsabilidade civil, que então se enuncia como princípio que subordina a reparação à sua incidência na pessoa do causador do dano. Não importa se o fundamento é a culpa, ou se é independentemente desta. Em qualquer circunstância, onde houver a subordinação de um sujeito passivo à determinação de um 8 dever de ressarcimento, aí estará a responsabilidade civil . Segundo o jurista Francisco Amaral: A expressão responsabilidade civil pode compreender-se em sentido amplo e em sentido estrito. Em sentido amplo, tanto significa a situação jurídica em que alguém se encontra de ter de indenizar outrem quanto a própria obrigação decorrente dessa situação, ou, ainda, o instituto jurídico formado pelo conjunto de normas e princípios que disciplinam o nascimento, conteúdo e cumprimento de tal obrigação. Em sentido estrito, designa o específico dever de indenizar nascido do fato lesivo imputável a 9 determinada pessoa . Pode-se inferir, portanto, que tal instituto é parte indissociável do direito obrigacional, já que a principal conseqüência de uma conduta que venha a gerar _____________ 4 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989. p. 545. 5 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 50. 6 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 1999, v. 4, p. 06. 7 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, v. 7, p.34. 8 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 11. 9 AMARAL, Francisco. Direito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 531. 11 conseqüências danosas é a obrigação de reparar o dano ocasionado, constituindo verdadeiro vínculo obrigacional entre o agente e o ofendido, cuja finalidade precípua é restabelecer o equilíbrio violado. Consoante os ensinamentos de Serpa Lopes: A violação de um direito gera a responsabilidade em relação ao que a perpetrou. Todo ato executado ou omitido em desobediência a uma norma jurídica, contendo um preceito de proibição ou de ordem, representa uma injúria privada ou uma injúria pública, conforme a natureza dos interesses 10 afetados, se individuais ou coletivos . A Responsabilidade Civil do Estado abrange todas as suas funções, resulta da sua atuação por meio de atos comissivos e omissivos dos seus agentes e possui duas naturezas distintas quanto ao seu fato gerador, quais sejam: a contratual, que decorre de um acordo entabulado entre as partes envolvidas, e a extracontratual ou, como também é chamada, aquiniana, figurando esta como o tema central da presente monografia, decorrente de atos jurídicos, de atos ilícitos de comportamentos materais ou de omissão por parte do Poder Público. Para Celso Antônio Bandeira de Mello a Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado configura-se na: obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os danos lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou 11 omissivos, materiais ou jurídicos . Conforme o fundamento que se dê à responsabilidade civil, a culpa “latu sensu” será ou não considerada elemento da obrigação de reparar o dano. Maria Helena Diniz, alinha que “a responsabilidade decorrente de ato ilícito baseia-se na idéia de culpa, e a responsabilidade sem culpa funda-se no risco 12”. Assim, decorrendo tal obrigação de imposição legal, a exemplo do disposto no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, será a responsabilidade objetiva, prescindindo de comprovação a ocorrência de culpa ou dolo do seu agente, bastando que se verifique o liame entre o dano gerado ao ofendido e a conduta do agente. Sendo subjetiva sua responsabilidade, conforme o caput do dispositivo legal _____________ 10 LOPES, Miguel de Serpa. Curso de Direito Civil. 8. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1996. v. 8. p. 550-551. 11 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 11. ed. São Paulo: Malheiros Editores. 1999. p.654. 12 supramencionado, será necessário que se verifique impreterivelmente a presença de três elementos, quais sejam: dano decorrente de Ação ou Omissão por parte do Estado e o Nexo de Causalidade entre o dano sofrido e a referida ação ou omissão. Analisa-se, então, cada um desses institutos. 2.1 Culpa O Código Civil, quando disciplina a responsabilidade pela prática de ato ilícito, em seu artigo 18613, inclui a noção de culpa, ao colocar que a ação ou omissão que propicia conseqüências civis deve ser realizada com, ao menos, imprudência ou negligência. Assim, tal instituto também figura como um dos elementos centrais do presente trabalho, já que não há responsabilidade civil sem culpa (em sentido amplo), excetuando-se os casos em que há disposição legal expressa nesse sentido, hipótese em que se terá responsabilidade objetiva, fundada no risco. Quando a culpa produz resultado danoso, se apresentando sob a forma de ato ilícito, causando dano ou repercutindo sobre o patrimônio de outrem, se caracteriza a responsabilidade civil e, em face dela, a obrigação de indenizar. Francisco Amaral alinha que “a culpa consiste na violação de um dever que o agente podia conhecer e observar14”. Serpa Lopes, refere que: a culpa é o nexo psicofísico que une um dado evento do mundo exterior a um determinado sujeito; nexo consistente na derivação causal do evento 15 externo daquele sujeito. Acquaviva define a culpa como o: _____________ 12 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 7. p. 39-40. 13 Artigo 186. Aquele que, por oção ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ilícito. 14 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003. p. 551. 15 SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de Direito Civil: Fontes acontratuais das obrigações Responsabilidade Civil. 4.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995. v.5. p.176. 13 ânimo de agir ou de se omitir sem o intuito de lesar, mas assumindo tal risco. Inobservância de uma norma sem intenção deliberada de causar 16 dano, mas sob o risco de produzi-lo . Defende Pedrotti, que: a culpa em sentido estrito, pode ser definida como a própria negligência, imperícia ou imprudência, que difere do sentido lato, que pode compreender a ação ou omissão, desde que não haja na conduta o dolo, o ânimo de 17 prejudicar . Segundo Pedro Nunes, a culpa, no Direito Civil, é a; omissão da diligência necessária de alguém, ou a falta de cumprimento do dever jurídico, sem o ânimo de lesar, de que resulta violação do direito de outrem, quando os efeitos da sua inação podiam ser calculados e 18 previstos. Maria Helena Diniz refere que: a culpa em sentido amplo, como violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela, compreende: o dolo, que é a violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou 19 negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever . Definindo culpa em sentido estrito e dolo, Cardoso de Gouveia, alinha que: se a vontade elegeu o ato ilícito, prevendo e querendo as suas conseqüências nocivas para outrem, surge a figura jurídica do dolo. (...) se a vontade se determinou pelo ato ilícito, com desconhecimento da sua ilegitimidade ou imprevisão das suas conseqüências, por virtude da negligência havida no trabalho crítico que precedeu a determinação, 20 aparece a figura jurídica da culpa . Verifica-se que na culpa lato sensu, também se inclui o dolo, que figura como a vontade consciente do indivíduo, dirigida para o resultado ilícito, ou seja, é a ação ou omissão voluntária e consciente no sentido de violar o direito. Desse modo, na culpa, seja em sentido amplo ou estrito, há efetivamente a violação de um dever, sendo imprescindível que seja provado um ato prejudicial, objetivamente ilícito ou o dever violado (elemento objetivo) e a culpabilidade ou imputabilidade do agente (elemento subjetivo). _____________ 16 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva. 9.ed. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1998. p. 413. 17 PEDROTTI, Irineu Antonio. Responsabilidade Civil. São Paulo:Livraria e Editora Universitária de Direito, 1999. v. 1. p. 22. 18 NUNES, Pedro. Dicionário de Tecnologia Jurídica. 13.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 348. 19 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 7. p. 42. 14 Note-se que esse elemento subjetivo consiste nas possibilidades de discernimento do agente no sentido de conhecer efetivamente o seu dever e de observá-lo, prevendo o dano e evitando-o. Assim, compõe-se a culpabilidade de outros três elementos, quais sejam, a negligência, que “é a omissão, é a inobservância das normas que nos mandam operar com atenção, capacidade, solicitude e discernimento21”, a imprudência, que “é a precipitação, procedimento sem cautela 22 ” e a imperícia, que figura como a “falta de habilidade ou inaptidão para praticar certo ato23”. Quanto às modalidades de culpa, temos que a culpa pode ser contratual, quando o dever violado está previsto nesse instrumento, ou extracontratual, também chamada de aquiliana, quando consiste na violação de um dever geral, que deveria ser respeitado por todos. Pedrotti define a culpa extracontratual como “a falta ou a violação de dever, fundado num princípio geral de direito que manda respeitar a pessoa e os bens alheios24”. No entender de Pedro Nunes, a culpa extracontratual ou aquiliana, se dá: quando o agente, fora dos vínculos obrigacionais, e por negligência, ou imprudência, imperícia ou falta de exação no cumprimento do dever funcional, causa lesão positiva ao direito de outrem, sem a intenção de o 25 prejudicar . No que tange à culpa contratual, segundo Pedrotti, esta figura como: aquela que compreende a violação ou a falta de um dever constante de um contrato. E a falta em relação à preexistência de obrigação contratual. Havendo um contrato e não cumprindo uma das partes obrigação dele constante, somente não responderá por perdas e danos se lograr 26 demonstrar que não agiu com falta ao dever assumido . _____________ 20 GOUVEIA, Jaime Augusto Cardoso de. Da responsabilidade Contratual. Lisboa: Seara Nova, 1932. p. 67. 21 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003. p. 552.. 22 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003. p. 552. 23 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 7. p. 42. 24 PEDROTTI, Irineu Antonio. Responsabilidade Civil. São Paulo:Livraria e Editora Universitária de Direito, 1999. v. 1. p. 23. 25 NUNES, Pedro. Dicionário de Tecnologia Jurídica. 13.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 348349. 26 PEDROTTI, Irineu Antonio. Responsabilidade Civil. São Paulo:Livraria e Editora Universitária de Direito, 1999. v. 1. p. 23. 15 Pedro Nunes conceitua a culpa contratual como sendo “a falta omissiva ou comissiva de cumprimento de uma obrigação, resultante de contrato ou convenção27”. Portanto, a culpa será contratual ou extracontratual conforme sua origem, pois sempre será oposição a um direito, seja ele legal ou obrigacional, já que seria a responsabilidade contratual a violação de uma obrigação, não necessariamente de um contrato, seja qual for sua fonte, enquanto que na culpa aquiliana ou extracontratual, a lesão a um direito absoluto. No dizer de Orlando Gomes, a responsabilidade civil extracontratual origina-se na violação do “dever de neminen laedere, isto é, o dever de a ninguém prejudicar28”. Nessa tangente, explica Caio Mário da Silva Pereira: na culpa contratual há um dever positivo de adimplir o que é objeto da avença. Na culpa aquiliana é necessário invocar o dever negativo ou obrigação de não prejudicar, e comprovado o comportamento antijurídico, evidencia que ele repercutiu na órbita jurídica do paciente, causando-lhe um 29 dano específico . Segundo Acquaviva, as diferenças entre a culpa contratual e a extracontratual podem ser sintetizadas no seguinte: na culpa contratual: a) só responde por ela o agente capaz; b) cabe ao devedor provar que não cumpriu a obrigação por caso fortuito ou força maior; c) consiste em não cumprir a obrigação assumida por contrato. Já na culpa extracontratual, a) não se requer capacidade especial; b) o ônus da prova compete a quem alega ter sido injustamente ofendido; c) envolve fatos diversos, como a intenção de prejudicar, a imperícia, a negligência, a imprudência, a falta de vigilância, o abuso de direito, a falta de cuidado, etc.30 Quanto ao conteúdo: A culpa diz-se ainda in eligendo, se decorrente da má escolha de representante ou preposto; in vigilando, se decorrente da ausência de fiscalização; in comittendo ou in faciendo, quando se age com imprudência; in omittendo, em caso de abstenção, negligência; in custodiendo, na falta de cautela ou atenção e guarda de pessoa ou coisa; in concreto, quando se _____________ 27 NUNES, Pedro. Dicionário de Tecnologia Jurídica. 13.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 348. GOMES, Orlando. Tendências Modernas da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 291. 29 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 265. 30 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva. 9.ed. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1998. p. 413. 28 16 toma em vista o agente e as circunstâncias que do ato; in abstrato, quando 31 se toma como paradigma o diligente pai de família . Relativamente aos modos de apreciação, Maria Helena Diniz esclarece que: considerar-se-á in concreto a culpa quando, no caso sub judicie, se atém ao exame da imprudência ou negligência do agente, e in abstracto, quando se faz uma análise comparativa da conduta do agente com a do homem médio 32 ou da pessoa normal, ou seja, do dilligens pater famílias dos romanos . Refere, ainda, a jurista que “o direito brasileiro adota, como critério, o da culpa in abstrato, na responsabilidade extracontratual, isto é, aferindo-se o comportamento do agente pelo padrão do homem normal33”. Quanto à sua graduação, a culpa poderá ser leve, quando a eclosão do evento danoso poderia ser evitada com atenção ordinária ou adoção de diligências próprias de um sujeito normal, ou levíssima, quando o dano somente seria evitável por uma atenção extraordinária, habilidades especiais ou conhecimento singular. 2.2 Dano Dano é a ”ação ou omissão ilícita com repercussão na esfera jurídica de outra pessoa34”. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso X, preceitua que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação", conferindo proteção expressa aos danos ocasionados, sejam eles de ordem patrimonial ou moral, na medida em que lhes assegura a possibilidade de reparação. Assim, tem-se que o dano figura como outro elemento ou requisito essencial à responsabilidade civil, pois, tendo esta por finalidade precípua a reparação," é preciso que haja alguma coisa a ser reparada35". _____________ 31 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003. p. 552-553. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 7. p.44. 33 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. São Paulo, Saraiva, 1984. p. 39. 34 SIDOU, José Maria Othon et al. Dicionário Jurídico. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 243. 32 _____________ 17 Para Pontes de Miranda, para configurar o dano: tem-se de considerar o patrimônio do ofendido no momento (momento em que ocorreu a ofensa) mais qual seria a realidade se o ato (ou fato) não houvesse ocorrido e as perdas ocorridas por este ato até o momento da 36 indenização . No mesmo sentido é o posicionamento de José de Aguiar Dias: O dano se estabelece mediante o confronto entre o patrimônio realmente existente após o dano e o que possivelmente existiria, se o dano não se tivesse produzido. O dano é expresso pela diferença negativa encontrada 37 nessa operação . Clayton Reis afirma que : "O fato é que a concepção normalmente aceita a respeito do dano envolve uma diminuição do patrimônio de alguém, em decorrência da ação lesiva de terceiros38." Analisando, entende-se que os ensinamentos de Maria Helena Diniz mostramse mais abrangentes, na medida em que aduz que o dano pode ser definido como a lesão (diminuição ou destruição) que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem 39 ou interesse jurídico, patrimonial ou moral . Não destoa Carlos Roberto Gonçalves, quando refere que o termo dano, em sentido amplo, vem a ser a lesão de qualquer bem jurídico, e aí se inclui o dano moral. Mas, em sentido estrito, dano é, para nós, a lesão do patrimônio; e patrimônio é o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, 40 apreciáveis em dinheiro . Dessarte, verifica-se que tal instituto nada mais representa do que os prejuízos ou diminuições causadas a qualquer bem ou interesse jurídicamente tutelados, sejam eles de cunho patrimonial ou não, resultantes de uma lesão, abrangendo tudo o que foi efetivamente perdido pelo ofendido (dano emergente) e também o que este deixou de ganhar (lucros cessantes) em virtude do evento danoso. 2.3 Ação e omissão _____________ 35 PEREIRA, Caio Mário. Responsabilidade Civil. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990. p. 43. MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsói, 1958, p. 208. 37 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1994, v.1, p. 709. 38 REIS, Clayton. Dano Moral. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 01. 39 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 7. p. 58. 40 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 390. 36 18 A responsabilidade civil, tanto objetiva como subjetiva, deverá sempre conter como elemento central uma conduta, ou seja, ações ou omissões, que deverão ser humanas e voluntárias para que se configure a responsabilidade civil. Francisco Amaral, refere que “ação é o ato humano, voluntário e objetivamente imputável. Sendo humano, exclui os eventos da natureza. Voluntário, no sentido de ser controlável pela vontade à qual se imputa ao fato.”41 Assim, também se excluem os atos inconscientes ou praticados sob coação absoluta. No entanto, conforme mencionado anteriormente, “o comportamento do agente pode consistir também em omissão, que será causa jurídica do dano se houver dever de agir, de praticar o ato omitido.42” Maria Helena Diniz inclui a omissão no seu conceito de ação, na medida em que a define como o ato humano, comissivo ou omissivo, lícito ou ilícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato do animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de 43 satisfazer os direitos do lesado . Verifica-se, assim, que a responsabilidade do agente pode decorrer tanto de ato próprio quanto de ato de terceiro que esteja sob sua responsabilidade, assim como de danos causados por coisas que estejam sob sua guarda. As hipóteses de responsabilização do agente por ato próprio buscam sentido no próprio princípio informador da teoria da reparação, pois se alguém, por sua ação pessoal, infringindo dever legal ou social, prejudica terceiro, gera dever próprio de reparar esse prejuízo. Cumpre salientar, por oportuno, que obviamente a responsabilização civil do Estado jamais se dará por ato próprio, já que não se trata de pessoa humana, mas sim de pessoa jurídica, invenção jurídica, que atua por meio dos seus agentes. Com relação à responsabilidade por atos praticados por terceiros, ter-se-á quando uma pessoa responde pelos danos causados a outrem independente de sua vontade, oriundos das condutas daqueles que estão, de uma forma ou de outra, sob sua subordinação. Assim, quanto ao agente, a responsabilização civil do Estado somente se dará nessa modalidade. _____________ 41 AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003. p. 549. AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003. p. 549. 43 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 7. p. 39. 42 19 No que tange à conduta puramente omissiva, nada mais é do que a inação que afronta o dever jurídico, ou seja, é o não fazer (conduta negativa) o que se deveria por imposição legal, o que figura, “em essência, culpa, numa de suas três vertentes: negligência, que, de regra, traduz desídia, imprudência, que é temeridade, e imperícia, que resulta de falta de habilidade44”. Alinha Rui Stoco que: [...] Não é apenas a ação que produz danos. Omitindo-se, o agente público também pode causar prejuízos ao administrado e à própria administração. [...] a omissão configura a culpa in omitendo e a culpa in vigilando. São casos de inércia, casos de não-atos. Se cruza os braços ou se não vigia, quando deveria agir, o agente público omite-se, empenhando a responsabilidade do Estado por inércia ou incúria do agente. Devendo agir, não agiu. Nem como o bonus pater familiae, nem como bonus administrador. Foi negligente. Às vezes imprudente e até imperito. Negligente, se a solércia o dominou; imprudente, se confiou na sorte; imperito, se não previu as possibilidades da concretização do evento. Em 45 todos os casos, culpa, ligada à idéia de inação, física ou mental […]. " Quanto à responsabilização civil extracontratual do Estado nos casos de omissão, Celso Antônio Bandeira de Mello refere que o Estado só responde por omissões quando deveria atuar e não atuou — vale dizer: quando descumpre o dever legal de agir. Em uma palavra: 46 quando se comporta ilicitamente ao abster-se . Nesses casos, para definir o tipo de responsabilização imputável, se objetiva, de acordo com o artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal47 ou subjetiva, necessitando da comprovação de culpa, diversos autores atualmente defendem que há dois tipos de omissão, quais sejam: a omissão geral e a omissão específica. O que, aliás, já figura como entendimento pacífico na jurisprudência, inclusive, do STF, conforme se apresenta posteriormente. Odete Medauar observa que: _____________ 44 LAZZARINI, Álvaro. Responsabilidade civil do Estado por atos omissivos dos seus agentes. Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. São Paulo, v. 23, n. 117, p. 125-162, mar/abr, 1989. 45 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 5. ed. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1994. p. 319 46 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Responsabilidade Extracontratual do Estado por Comportamentos Administrativos. Revista dos Tribunais. São Paulo. v.552, p. 11-14, mai/jun 1979. 47 Artigo 37: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte”: parágrafo 6º: “As pessoas jurídicas direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes , nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. 20 Informada pela teoria do risco, a responsabilidade do Estado apresenta-se hoje, na maioria dos ordenamentos, como responsabilidade objetiva. Nessa linha, não mais se invoca o dolo ou culpa do agente, o mau funcionamento ou falha da Administração. [...] Deixa-se de lado, para fins de ressarcimento do dano, o questionamento do dolo ou culpa do agente, o questionamento da licitude ou ilicitude da conduta, o questionamento do bom ou mau funcionamento da Administração. Demonstrado o nexo de causalidade, o 48 Estado deve ressarcir . No entanto, Odília Ferreira da Luz entende que: Isso não significa, necessariamente, adoção da tese objetiva com exclusividade, pois ainda existe a responsabilidade decorrente da falta do serviço, que é a regra; na verdade, coexistem a responsabilidade objetiva e a subjetiva, esta fundada na faute de service e não mais na culpa do agente 49 público . Ainda, segundo Osvaldo Aranha Bandeira de Mello: A responsabilidade por falta de serviço, falha do serviço ou culpa do serviço, não é de modo algum modalidade de responsabilidade objetiva, mas subjetiva, porque baseada na culpa do serviço diluída na sua organização, assumindo feição anônima ou impessoal. Cabe nesse caso, à vítima comprovar a não prestação do serviço ou a sua prestação retardada ou máprestação, a fim de ficar configurada a culpa do serviço, e conseqüentemente, a responsabilidade do Estado a quem incumbe prestá50 lo . Já Sérgio Henriques Zanon Freitas, aduz que: Após analisar o tema apresentado, entende-se que estará sujeita à ação de reparação por responsabilidade objetiva a Administração que, não por qualquer inércia ou abstenção (faute du service), mas quando, por manifesta e presumível omissão deixar de executar atividade ou prestar algum serviço público determinado por lei ou por decisão judicial, 51 acarretando prejuízo a terceiros . Acerca da responsabilidade civil estatal expõe Sundfeld: Para, diante de um evento lesivo, configurar-se a responsabilidade estatal, necessária a existência de relação de causa e efeito entre o comportamento do Estado (positivo ou negativo, isto é, uma ação ou omissão) e o dano provocado. A responsabilidade objetiva não faz do Estado um segurador universal, mas apenas o obriga a suportar os prejuízos que gere, direta ou indiretamente [...]. Quando se tratar de danos derivados de comportamento positivo (por ação), pouco importa a juridicidade ou ilegitimidade da conduta estatal: havendo nexo de causalidade entre esta e o dano, surge a vinculação do Estado [...]. Entretanto, quando em pauta a responsabilidade _____________ 48 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 430. 49 LUZ, Odília Ferreira da. Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 298. 50 MELLO, Osvaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1979. v. 2. p.482-483. 51 FREITAS, Sérgio Henriques Zanon. Curso Prático de Direito Administrativo. 2.ed. Belo Horizonte:Del Rey, 2004. p.276. 21 por comportamento negativo, o Estado só responderá se houver omitido dever que lhe tenha sido prescrito pelas normas; não se sua inação for lícita. É que o ‘conceito de omissão, em direito, está ligado ao de ilicitude’. Sob o ponto de vista jurídico, a mera inação não configura omissão; está só 52 se apresenta quando, tendo o dever de agir, o sujeito fica inerte . Assim, tem-se que, em que pese o Direito brasileiro aceitar a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, isso não induz à responsabilidade do Poder Público por qualquer fato ou ato, comissivo ou omissivo no qual esteja envolvido, direta ou indiretamente, bem como nem toda hipótese em que tiver lugar dano proveniente de omissão estatal será encarada sob o prisma subjetivo. Note-se que, há previsão de responsabilidade objetiva do Estado, mas, para que ocorra, cumpre que os danos ensejadores da reparação hajam sido causados por agentes públicos. Se não foram eles os causadores, se incorreram em omissão e adveio dano para terceiros, a causa é outra; não decorre do comportamento dos agentes. Terá sido propiciada por eles. A omissão haverá condicionado sua ocorrência, mas não a causou. Donde não há cogitar, neste caso, responsabilidade objetiva [...]. A responsabilidade por omissão é responsabilidade por comportamento ilícito. E é responsabilidade subjetiva, porquanto supõe dolo ou culpa em suas modalidades de negligência, imperícia ou imprudência, embora possa tratarse de uma culpa não individualizável na pessoa de tal ou qual funcionário, mas atribuída ao serviço estatal genericamente. É a culpa anônima ou 53 ‘faute de service’ dos franceses, entre nós traduzida por ‘falta do serviço’ (grifos do autor). Destarte, infere-se que é de grande importância fazer uma distinção entre a omissão genérica e a omissão específica. Segundo Sérgio Cavalieri Filho: Se um motorista embriagado atropela e mata pedestre que estava na beira da estrada, a Administração (entidade de trânsito) não poderá ser responsabilizada pelo fato de estar esse motorista ao volante sem condições. Isso seria responsabilizar a Administração por omissão genérica. Mas se esse motorista, momentos antes, passou por uma patrulha rodoviária, teve o veículo parado, mas os policiais, por alguma razão, deixaram-no prosseguir viagem, aí haverá omissão específica que se erige em causa adequada do não-impedimento do resultado. Nesse segundo 54 caso haverá responsabilidade objetiva do Estado . Consoante Edimur Ferreira de Faria: Por omissão, o Poder Público responde pela responsabilidade objetiva ou pela culpa subjetiva, dependendo da situação concreta. Será caso de _____________ 52 SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de Direito Público. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 181. 53 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Responsabilidade Extracontratual do Estado por Comportamentos Administrativos. Revista dos Tribunais. São Paulo. v.552, p. 11-14, mai/jun 1979. 54 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4. ed, São Paulo: Malheiros Editora, 2003. p.247. 22 responsabilidade objetiva por omissão quando o Estado, ou quem lhe faça às vezes, deixar de agir quando tinha o dever legal de atuar comissivamente, mas se absteve, deliberadamente ou não, de praticar o ato que lhe competia. A culpa será subjetiva quando, embora o Estado não tivesse o dever legal de agir, objetivamente previsto, devesse, ante a situação concreta, adotar providências visando evitar conseqüências 55 danosas ao administrado . Impõe-se, portanto, em que pese uma análise mais profunda acerca das modalidades de omissão genérica e específica figurar como objeto de capítulo posterior, onde serão analisadas diversas decisões jurisprudenciais nesse sentido, por ora, é necessário delimitar tais institutos, ainda que brevemente, para que se possa diferenciar os casos em que há uma ou outra espécie, cuja diferença fundamental reside na existência ou não do dever individualizado de agir. 2.3.1 Omissão Específica A omissão específica se verifica nas hipóteses em que o evento danoso decorreu diretamente da inação do ente público, figurando a inércia administrativa como causa direta e imediata da ocorrência do resultado danoso, pois, nesse caso, havia o dever legal de agir e o Estado não o fez. Nesse sentido, Sergio Cavalieri Filho exemplifica: veículo muito velho, sem condições normais de trânsito, causa um acidente por defito de freio ou falta de luz traseira. A Administração não pode ser responsabilizada pelo fato de esse veículo ainda estar circulando. Isso seria responsabilidade pela omissão genérica. Mas se esse veículo foi liberado numa vistoria, ou passou pelo posto de fiscalização sem problemas, aí já 56 teremos omissão específica . Alinha, ainda, o autor supramencionado, que “haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a situação propícia para a ocorrência do evento em situação em que tinha o dever de agir para impedi-lo57." Ora, no que tange à responsabilização civil do Estado, verifica-se que: _____________ 55 FARIA, Edimur Ferreira. Curso de Direito Administrativo Positivo. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 525. 56 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 248. 57 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 6. ed., São Paulo: Malheiros, 2005, p. 261. 23 A regra é a responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco administrativo, sempre que o dano for causado por agentes do Estado, nessa qualidade; sempre que houver direta relação de causa e efeito entre 58 a atividade administrativa e o dano . E, o mesmo ocorre relativamente à inação administrativa, quando figurar como causa direta da ocorrência do evento danoso, hipótese em que restará configurada a omissão específica do Poder Público, sendo a responsabilização civil extracontratual do Estado objetiva, fundada na teoria do risco administrativo, consoante dispõem os artigos 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal e 43 do Código Civil. E, nesse caso, insta sinalar, se inverte o ônus da prova no sentido da demonstração por parte do Estado de que não agiu com culpa ou dolo para a eclosão do evento danoso. 2.3.2 Omissão Genérica ou Geral Já a omissão genérica se verifica quando a ocorrência do dano não se dá diretamente em razão da inércia do Estado, mas sim de falta do serviço ou faute du service, como dizem os franceses, seja por que não funcionou, quando deveria normalmente funcionar, porque funcionou mal ou tardiamente, hipótese em que é dispensável a prova de que qualquer agente do Estado tenha incorrido em culpa. No entanto, "quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de se aplicar a teoria da responsabilidade subjetiva59". Assim, não há a inversão do ônus da prova nessas hipóteses, cabendo à vítima comprovar a ocorrência de culpa do Estado, no sentido do serviço que lhe incumbia prestar falhou. E, sendo assim, é necessário, que o Estado haja incorrido em ilicitude, por não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente neste mister, em razão de 60 comportamento inferior ao padrão legal exigível . _____________ 58 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 259. 59 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 11. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1999, p. 672. 60 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 855. 24 Sinale-se que, conforme recente entendimento do Supremo Tribunal Federal, que será objeto de análise aprofundada no capítulo seguinte, a responsabilidade civil por omissão genérica é subjetiva, exigindo a comprovação da ocorrência de culpa lato sensu: dolo, negligência, imperícia ou imprudência. Entretanto, tal entendimento se firma no sentido de entender desnecessário individualizar tais elementos, que podem ser atribuídos, de forma genérica, à falta do serviço - faute du service, sendo anônima relativamente aos agentes a culpa instaurada. A responsabilidade por omissão é responsabilidade por comportamento ilícito. E é responsabilidade subjetiva, porquanto supõe dolo ou culpa em suas modalidades de negligência, imperícia ou imprudência, embora possa tratar-se de uma culpa não individualizável na pessoa de tal ou qual funcionário, mas atribuída ao serviço estatal genericamente. É a culpa anônima ou faute de service dos franceses, entre nós traduzida por ‘falta de 61 serviço ’. Nesse sentido menciona Inácio de Carvalho Neto: entende-se que a responsabilidade, não é objetiva, porque decorrente do mau funcionamento do serviço público; a omissão na prestação do serviço tem levado à aplicação da teoria da culpa do serviço público (faute du service); é a culpa anônima, não individualizada, o dano não decorreu de 62 atuação de agente público, mas de omissão do poder público . Sérgio Cavalieri Filho refere que: a responsabilidade por falta de serviço, falhado serviço ou culpa do serviço, seja qual for a tradução que se dê à fórmula francesa faute du service, não é, de modo algum, modalidade de responsabilidade objetiva, mas subjetiva, porque baseada na culpa do serviço diluída na sua organização, assumindo feição anômina ou impessoal. Responsabilidade com base na culpa e culpa do próprio Estado, do serviço que lhe incumbe prestar, não individualizável em determinado agente público, insuscetível de ser atribuída a certo agente público, porém no funcionamento ou não funcionamento do serviço, por falta 63 de sua organização . Por fim, vale citar um exemplo de situação em que a responsabilidade do Estado por omissão é genérica e, portanto sua responsabilização civil será subjetiva: É o caso de uma manifestação pública, em que uma multidão de terceiros particulares não na qualidade de agentes públicos venha a causar danos às pessoas, depredando propriedades, por exemplo; ou de fenômenos da natureza, como vendavais, chuvas, enchentes, etc... que venham a causar sérios prejuízos à população. Nessas hipóteses, a indenização estatal só _____________ 61 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Responsabilidade Extracontratual do Estado por Comportamentos Administrativos. Revista dos Tribunais. São Paulo. v.552, p. 11-14, mai/jun 1979. 62 CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade do Estado por Atos de Seus Agentes. São Paulo: Atlas, 2000. p.126. 63 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 238. 25 será devida se restar comprovada 64 [responsabilidade subjetiva] . a culpa da Administração 2.4 Nexo de Causalidade Tal elemento figura como a interligação entre a atividade ou inação do agente e o dano experimentado pelo ofendido, ou seja, se trata da relação de causa e efeito imediata e direta entre a ação ou omissão daquele e o dano gerado a este, figurando como fator determinante para a responsabilização civil do respectivo agente, independentemente de ser a natureza dessa obrigação objetiva ou subjetiva. Pois, não é suficiente, para que seja exigível a responsabilidade civil, que o demandante haja sofrido um prejuízo, nem que o demandado tenha agido com culpa. Deve reunir-se um terceiro e último requisito, a existência de um vínculo de causa e efeito entre a culpa e o dano, é necessário que o dano 65 sofrido seja conseqüência da culpa cometida ". Quanto causalidade da omissão, Sérgio Cavalieri Filho expõe que: O Direito nos impõe, muitas vezes, o dever de agir, casos em que, nos omitindo, além de violar dever jurídico, deixamos de impedir a ocorrência de um resultado. Dessa forma, embora a omissão não dê causa a nenhum resultado, não desencadeie qualquer nexo causal, pode ser causa para não impedir o resultado. Ora, não impedir significa permitir que a causa opere. O omitente, portanto, coopera na realização do evento com uma condição negativa: ou deixando de se movimentar, ou não impedindo que o resultado se concretize. Responde por esse resultado não porque o causou com a omissão, mas porque não o impediu, realizando a conduta a que estava obrigado. Conclui-se do exposto, que a omissão adquire relevância causal porque a norma lhe empresta esse sopro vital, impondo ao sujeito um determinado comportamento. Quando não houver esse dever jurídico de agir, a omissão 66 não terá relevância causal e, conseqüentemente, nem jurídica . Nesse sentido, tem-se que O nexo de causalidade é a relação de causa e efeito entre o fato e o dano. Constitui elemento essencial ao dever de indenizar, porque só existe _____________ 64 ALEXANDRINO, Marcelo; VICENTE, Paulo. Direito administrativo. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004. p. 410. 65 MAZEAUD, Henry et al. Taité théorique et pratique de la responsabilité cívile délictuelle et contractuelle . 5. ed. Paris: Montchirestiem, 1958. v. 2. p. 258. 66 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 81-82. 26 responsabilidade civil se houver nexo causal entre o dano e seu autor, 67 independentemente de culpa do agente ". Kfouri explicita que: para se poder chegar, partindo de um evento danoso, até seu autor, é indispensável assentar uma ponte entre esses dois extremos: em termos 68 jurídicos, essa ponte se chama nexo de causalidade ". Assim, inexistindo nexo causal entre determinada conduta e o dano, não se pode sequer cogitar o dever de indenizar, uma vez que a finalidade precípua desse elemento é justamente identificar o responsável pelo dano causado ao ofendido, apresentando-se como meio de conhecimento jurídico da efetiva situação danosa verificada em determinado caso. 2.5 Excludentes de responsabilização civil Há hipóteses em que, apesar da ocorrência do dano e da existência de nexo de causalidade entre determinada conduta, não haverá responsabilidade civil. Tem-se como elemento constitutivo indissociável da noção de culpa também a noção de imputabilidade, no que tange às condições pessoais ou subjetivas do ofensor, que se materializam na sua consciência e vontade. Assim, ter-se-á imputabilidade sempre que os atos de uma pessoa advierem de sua vontade livre e capaz, necessitando, portanto, que haja autodeterminação e discernimento do agente. Desse modo, verifica-se que os menores de 18 anos e os curatelados, por exemplo, são inimputáveis, já que lhes falta elemento essencial à imputabilidade, qual seja, ser capaz de dirigir suas ações. No entanto, sua incapacidade, ainda que relativa, não elide o dever de indenizar os danos por eles provocados a outrem por seus representantes legais, não figurando a inimputabilidade como excludente de _____________ 67 AMARAL NETO, Francisco dos Santos. Direito Civil Brasileiro: Introdução. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 527. 68 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p. 52. 27 responsabilização, razão pela qual, exime-se de tecer maiores comentários acerca desse tema. As hipóteses em que efetivamente inexistirá responsabilização civil, são a legítima defesa, o estado de necessidade, o exercício regular de um direito, que figuram como excludentes de ilicitude, conforme dispõe o artigo 188 do Código Civil, e o caso fortuito ou força maior, nos moldes do artigo 393 do diploma legal já invocado, já que ninguém pode responder por atos a que não tenha dado causa. Importa salientar, entretanto, que a responsabilidade civil do Estado estará elidida também quando houver a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, institutos estes que também se aborda, ainda que brevemente, em face da problemática central tratada no presente trabalho. A legítima defesa é a reação inevitável dirigida contra agressão injusta, atual e que não exceda o necessário à repeli-la. Isso, quando restar impossível que o Estado o faça. Marcelo Saraiva define a legítima defesa como a "defesa conforme ao direito de um injusto perigoso e ameaçador, segundo a relação de forças e valores da situação, isto é, segundo a ponderação dos interesses contrapostos na situação"69. Um bom exemplo desse estado, ocorre quando “o agente vê-se colocado numa alternativa irrefugível e, para preservar a coisa própria, tem de optar pelo sacrifício da coisa alheia”70. _____________ 69 SARAIVA, Marcelo. Legítima Defesa. São Paulo: Saraiva, 1975. p. 10. DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil.10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, v.2. p. 675. 70 28 Já o estado de necessidade, caracteriza-se pela ação destinada a repelir perigo iminente, sem a qual não seria possível evitar com a deterioração ou destruição de coisa alheia ou, até mesmo, lesão à pessoa, já que, nessas situações, prevalece o interesse geral sobre o pessoal. No entanto, acerca do ato praticado em estado de necessidade, José Aguiar Dias alinha que Para caracterizar, pois, o ato necessário, não basta o perigo hipotético, eventual, possível ou remoto, porque, então, ao indivíduo assustadiço se deparariam mil e uma ocasiões de invocá-los, conforme imaginasse sua fantasia o estabelecimento de uma situação desse gênero. É preciso que o 71 mal a evitar se apresente com o duplo caráter de certo e iminente . Quanto ao exercício regular de um direito, nada mais representa do que a exclusão da própria ilicitude, já que, apesar de ocasionar o dano, o seu agente causador atua dentro das suas prerrogativas legais, salvo nos casos em que haja abuso de direito, o que se configurará sempre que o exercício do direito exceder o seu fim econômico ou social, a boa-fé ou os bons costumes e configurará o ilícito, não elidindo a responsabilização civil. A concepção do abuso de direito como espécie de ato ilícito, permita-se insistir, além de obscurecer seus contornos, caminha no sentido da responsabilidade subjetiva, sendo a culpa elemento quase indissociável do conceito de ilicitude. Trata-se de concepção absolutamente anacrônica, pois a efetiva aplicação da teoria exige que a aferição da abusividade no exercício de um direito seja objetiva, revelada no simples confronto entre o 72 ato praticado e os valores tutelados pelo ordenamento civil-constitucional . O caso fortuito e a força maior incidem sobre o nexo de causalidade entre o dano e eventual conduta culposa, pois, nesses casos, é impossível vincular o dano à qualquer ato, seja ele comissivo ou não, de algum sujeito de direitos e deveres. Nota-se que na hipótese de caso fortuito, diferentemente do que ocorre no caso de força maior, em que o dano é gerado pela natureza, o dano decorre de ato humano alheio à vontade do agente, já que figura com um acaso, imprevisível, que não poderia ser evitado pela vontade humana e, portanto, elide o nexo de causalidade, excluindo a responsabilidade civil. _____________ 71 DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil.10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, v.2. p. 676. 72 CARPENA, Heloísa. Abuso de Direito no Código de 2002: Relativização de direitos na ótica civilconstitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 382. 29 Assim, o caso fortuito ou de força maior “consiste em todo acontecimento alheio à vontade do contratante ou agente que, por si só, proporcionou o resultado danoso73”. Relativamente à descaracterização do liame de causalidade, importa observar que Não é qualquer acontecimento, por mais grave e ponderável, bastante para liberar o devedor, porém aquele que impossibilita o cumprimento da obrigação. Se o devedor não pode prestar, por uma razão pessoal, ainda que relevante, nem por isto fica exonerado, de vez que estava adstrito ao cumprimento, e tinha de tudo prever e a tudo prover, para realizar a prestação. Se esta se dificulta ou se torna excessivamente onerosa, não há força maior ou caso fortuito. Para que se ache exonerado, é indispensável que o obstáculo seja estranho ao seu poder, e a ele seja imposto pelo acontecimento natural ou pelo fato de terceiro, de modo a construir uma barreira intransponível à execução da obrigação. ... Mas não basta que à sua vontade ou à sua diligência se anteponha a força do evento extraordinário. Requer-se, ainda, que não haja meios de evitar ou de 74 impedir os seus efeitos, e estes interfiram com a execução do obrigado . Assim, cumpre ressaltar que, se o Estado deixar de implementar conduta considerada indispensável e sobrevier fenômeno natural que cause danos diretamente pela falta da referida conduta, esta omissão do Poder Público ensejará sua responsabilização, visto que neste caso estará presente o nexo de causalidade entre o ato omissivo e o dano, já que a causa imediata do dano não é o fato de força maior, mas o desleixo do Estado em, sendo possível prever tal fenômeno e suas conseqüências, nada tendo feito para evitá-las. No que tange à culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, também são consideradas excludentes da responsabilização civil estatal, conforme já mencionado anteriormente, pois haverá um rompimento do nexo de causalidade entre as condutas do ente público e o dano gerado à vítima. Nesse sentido, insta salientar que o fato de terceiro há de poder ser atribuído a alguém, o que não quer dizer que se imponha, necessariamente, a sua identificação. Sem dúvida, o fato de poder identificar o terceiro contribui para a melhor caracterização do fato que se lhe atribui. Mas isso não é condição essencial para tal configuração, como sucede, por exemplo, no dano produzido por terceiro que fugiu e não foi encontrado, tendo sido visto, entretanto, a praticar o ato de que resultou o prejuízo. Se o dano não pode ser atribuído a alguém, nesse sentido de _____________ 73 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Responsabilidade Civil. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 85. 74 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1996, v. 2. p. 245. 30 que se deva a ação humana, estranha aos sujeitos da relação vítima75 responsável, não há fato de terceiro, mas caso fortuito (...) . Por outro lado, importa ressaltar que, nos casos em que se verifica a existência de concausas, isto é, mais de uma causa ensejadora do resultado danoso, praticadas simultaneamente pelo Estado e pela vítima, não haverá exclusão total da responsabilização civil do ente público, mas, sim, uma adequação do quantum indenizatório na medida da participação de cada um no referido evento, na forma do artigo 944, parágrafo único, do Código de Processo Civil76. _____________ 75 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. v. 7. p. 79. 76 Art. 144. A indenização emede-se pela extensão do dano. Parágrado único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dabo, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização. 3 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL IMPUTÁVEIS AO ESTADO Conforme anteriormente referido, a responsabilização civil extracontratual do Estado poderá, quanto ao seu fundamento, ser tanto subjetiva, tendo como base a noção de culpa, quanto objetiva, fundada na Teoria do Risco Administrativo. Cumpre salientar que: Quando se fala em responsabilidade do Estado, está-se cogitando dos três tipos de funções pelas quais se reparte o poder estatal: a administrativa, a jurisdicional e a legislativa. Fala-se, no entanto, com mais freqüência, de responsabilidade resultante de comportamentos da Administração Pública, já que, com relação aos Poderes Legislativo e Judiciário, essa 77 responsabilidade incide em casos excepcionais . Assim, para que se possa compreender melhor cada uma das modalidades de responsabilização civil, antes de abordar diretamente as teorias supramencionadas, insta observar a evolução da responsabilidade civil do Estado, que passou por diversas fases, como bem expõe Maria Sylvia Zanella Di Pietro: O tema da responsabilidade civil do Estado tem recebido tratamento diverso no tempo e no espaço; diversas teorias têm sido elaboradas, inexistindo dentro de um mesmo direito uniformidade de regime jurídico que abranja todas as hipóteses. Em alguns sistemas, como no anglo-saxão, prevalecem os princípios de direito privado; em outros, como o eurpeu-continental, adota-se o regime publicístico. A regra adotada, por muito tempo, foi a da irresponsabilidade; encaminhou-se, depois, para a responsabilidade subjetiva, vinculada à culpa, ainda hoje aceita em várias hipóteses; evoluiuse, posteriormente, para a teoria da responsabilidade objetiva, aplicável, no entanto, diante de requisitos variáveis de um sistema _____________ 77 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.561. 32 78 para outro, de acordo com normas impostas pelo direito positivo . Veja-se, então, essas fases evolutivas. 3.1 Evolução histórica da responsabilidade civil do Estado Inicialmente, houve a chamada fase da irresponsabilidade do Estado, em que a este não incumbia responsabilização civil por qualquer lesão, tendo em vista a concepção absolutista de Estado, em que este estava acima das relações normais entre as pessoas físicas e jurídicas. A teoria da irresponsabilidade foi adotada na época dos Estados absolutos e repousava fundamentalmente na idéia de soberania: o Estado dipõe de autoridade incontestável perante o súdito; ele exerce a tutela do direito, não podendo, por isso, agir contra ele; daí os princípios de que o rei não pode errar (the king can do no wrong; lê roi ne peut mal faire) eo de que “aquilo que agrada ao prícipe tem força de lei” (quod principi placuit habet legis vigorem). Qualquer responsabilidade atribuída aos Estado significaria 79 coloca-lo no mesmo nível que o súdito, em desrespeito a sua soberania . Cumpre ressaltar, entretanto, que havia a possibilidade de responsabilização individual dos agentes públicos, pois, sustentava-se que o Estado e o funcionário são sujeitos diferentes, pelo quê este último, mesmo agindo fora dos limites de seus poderes, ou abusando 80 deles, não obrigava, com seu fato, a Administração . Segundo Moraes: não ficavam os indivíduos a descoberto de qualquer proteção, pois haveria possibilidade de responsabilização individual dos agentes públicos que, atuando com dolo ou culpa, acarretassem dano a outrem. Ressalte-se, porém, que a responsabilidade existiria em nome próprio, e não como 81 preposto do Estado . Entretanto, _____________ 78 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.562. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.563. 80 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 236. 81 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 231. 79 33 Essa teoria logo começou a ser combatida, por evidente injustiça; se o Estado deve tutelar o direito, não pode deixar de responder quando, por sua ação ou omissão, causar danos a terceiros, mesmo porque, sendo pessoa 82 jurídica, é titular de direitos e obrigações . Nesse sentido, vale observar a sabedoria dos juristas pátrios, na medida em que: A teoria da irresponsabilidade do Estado não foi acolhida pelo direito brasileiro; mesmo não havendo normas legais expressas, os nossos 83 tribunais e doutrinadores sempre repudiaram aquela orientação . Apesar da evidente injustiça perpetrada por essa teoria, somente no século XIX que a tese da irresponsabilidade ficou superada. Porém, ao admitir-se, inicialmente, a responsabilidade do Estado, adotavam-se os princípios do Direito Civil, apoiados na idéia de culpa; daí falar-se em teoria 84 civilista da culpa .” Assim, crescente o quadro evolutivo, a responsabilização civil do Estado passou para a fase da responsabilidade civilista, surgida na França, quando da discussão sobre a conceituação de atos de império, ou seja, aqueles praticados com as prerrogativas e privilégios da administração pública com fundamento em um direito soberano e isento de qualquer responsabilidade; e atos de gestão, quais sejam, aqueles praticados em estado de igualdade com o administrado, na medida em que se configuravam em atividades privadas exercidas pelo Estado, e, assim, estavam sujeitos a responsabilização. Assim, para os atos de gestão, onde a administração pública apenas administra seus bens e serviços, semelhantemente ao particular, sem necessidade da utilização de sua soberania, o dever de ressarcir existiria, enquanto que para os atos de império, dada sua natureza peculiar, não haveria tal 85 obrigação . Segundo Sérgio Cavalieri Filho, ocorreu uma transição da teoria da irresponsabilidade “para uma concepção civilista da responsabilidade estatal, _____________ 82 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.563. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.566. 84 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.563. 85 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 9.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 429. 83 34 fundada na culpa do funcionário e nos princípios da responsabilidade por fato de terceiro (patrão, preponente, mandante, representante)86”. Nessa fase, então, começou a ser firmada a responsabilidade da administração pública por danos provenientes de atos de gestão, no caso de culpa ou dolo do agente público. Hely Lopes Meirelles mostra-se, de certo modo, favorável a esse entendimento, na medida em que afirma: o Estado não pode ser equiparado com seu poder e os seus privilégios administrativos ao particular, despido de autoridade e de prerrogativas públicas, tornando-se inaplicáveis em sua pureza os princípios subjetivos da culpa civil, para a responsabilidade da Administração pelos danos causados 87 aos administrados. . No entanto, embora mais evoluída, tal teoria também se demonstrou insuficiente para garantir a reparação do dano, pois nem sempre era possível ao lesado provar a atuação contrária à lei do agente público, principalmente, em virtude da desigualdade de poder, demonstrando claramente a inadequação da teoria civilista na apuração de prejuízos causados pelo Estado aos indivíduos. Assim, como evolução da teoria supramencionada, passa-se para a fase publicista, com a criação do Conselho de Estado Francês. Tal teoria inova profundamente os parâmetros jurídicos de responsabilização civil do Estado, pois se vislumbra sua responsabilidade independentemente da falta que tenha cometido o agente público, passando a analisá-la nas hipóteses em que é originária da Administração, pelo mau funcionamento do serviço público ou pela sua inexistência. Nessa fase constatou-se que o Estado não é representado por seus agentes, que agem por seu intermédio e dos órgãos em que atuam. Pela teoria do órgão (ou organicista) o Estado é concebido com um organismo vivo, integrado por um conjunto de órgãos que realizam suas funções. Tal como o ser humano, é dotado de órgãos de comando (políticos) que manifestam a vontade estatal e órgão de execução (administrativos) que cumprem as ordens dos primeiros. A vontade e as ações desses órgãos, todavia, não são dos agentes humanos que neles 88 atuam, mas sim do próprio Estado . _____________ 86 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 240. 87 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo. 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1999, p. 363. 88 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 237. 35 E, nesse sentido, menciona-se o caso da menina Agnes, muito bem exposto por Maria Sylvia Zanella Di Pietro: O primeiro passo no sentido da elaboração de teorias de responsabilidade do Estado segundo princípios do direito público foi dado pela jurisprudência francesa, com o famoso caso Blanco, ocorrido em 1873: a menina Agnes Blanco, ao atravessar uma rua da cidade de Bordeaux, foi colhida por uma vagonete da Cia. Nacional de Manufatura do Fumo; seu pai promoveu ação civil de indenização, com base no princípio de que o Estado é civilmente responsável por prejuízos causados a terceiros, em decorrência de ação danosa de seus agentes. Suscitado conflito de atribuições entre a jurisdição comum e o contencioso administrativo, o Tribunal de Conflitos decidiu que a controvérsia deveria ser solucionada pelo tribunal administrativo, porque se tratava de apreciar a responsabilidade decorrente de funcionamento do serviço público. Entendeu-se que a responsabilidade do Estado não pode reger-se pelos princípios do Código Civil, porque se sujeita a regras especiais que variam conforme as necessidades do serviço e a imposição de conciliar os direitos do Estado com os direitos privados. A partir daí começaram a surgir as teorias publicistas da responsabilidade do Estado: teoria da culpa do serviço ou da culpa administrativa e teoria do risco, desdobrada por alguns autores, em teoria do risco administrativo e 89 teoria do risco integral . Assim, no que tange às teorias públicas, estas se subdividem fundamentalmente em: culpa do serviço ou administrativa, ou seja, aquela que desvincula a responsabilidade estatal da idéia de culpa do funcionário, atribuindo-se esta ao próprio serviço, figurando como a culpa anônima, seja porque o serviço funcionou mal, tardiamente ou até mesmo porque não funcionou, não se perquirindo a atuação culposa do funcionário; e no risco administrativo, cuja responsabilização civil será objetiva, baseada na idéia de que os prejuízos da atuação estatal, assim como de que os benefícios, devem ser repartidos entre todos os membros da sociedade. Justamente por esse fato não há que se falar em dolo ou culpa, mas sim em nexo causal entre o funcionamento do serviço e o dano ocasionado, já que o risco é inerente a toda atividade estatal. Melhor explicitando, as teorias publicistas, a autora supramencionada ainda alinha que: A teoria da culpa do serviço, também chamada de culpa administrativa, ou teoria do acidente administrativo, procura desvincular a responsabilidade do Estado da idéia de culpa do funcionário. Passou a falar em culpa do serviço público. Distinguia-se, de um lado, a culpa individual do funcionário, pela qual ele mesmo respondia, e, de outro, a culpa anômina do serviço público; nesse caso, o funcionário não é identificável e se considera que o serviço funcionou mal; incide, então a responsabilidade do Estado. _____________ 89 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.564. 36 Sem abandonar essa teoria, o Conselho de Estado francês passou a adotar, em determinadas hipóteses, a teoria do risco, que serve de fundamento para a responsabilidade objetiva do Estado. Essa doutrina baseia-se no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais: assim como os benefícios decorrentes da atuação estatal repartemse por todos, também os prejuízos sofridos por alguns membros da sociedade devem ser repartidos. Quando uma pessoa sofre um ônus maior do que o suportado pelas demais, rompe-se o equilíbrio que necessariamente deve haver entre os encargos sociais; para restabelecer esse equilíbrio, o Estado deve indenizar o prejudicado, utilizando recursos de erário público. Nessa teoria, a idéia de culpa é substituída pela de nexo de causalidade ente o funcionamento do serviço e o prejuízo sofrido pelo administrado. É indiferente que o serviço público tenha funcionado bem ou mal, de forma regular ou irregular. É chamada teoria da responsabilidade objetiva, precisamente por prescindir da apreciação dos elementos subjetivos (culpa ou dolo); é também chamada teoria do risco, porque parte da idéia de que a atuação estatal envolve risco de dano, que lhe é inerente. Causado o dano, o Estado responde como se fosse uma empresa de seguro em que os segurados seriam os contribuintes que, pagando seus tributos, contribuem para a 90 formação de um patrimônio coletivo . Desse modo, as teorias publicistas encerram o quadro evolutivo da responsabilização civil do Estado. Relativamente à responsabilização civil do Estado no Brasil, vale lembrar que As constituições de 1824 e 1891 não continham disposição que previsse a responsabilidade do Estado; elas previam apenas a responsabilidade do funcionário em decorrência de abuso ou omissão praticados no exercício de suas funções. Nesse período, contudo, havia leis ordinárias prevendo a responsabilidade do Estado, acolhida pela jurisprudência como sendo solidária com a dos funcionários; era o caso dos danos causados por estrada de ferro, por colocação de linhas telegráficas, pelos serviços de correio. Com o Código Civil, promulgado em 1916, entende-se que teria sido adotada a teoria civilista da responsabilidade subjetiva, à vista do disposto no seu artigo 15: “as pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis por atos de seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo do modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo direito de regresso contra os causadores do 91 dano . Posteriormente, A Constituição de 1934 acolheu o princípio da responsabilidade solidária entre Estado e funcionário. Nos termos de seu artigo 171, os funcionários são responsáveis solidariamente com a Fazenda Nacional, Estadual ou Municipal, por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício de seus cargos. A mesma norma se repetiu no artigo 158 da Constituição de 1937. Com a Constituição de 1946 é que se adotou a teoria da responsabilidade objetiva. De acordo com seu artigo 194, “as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que seus _____________ 90 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.565. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.566. 91 37 funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros”. Pelo parágrafo único, “caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”. A Constituição de 1967 repete a norma em seu artigo 105, acrescentando, no parágrafo único, que a ação regressiva cabe em caso de culpa ou dolo, expressão não incluída no preceito da Constituição anterior. Na Emenda º 1, de 1969, a norma foi mantida no artigo 107. A Constituição de 1988, no artigo 37, 6º, determina que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos caso de dolo ou culpa”. O Código Civil de 2002 não repete a norma do artigo 15 do Código Civil de 1916. Determina, no artigo 43, que “ as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos que seus agentes nessa qualidade causem a terceiros, ressalvado o direito de regresso contra os causadores de dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo”. De certa forma, está atrasado em relação à norma constitucional, tendo em vista que não faz referência às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. Entende-se que, a partir da Constituição de 1946, ficou consagrada a teoria da responsabilidade objetiva do Estado; parte-se da idéia de que, se o dispositivo só exige culpa ou dolo para o direito de regresso contra o funcionário, é porque não quis fazer a mesma exigência para as pessoas 92 jurídicas . Visto isso, passa-se a análise das espécies de responsabilização civil imputáveis ao Estado, assim como das teorias que lhes embasam. 3.2 Responsabilidade Civil Objetiva: Referindo-se à necessidade de evolução das teorias informadoras da responsabilidade civil, para que pudesse esta se adequar à realidade social, Sérgio Cavalieri Filho aduziu que: Foi no campo dos acidentes de trabalho que a noção de culpa, como fundamento da responsabilidade, revelou-se primeiramente insuficiente. Na medida em que a produção passou a ser mecanizada, aumentou vertiginosamente o número de acidentes, não só em razão do despreparo dos operários, mas, também, e principalmente, pelo empirismo das máquinas então utilizadas, expondo os trabalhadores a grandes riscos. O operário ficava desamparado diante da dificuldade – não raro, impossibilidade – de provar a culpa do patrão. A injustiça que esse desamparo representava estava a exigir uma revisão do fundamento da responsabilidade civil. Algo idêntico ocorreu com os transportes coletivos, _____________ 92 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.567. 38 principalmente trens, na medida em que foram surgindo. Os acidentes multiplicaram-se, deixando as vítimas em situação de desvantagem. Como iriam provar a culpado transportador por um acidente ocorrido a centenas de quilômetros de casa, em condições desconhecidas para a vítima e seus familiares. Logo os juristas perceberam que a teoria subjetiva não mais era suficiente para atender a essa transformação social ocorrida em nosso século; constataram que, se a vítima tivesse de provar a culpa do causador do dano, em numerosíssimos casos ficaria sem indenização, ao desamparo, dando causa a outros problemas sociais, porquanto, para quem vive de seu trabalho, o acidente corporal significa a miséria, 93 impondo-se organizar a reparação (grifo do autor). Assim, fulcrada no risco, surgiu a responsabilidade civil objetiva. Com o intuito fundamental de proteger a vítima, já que em certas hipóteses o ônus da prova da culpa figura como tarefa demasiadamente difícil para a parte hipossuficiente de determinada relação jurídica, especialmente a exemplo do que ocorre entre Estado (administrador) ou preposto deste e cidadão (administrado), determina que há uma inversão do ônus probatório, cabendo ao demandado realizar a prova de que não agiu com culpa para a eclosão do dano, já que há uma presunção que lhe desfavorece. Note-se que nessa modalidade de responsabilização civil basta para configurar o dever de indenizar a conduta, o dano e o nexo de causalidade existente entre os primeiros elementos. Pois, Em vários casos, a opção legislativa será não a de pôr em relevo a falha de comportamento, mas sim o dano, atento primordialmente à necessidade reparatória. Em tais casos, pode o ato ser lícito ou ilícito, pode ou não haver conduta culposa, porém, aferido o necessário liame jurídico entre conduta e 94 dano, existe obrigação de indenizar. Assim, Sinteticamente, a responsabilidade do Estado se caracteriza pelo preenchimento dos seguintes pressupostos: 1) que se trate de pessoa jurídica de direito público ou de direito privado prestadora de serviços públicos; 2)que estas entidades estejam prestando serviço público; 3) que haja um dano causado a particular; 4) que o dano seja causado por agente (a qualquer título) destas pessoas jurídicas e; 5) que estes agentes, ao 95 causarem dano, estejam agindo nesta qualidade . _____________ 93 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 6.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 154. 94 CASTRO, Guilherme Couto de. A Responsabilidade Civil Objetiva no Direito Brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 29. 95 CAETANO, Marcelo. Princípios Fundamentais do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1977. p. 542. 39 Nessa tangente cumpre referir, que a responsabilidade objetiva, em razão da sua amplitude, somente pode ser aplicada quando existe lei expressa que a autorize, a exemplo do previsto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, relativamente ao Poder Público, ou quando o dano decorrer da atividade normalmente desenvolvida pelo causador do dano, consoante dispõe o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil96. A esse respeito, escreve Meireles: o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiro por seus servidores, independente de prova de culpa no cometimento da lesão. Firmou, assim, o princípio objetivo da responsabilidade sem culpa pela autuação lesiva dos agentes públicos e 97 seus delegados . Ademais: O § 6.º do art. 37 da Constituição Federal segui a linha traçada nas Constituições anteriores, e, abandonando a privatística teoria subjetiva da culpa, orientou-se pela Doutrina do Direito Público e manteve a responsabilidade civil objetiva da administração, sob a modalidade do risco administrativo. Não chegou, porém, aos extremos do risco integral. É o que se infere do texto constitucional e tem sido admitido reiteradamente pela 98 jurisprudência, com apoio na melhor doutrina... No entanto, há divergências, como esclarece Patsy Schlesinger: No que diz respeito ao art. 37, § 6º, da vigente Constituição, alguns sustentam que tal dispositivo só previu os casos de responsabilidade objetiva; enquanto outros entendem que o referido artigo disciplinou hipóteses de responsabilidade objetiva e subjetiva. A maioria dos doutrinadores, capitaneada pelo emérito Hely Lopes Meirelles, postula que o art. 37, § 6º, diz respeito tão-somente às hipóteses de responsabilidade objetiva, fundada no risco. A segunda corrente defendida por Celso Antônio Bandeira de Mello sustenta que a responsabilidade subjetiva do Poder Público funda-se na falta de serviço público, isto é, baseia-se na teoria da 99 culpa do serviço, que não funcionou, funcionou mal ou tardiamente. ” Nesse sentido, especificamente no que se refere aos casos em que há omissão estatal, vale lembrar Sérgio Henriques Zanon Freitas, que afirma: _____________ 96 “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direito de outrem”. 97 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 630. 98 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 629. 99 SCHLESINGER, Patsy. Responsabilidade Civil do Estado Por Ato do Juiz. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1999. p. 43. 40 entende-se que estará sujeita à ação de reparação por responsabilidade objetiva a Administração que, não por qualquer inércia ou abstenção (faute du service), mas quando, por manifesta e presumível omissão deixar de executar atividade ou prestar algum serviço público determinado por lei ou 100 por decisão judicial, acarretando prejuízo a terceiros . Veja-se, então, a teoria do Risco Administrativo, que informa a responsabilização Civil objetiva do Estado. 3.2.1 Teoria do Risco Administrativo Nos casos de responsabilização civil extracontratual objetiva do Estado, o nosso sistema jurídico positivo impõe, em regra, como previamente mencionado, a aplicação da teoria do Risco Administrativo, que tem por base a noção de que a atividade estatal é de risco por natureza, tendo em vista seus diversos campos de atuação, o que pode vir acarretar danos macroscópicos aos indivíduos, ainda que seja plenamente lícita sua conduta. Pois, O Estado tem o dever de exercer a sua atividade administrativa, mesmo quando perigosa ou arriscada, com absoluta segurança, de modo a não causar dano a ninguém. Está vinculado, portanto, a um dever de incolumidade, cuja violação enseja o dever de indenizar independentemente 101 de culpa . E, cumpre salientar que O próprio sentido de justiça (eqüidade), o neminen laedere, o alterum non laedere, que permeia o Direito e a própria vida, em virtude do qual o causador de prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano. No caso da Administração Pública, a multiplicidade e amplitude de suas atividades 102 e a suas prerrogativas de poder ensejam risco maior a terceiros (grifo da aurora). Nessa tangente, alinha Sérgio Cavalieri Filho: Em busca de um fundamento para a responsabilidade objetiva do Estado, valeram-se os juristas da teoria do Risco, adaptando-a para a atividade pública. Resultou, daí, a teoria do risco administrativo, imaginada originalmente por Léon Duguit e desenvolvida por renomados _____________ 100 FREITAS, Sérgio Henriques Zanon. Curso Prático de Direito Administrativo. 2.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 276. 101 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 240. 102 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 9.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 430. 41 administrativistas, teoria, essa, que pode ser assim formulada: a Administração Pública gera risco para os administrados, entendendo-se como tal a possibilidade de dano que os membros da comunidade podem sofrer em decorrência da normal ou anormal atividade do Estado. Tendo em vista que essa atividade é exercida em favor de todos, seus ônus devem ser também suportados por todos, e não apenas por alguns. Conseqüetemente, deve o Estado, que a todos representa, suportar os ônus da sua atividade, 103 independentemente de culpa dos seus agentes. E, continua o mesmo autor: Na última fase dessa evolução proclamou-se a responsabilidade objetiva do Estado, isto é, independentemente de qualquer culpa do serviço, desenvolvida no terreno próprio do direito público. Chegou-se à essa posição com base nos princípios da eqüidade e da igualdade de ônus e encargos sociais . Se a atividade administrativa do Estado é exercida em prol da coletividade, se traz benefícios para todos, justo é, também, que todos respondam pelos ônus, a serem custeados pelos impostos. O que não tem sentido, nem amparo jurídico, é fazer com que um ou apenas alguns administrados sofram todas as conseqüências danosas da atividade 104 administrativa (grifo do autor). Segundo, Guilherme Couto de Castro: a responsabilidade sem culpa do Estado existe e tem como fundamento a idéia de socializar o ônus injusto recaindo sobre um ou alguns isoladamente; a vítima também não é culpada, e como foi a ação própria e direta da administração a causadora do mal, é mais justo, em tais casos, a 105 divisão dos custos pela coletividade, representada pelo ente público . Interessante é o esclarecimento prestado por Caio Mário, que refere que a teoria do risco administrativo, foi imaginada originariamente por Leon Duguit, sobre a idéia de um seguro social suportado pela caixa coletiva, em proveito de quem sofre um prejuízo causado pelo funcionamento do serviço 106 público . Não há dúvida, pois, que havendo responsabilização civil extracontratual do Estado objetiva, a noção de culpa se desloca para a idéia de risco criado pela atividade. No mais, quanto aos efeitos da adoção desta teoria, Juarez Freitas referiu que: A adoção da teoria do risco não só influencia o modo de solução da lide, aumentando as chances de procedência do pedido; como também a celeridade de seu trâmite, dada a maior celeridade instrutória, eis que dos três tradicionais pressupostos do dever de indenizar, a culpa é, sem dúvida _____________ 103 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 237. 104 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 6.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 252. 105 CASTRO, Guilherme Couto de. Responsabilidade civil objetiva no Direito Brasileiro. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 54. 106 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p.132. 42 alguma, a que traz maiores problemas àquele que tenha o ônus de 107 comprová-la . Assim, dispensando a análise do fator culpa, A teoria do risco, ou teoria da responsabilidade objetiva do estado, leva em conta apenas o fato do serviço, e o dever de indenizar surge, para o Estado, decorrente de dois pressupostos: o dano e o nexo causal entre a ação ou 108 omissão do agente e o prejuízo causado. . Odete Medauar refere que: informada pela teoria do risco, a responsabilidade do Estado apresenta-se hoje, na maioria dos ordenamentos, como responsabilidade objetiva. Nessa linha, não mais se invoca o dolo ou culpa do agente, o mau funcionamento ou falha da Administração. [...] Deixa-se de lado, para fins de ressarcimento do dano, o questionamento do dolo ou culpa do agente, o questionamento da licitude ou ilicitude da conduta, o questionamento do bom ou mau funcionamento da Administração. Demonstrado o nexo de causalidade, o 109 Estado deve ressarcir . Importa, entretanto, fazer aqui uma observação concernente ao risco administrativo e o risco integral, já que qualificar o risco do Estado como integral significa dizer que este é responsável por qualquer dano causado, independentemente de ser a culpa exclusiva da vítima, hipótese de caso fortuito ou de força maior. Pois, contrariamente à teoria do risco administrativo, a teoria do risco integral não permite qualquer prova no sentido de elidir a responsabilização do Poder Público, havendo, isso sim, a presunção juris et de jure (de direito e por direito)110 de que o Estado atua com culpa quando ocasiona um prejuízo, bastando para caracterizar a obrigação de reparar, o seu simples envolvimento no evento danoso. Nesse sentido, adverte Carlos Roberto Gonçalves que: a teoria do risco, sem qualificações, conduz necessariamente à responsabilidade objetiva em sua plenitude, com a dispensa de qualquer pressuposto de falha do serviço, ou culpa anônima da administração, na 111 verificação do evento danoso . _____________ 107 FREITAS, Juarez. Responsabilidade Civil do Estado. 1.ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2006, p. 54. 108 VENDRAMEL, Aparecida. Responsabilidade Extracontratual do Estado. São Paulo: Themis, 2000. p. 31. 109 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 430. 110 COSTA, Wagner Veneziani; AQUAROLI, Marcelo. Dicionário Jurídico. São Paulo: WVC, [19--].p. 345. 111 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 175. 43 Segundo Hely Lopes Meirelles112 a teoria do risco integral representa uma modalidade extremada da doutrina do risco administrativo, cuja prática é inviabilizada por conduzir ao abuso e falta de eqüidade social, já que por essa fórmula radical, a Administração ficaria obrigada a indenizar qualquer dano suportado por terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo da vítima. Daí por que foi acoimada de “brutal”, pelas graves 113 conseqüências que haveria de produzir se aplicada na sua inteireza . Para Yussef Said Cahali114, a distinção entre risco administrativo e risco integral não é estabelecida em função de uma distinção conceitual ou ontológica entre as duas modalidades de risco, mas simplesmente em função das conseqüências de sua aplicação. Segundo ele, o risco administrativo permite a contraprova de excludente de responsabilidade, o que não é admitido na modalidade de risco integral, já que dispensa até mesmo a existência do nexo causal entre conduta e dano, bastando a existência desse último elemento. Nesse sentido, aduz Sérgio Cavalieri Filho que A teoria do risco integral é uma modalidade extremada da doutrina do risco destinada a justificar o dever de indenizar até nos casos de inexistência do nexo causal. Mesmo na responsabilidade objetiva, conforme já enfatizado, embora dispensável o elemento culpa, a relação de causalidade é indispensável, todavia, o dever de indenizar se faz presente tão só em face do dano, ainda nos casos de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou de força maior. Dado o seu extremo , o nosso Direito só 115 adotou essa teoria em casos excepcionais... (grifo do autor). Um exemplo de adoção da teoria do risco integral no sistema jurídico pátrio é a determinação da Lei n º 10.744, de 09 de outubro de 2003, que trata da assunção, pela União, de responsabilidades civis perante terceiros no caso de atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo Público, excetuando-se as empresas de táxi aéreo, que em seu artigo 1º, parágrafo 1º116, que _____________ 112 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 616. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 627. 114 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade Civil do Estado. São Paulo: Malheiros, 1995, p.40. 115 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 6.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 157-158. 116 o Art. 1 Fica a União autorizada, na forma e critérios estabelecidos pelo Poder Executivo, a assumir despesas de responsabilidades civis perante terceiros na hipótese da ocorrência de danos a bens e pessoas, passageiros ou não, provocados por atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, ocorridos no Brasil ou no exterior, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi aéreo. 113 _____________ 44 determina que poderá a União, independentemente da verificação de culpa ou nexo de causalidade entre eventuais condutas e danos, assumir determinadas despesas até o limite de US$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de dólares dos Estados Unidos da América). Outro caso é a hipótese, por exemplo, prevista no artigo 21, inciso XXIII, alínea c, da Constituição Federal117, que trata dos danos nucleares. Tal dispositivo, embora isto seja objeto de controvérsias, configura uma das poucas situações previstas em nosso ordenamento jurídico em que se pode cogitar a aplicação da teoria do risco integral. Segundo Juarez Freitas: Em particular, entende-se que o art. 21, XXIII, ‘c’, diferentemente do art. 37, § 6.º, contemplou a teoria da responsabilidade do Estado pelo risco integral. É que quando o constituinte se valeu da expressão ‘independentemente de culpa’ para reconhecer aí a responsabilidade estatal, excluiu, de plano, a possibilidade de se cogitar de culpa, seja ela do Estado, da vítima ou mesmo derivada de evento alheio à ação ou omissão de ambos: desde que configurado o dano e o nexo causal, inexistente a possibilidade de excludente de responsabilidade de parte do Estado. Caso contrário, a prescrição do art. 21, XXIII, ‘c’ seria completamente 118 desnecessária (grifo do autor). Sérgio Cavalieri Filho119, também afirma que haverá casos em que a responsabilização civil objetiva do Estado poderá ser embasada da teoria do risco integral, na medida em que afirma que assim o será nas hipóteses de responsabilização pelos danos causados ao meio ambiente, conforme prevê o artigo 225 § 3º, da Constituição Federal120, pois, alinha o autor, que _____________ o § 1 O montante global das despesas de responsabilidades civis referidas no caput fica limitado ao equivalente em reais a US$ 1,000,000,000.00 (um bilhão de dólares dos Estados Unidos da América) para o total dos eventos contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi aéreo. 117 Art. 21. Compete à União: XXIII – explorar serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições: (,,,) c) a responsabilidade civil por danosas nucleares independentemente da existência de culpa; 118 FREITAS, Juarez. Responsabilidade Civil do Estado. 1.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 214. 119 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 153-154. 120 Artigo 225. Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e À coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (...) _____________ 45 se fosse possível invocar o caso fortuito ou a força maior como causas excludentes de responsabilidade civil por dano ecológico, ficaria fora da incidência da lei a maior parte dos casos de poluição ambiental. Já Alvino Lima afirma que a responsabilização civil objetiva do Estado, nos casos de danos ao meio ambiente, deverá ter sua base na teoria do risco, na medida em que alinha: A responsabilidade pelo dano ecológico, à vista do disposto no art. 14 da Lei n.º 6.938/81, na conformidade da jurisprudência atual, é objetiva, pois “obriga o poluidor a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade, independentemente de existência de culpa. Portanto, em cada caso concreto, haverá de existir a prova de dois pressupostos indispensáveis: a existência do dano ambiental e seu nexo causal com a ação ou omissão do pretenso responsável que seja a causa 121 eficiente do evento capaz de gerar o prejuízo a ser indenizado . Não destoa desse autor o entendimento de Tupinambá Miguel Castro do Nascimento, na medida em que refere: A ‘culpa exclusiva’, seja da vítima, seja de terceiro, que não seja o agente ‘nessa qualidade (§ 1º do art. 37 da C.F.), é causa excludente da responsabilidade estatal porque desfaz o próprio nexo causal necessário à responsabilização. Com efeito, se a causa exclusiva, ou única, dos danos, é a culpa da vítima ou de terceiro, este sem qualquer vinculação com o Estado, o nexo causal não tem origem na atividade da administração pública ou em sua omissão. Ao contrário, o nexo causal se daria entre o ato ou omissão culposos da vítima e os danos então resultantes. Esta 122 excludente ataca a raiz da responsabilidade . Note-se que, mesmo sendo discutível, alguns autores admitem a responsabilização civil com base no risco integral somente em casos excepcionais, cuja relevância do dano alcança proporções planetárias, como é o caso do meio ambiente, bem de uso comum do povo e patrimônio da humanidade, por excelência, e no caso de danos nucleares, que acaba por afetar diretamente ao bem ambiental protegido, direito fundamental de terceira geração. Nesse sentido, relativamente à omissão do Poder Público na esfera ambiental, vale trazer a valiosa lição de Ana Maria Moreira Marchesan, Annelise Monteiro Steigleder e Sílvia Cappeli: _____________ §3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambinete sujeitarão aos infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. 121 LIMA, Alvino. Culpa e Risco. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 320. 122 NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Responsabilidade Civil do Estado. Rio de Janeiro: Aide, 1995. p. 19. 46 Em se tratando de omissão do Poder Público quanto ao funcionamento de serviço público que, na hipótese da degradação ambiental, consubstancia em deficiência do exercício do poder de polícia na fiscalização das atividades poluidoras e na concessão de licenças ambientais, há divergência doutrinária. Conforme Mello, em se tratando de atividades clandestinas, a responsabilidade do Poder Público é subjetiva, embora se possa partir de uma presunção juris tantum de responsabilidade, e somente incide nas situações de falta do serviço público: o serviço não funciona, funciona mal ou funciona tardiamente, devendo, ainda, existir uma obrigação legal de o Poder Públio impedir certo evento danoso. Do mesmo sentir compartilham Leite, Lucarelli, Oliveira e Jucovsky. Veja-se que, nesta hipótese, inexiste nexo de causalidade direto entre o dano ambiental e a atividade estatal, uma vez que o dano resultou de uma atividade clandestina do particular ou de uma atividade lícita do particular empreendida em virtude de uma autorização administrativa ou licenciamento ambiental irregular ou deficiente. Trata-se de uma responsabilidade indireta, decorrente de omissão, reputada uma das condições do evento lesivo, pelo que se deve demonstrar que o Estado omitiu-se ilicitamente, “por não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente neste mister, em razão de comportamento inferior ao padrão legal exigível”. Silveira refere, ainda, que “não basta à configuração da responsabilidade estatal a simples relação entre a ausência de serviço (omissão estatal) e o dano sofrido. È necessário demonstrar a culpa por negligência ou imperícia no serviço ensejador do dano, quando ao Estado era exigido um certo padrão de conduta capaz de obstar o evento lesivo”, sendo que este padrão de conduta será aferido caso a caso. Essa mesma construção é aplicável aos fatos da natureza, “a cuja lesividade o Poder Público não obstou, embora devesse fazê-lo. Sirva de exemplo o algamento de casas ou depósitos por força do empoçamento de águas pluviais que não escoaram por omissão do Poder Público em limpar os bueiros e galerias que lhes teriam dado vazão. No entanto, se houver dano ou sacrifício especial ao ambiente, a responsabilização estatal será objetiva, sob o fundamento do princípio da igualdade, procurando-se garantir uma equânime repartição dos ônus provenientes dos atos ou efeitos lesivos, evitando que alguns suportem prejuízos ocorridos por ocasião ou por causa de atividades desempenhadas no interesse de todos. Além do que se deve reconhecer que foi por meio de uma atuação estatal que se criou a situação propiciatória do dano, que decorreu de uma atividade licenciada. Assim, Mello afirma que “a responsabilidade em tais casos (danos dependentes de situação produzida pelo Estado)evidentemente será relacionada com o risco suscitado. Donde, se a lesão sofrida não guardar qualquer vínculo com este pressuposto, não haverá falar em responsabilidade objetiva”. Já para Machado, Mancuso e Milaré, a responsabilidade advinda da omissão estatal será sempre objetiva, já que o art. 3º, inc. IV, refere-se à “responsabilidade indireta”, pelo que não exigiria um nexo de causalidade direto entre ação e dano. Daí o Poder Público, que não coíbe a ação do particular mediante ações fiscalizatórias, e que concede uma licença ambiental precária e ilegal, está concorrendo indiretamente para a produção do dano, aplicando-se-lhe a regra da responsabilidade civil objetiva e o princípio da solidariedade entre os co-poluidores. Este entendimento, de acordo com os autores referidos, vem reforçado pelo art. 225, caput, da Constituição Federal, que impõe ao Estado o dever de defender o meio ambiente e de preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (...) Finalmente, uma terceira hipótese de responsabilização estatal traduz-se quando a omissão estatal é a única causa do dano (responsabilidade comissiva por omissão). Ou seja, ocorre omissão na prestação de um serviço público essencial, tal como a destinação final do resíduo sólido 47 urbano, a conservação de rodovias, ameaças de erosão e o tratamento de esgoto. Neste caso, Pasqualotto e Leite manifestam-se pela incidência da responsabilização objetiva do Poder Público, pois que a omissão estatal é a 123 causa direta do dano . Note-se que, clara é, portanto, a inviabilidade de aplicação ampla e irrestrita da teoria do Risco Integral, sobretudo, no que tange à responsabilização civil extracontratual do Estado, já que sendo ela aplicada desse modo, seria inviabilizada a atuação estatal, na medida em que se transformaria o ente público em segurador universal, cobrindo todo e qualquer dano ocasionado, tendo em vista o seu vasto campo de atuação. Portanto, sendo objetiva a responsabilidade do Poder Público, a regra é a aplicação da teoria do risco administrativo. Pois, a Constituição distingue é o dano causado pelos agentes da Administração (servidores) dos danos ocasionados por atos de terceiros ou por fenômenos da natureza. Observe-se que o art. 37, § 6º, só atribui responsabilidade objetiva à Administração pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causem a terceiros. Portanto o legislador constituinte só cobriu o risco administrativo da atuação ou inação dos servidores públicos; não responsabilizou objetivamente a Administração por atos predatórios de terceiros, nem por fenômenos naturais que causem danos aos 124 particulares . No entanto, não se pode esquecer que isso não significa, necessariamente, adoção da tese objetiva com exclusividade, pois ainda existe a responsabilidade decorrente da falta do serviço, que é a regra; na verdade, coexistem a responsabilidade objetiva e a subjetiva, esta fundada na faute de service e não mais na culpa do agente público (a não ser nos casos em que o Estado se iguale juridicamente ao 125 administrado) . 3.3 Responsabilidade Civil Subjetiva Em que pese a regra geral do Direito brasileiro ser a modalidade de responsabilização objetiva, cuja aplicabilidade, inclusive, foi ampliada pelo novo _____________ 123 MARCHESAN, Ana Maria Moreira; STEIGLEDER, Annelise Monteiro; CAPPELI, Sílvia. Direito Ambiental: Série Concursos. 4. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2007. p. 155-159. 124 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 21 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996. p. 566. 125 LUZ, Odília Ferreira. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 298. 48 texto do Código Civil vigente, em seus artigos 933126 e 936127, assim como na regra geral do artigo 927, parágrafo único128, a responsabilização subjetiva ainda é muito adotada e se dá em razão da prática de ato ilícito, o que pressupõe a ocorrência de culpa latu senso. Expõe Fernando Noronha: A responsabilidade subjetiva, ou culposa, também chamada de responsabilidade civil por atos ilícitos, ou aquiliana, é obrigação de reparar danos causados por ações ou omissões intencionais (ou seja, dolosas), imperitas, negligentes ou imprudentes (isto é, culposas), que violem direitos 129 alheios. Nesse sentido, Sérgio Cavalieri Filho refere que: A idéia de culpa está visceralmente ligada à responsabilidade, por isso que, de regra, ninguém pode merecer censura ou juízo de reprovação sem que tenha faltado com o dever de cautela em seu agir. Daí ser a culpa, de acordo com a teoria clássica, o principal pressuposto da responsabilidade civil subjetiva. O novo Código Civil, em seu artigo 186 (art. 159 do Código Civil de 1916), manteve a culpa como fundamento da responsabilidade subjetiva. A palavra culpa está sendo aqui á sendo aqui empregada em sentido amplo, lato 130 sensu, para indicar não só a culpa strito sensu, como também o dolo. Contudo, no que tange à responsabilização civil do Estado, a aplicação da teoria em comento ainda é muito restrita, pois, em virtude do enunciado constitucional (artigo 37, §6º), há uma tendência equivocada em se aplicar de maneira incondicionada a teoria objetiva. Com efeito, a regra decorrente de disposição constitucional supramencionada determina que as pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos serão responsáveis objetivamente pelos danos que seus agentes causarem a terceiros, não havendo o que se discutir, portanto, nas hipóteses de responsabilização por atos comissivos. Desse modo, como bem refere Rui Stoco: _____________ 126 Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos. 127 Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior. 128 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a reparálo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. 129 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 1. pág. 484. 130 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2004. p. 38. 49 A verdade é que o ponto sensível da controvérsia em torno dos problemas da responsabilidade civil, são os casos de ação ou falta de providências do serviço. É o que já se chamou de inércia da Administração na execução de serviços públicos que visam a segurança da população e dos usuários. (...) Nesses casos, a responsabilidade se aproxima da culpa, pela omissão em 131 tomar as providências exigidas para a segurança do serviço (...) . Há quem defenda, inclusive, que em todos os casos em que houver omissão do Poder Público, deverá ser aplicada a responsabilidade subjetiva, porquanto ainda que consagre o texto constitucional a responsabilidade objetiva, não há como se verificar a adequabilidade da imputação ao Estado na hipótese 132 de omissão, a não ser pela teoria subjetiva . Nesse sentido, referiu Maria Helena Diniz que: O art. 37, § 6º da Carta Constitucional reporta-se a comportamento comissivo do Estado, pois só uma atuação positiva do Estado pode gerar, causar, produzir um efeito. Logo, para haver responsabilidade objetiva do Poder Público cumpre que haja um comportamento comissivo, uma vez que sem ele jamais haverá causa. (...) Na hipótese de dano por comportamento omissivo, a responsabilidade estatal é subjetiva, por depender de 133 procedimento doloso ou culposo. Celso Antônio Bandeira de Mello mencionou que a: responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente a responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa), ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade 134 subjetiva. Ocorre que, consoante recente entendimento do Supremo Tribunal Federal, a responsabilidade civil por omissão estatal, somente em certos casos, é de ser visualizada sob o ângulo subjetivo, exigindo a ocorrência de dolo ou culpa (negligência, imperícia ou imprudência), não sendo, entretanto, necessário individualizá-los, já que podem ser atribuídos genericamente à falta do serviço, na forma de uma culpa anônima. _____________ 131 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 961. 132 FIGUEIREDO, Lúcia Valle, Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 172. 133 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 1990, v. 7. p. 415. 134 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p.778. 50 Sinale-se que não é qualquer omissão estatal em que a sua responsabilidade será subjetiva, pois, há dois tipos de omissão, a geral e a específica, para aquela a responsabilidade é subjetiva e, para esta é objetiva. Nessa tangente, cumpre salientar que atualmente as decisões dos tribunais se dão, em sua maioria, conforme se verifica no trecho que segue: Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três vertentes - a negligência, a imperícia ou a imprudência não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. - A falta do serviço -- faute du service dos franceses -- não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro. III. - Detento ferido por outro detento: responsabilidade civil do Estado: ocorrência da falta do serviço, com a culpa genérica do serviço público, por isso que o Estado deve zelar pela integridade física do preso. IV. - RE conhecido e provido. 135 (...) . 3.3.1 Teoria da Responsabilidade Subjetiva (aquilina) ou Teoria da Culpa Administrativa por atos omissivos Marcelo Caetano alinha que A teoria da culpa administrativa representa o primeiro estágio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a tese objetiva do risco administrativo, pois leva em conta a falta do serviço para dela inferir a culpa da Administração. É o estabelecimento do binômio falta do serviço - culpa da Administração. Já aqui não se perquire da culpa subjetiva do agente administrativo, mas perquire-se a falta do serviço em si mesmo, como gerador da obrigação de indenizar o dano causado a terceiro. Exige-se, também, uma culpa, mas uma culpa especial da Administração, a que se 136 convencionou chamar culpa administrativa. Na teoria em tela, a obrigação de indenizar está embasada na falta do serviço, denominada pelos franceses de faute du service. A culpa do serviço, ou falta do serviço, ocorre sempre que este não funciona, funciona mal ou tardiamente, _____________ 135 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 3820541/RJ. Órgão Julgador:Segunda Turma Julgado em: 03 ago. 2004. 136 CAETANO, Marcelo. Princípios Fundamentais do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1977. p. 544. 51 caracterizando-se uma espécie de culpa anônima, já que não há como identificar o causador direto do dano pela ausência ou defeito objetivos do serviço prestado. José Cretella Júnior ensina que: Se o serviço funcionou mal, se não funcionou, ou se funcionou com atraso, temos a culpa do serviço, acarretando a responsabilidade civil do Estado 137 por defeito ou falha do serviço público. Nesse sentido, refere Celso Antônio Bandeira de Mello: Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar 138 ao evento lesivo . Afirma o autor, ainda que Ademais, solução diversa conduziria a absurdos. É que, em princípio, cumpre ao Estado prover a todos os interesses da coletividade. Ante qualquer evento lesivo causado por terceiro, como um assalto em via pública, uma enchente qualquer, uma agressão sofrida em local público, o lesado poderia sempre argüir que o ‘serviço não funcionou’. A admitir-se responsabilidade objetiva nessas hipóteses o Estado estaria erigido em segurador universal! Razoável que responda pela lesão patrimonial da vítima de um assalto se agentes policiais relapsos assistiram à ocorrência inertes e desinteressados ou se alertados a tempo de evitá-lo omitiram-se na adoção de providências cautelares. Razoável que o Estado responda por danos oriundos de uma enchente se as galerias pluviais e os bueiros de escoamento das águas estavam entupidos ou sujos, propiciando o acúmulo da água. Nestas situações, sim, terá havido descumprimento do dever legal na adoção de providências obrigatórias. Faltando, entretanto, este cunho de injuridicidade, que advém do dolo, ou da culpa tipificada na negligência, na imprudência ou 139 na imperícia, não há cogitar de responsabilidade pública . Por outro lado, cumpre sinalar que os casos de omissão genérica, pela falta do serviço, em nada se relacionam com eventual conduta culposa do agente público. Como bem explicita Martine Lombard140, a falta do serviço configura necessariamente uma falta anônima, totalmente desvinculada do agente público, já que resulta da carência deste ou, até mesmo, da má organização do próprio serviço, _____________ 137 CRETELLA JÚNIOR, José. O Estado e a Obrigação de Indenizar. São Paulo: Saraiva, 1980. p. 85. 138 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1992. p. 344-345. 139 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1992. p. 345-346. 140 LOMBARD, Martine. Droit Administratif. 3. ed. Paris: Dalloz, 1999. p. 452/454. 52 sendo impossível identificar eventual agente que tenha incorrido em falta, até porque, esta incumbe somente ao serviço público defeituoso. Celso Antônio Bandeira de Mello ensina que em face dos princípios publicísticos não é necessária a identificação de uma culpa individual para deflagrar-se a responsabilidade do Estado. Esta noção civilista ultrapassada pela idéia denominada faute du service entre os franceses. Ocorre a culpa do serviço ou falta de serviço, quando este não funciona, devendo funcionar, funciona mal ou funciona atrasado. Esta é a tríplice modalidade pela qual se apresenta e nela se traduz um elo entre a 141 personalidade tradicional do direito civil e a responsabilidade objetiva . Note-se que essa teoria representa um liame entre a responsabilidade civil tradicional, baseada na culpa, e a responsabilidade objetiva, pois leva em conta a falta do serviço objetivo para dela inferir a responsabilidade do Estado, visto aqui sob o âmbito organicista. Ao mesmo tempo que torna despicienda a análise objetiva da culpa lato sensu, em razão da figura da culpa anônima, que é atribuída genericamente ao serviço público, também não dispensa a demonstração da ocorrência desse elemento, na medida em que não se perquire a falta subjetiva do agente, mas sim a falta objetiva do serviço, atribuindo uma culpa específica à Administração Pública, considerado o serviço em si mesmo, como fato gerador da obrigação de reparar o dano causado. Maria Sylvia Zanella Di Pietro menciona que Essa culpa do serviço público ocorre quando: o serviço público não funcionou (omissão), funcionou atrasado ou funcionou mal. Em qualquer dessas três hipóteses, ocorre a culpa (faute) do serviço ou acidente administrativo, incidindo a responsabilidade do Estado independentemente 142 de qualquer apreciação de culpa do funcionário . Refere a autora, ainda, que “a culpa do serviço público, demonstrada pelo seu mau funcionamento, não funcionamento ou funcionamento tardio é suficiente para justificar a responsabilidade do Estado143”. Ainda, quanto à teoria telada, Rui Stoco alinha que: Por ela não se indaga da culpa do agente administrativo, mas apenas da falta objetiva do serviço em si mesmo, como fato gerador da obrigação de 144 indenizar o dano causado a terceiro . _____________ 141 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Ato Administrativo e Direitos dos Administrados. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 133. 142 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 504. 143 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 508. 144 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 270. 53 Entretanto, cabe à vítima comprovar a inexistência do serviço, seu mau funcionamento ou seu retardamento. Apenas haverá responsabilização civil do Estado, se comprovado que este deixou de atuar quando deveria, ou seja, quando tinha o dever legal de agir e não o fez, implementando, assim, o ilícito a embasar o subjetivismo a ser adotado. Nesse sentido, alinha Sérgio Cavalieri Filho que, para esta teoria, é dispensável a prova de que funcionários nominalmente especificados tenham incorrido em culpa, satisfazendo-se a responsabilização apenas com a constatação de um mau agenciador geral, anônimo, impessoal, na 145 defeituosa condução do serviço, à qual o dano possa ser imputado . Pois, a teoria da responsabilidade subjetiva desvincula a responsabilidade do Estado da idéia de culpa do funcionário, passando a entender como centro da responsabilidade do Estado a culpa do serviço público. Esta culpa anônima do serviço público compreende três formas, estabelecidas na jurisprudência do Conselho de Estado francês: quando o serviço prestado não funciona (culpa in omittendo), funcionou mal 146 (culpa in committendo) ou funcionou tardiamente . Vale ressaltar que o artigo 37, §6º, da Constituição Federal prescreve a responsabilização civil nos casos em que os danos foram causados pelos agentes públicos, sendo discutível afirmar que isso engloba as hipóteses em que a ação ou inação destes figura somente como condição para a ocorrência do dano que estava o Estado obrigado a impedir, mesmo não tendo dado causa direta a estes. Nesse sentido, tem-se que também o Estado não é o autor do dano. Em rigor, não se pode dizer que o causou. Sua omissão ou deficiência haveria sido condição do dano, e não causa. Causa é o fator que positivamente gera um resultado. Condição é o evento que não ocorreu, mas que, se houvera ocorrido, teria impedido o resultado. É razoável e impositivo que o Estado responda objetivamente pelos danos que causou. Mas só é razoável e impositivo que responda pelos danos que 147 não causou quando estiver de direito obrigado a impedi-los . Cumpre sinalar, no entanto, que o comportamento omissivo do agente público, quando figurar como condição primária para a ocorrência do dano praticado por terceiro, constitui a causa e não simples condição do evento danoso. _____________ 145 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 238. 146 BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa. Manual de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 168-169. 147 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 897. 54 Assim, tem-se que em que pese a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva ser adotada pela Constituição Federal, o Poder Judiciário, em determinados julgamentos, utiliza a teoria da culpa administrativa para responsabilizar o Estado em casos de omissão. Assim, a omissão na prestação de serviço público tem levado à aplicação da teoria da culpa do serviço público (faute du service). A culpa decorreu da omissão do Estado, quando este deveria ter agido. Por exemplo, o Poder Público não conservou adequadamente as 148 rodovias e ocorreu um acidente automobilístico com terceiros . Outro bom exemplo de aplicação da teoria subjetiva ou da culpa administrativa É o caso de uma manifestação pública, em que uma multidão de terceiros (particulares não na qualidade de agentes públicos) venha a causar danos às pessoas, depredando propriedades, por exemplo; ou de fenômenos da natureza, como vendavais, chuvas, enchentes, etc... que venham a causar sérios prejuízos à população. Nessas hipóteses, a indenização estatal só será devida se restar comprovada a culpa da Administração 149 (responsabilidade subjetiva) ”. Ou seja, deverá restar comprovado que a omissão estatal específica, requisito subjetivo, deu causa direta aos danos, não bastando para a hipótese apenas a constatação do liame causal, já que se trata de omissão genérica do Estado. Verifica-se, pois, que Não bastará, então, para configurar-se responsabilidade estatal, a simples relação entre ausência do serviço (omissão estatal) e o dano sofrido. Com efeito: inexistindo obrigação legal de um certo evento dano (obrigação, de resto, só cogitável quando haja possibilidade de impedi-lo mediante atuação diligente), seria um verdadeiro absurdo imputar ao Estado responsabilidade por um dano que não causou, pois equivaleria a extraí-la do nada; significaria pretender instaurá-la prescindindo de qualquer fundamento racional ou jurídico. Cumpre que haja algo mais: a culpa por negligência, imprudência ou imperícia no serviço, ensejadoras do dano, ou então o dolo, intenção de omitir-se, quando era obrigatório para o Estado atuar e fazê-lo segundo um certo padrão de eficiência capaz de obstar ao evento lesivo. Em uma palavra: é necessário que o Estado haja incorrido em ilicitude, por não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente neste mister, em razão de comportamento inferior ao padrão legal exigível. Não há resposta a priori quanto ao que seria o padrão normal tipificador da obrigação a que estaria legalmente adstrito. Cabe indicar, no entanto, que a normalidade que a normalidade da eficiência há de ser apurada em função do meio social, do estádio de desenvolvimento tecnológico, cultural, econômico e da conjuntura da época, isto é, das possibilidades reais médias dentro do ambiente em que se produziu o fato danoso. (...) Em síntese: se o estado, devendo agir, por imposição legal, não agiu ou o fez deficientemente, comportando-se abaixo dos padrões legais que normalmente deveriam caracterizá-lo, responde por esta incúria, negligência ou deficiência, que traduzem um ilícito ensejador do dano não evitado _____________ 148 BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa. Manual de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 171. 149 ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito Administrativo. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004, p. 410. 55 quando, de direito, devia sê-lo. Também não o socorre eventual incúria em ajustar-se aos padrões devidos. Reversamente, descabe responsabilizá-lo se, inobstante atuação compatível com as possibilidades de um serviço normalmente organizado e eficiente, não lhe foi possível impedir o evento danoso gerado por força 150 (humana ou material) alheia . _____________ 150 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 896 -897. 57 4 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL ACERCA DA RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO POR OMISSÃO A fim de demonstrar a diferenciação prática no que tange a aplicação das teorias objetiva e subjetiva quando se trata de responsabilizar civilmente o Estado por omissão, analisam-se alguns julgados dos Tribunais Superiores, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e também do Tribunal Regional Federal da 4ª Região acerca de casos em que há omissão do Poder Público. Em que pese haver recentes julgados, acolhendo a posição inovadora ora defendida, qual seja, a de que nos casos em que a omissão estatal é genérica, em que não havia um dever individualizado de agir, deverá ser aplicada a teoria subjetiva e, havendo omissão específica, em que aí sim existia esse dever especificado, a teoria a ser aplicada é a objetiva, verifica-se que há outros entendimentos a respeito do tema. Em alguns julgados se encontra entendimento que deverá a responsabilização civil do Poder Público ser analisada sob a ótica objetiva, mesmo que se trate de conduta omissiva independentemente de ser a omissão perpetrada específica ou genérica. Outros afirmam que, em se tratando de conduta omissiva do Estado, o fator culpa deverá impreterivelmente ser analisado, aplicando-se, portanto, a teoria subjetiva. Alinham estes magistrados, embasados nos mais expressivos defensores dessa idéia, Osvaldo Aranha Bandeira de Mello e seu sucessor, Celso Antônio Bandeira de Mello, que somente haverá o dever de indenizar por parte do Estado quando a sua omissão for ilícita, tendo em vista o princípio da legalidade que delimita sua atuação. Assim, partindo-se da premissa de que o Estado somente 57 poderá agir em virtude de lei, se for omisso ao se abster de praticar qualquerconduta que não esteja expressamente determinada, não haverá sua responsabilização civil, já que agiu ou deixou de agir dentro de suas atribuições. Por outro lado, omitindo-se quando a lei determinava que agisse, estará cometendo ilícito, o que pressupõe sua culpa, não havendo outra maneira de lhe imputar responsabilidade que não analisando os fatores subjetivos de determinada conduta. No entanto, independentemente da teoria adotada, jamais se pode perder de vista, quando se trata de responsabilizar civilmente o Estado por sua omissão, os princípios que norteiam a Administração Pública para que se tenha um julgamento efetivamente justo. Pois, Os princípios, ao constituírem exigências de otimização, permitem o balanceamento e valores e interesses (não obedecem, como as regras, à ‘lógica do tudo ou nada’), consoante seu peso e a ponderação de outros princípios eventualmente conflitantes; as regras não deixam espaço para qualquer outra solução, pois se uma regra vale (tem validade) deve cumprirse na exata medida das suas prescrições, nem mais nem menos. Em caso de conflito entre princípios, estes podem ser objeto de ponderação, de harmonização, pois eles contém apenas ‘exigências’ ou ‘standards’ que, prima faciae, devem ser realizados; as regras contém ‘fixações normativas’ definitivas, sendo insustentável a validade simultânea de regras 151 contraditórias. Nessa tangente, acerca do Princípio da Razoabilidade, um dos que mais importa ser analisado, merece destaque a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello: Enuncia-se com este princípio que a Administração, ao atuar no exercício de discrição, terá de obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosa das finalidades que presidiram a outorga da competência exercida. Vale dizer: pretende-se colocar em claro que não serão apenas inconvenientes, mas também ilegítimas - e, portanto, jurisdicionalmente invalidáveis - , as condutas desarrazoadas e bizarras, incoerentes ou praticadas com desconsideração às situações e circunstâncias que seriam atendidas por quem tivesse atributos normais de prudência, sensatez e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada. Com efeito, o fato de a lei conferir ao administrador certa liberdade (margem de discrição) significa que lhe deferiu o encargo de adotar, ante a diversidade de situações a serem enfrentadas, a providência mais adequada a cada qual delas. Não significa, como é evidente, que lhe haja outorgado o poder de agir ao sabor exclusivo de seu libito, de seus humores, paixões pessoais, excentricidades ou critérios personalíssimos, e muito menos significa, muito menos significa que liberou a Administração para manipular a regra de Direito de maneira a sacar dela efeitos não pretendidos nem assumidos pela lei aplicanda. Em outras palavras: ninguém poderia aceitar como critério exegético de uma lei que esta _____________ 151 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 2. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p. 1037. 58 sufrague as providências insensatas que o administrador queira tomar; é dizer, que avalize previamente as condutas desarrazoadas, pois isto corresponderia irrogar dislates à própria regra de Direito. [...] Fácil é ver-se, pois, que o princípio da razoabilidade fundamenta-se nos mesmos preceitos que arrimam constitucionalmente os princípios da legalidade (arts. 5º, II, 37 e 84) e da finalidade (os mesmos e mais o art. 5º, LXIX, nos termos já apontados). Não se imagine que a correção judicial baseada na violação do princípio da razoabilidade invade o "mérito" do ato administrativo, isto é, o campo de "liberdade" conferido pela lei à Administração para decidir-se segundo uma estimativa da situação e critérios de conveniência e oportunidade. Tal não ocorre porque a sobredita "liberdade" é liberdade dentro da lei, vale dizer, segundo as possibilidades nela comportadas. Uma providência desarrazoada, consoante dito, não pode ser havida como comportada pela lei. Logo, é ilegal: é desbordante dos limites nela admitidos. [...] Sem embargo, o fato de não se poder saber qual seria a decisão ideal, cuja apreciação compete à esfera administrativa, não significa, entretanto, que não se possa reconhecer quando uma dada providência, seguramente, sobre não ser a melhor, não é sequer comportada na lei em face de uma 152 dada hipótese . Também há de se observar o princípio da proporcionalidade nas condutas do Estado. Tal princípio Sem dúvida, pode ser chamado de princípio da proibição de excesso, que, em última análise, objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais. Como se percebe, parece-nos que a razoabilidade envolve a proporcionalidade, e vice versa. Registre-se, ainda, que a razoabilidade não pode ser lançada como instrumento de substituição da vontade da lei pela vontade do 153 julgador ou do intérprete... Outro princípio a ser observado é o da eficiência, previsto no caput do artigo 37 da Constituição Federal que prevê que o Dever de eficiência é o que se impõe a todo agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade 154 e de seus membros . Neste sentido: _____________ 152 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 14 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 91-93. 153 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p.91. 154 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 21. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 90. 59 Ser eficiente, portanto, exige primeiro da Administração Pública o aproveitamento máximo de tudo aquilo que a coletividade possui, em todos os níveis, ao longo da realização de suas atividades. Significa racionalidade e aproveitamento máximo das potencialidades existentes. Mas não só. Em seu sentido jurídico, a expressão, que consideramos correta, também deve abarcar a idéia de eficácia da prestação, ou de resultados da atividade realizada. Uma atuação estatal só será juridicamente eficiente quando seu resultado quantitativo e qualitativo for satisfatório, levando-se em conta o universo possível de atendimento das necessidades existentes e os meios 155 disponíveis . Insta salientar a importância de tal discussão no sentido de definir, inclusive, a competência para a interposição de eventuais recursos, uma vez que, entendendo o julgador que se trata de responsabilização subjetiva, não caberá a interposição de recurso extraordinário, já que se trata da aplicação de lei infraconstitucional e não do preceito contido no artigo 37, parágrafo 6º da Constituição Federal, e, vice versa. 4.1 Decisões Judiciais em que a responsabilidade civil do Estado foi considerada objetiva A individualização do dever de agir do Estado, determinante em sua responsabilização civil ou não, reside no fato de sua omissão figurar como fator primordial de condição para a ocorrência do dano, que poderia ou deveria ser evitado pela ação do Ente Público. Segundo Sérgio Cavalieri Filho, "Haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a situação propícia para a ocorrência do evento em situação em que tinha o dever de agir para impedi-lo.156" _____________ 155 MORAES, Alexandre. Os 10 anos da Constituição Federal. São Paulo: Atlas, 1999, p. 166. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 261. 156 60 4.1.1 Por danos causados a Propriedade Privada Nesse sentido, primeiramente, analiza-se a omissão estatal relativamente à proteção da propriedade privada, um dos mais valiosos bens jurídicamente tutelados. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO CULPOSA NO PREVENIR DANOS CAUSADOS POR TERCEIROS À PROPRIEDADE PRIVADA: INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. Para afirmar, no caso, a responsabilidade do Estado não se fundou o acórdão recorrido na infração de um suposto dever genérico e universal de proteção da propriedade privada contra qualquer lesão decorrente da ação de terceiros: aí, sim, é que se teria afirmação de responsabilidade objetiva do Estado, que a doutrina corrente efetivamente entende não compreendida na hipótese normativa do art. 37, § 6º, da Constituição da República. 2. Partiu, ao contrário, o acórdão recorrido da identificação de uma situação concreta e peculiar, na qual - tendo criado risco real e iminente de invasão da determinada propriedade privada - ao Estado se fizeram imputáveis as conseqüências da ocorrência do fato previsível, que não preveniu por omissão ou deficiência do aparelhamento administrativo. 3. Acertado, assim, como ficou, definitivamente, nas instâncias de mérito, a existência da omissão ou deficiência culposa do serviço policial do Estado nas circunstâncias do caso - agravadas pela criação do risco, também imputável à administração -, e também que a sua culpa foi condição sine qua da ação de terceiros - causa imediata dos danos -, a opção por uma das correntes da disceptação doutrinária acerca da regência da hipótese será irrelevante para a decisão da causa. 4. Se se entende - na linha da doutrina dominante -, que a questão é de ser resolvida conforme o regime legal da responsabilidade subjetiva (C.Civ. art. 15), a matéria é infraconstitucional, insusceptível de reexame no recurso extraordinário. 5. Se se pretende, ao contrário, que a hipótese se insere no âmbito normativo da responsabilidade objetiva do Estado (CF, art. 37, § 6º), a questão é constitucional, mas - sempre a partir dos fatos nela acertados - a decisão recorrida deu-lhe solução que não contraria a norma invocada da 157 Lei Fundamental . Tratou o acórdão acima colacionado da pretensão indenizatória pelos danos materiais e morais sofridos por proprietário de imóvel rural, o qual acabou por ser invadido por colonos integrantes do grupo “sem-terra”, que, inicialmente, estavam acampados em situação demasiadamente precária nos arredores da fazenda invadida. Entendeu o Ministro Sepúlveda Pertence que o Estado tinha o dever específico de prevenir a ocupação daquele imóvel, que figurava, segundo ele, como a única _____________ 157 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n º 237561/RS. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 18 dez. 2001. 61 movimentação invasiva possível dos colonos, não o fazendo o Ente Público por imprevidente e ineficiente. Assim, foi matida a decisão atacada, que condenou civilmente o Estado por sua omissão. Importa salientar que os julgadores vislumbraram a possibilidade de condenação do Ente Público nas duas modalidades de responsabilização civil. Na objetiva por haver o nexo de causalidade entre sua inação e o dano comprovado. E, na modalidade subjetiva, em razão da falta do serviço. Verifica-se, portanto, que a análise do caso concreto é preponderante na determinação do dever de indenizar ou não, e que, por vezes, sequer importa qual a teoria de responsabilização a ser aplicada. No sentido da responsabilização objetiva do Estado, traz-se à colação também a amenta que segue: EMENTA: CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. ARTIGO 37, § 6.º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DANOS CAUSADOS POR TERCEIROS EM IMÓVEL RURAL. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. INDENIZAÇÃO. ILEGITIMIDADE DE PARTE. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. Esta Corte já firmou entendimento de que é incabível, na via extraordinária, alegação de ofensa indireta à Constituição Federal, por má interpretação de normas processuais, contidas na legislação infraconstitucional. Caracteriza-se a responsabilidade civil objetiva do Poder Público em decorrência de danos causados, por invasores, em propriedade particular, quando o Estado se omite no cumprimento de ordem judicial para envio de força policial ao imóvel 158 invadido. Recursos extraordinários não conhecidos . Verifica-se que, na hipótese do precedente acima colacionado, a responsabilidade imputada ao Estado teve base na teoria objetiva, pois se tratou de omissão específica do Poder Público, diante da individualização do dever de agir, que havia sido ditada pela ordem judicial emanada. 4.1.2 Por danos causados em virtude de acidentes Veja-se a responsabilização civil extracontratual do Estado em alguns casos em que sua omissão causou acidentes. _____________ 158 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 283989/PR. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 28 mai.2002. 62 PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO PROVOCADO POR FALHA NA PAVIMENTAÇÃO (BURACO) DE RODOVIA FEDERAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. RITO SUMÁRIO. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 277, § 5º, DO CPC. NÃOOCORRÊNCIA. CONVERSÃO PARA O RITO COMUM ORDINÁRIO. DESNECESSIDADE. DESPROVIMENTO. 1. A ação de indenização por danos materiais causados em acidente de veículo de via terrestre processar-se-á pelo rito comum ordinário, independentemente do valor da causa (CPC, art. 275, II, d). 2. O art. 277, § 5º, do CPC, autoriza a conversão do rito sumário para o ordinário quando houver necessidade de prova técnica de maior complexidade. 3. O TRF da 1ª Região, com base nos fatos e provas, conclui que: (I) restou caracterizada a responsabilidade civil da recorrente; (II) foram comprovados o ato lesivo, os danos materiais, o nexo de causalidade e a omissão do Estado; (III) não houve culpa (negligência) do motorista no acidente. 4. O conjunto de provas produzidas nos autos (documentos, testemunhas e perícia técnica) foi suficiente para julgar a lide. Portanto, revela-se completamente desnecessária a realização de prova técnica complexa e, assim, totalmente impertinente a conversão do procedimento. 159 5. Recurso especial desprovido . Com o intuito de aclarar a motivação relativa ao fundamento da responsabilização do Estado atribuída nesse caso, vale analisar também parte do voto do julgado supramencionado: A obrigação de indenizar decorre da hipótese insculpida no art. 37, § 6º da Constituição Federal (responsabilidade civil do Estado), bastando que se façam presentes e comprovados o dano suportado pelo cidadão, e o nexo causal com a conduta do Órgão ou Agente estatal. [...] In casu, os danos foram devidamente demonstrados, e da mesma maneira identificada a conduta omissiva do Estado, em não propiciar aos cidadãos, as devidas condições para que pudessem trafegar normalmente pelas estradas sob sua administração, assumindo destarte o risco pelos eventos danosos que porventura surgissem como conseqüência da mesma omissão. (grifou-se) O caso da decisão em comento, é inequívoca a constatação de que a rodovia em comento se encontrava em péssimo estado de conservação e também o fato de que isso era público e notório, o que autoriza a responsabilização civil do Estado pela sua omissão em conservá-la. Entretanto, insta observar que, sendo o dano causado por acidente de trânsito provocado por falha na pavimentação (buraco), entende-se que depende a teoria a ser adotada da análise de cada caso específico, já que é humanamente impossível que se procedam inspeções, diariamente, em cada uma das vias públicas, para verificar se tudo se encontra de acordo com as normas de trânsito e de segurança. _____________ 159 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 2004/0037073-9. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 27mar.2007. 63 Até mesmo porque, a responsabilização civil do Estado deve sempre levar em conta os princípios que norteiam os atos da administração pública. Nesse sentido, veja-se o teor da ementa a seguir transcrita: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. BURACO EM PASSEIO PÚBLICO. QUEDA DE MUNÍCIPE. AUSÊNCIA DE TAMPA DE PROTEÇÃO OU SINALIZAÇÃO NO LOCAL. DEMONSTRAÇÃO DE RELAÇÃO DE CAUSA E EFEITO ENTRE O ATO OMISSIVO E O ACIDENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR OMISSÃO. DANOS IRREVERSÍVEIS E IRREPARÁVEIS. INCAPACITAÇÃO PARCIAL. INDENIZAÇÃO DEVIDA. PRECEDENTE. 1. Recurso Especial interposto contra v. Acórdão que julgou improcedente ação de indenização por danos sofridos com a queda da recorrente em buraco no passeio público. 2. Para que se configure a responsabilidade objetiva do ente público basta a prova da omissão e do fato danoso e que deste resulte o dano material ou moral. 3. O exame dos autos revela que está amplamente demonstrado que o acidente ocorreu, que das seqüelas dele decorreram danos irreversíveis e irreparáveis e que não havia tampa de proteção no buraco ou sinalização que pudesse tê-lo evitado. 4. A ré só ficaria isenta da responsabilidade civil se demonstrasse - o que não foi feito - que o fato danoso aconteceu por culpa exclusiva da vítima. 5. A imputação de culpa lastreia-se na omissão da ré no seu dever de, em se tratando de via pública (passeio público), zelar pela segurança dos munícipes e pela prevenção de acidentes. 6. Jurisdição sobre o passeio público de competência da ré e a ela incumbe a sua manutenção e sinalização, advertindo, caso não os conserte, os transeuntes dos perigos e dos obstáculos que se apresentam. A falta no cumprimento desse dever caracteriza a conduta negligente da Administração Pública e a torna responsável pelos danos que dessa omissão advenham. 7. Os tributos pagos pelos munícipes devem ser utilizados, em contrapartida, para o bem estar da população, o que implica, dentre outras obras, a efetiva melhora das vias públicas (incluindo aí as calçadas e passeios públicos). 8. Estabelecido o nexo causal entre a conduta omissiva e o acidente ocorrido, responde a ré pela reparação dos prejuízos daí decorrentes. 9. Precedente da 1ª Turma desta Corte Superior. 160 10. Recurso provido . Verifica-se, compulsando o relatório da decisão supramencionada, que o Estado foi responsabilizado objetivamente pelo fato de haver um buraco no meio fio da calçada em frente da Prefeitura, sem sinalização. Note-se que pela leitura do inteiro teor do referido acórdão161 não se pode inferir que tenha havido a análise de qualquer elemento subjetivo, como a existência de reclamações concernentes ao buraco na via, o que poderia indicar, por exemplo, _____________ 160 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 2002/0149032-2. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 10 dez.2002. 161 Anexo A 64 que o Ente Público tinha ciência daquela falha, indicando, aí sim, o cometimento da omissão específica, com o descumprimento de um dever legal e objetivo de agir, ensejando a sua responsabilização civil objetiva. No entanto, pelo fato de estar o referido buraco bem em frente ao prédio da Prefeitura e, tendo em vista que incumbe objetivamente ao Estado promover a manutenção das vias públicas, é inadmissível que este se escuse dessa responsabilidade, já que é razoável supor que o Estado, representado por seus agentes, tinha conhecimento daquela falha e nada fez para repará-la. Veja-se o teor da seguinte ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: MORTE DE PASSAGEIRO EM ACIDENTE DE AVIAÇÃO CIVIL: CARACTERIZAÇÃO. 1. Lavra dissenção doutrinária e pretoriana acerca dos pressupostos da responsabilidade civil do Estado por omissão (cf. RE 257.761), e da dificuldade muitas vezes acarretada à sua caracterização, quando oriunda de deficiências do funcionamento de serviços de polícia administrativa, a exemplo dos confiados ao D.A.C. - Departamento de Aviação Civil -, relativamente ao estado de manutenção das aeronaves das empresas concessionárias do transporte aéreo. 2. No caso, porém, o acórdão recorrido não cogitou de imputar ao D.A.C. a omissão no cumprimento de um suposto dever de inspecionar todas as aeronaves no momento antecedente à decolagem de cada vôo, que razoavelmente se afirma de cumprimento tecnicamente inviável: o que se verificou, segundo o relatório do próprio D.A.C., foi um estado de tal modo aterrador do aparelho que bastava a denunciar a omissão culposa dos deveres mínimos de fiscalização. 3. De qualquer sorte, há no episódio uma circunstância incontroversa, que dispensa a indagação acerca da falta de fiscalização preventiva, minimamente exigível, do equipamento: é estar a aeronave, quando do acidente, sob o comando de um "checador" da Aeronáutica, à deficiência de cujo treinamento adequado se deveu, segundo a instância ordinária, o retardamento das medidas adequadas à emergência surgida na decolagem, 162 que poderiam ter evitado o resultado fatal . Nessa hipótese não houve a imputação do Estado por sua omissão, mas sim por ato comissivo de sua agente, que comandou a decolagem do avião, dando causa imediata ao dano. [...] Certo, não se ignora a dissenção doutrinária e prtoriana acerca dos pressupostos da responsabilidade civil do Estado por omissão – que, não faz muito resenhei no RE 257761 -, e da dificuldade muitas vezes acerretadas à sua caracterização. Dificuldade essa sabidamente frequente, quando se atribua a omissão do Estado a deficiências do funcionamento de serviços de polícia administrativa, a exemplo dos confiados ao D.A.C. – Departamento de _____________ 162 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 258726/AL. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 14 mai.2002. 65 Aviação Civil - , relativamente ao estado de manutenção das aeronaves das empresas cessionárias do transporte aéreo. No caso, entretanto, nem será necessário enfatizar que o acórdão recorrido não cogitou de imputar ao D.A.C. a omissão no cuimprimento de um suposto dever de inspecionar todas as aeronaves no momento antecente à decolagem de cada vôo, que razoavelmente se afirma de cumprimento tecnicamente inviável: o que se verificou, segundo o relatório do próprio D.A.C., foi um estado de tal modo aterrador do aparelho que bastava a denunciar a omissão culposa dos deveres mínimos de fiscalização. De qualquer sorte, há no episódio uma circusntância incontroversa, que dispensa a indagação acerca da falta de fiscalizaçãopreventiva, minimamente exigida do equipamento. Refiro-me a que o “checador” (entre aspas), a que alude o acórdão, é um oficial da Aeronautica, em serviço, que assumira o comando do avião na operação de decolagem. Ausente da cabina o seu comandante. (...) De tudo resultou que, na cadeia causal do desastre, o relatório incluiu “a nível individual – a demora de decisão dos pilotos, quanto aos procedimentos adequados para aquela situação de emergência”. Dentre eles, o papel principal coube ao oficial da Aeronáutica, o desartunado “checador”, que comandou a infeliz decolagem (...) Note-se que claramente foi evitada a discussão acerca da responsabilização civil do Estado pela omissão perpetrada, justamente com o intuito de não abordar diretamente a questão atinente à teoria correta a ser adotada. Por outro lado, o entendimento muda quando se trata de crianças e adolescentes. Isso porque, gozam estes do direito à proteção integral que lhes é conferido pelo sistema jurídico brasileiro, conforme se verifica no artigo 227 da Constituição Federal 163 . A exemplo disso, veja-se: INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO PODER PÚBLICO TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - PRESSUPOSTOS PRIMÁRIOS DE DETERMINAÇÃO DESSA RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO CAUSADO A ALUNO POR OUTRO ALUNO IGUALMENTE MATRICULADO NA REDE PÚBLICA DE ENSINO - PERDA DO GLOBO OCULAR DIREITO - FATO OCORRIDO NO RECINTO DE ESCOLA PÚBLICA MUNICIPAL CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO MUNICÍPIO - INDENIZAÇÃO PATRIMONIAL DEVIDA - RE NÃO CONHECIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. - A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá- _____________ 163 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 66 la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público. - Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417). - O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 RTJ 55/50). RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO POR DANOS CAUSADOS A ALUNOS NO RECINTO DE ESTABELECIMENTO OFICIAL DE ENSINO. - O Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos estabelecimentos da rede oficial de ensino, assume o grave compromisso de velar pela preservação de sua integridade física, devendo empregar todos os meios necessários ao integral desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em responsabilidade civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno. - A obrigação governamental de preservar a intangibilidade física dos alunos, enquanto estes se encontrarem no recinto do estabelecimento escolar, constitui encargo indissociável do dever que incumbe ao Estado de dispensar proteção efetiva a todos os estudantes que se acharem sob a guarda imediata do Poder Público nos estabelecimentos oficiais de ensino. Descumprida essa obrigação, e vulnerada a integridade corporal do aluno, emerge a responsabilidade civil do Poder Público pelos danos causados a quem, no momento do fato lesivo, se achava sob a guarda, vigilância e proteção das autoridades e dos funcionários escolares, ressalvadas as situações que descaracterizam o nexo de causalidade material entre o evento danoso e a atividade estatal imputável aos agentes 164 públicos . No mesmo sentido, é o teor da decisão abaixo colacionada: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO. ACIDENTE SOFRIDO POR ALUNO DE CRECHE MUNICIPAL. LESÃO OCULAR. DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. 1. A questão de fundo versa sobre a responsabilidade civil por omissão do ente público público em relação ao dever de vigilância da qual resultou lesão corporal sofrida pelo filho dos autores, à época com três anos de idade, em creche municipal. A criança subiu em uma lixeira da sala de aula para pegar um brinquedo, quando a lixeira virou e a criança caiu com a cabeça sobre um gancho fixado na parede para aparar mochilas. 2. O sistema jurídico brasileiro adota a responsabilidade patrimonial objetiva do Estado sob a forma da Teoria do Risco Administrativo. Tal assertiva encontra respaldo legal no art. 37, § 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil. Para que incida a responsabilidade objetiva, em razão dos termos da norma constitucional em destaque, há necessidade de que o dano causado a terceiros seja provocado por agentes estatais nessa qualidade. 3. O art. 14 do Código de _____________ 164 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 109615/RJ. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 28 mai.1996. 67 Defesa do Consumidor, estabeleceu a responsabilidade objetiva direta para todos os fornecedores de serviços em relação aos danos causados aos seus hóspedes, educandos, etc., que tenham por causa o defeito do serviço. Trata-se de responsabilidade, fundada no fato do serviço, e não mais indireta, fundada no fato do preposto ou de outrem. Precedentes do STJ. 4. Não tendo o ente público demandado se desincumbido de seu ônus probatório, permanece responsável por indenizar os danos sofridos pelo menor, porquanto não há falar em culpa exclusiva ou concorrente da vítima, tendo em vista que o autor contava com três anos de idade, não possuindo o necessário discernimento acerca das conseqüências que poderiam advir da sua atitude de subir na lixeira para pegar um brinquedo, junto à parede onde fixados ganchos de metal, o que, inclusive, é roborado pela própria professora que acompanhava as crianças na época do fato. 5. DANOS MORAIS. O dano moral relaciona-se ao sofrimento psíquico que molestou a parte afetiva do patrimônio moral do autor, gerando-lhe tristeza e constrangimento, motivo pelo qual o mesmo é tido como in re ipsa, sendo presumível, prescindindo de prova de sua efetiva ocorrência. 6. QUANTUM INDENIZATÓRIO. Em relação ao quantum indenizatório, sabe-se que a indenização deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado. 7. DIES A QUO PARA CONTAGEM DE JUROS MORATÓRIOS. Na hipótese de reparação por dano moral, cabível o início da contagem a partir da fixação do quantum indenizatório, é dizer, a contar do julgamento no qual foi arbitrado o valor da condenação. 8. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. Decaimento mínimo do autor. Condenação do réu ao pagamento da totalidade das custas processuais e de honorários 165 advocatícios. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. Não destoa o entendimento que segue: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO. LESÕES CORPORAIS SOFRIDAS POR ALUNO POR AGRESSÃO PERPRETADA POR COLEGA DURANTE O RECREIO EM ESCOLA DA REDE ESTADUAL. PERDA DO BAÇO. DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. COMPROVADOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. 1. A questão de fundo versa sobre a responsabilidade civil por omissão do ente público em razão de lesão corporal sofrida pelo autor em escola estadual, ocasionada por agressão física perpetrada por outro aluno, causando-lhe a perda do baço, removido por procedimento cirúrgico em virtude de - necrose hemorrágica traumática. 2. O sistema jurídico brasileiro adota a responsabilidade patrimonial objetiva do Estado sob a forma da Teoria do Risco Administrativo. Tal assertiva encontra respaldo legal no art. 37, § 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil. Para que incida a responsabilidade objetiva, em razão dos termos da norma constitucional em destaque, há necessidade de que o dano causado a terceiros seja provocado por agentes estatais nessa qualidade. 3. O art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, estabeleceu a responsabilidade objetiva direta para todos os fornecedores de serviços em relação aos danos causados aos seus hóspedes, educandos, etc., que tenham por causa o defeito do serviço. Trata-se de responsabilidade, fundada no fato do serviço, e não mais indireta, fundada no fato do preposto ou de outrem. Precedentes do STJ. 4. Na casuística, resta incontroverso _____________ 165 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70018125088. Órgão Julgador: Nona Câmara Cível. Julgado em 11abr.2007. 68 nos autos que o autor, à época com 12 anos de idade, participava de uma brincadeira - chamada - garrafão - com outros colegas na hora do recreio no pátio da escola. Dito entretenimento praticado pelos alunos do educandário, consistia na formação de duas fileiras de alunos, formando uma espécie de corredor, no qual desferiam chutes nas nádegas de um deles como penalidade, ocasião em que o demandante foi atingido no abdômen. 5. Não tendo o ente público demandado se desincumbido de seu ônus probatório, permanece responsável por indenizar os danos sofridos pelo menor, porquanto não há falar em culpa exclusiva ou concorrente da vítima, tendo em vista que o autor contava com doze anos de idade, não possuindo o necessário discernimento acerca das conseqüências que poderia advir da atividade agressiva e potencialmente lesiva que praticava, ainda que advertido por familiares. 6. DANOS MATERIAIS. Os danos materiais, consubstanciados em despesas com medicamentos, exames e consultas médicas após o evento lesivo, foram devidamente comprovados. 7. DANOS ESTÉTICOS E MORAIS. A lesão estética, além do dano físico a ela correspondente, pode gerar danos psíquicos. O dano estético relaciona-se à própria marca física decorrente da cirurgia realizada pelo autor para extração do baço, com a qual se viu obrigado a conviver. Por outro lado, o dano moral relaciona-se ao sofrimento psíquico que molestou a parte afetiva do patrimônio moral do autor, gerando-lhe tristeza e constrangimento, motivo pelo qual o mesmo é tido como in re ipsa, sendo presumível, prescindindo de prova de sua efetiva ocorrência. 8. QUANTUM INDENIZATÓRIO. Em relação ao quantum indenizatório, sabe-se que a indenização deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado. 9. DIES A QUO PARA CONTAGEM DE JUROS MORATÓRIOS. Na hipótese de reparação por dano moral, cabível o início da contagem a partir da fixação do quantum indenizatório, é dizer, a contar do julgamento no qual foi arbitrado o valor da condenação. 10. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. Decaimento mínimo do autor. Condenação do réu ao pagamento da totalidade das custas processuais e de honorários advocatícios. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO RÉU, DERAM PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR E, NO MAIS, EM 166 REEXAME NECESSÁRIO, MANTIVERAM A SENTENÇA. UNÂNIME. Relativamente aos estabelecimentos de ensino é necessário observar, ainda, o disposto nos artigos 932 do Código Civil 167 e 14 do Código de Defesa do Consumidor168, onde a lei não deixou brechas para que fosse aplicada a teoria subjetiva de responsabilização, pois, diante do bem jurídico tutelado, qual seja, a _____________ 166 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70016279275. Órgão Julgador: Nona Câmara Cível. Julgado em 28 dez.2006. 167 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: ... IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; 168 Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relatrivos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos: 69 proteção integral conferida à criança e ao adolescente, sequer cogitou a aplicação da teoria subjetiva no sistema jurídico pátrio. Os acidentes de trabalho decorrentes da omissão do Estado em fiscalizar o cumprimento das normas de segurança do funcionário também ensejam sua responsabilização objetiva. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. EVENTO DANOSO. AUXILIAR DE ENFERMAGEM EXPOSTA A RADIAÇÃO SEM EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO. DEVER DO EMPREGADOR DE FISCALIZAR O CUMPRIMENTO DAS NORMAS DE SEGURANÇA NO TRABALHO. CULPA "IN VIGILANDO". NEXO CAUSAL ENTRE O EVENTO E A ATIVIDADE DA ADMINISTRAÇÃO. - Impossível presumir a existência da doença antes do ingresso no serviço público, especialmente considerando-se a literatura que garante causaefeito na exposição da radiação a que era submetida a vítima. - Presente o nexo de causalidade, resta caracterizada a responsabilidade civil do Estado, visto que a ação ou omissão do agente é demonstrada pela falta de fiscalização no trabalho exercido pelo servidor e por não exigir de tais servidores o uso de Equipamento de Proteção Individual. - É obrigação do empregador, neste caso o Estado, exigir e fiscalizar se seus funcionários estão usando regularmente o equipamento de proteção 169 individual, o que caracteriza a omissão . Denota-se, da análise dos fundamentos da decisão170, que invariavelmente é objetiva a responsabilização civil do Estado, nas hipóteses de acidente de trabalho em decorrência da falta de fiscalização por parte deste, no que tange aos equipamentos obrigatórios de proteção individual dos trabalhadores. Isso ocorre justamente em razão de serem esles partes hipossuficientes da relação, a quem o nosso sistema jurídico outorga especial proteção. Vale relacionar parte do voto: [...] No mérito, vale reproduzir, por seu acerto, a manifestação da douta representante do Ministério Pùblico Federal nesta instância, na forma do parecer de fls. 300/301; “O exame dos autos demonstra preenchidos os requisitos necessários à caracterização da responsabilidade civil do Estado. A ação ou omissão do agente é demonstrada pela falta de fiscalização no trabalho exercido pelo servidor e por não exigir de tais servidores o uso de Equipamento de Proteção Individual. Importa salientar que é obrigação de empregador, neste caso o Estado, exigir e fiscalizar se seus funcionários estão usando regularmente o equipamento de proteção individual. O que caracteriza, de imediato, a omissão. O dano é indiscutível. Não há como presumir a existência de doença antes do ingresso no serviço público, especialmente diante da literatura que _____________ 169 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2002.04.01.047232-8. Órgão Julgador: Quarta Turma. Julgado em 20 fev.2003. 170 Anexo B. 70 garante causa-efeito na exposição da radiação a que era submetida a vítima. Assim, presente o nexo de causalidade, igualmente necessário o exame da questão, motivo pela qual resta completada a responsabilidade do Estado[...] 4.1.3 Por danos causados em virtude da falta de segurança pública A responsabilização objetiva do Estado pela falta de segurança pública se dará mediante a inércia do Ente Público diante de um dever objetivo e individualizado de agir, não sendo possível, segundo o tratamento jurisprudencial majoritário, imputar esse tipo de responsabilidade genericamente pela simples ofensa ao disposto no artigo 144 da Constituição Federal171. EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FAUTE DU SERVICE PUBLIC CARACTERIZADA. ESTUPRO COMETIDO POR PRESIDIÁRIO, FUGITIVO CONTUMAZ, NÃO SUBMETIDO À REGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL COMO MANDA A LEI. CONFIGURAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. Impõe-se a responsabilização do Estado quando um condenado submetido a regime prisional aberto pratica, em sete ocasiões, falta grave de evasão, sem que as autoridades responsáveis pela execução da pena lhe apliquem a medida de regressão do regime prisional aplicável à espécie. Tal omissão do Estado constituiu, na espécie, o fator determinante que propiciou ao infrator a oportunidade para praticar o crime de estupro contra menor de 12 anos de idade, justamente no período em que deveria estar recolhido à prisão. Está configurado o nexo de causalidade, uma vez que se a lei de execução penal tivesse sido corretamente aplicada, o condenado dificilmente teria continuado a cumprir a pena nas mesmas condições (regime aberto), e, por conseguinte, não teria tido a oportunidade de evadir-se pela oitava vez e 172 cometer o bárbaro crime de estupro. Recurso extraordinário desprovido . No precedente supra colacionado, verifica-se que, após diversos debates entre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, acerca do tipo de responsabilização imputável ao Estado, novamente a falta do serviço figurou como fator determinante _____________ 171 Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. 71 para a ocorrência do dano, razão pela qual sua responsabilização civil foi considerada objetiva. Nesse sentido, mesmo sendo vencido, valiosa é a lição do Ministro Carlos Veloso, relator do feito supramencionado, ao proferir seu voto, que se encontra no anexo C, assim como os votos de vista proferidos pelo Ministro Joaquim Barbosa e pela Ministra Ellen Gracie, dos quais não destoou o voto do Presidente Ministro Celso de Mello: Entendo incensurável, Senhores Ministros, o acórdão ora impugnado nesta sede recursal extraordinária, especialmente se analisado em face do que dispõe o § 6º do art. 37 da Constituição da República, que adotou, em tema de responsabilidade civil do Poder Público, a teoria do risco administrativo. Com efeito, a teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros, desde a Constituição de 1946, revela-se fundamento de ordem doutrinária subjacente à norma de direito positivo que instituiu, em nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público, pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, por ação ou por omissão (CF, art. 37, § 6º). Essa concepção teórica - que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, tanto no que se refere à ação quanto no que concerne à omissão do agente público - faz emergir, da mera ocorrência de lesão causada à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público, não importando que se trate de comportamento positivo ou que se cuide de conduta negativa daqueles que atuam em nome do Estado, consoante enfatiza o magistério da doutrina (HELY LOPES MEIRELLES, “Direito Administrativo Brasileiro”, p. 650, 31ª ed., 2005, Malheiros; SERGIO CAVALIERI FILHO, “Programa de Responsabilidade Civil”, p. 248, 5ª ed., 2003, Malheiros; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Curso de Direito Administrativo”, p. 90, 17ª ed., 2000, Forense; YUSSEF SAID CAHALI, “Responsabilidade Civil do Estado”, p. 40, 2ª ed., 1996, Malheiros; TOSHIO MUKAI, “Direito Administrativo Sistematizado”, p. 528, 1999, Saraiva; CELSO RIBEIRO BASTOS, “Curso de Direito Administrativo”, p. 213, 5ª ed., 2001, Saraiva; GUILHERME COUTO DE CASTRO, “A Responsabilidade Civil Objetiva no Direito Brasileiro”, p. 61/62, 3ª ed., 2000, Forense; MÔNICA NICIDA GARCIA, “Responsabilidade do Agente Público”, p. 199/200, 2004, Fórum, v.g.), cabendo ressaltar, no ponto, a lição expendida por ODETE MEDAUAR (“Direito Administrativo Moderno”, p. 430, item n. 17.3, 9ª ed., 2005, RT): “Informada pela ‘teoria do risco’, a responsabilidade do Estado apresenta-se hoje, na maioria dos ordenamentos, como ‘responsabilidade objetiva’. Nessa linha, não mais se invoca o dolo ou culpa do agente, o mau funcionamento ou falha da Administração. Necessário se torna existir relação de causa e efeito entre ação ou omissão administrativa e dano sofrido pela vítima. É o chamado nexo causal ou nexo de causalidade. Deixa-se de lado, para fins de ressarcimento do dano, o questionamento do dolo ou culpa do agente, o questionamento da licitude ou ilicitude da _____________ 172 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 409.203-4/RS. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 07 mar.2006. 72 conduta, o questionamento do bom ou mau funcionamento da Administração. Demonstrado o nexo de causalidade, o Estado deve ressarcir.” (grifei) Impõe-se destacar, neste ponto, segundo entendo (RTJ 163/1107-1109, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o “eventus damni” e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público, que, nessa condição funcional, tenha incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do seu comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 – RTJ 71/99 – RTJ 91/377 – RTJ 99/1155 - RTJ 131/417). A compreensão desse tema e o entendimento que resulta da exegese dada ao art. 37, § 6º, da Constituição foram bem definidos e expostos pelo Supremo Tribunal Federal em julgamentos cujos acórdãos estão assim ementados: “RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. - A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizála pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público. - Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417). - O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior – ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50). (...).” (RTJ 163/1107-1108, Rel. Min. CELSO DE MELLO) “- Recurso extraordinário. Responsabilidade civil do Estado. Morte de preso no interior do estabelecimento prisional. 2. Acórdão que proveu parcialmente a apelação e condenou o Estado do Rio de Janeiro ao pagamento de indenização correspondente às despesas de funeral comprovadas. 3. Pretensão de procedência da demanda indenizatória. 4. O consagrado princípio da responsabilidade objetiva do Estado resulta da causalidade do ato comissivo ou omissivo e não só da culpa do agente. Omissão por parte dos agentes públicos na tomada de medidas que seriam exigíveis a fim de ser evitado o homicídio. 5. Recurso conhecido e provido para condenar o Estado do Rio de Janeiro a pagar pensão mensal à mãe da vítima, a ser fixada em execução de sentença.” (RTJ 182/1107, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - grifei) 73 Cabe advertir, por necessário, que a ausência de qualquer dos pressupostos legitimadores da incidência da regra inscrita no art. 37, § 6º, da Carta Política basta para descaracterizar a responsabilidade civil objetiva do Estado, especialmente quando ocorre circunstância que rompe o nexo de causalidade material entre o comportamento do agente público (positivo ou negativo) e a consumação do dano pessoal ou patrimonial infligido ao ofendido. As circunstâncias do presente caso - apoiadas em pressupostos fáticos soberanamente reconhecidos pelo Tribunal de Justiça local (RTJ 152/612 RTJ 153/1019 - RTJ 158/693, v.g.) - evidenciam que o nexo de causalidade material restou plenamente configurado em face do comportamento omissivo em que incidiu o Poder Público, que se absteve de promover a fiscalização do cumprimento da pena pelo autor do fato, que já havia fugido em 7 (sete) oportunidades. Essa omissão do Estado do Rio Grande do Sul foi causa direta do evento danoso. Diante das inúmeras fugas do condenado, a autoridade competente tinha o dever de ser mais vigilante e de promover a regressão do sentenciado em referência no regime de cumprimento da pena. Se o Estado assim houvesse agido, procedendo com diligência em face dos incidentes anteriormente registrados, o apenado em questão teria sido submetido a regime penal mais gravoso, o que o teria impedido de praticar os delitos gravíssimos que veio a cometer. A omissão do Poder Público local, além de profundamente censurável, revelou-se causa suficiente à eclosão dos eventos delituosos perpetrados por referido sentenciado, do que resultou – ante a falha evidente do Estado no cumprimento de sua obrigação de fiscalizar – a prática de violência pessoal, inclusive estupro, contra as moradoras de uma residência em que esse mesmo sentenciado veio, criminosamente, a ingressar durante a fuga que empreendeu. O E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul proferiu decisão que interpretou, com absoluta fidelidade, a norma constitucional que consagra, em nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público. O v. acórdão impugnado nesta sede recursal extraordinária, ao fazer aplicação do preceito constitucional em referência, reconheceu, com inteiro acerto, no caso em exame, a cumulativa ocorrência dos requisitos concernentes (1) à consumação do dano, (2) à omissão administrativa, (3) ao vínculo causal entre o evento danoso e o comportamento estatal e (4) à ausência de qualquer causa excludente de que pudesse eventualmente decorrer a exoneração da responsabilidade civil do Estado. Sendo assim, pelas razões expostas e pedindo vênia, acompanho os doutos votos proferidos pelos eminentes Ministros JOAQUIM BARBOSA e ELLEN GRACIE, para, também, conhecer do presente recurso extraordinário, em ordem a negar-lhe provimento, mantendo, em conseqüência, o v. acórdão proferido pelo E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. É o meu voto (grifos do autor). Note-se que, por maioria, reconheceram os Ministros que a falha na aplicação da Lei Penal figurou como causa direta do dano ocorrido, já que, se tivesse o Estado cumprido suas atribuições não haveria possibilidade de ter ocorrido o evento que o desencadeou. 74 4.1.4 Por danos causados ao Meio Ambiente Ecológico Preceitua a Carta Magna em seu artigo 225, caput, que Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. Assim, diante da vasta atribuição do Poder Público no que tange à preservação do meio ambiente, verifica-se que, nesse caso específico, é por demais tênue a distinção entre os tipos de responsabilidades, assim como das teorias que as informam. Nesse sentido, vale colacionar parte da manifestação do Ministro Themístocles Cavalcanti proferida em sede de voto-vista no Recurso Extraordinário nº 61.387/SP, publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência nº47, em que alinha que: [...] a jurisprudência dominante se inclina pela tese do recorrente, mas se apóia em uma das doutrinas civilistas que tem orientado o problema da responsabilidade, isto é, o risco. Esta doutrina se resume em estabelecer, como causa da responsabilidade, uma simples relação entre o fato e o prejuízo. Nenhum elemento subjetivo entra na apuração da responsabilidade. Não admito, por isso, a aplicação pura e simples da teoria do risco que abrangeria as inúmeras ações do Estado nos múltiplos setores de sua atividade administrativa, econômica. assistencial etc. Tem vacilado, por isso, a jurisprudência na aplicação estrita da Teoria do risco que envolveria a responsabilidade do Estado em casos, que 75 evidentemente, não caracterizariam o problema do funcionamento do serviço público. Não basta fugir ao tema da culpa para admitir o risco. Daí admitir-se o chamado risco administrativo, ou como já se denominou "a culpa anônima da Administração" (Ac. do T.J. SP. in R.D.A., 15/65); que, atinge o Estado pelas faltas cometidas no funcionamento dos serviços públicos, o que ameniza a simples transplantação da teoria civilista do risco para o Direito Administrativo (R.D:A. 38/328) . Com isto, permite-se o exame dos casos particulares e a análise de circunstâncias peculiares a cada um, de maneira a atender as condições em que se verifica a responsabilidade do Estado. Aquilo que os franceses chamam a 'faute de service' que é imputável não só ao funcionário individualmente, mas à Administração como órgão, permite definir a natureza da falta e a conseqüente responsabilidade. Não é preciso enveredar pela teoria pura do risco, mas considerar também na apuração dos fatos a verificação da existência de falta imputável à Administração. Partindo da teoria da igualdade dos encargos e das finalidades essenciais do Estado, o clássico Tirard chegava à responsabilidade do Estado pela falta verificada no serviço (De la responsabilité du service publique, 1906). Neste particular, a variedade na aplicação dos casos é muito grande. Principalmente a jurisprudência francesa se detém no exame das hipóteses. É assim que são mencionados casos de responsabilidade, ou por não se ter evitado um perigo por meio de obras necessárias, como a construção de um parapeito na estrada; de não se ter impedido a circulação em um trecho perigoso; de não se ter retirado obstáculo em um rio canalizado etc. ou por omissão material, por falta de sinalização, de abandono de trecho de estrada, abertura de trincheira em uma estrada etc. Essa teoria não é talvez suficiente para prever todas as hipóteses de responsabilidade do Estado, mas a sua aplicação deve ser casuística para não envolver a responsabilidade do Estado em todos os casos em que age dentro da sua finalidade própria. Assim, nem sempre se verifica essa responsabilidade, de acordo com a boa doutrina, quando há escassez de abastecimento de água. Interrupção de energia elétrica, o mal calçamento de uma estrada. Depende sempre das circunstâncias. É a razão pela qual no direito administrativo não prosperou a doutrina francesa de responsabilidade 'pour le fait des choses', porque esta se restringe apenas àquelas coisas de que se tem a guarda. A sua aplicação é restrita e não se pode ampliar aos serviços públicos em geral. A verdade é que o ponto sensível da controvérsia em torno dos problemas da responsabilidade, são os casos de ação ou falta de providências indispensáveis ao bom funcionamento do serviço . É o que já se chamou de inércia da Administração na execução de serviços públicos que visam a segurança da população e dos usuários (Piarre Montané de Ia Roque, L_iner. tie das pouvoirs publics, Paris 1950), Nesses casos, a responsabilidade se aproxima da culpa, pela omissão em tomar as providências exigidas para as providências exigidas para 173 asegurança do serviço [...]. Não há duvida de que incumbe principalmente ao Estado preservar a Mata Atlântica, por exemplo. No entanto, devido ao tamanho da sua extensão, não é possível evitar todas as hipóteses de degradação, já que seria desarrazoado e, por _____________ 173 CAVALCANTI, Themístocles. Voto Publicado. Revista Trimestral de Jurisprudência. São Paulo, nº 47, p. 378-384, fev. 1969. 76 conseguinte, vedado ao administrador público, disponibilizar um fiscal para cada cem metros de Mata Atlantica existentes no Brasil com a finalidade de prevenir que nenhum mal ocorra. Assim, a responsabilidade civil estatal por eventuais danos causados ao meio ambiente, deve ser muito bem analisada, para que se adote os critérios mais justos e não se torne o Estado um “segurador universal”. Veja-se o teor da ementa que segue: DIREITO ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. ARTIGOS 23, INCISO VI E 225, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO. SOLIDARIEDADE DO PODER CONCEDENTE. DANO DECORRENTE DA EXECUÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO DE CONCESSÃO FIRMADO ENTRE A RECORRENTE E A COMPANHIA DE SANEAMENTO BÁSICO DO ESTADO DE SÃO PAULO - SABESP (DELEGATÁRIA DO SERVIÇO MUNICIPAL). AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO POR ATO DE CONCESSIONÁRIO DO QUAL É FIADOR DA REGULARIDADE DO SERVIÇO CONCEDIDO. OMISSÃO NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO DA BOA EXECUÇÃO DO CONTRATO PERANTE O POVO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARA RECONHECER A LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO. I - O Município de Itapetininga é responsável, solidariamente, com o concessionário de serviço público municipal, com quem firmou "convênio" para realização do serviço de coleta de esgoto urbano, pela poluição causada no Ribeirão Carrito, ou Ribeirão Taboãozinho. II - Nas ações coletivas de proteção a direitos metaindividuais, como o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a responsabilidade do poder concedente não é subsidiária, na forma da novel lei das concessões (Lei n.º 8.987 de 13.02.95), mas objetiva e, portanto, solidária com o concessionário de serviço público, contra quem possui direito de regresso, com espeque no art. 14, § 1° da Lei n.º 6.938/81. N ão se discute, portanto, a liceidade das atividades exercidas pelo concessionário, ou a legalidade do contrato administrativo que concedeu a exploração de serviço público; o que 174 importa é a potencialidade do dano ambiental e sua pronta reparação . Novamente a falta do serviço público, nesse caso o de fiscalização da atividade concedida, figurou como fator preponderante para a ocorrência do dano, o que autorizou a responsabilização civil objetiva do ente Público. Assim, tem-se que sempre que a inação Estatal figurar como causa direta e imediata da ocorrência do dano, seja por produzi-lo, ou não o evitar, será objetiva sua responsabilidade civil. Nessa tangente, veja-se o teor da ementa que seque: _____________ 174 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1992/0026117-5. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 15 fev.2000. 77 ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. PRESCRIÇÃO. OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO ECOLÓGICO. 1. Quanto à prescrição. - O mundo ocidental, como é por todos sabido, sofreu decisiva influência das idéias liberalistas que determinaram a Revolução Francesa, onde o objetivo principal foi limitar o poder do Estado e exaltar o homem enquanto ser individual. Isso veio a se refletir também na ordem jurídica, salvo no que respeita à jurisdição criminal, de modo que o funcionamento do Poder Judiciário ficou na dependência da vontade do titular do 'direito individual' invocado, enquanto a legislação material, como não poderia deixar de ser, passou a também regular exclusivamente relações jurídicas de ordem individual (relação de base). Sobre a matéria não se pode deixar de trazer à balha a lição de JOSÉ DE ALBUQUERQUE ROCHA: - "Conclusão: a legitimação dos entes coletivos apresenta perfil singular. Por isso, exige ruptura com os critérios classificatórios clássicos, ancorados nos dogmas do liberalismo, que vê o conflito social como choque de interesses interindividuais, visão insuficiente para explicar a atual realidade sóciojurídica, caracterizada pelosurgimento dos conflitos coletivos e difusos.: (Teoria Geral do Processo, p. 194, São Paulo, Malheiros Editores, 1996). Sem grifos no original. - E foi inspirado no liberalismo que também se estabeleceram os princípios que regem a prescrição e a decadência, ou, melhor dizendo, resultaram de considerações que tinham em mira as relações de natureza individual, sem embargo de já se considerar determinados interesses que, por suas nuances próprias, eram julgados indisponíveis. - O fundamento da prescrição - instituto que faz perecer a actio romana (ação de direito material), um dos efeitos do fato jurídico beneficiador do credor, inviabilizando a ação processual contra seu devedor - está exatamente na necessidade de criação de mecanismos de defesa das relações jurídicas individuais, cuja eficácia não pode durar indefinidamente, pelo menos quando se tem em vista as conseqüências de ordem econômica. - Ao lado dela, instituiu-se também a decadência, cuja ocorrência faz perecer o próprio 'direito subjetivo', cujo fundamento, apesar de também ter em mira a segurança das relações jurídicas, é a proteção daquelas relações jurídicas individuais cujo interesse público reclama um tratamento mais rígido na sua manutenção, razão pela qual instituiu-se um prazo diminuto para a ação visando sua desconstituição. - Por fim, existem determinados direitos que, por seu interesse individual e social, não podem estar sujeitos à prescrição, como é o caso dos direitos de personalidade (vida, liberdade, etc.) e daqueles relacionados ao estado da pessoa (condição de filho, de esposo, etc.), salvo no que respeita aos efeitos econômicos dele derivados. - Como se observa, até mesmo o sistema jurídico inspirado no liberalismo reconhece a existência de direitos que não podem, por razões de interesse público, estar sujeitos à prescrição. Em outras palavras, mesmo o direito oriundo das idéias que se fizeram ecoar na Revolução Francesa reconhece a necessidade de criar mecanismos protetivos contra a extinção de determinadas relações jurídicas, a exemplo do que se vê nos casos de decadência e de imprescritibilidade, o que era e continua sendo justificado pelo interesse social. - Em tudo isso resta a certeza de que o instituto da prescrição, nos moldes como foi concebido, não teve qualquer objetivo de regular os denominados interesses difusos e coletivos de efeitos sociais. Daí a indagação: é possível sua aplicação para os interesses que reclamam a tutela por intermédio da ação popular ou da ação civil pública, excluídos os individuais homogêneos? A resposta é no sentido de que as razões que explicam a imprescritibilidade de determinados direitos individuais são inteiramente aplicáveis aos interesses que reclamam a tutela jurisdicional coletiva (interesses difusos e coletivos de efeitos sociais). 78 - A propósito, imagine-se a hipótese de o poluidor sustentar a prescrição da ação que ataca sua conduta, reclamando, assim, o direito de continuar poluindo ou fazer permanecer os efeitos da poluição. Esse exemplo singelo demonstra a impossibilidade de se aceitar a prescrição de ato violador da ordem jurídica, quando ofensivo ao interesse público. Essa forma de encarar a questão encontra respaldo na doutrina de EDIS MILARÉ, a saber: - "A ação civil pública não conta com disciplina específica em matéria presencional. Tudo conduz, entretanto, à conclusão de que se inscreve ela no rol das ações imprescritíveis. - A doutrina tradicional repete uníssona que só os direitos patrimoniais é que estão sujeitos à prescrição. Precisamente, os direitos patrimoniais é que são prescritíveis. Não há prescrição senão de direitos patrimoniais, afirma o grande Clóvis Beviláqua. - Ora, a ação civil pública é instrumento para tutela jurisdicional de bensinteresses de natureza pública, insuscetíveis de apreciação econômica, e que têm por marca característica básica a indisponibilidade. Versa, portanto, sobre direitos não patrimoniais, direitos sem conteúdo pecuniário. - Qual, por exemplo, o valor do ar que respiro? Da praça onde se deleitam os velhos e crianças? Do manancial que abastece minha cidade? - É claro que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado não é um direito patrimonial, muito embora seja passível de valoração, para efeito indenizatório." (A Ação Civil Pública na Nova Ordem Constitucional, pp. 15/16, São Paulo, Saraiva, 1990). - No caso concreto, portanto, não é aceitável a aplicação da prescrição, posto que implicaria na continuidade de ocorrência de atos prejudiciais ao meio ambiente e na manutenção de toda degradação ambiental ocorrida ao longo do tempo. - No mérito. - Quanto à responsabilidade da Prefeitura e dos permissionários. Sustenta a Prefeitura Municipal de Itapema, em sua petição recursal, que o atual Governo é dotado da mais alta consciência ecológica e que não caberia a responsabilização da Prefeitura por ato ímprobo do ex-Prefeito, que lavrou certidão falsa acerca da viabilidade da construção do edifício residencial. - Ora, em que pese a alegação de que a Prefeitura atualmente busca incessantemente preservar e defender o meio ambiente - saliente-se que não foi o que se verificou no andamento do processo, como adiante se demonstrará - e de que o ato atacado foi praticado unilateralmente pelo exPrefeito, sem o respaldo da Municipalidade, permanece para a Prefeitura os deveres elencados no § 1º do art. 225 da CF. - O Prefeito, embora seja o Chefe do Executivo Municipal, deve-se igualmente submeter-se à lei, e a Prefeitura e a Câmara de Vereadores devem zelar para que o mesmo obedeça aos limites estritos da legalidade. Ora, se o ex-Prefeito de Itapema lavrou certidão de conteúdo falso aprovando a execução da obra, tal ato deveria ter sido desconstituído ainda administrativamente, pois cabe ao Poder Público zelar pela preservação do meio ambiente, conforme explicitado no art. 225 da CF. - Ademais, o Poder Público Municipal, mesmo 'dotado da mais alta consciência ecológica' - conforme afirma em sua apelação -, descumpriu novamente o que estabelece o art. 225, § 1º, VII, ao permitir que fosse construída no terreno objeto desta lide uma residência, sem que fosse avaliado o impacto ambiental que uma moradia no local, aparentemente sem ligação à rede de tratamento de esgoto, causaria, e tudo isso após instaurado este processo, no qual foi determinada a interrupção da construção do edifício residencial exatamente face à potencialidade de dano ao meio ambiente, em especial à flora e ao lençol freático. - Por outro lado, sustentam os permissionários que o autor Luiz Antônio Palhares estaria motivado apenas por motivos pessoais, posto que a construção de um edifício residencial em terreno limítrofe ao seu certamente 79 lhe prejudicaria a paisagem. Aduziram, ainda, que não desejaram em momento algum causar dano ao meio ambiente ou à coletividade. - No tocante aos motivos que levaram o autor popular a ajuizar a presente ação, não há qualquer evidência no sentido de que estes seriam apenas particulares, sem a menor preocupação com a defesa do meio ambiente. Não obstante ser de fácil constatação o fato de que a construção de um edifício em terreno lindeiro ao seu fosse lhe trazer alguns transtornos, igualmente é de fácil constatação o fato de que a execução do projeto rejeitado pela FATMA traria graves prejuízos não só ao autor, mas também ao meio ambiente e à coletividade, em especial face à contaminação do lençol freático e da possível alteração das condições de balneabilidade da praia próximo ao prédio. - Ademais, também a União Federal viu interesse na presente lide, face à área em que o prédio seria construído ser terreno de marinha e a execução da obra se configurar em inequívoca ameaça ao meio ambiente. Assim, não deve subsistir a tese de que o feito deva ser julgado improcedente por ter sido o autor motivado por interesses meramente individuais. - E, no que concerne à alegação de que os permissionários jamais desejaram causar dano ou ameaça ao meio ambiente, deve ser destacado que a Constituição Federal prevê a responsabilidade 'objetiva', isto é, independentemente de culpa, em casos de dano ao meio ambiente. Isso não impede, como evidente, a responsabilização solidária do Poder Público, por faute du service, o que acarreta apenas a exigência da ocorrência de culpa (responsabilidade subjetiva). - No caso concreto, percebe-se que enquanto à Municipalidade compete a expedição de certidão atestando a aprovação do órgão ambiental para o início das obras, caberia aos construtores e permissionários do terreno o dever de iniciar as obras apenas após a aprovação de seu projeto pela FATMA. - Evidente que a Municipalidade, pelo fato de atuar no âmbito da autorização para construir, não se despe do seu dever de proteger o meio ambiente, direito de toda coletividade e dever imposto ao Poder Público, conforme se infere do art. 225 da Constituição Federal. - Em tal situação, no momento da autorização deveria exigir do beneficiário todas as medidas necessárias e aptas à defesa do meio ambiente, compatibilizando a atividade de construção civil com as exigências de preservação dos recursos naturais, especialmente a flora e aqueles de natureza hídrica. Não o fazendo ou deixando de exigir a realização das medidas necessárias ao equilíbrio ambiental, deve ser responsabilizada pela omissão. - Os permissionários, do mesmo modo, enquanto titulares da concessão do terreno de marinha em que o edifício seria construído, deveriam condicionar sua autorização para a construtora J. Guesser construir à elaboração de um projeto que respeitasse as normas ambientais. Deste modo, caracteriza-se a condição de infratores também aos permissionários, pois concorreram para a concretização do efeito danoso. Consulte-se: - "A obrigação de reparação do dano ecológico compete, imediatamente, ao responsável pela atividade poluidora. Pode ocorrer, porém, que haja mais de um responsável, ocorrendo solidariedade, conforme a regra do art. 1.518, parágrafo único, do CC. Rodolfo de Camargo Mancuso, finalmente, aponta o art. 225, § 3º, da CF,que impõe indistintamente a todos os infratores das normas de proteção ambiental, além das sanções penais e administrativas, a obrigação de reparar os danos. Conforme a doutrina administrativista, a falta de serviço significa ausência, o não funcionamento ou o funcionamento deficiente dos serviços públicos. Importa sempre numa omissão ou, ao menos, num déficit. Muitas vezes, significa a falta do efetivo exercício do poder de polícia. Deixando sem a devida fiscalização determinada atividade, permite-se que seja desrespeitado o regulamento pertinente, sobrevindo o evento danoso. 80 - Respeitáveis autores entendem que, mesmo nessas hipóteses, há responsabilidade da administração pública. - Se a omissão administrativa é a causa única do dano, não há dúvida sobre a incidência da regra constitucional do art. 37, § 6º. Contudo, se entre a falta, v. g., da fiscalização e o dano interpõe-se o ato comissivo do causador direto do evento, parece mais razoável perquirir-se da culpa da administração, como propõe Celso Antônio Bandeira de Mello, ainda que se possa partir de uma presunção juris tantum de responsabilidade." (ADALBERTO PASQUALOTTO, Responsabilidade Civil por Dano Ambiental: considerações de ordem material e processual, in Dano Ambiental, Prevenção, Reparação e Repressão, obra coordenada por ANTONIO HERMAN VASCONCELOS E BENJAMIM, pp. 451/452, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1993). - Percebe-se, então, que no caso de faute du service, pelo menos em razão de culpa, está o ente estatal encarregado da fiscalização obrigado a responder solidariamente pelo dano ambiental. - Ademais, está claro nas perícias requeridas e nos pareceres da FATMA o risco de graves danos ao meio ambiente, com perigosa poluição dos recursos hídricos utilizados pela população da região, fato ameaçador para a saúde e vida de toda ela, conforme é também reconhecido. - E, no tocante à situação atual do terreno, verifica-se que a Prefeitura mais uma vez falhou no seu dever de defesa e preservação do meio ambiente ao permitir que fosse construída no local objeto da presente lide uma residência aparentemente não conectada à rede de esgoto - sabe-se que à época da realização das perícias a rede de esgoto não se estendia até o terreno em questão -, e que não teve o projeto de sua construção avaliado pelo órgão ambiental competente, a fim de se examinar se a execução do projeto desta casa colocaria em risco o meio ambiente. - De igual forma, os permissionários mais uma vez deram prova de que o discurso de que não desejaram em momento algum causar dano ao meio ambiente nada mais é do que um discurso, sem haver a menor demonstração prática de que os mesmos buscam a tutela ambiental juntamente com de seus interesses, e não apenas a destes. - Assim, tenho que deve ser interditada a residência construída no terreno em debate até que seja concluído um estudo sobre o impacto ambiental causado pela moradia que se encontra no local com a indicação de procedimentos que tornem aceitável o impacto ambiental e a recuperação do meio ambiente, se aplicável. Isso sem prejuízo da remoção dos materiais referentes à construção do edifício residencial que teve seu projeto reprovado pelo órgão ambiental e da recuperação ecológica da área. - Quanto à fixação de honorários em favor da União Federal. - O art. 20 do CPC, diante da consideração de algumas circunstâncias previstas no seu § 3º, estabelece que os honorários advocatícios devem ser fixados entre 10% (dez por cento) e 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. - No caso em tela, no entanto, não houve o arbitramento da verba honorária em favor da União Federal por se entender que a sua atuação no feito fora meramente opinativa e de menor importância, comparativamente à do autor popular. - Entretanto, muito embora a participação da União Federal não tenha sido tão relevante quanto a de seu litisconsorte, tenho que ela não foi tão somente opinativa, tal como entendeu a sentença. Ao longo desses mais de treze anos do ajuizamento da ação, a União atuou zelosamente no feito, despendendo recursos consideráveis no acompanhamento da demanda. - Assim, vislumbro certa insuficiência na não fixação de honorários em favor do ente público, posto que este atuou zelosamente e com considerável dispêndio de tempo, face à natureza e importância da matéria. Por conseguinte, entendo que deva haver fixação da verba honorária em favor 81 da União, na razão de 50% do quantum arbitrado em favor de Luiz Antônio Palhares. 2. Provimento da apelação da União e improvimento dos demais recursos, 175 inclusive a remessa oficial . Vale reproduzir também parte do voto do precedente supra colacionado: [...] E, no que concerne à alegação de que os permissionários jamais desejaram causar dano ou ameaça ao meio ambiente, deve ser destacado que a Constituição Federal prevê a responsabilidade ‘objetiva’, isto é, independentemente de culpa, em casos de dano ao meio ambiente. Isso não impede, como evidente, a responsabilização solidária do Poder Público, por faute du service, o que acarreta apenas a exigência da ocorrência de culpa (responsabilidade subjetiva). No caso concreto, percebe-se que enquanto à Municipalidade compete a expedição de certidão atestando a aprovação do órgão ambiental para o início das obras, caberia aos construtores e permissionários do terreno o dever de iniciar as obras apenas após a aprovação de seu projeto pela FATMA. Evidente que a Municipalidade, pelo fato de atuar no âmbito da autorização para construir, não se despe do seu dever de proteger o meio ambiente, direito de toda coletividade e dever imposto ao Poder Público, conforme se infere do art. 225 da Constituição Federal. Em tal situação, no momento da autorização deveria exigir do beneficiário todas as medidas necessárias e aptas à defesa do meio ambiente, compatibilizando a atividade de construção civil com as exigências de preservação dos recursos naturais, especialmente a flora e aqueles de natureza hídrica. Não o fazendo ou deixando de exigir a realização das medidas necessárias ao equilíbrio ambiental, deve ser responsabilizada pela omissão. Existia dever objetivo do Município de agir, na medida em que deveria se assegurar, que todas as medidas pertinentes à preservação do Meio Ambiente haviam sido adotadas antes de autorizar a realização da construção em comento, levando, ainda em consideração, os relatórios técnicos que foram elaborados nesse sentido. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ENTE ESTATAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RESPONSÁVEL DIRETO E INDIRETO. SOLIDARIEDADE. LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO. ART. 267, IV DO CPC. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. 1. Ao compulsar os autos verifica-se que o Tribunal a quo não emitiu juízo de valor à luz do art. 267 IV do Código de Ritos, e o recorrente sequer aviou embargos de declaração com o fim de prequestioná-lo. Tal circunstância atrai a aplicação das Súmulas nº 282 e 356 do STF. 2. O art. 23, inc. VI da Constituição da República fixa a competência comum para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que se refere à proteção do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas. No mesmo texto, o art. 225, caput, prevê o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à _____________ 175 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional da 4ª Região. Apelação Cível nº 2001.04.01.045587-9. Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 06 ago.2002. 82 coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 3. O Estado recorrente tem o dever de preservar e fiscalizar a preservação do meio ambiente. Na hipótese, o Estado, no seu dever de fiscalização, deveria ter requerido o Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo relatório, bem como a realização de audiências públicas acerca do tema, ou até mesmo a paralisação da obra que causou o dano ambiental. 4. O repasse das verbas pelo Estado do Paraná ao Município de Foz de Iguaçu (ação), a ausência das cautelas fiscalizatórias no que se refere às licenças concedidas e as que deveriam ter sido confeccionadas pelo ente estatal (omissão), concorreram para a produção do dano ambiental. Tais circunstâncias, pois, são aptas a caracterizar o nexo de causalidade do evento, e assim, legitimar a responsabilização objetiva do recorrente. 5. Assim, independentemente da existência de culpa, o poluidor, ainda que indireto (Estado-recorrente) (art. 3º da Lei nº 6.938/81), é obrigado a indenizar e reparar o dano causado ao meio ambiente (responsabilidade objetiva). 6. Fixada a legitimidade passiva do ente recorrente, eis que preenchidos os requisitos para a configuração da responsabilidade civil (ação ou omissão, nexo de causalidade e dano), ressalta-se, também, que tal responsabilidade (objetiva) é solidária, o que legitima a inclusão das três esferas de poder no pólo passivo na demanda, conforme realizado pelo Ministério Público (litisconsórcio facultativo). 176 7. Recurso especial conhecido em parte e improvido . Para melhor analisar o caso em tela, vale transcrever parte do seu relatório: A demanda foi proposta para fazer cessar possíveis danos ambientais decorrentes: a) da construção da via pública denominada Avenida Beira Rio, que tangencia o Rio Paraná por uma extensão de 7.620 m, compreendidos entre a Ponte Internacional da Amizade e a Avenida das Morenitas no Município de Foz do Iguaçu, e b) pelo não cumprimento por parte deste Município do Termo de Compromisso firmado com o IBAMA, para proteção do meio ambiente na área de preservação permanente em que se projetou a construção desta avenida, bem como restaurá-lo ao estado em que se encontrava antes da construção da citada obra. Elucidativa é também parte do parecer do Ministério Público Federal, mencionado no inteiro teor do referido acórdão: A responsabilidade solidária da Administração Pública em relação ao poluidor, pode ocorrer tanto da ação quanto da omissão ou complacência do órgão ambiental. Posição essa compartilhada pela ampla maioria dos doutrinadores, aos quais homenageamos reproduzindo a lição de PAULO AFFONSO LEME MACHADO: 'A intervenção estatal no domínio ambiental visa preservar a saúde pública e ordenar as atividades produtoras. Não se pode esquecer que muitas vezes o Poder Público, ao baixar normas de emissão e elaborar padrões de qualidade, age em causa própria, pois ele, o Poder Público, também exerce algumas atividades iguais às dos particulares (siderurgia, petroquímica ... ). Dessa forma, nem sempre os parâmetros oficiais são ajustados à realidade _____________ 176 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 2003/0195400-5. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 21 jun.2005. 83 sanitária e ambiental, decorrendo daí, que, mesmo em se observando essas normas, as pessoas e a natureza sofrem prejuízos' [...] Para compelir, contudo, o Poder Público a ser prudente e cuidadoso no vigiar, orientar e ordenar a saúde ambiental nos casos em que haja prejuízo para as pessoas, para a propriedade ou para ou recursos naturais mesmo com a observância dos padrões oficiais, o Poder Público deve responder solidariamente com o particular. [...] Como acentua Armando H. Dias Cabral: 'A propriedade privada não se tornou algo intocável; desde que seu uso se desencontre de sua função social, vale dizer do interesse público concernente à segurança à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, à tranqüilidade pública, ao respeito às demais propriedades, à estética urbana e aos direitos individuais e coletivos, seja ou não matéria ou energia poluente, o Poder Público tem o dever de limitá-la administrativamente. Não o fazendo, a Administração se torna civilmente responsável por eventuais danos sofridos por terceiros em virtude de sua ação (permitindo o exercício da atividade poluente, em desacordo com a legislação vigorante) ou de sua omissão (negligenciando o policiamento dessas atividades poluentes, (Direito Ambiental Brasileiro, 10ª edição, 2002, pp. 319- 320, grifamos) ”. No mesmo sentido do parecer ministerial, seguem partes do voto proferido: O art. 23, inc. VI da Constituição da República fixa a competência comum para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que se refere à proteção do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas, e seu art. 225, caput, prevê o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Em seus parágrafos constam as diretrizes para o Estado (latu sensu), viabilizar tais objetivos, as conseqüências decorrentes da inobservância de tais deveres e a natureza objetiva da responsabilidade nestes casos.”“ [...] Assim, consoante preceitua a Carta Magna, o Poder Público, que por sua vez, abarca todos os entes políticos, e por conseguinte, o Estado ora recorrente, tem o dever de preservar e fiscalizar a preservação do meio ambiente. Na hipótese em estudo, o Estado, no seu dever de fiscalização, deveria ter requerido o Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo relatório, bem como até a realização de audiências públicas acerca do tema, ou até mesmo a paralisação da obra.” [...] Conclusão: O repasse das verbas pelo Estado do Paraná ao Município de Foz de Iguaçu (ação), a ausência das cautelas fiscalizatórias no que se refere às licenças concedidas e as que deveriam ter sido confeccionadas pelo ente estatal (omissão), concorreram para a produção do dano ambiental. Tais circunstâncias, pois, são aptas a caracterizar o nexo de causalidade do evento, e assim, legitimar a responsabilização objetiva do recorrente. Fixada a legitimidade passiva do ente recorrente, eis que preenchidos os requisitos para a configuração da responsabilidade civil (ação ou omissão, nexo de causalidade e dano), ressalto, também, que tal responsabilidade (objetiva) é solidária, o que legitima a inclusão das três esferas de poder no pólo passivo na demanda conforme realizado pelo recorrido.” (grifos do autor) Verifica-se, pois, que, nesse caso, o Estado foi duplamente responsabilizado civilmente, ou seja, tanto por ação quanto por omissão específica, esta por não ter desempenhado satisfatoriamente sua função fiscalizatória. No mesmo sentido, 84 AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EMPREENDIMENTO RESIDENCIAL PRAIA MOLE. ÁREA DE PROTEÇÃO PERMANENTE. VEGETAÇÃO DE RESTINGA. DANOS AMBIENTAIS. RESPONSABILIDADE PELOS DANOS. - Classificada e definida pela legislação federal como de preservação permanente a área sobre a qual se localiza o empreendimento em questão não poderia o poder municipal classificá-la de forma distinta, menos restrita do que aquela. Mantida a sentença que reconheceu a nulidade ao alvará concedido. - Não havendo a transcrição no Cartório de Registro de imóveis, permanece o proprietário da área como responsável pela obra, quem prestou declarações junto à Secretaria de Urbanismo junto à Prefeitura, ainda que não tenha participado diretamente do empreendimento. - A responsabilidade para os causadores de danos ecológicos é a objetiva e integral. - A lei também consagra a responsabilidade solidária entre o causador direto e o indireto da atividade causadora da degradação ambiental (art. 3º, IV, da Lei nº 6.938/81), revelando-se pertinente a condenação do espólio pelos danos ambientais ocorridos pela atividade, assim como daquele que contribuiu diretamente, no caso aquele que está na posse do bem. - Mantida a condenação na FATMA, que restou condenada pela omissão da atividade fiscalizatória, e o escasso número de agentes e os parcos recursos financeiros do órgão não são argumentos suficientes a justificar a omissão e a ensejar o provimento do apelo. - O Município de Florianópolis negligenciou a correta aplicação dos dispositivos constitucionais quando estabeleceu o zoneamento da Praia Mole com padrões menos restritivos do que os determinados na Constituição e na 177 legislação federal pertinente . O que interessa no acórdão acima transcrito é a responsabilização do Poder Público pela omissão específica verificada na aplicação das normas constitucionais, assim como da Fundação do Meio Ambiente – FATMA, órgão ambiental da esfera estadual do Estado de Santa Catarina, que foi omissa em sua atividade de fiscalização. Nesse sentido, insta observar que, em ambos os casos, a responsabilidade é objetiva, já que havia o dever legal e concreto de agir bem delimitado, conforme se verifica no inteiro teor da decisão em tela, que segue em anexo178. 4.1.5 Por danos causados pela Demora legislativa Nas hipóteses de responsabilização civil do Estado por omissão no que tange à demora legislativa, em que pese não se tratar de agente indeterminado, em que se teria a culpa anônima, também se trata da falta do serviço, sendo o poder público responsabilizado por omissão. E, nessas hipóteses especificamente, entende-se que _____________ 177 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2003.04.01.029648-8. Órgão Julgador: quarta Turma. Julgado em 11 out. 2006. 178 Anexo D. 85 não há embasamento plausível para a aplicação da teoria subjetiva, uma vez que o dano sempre decorrerá de uma imposição positiva de fazer, sendo aplicável, portanto, o comando de responsabilização objetiva constitucional. Nesse sentido é o teor da ementa do precedente que se traz à colação: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. POSSIBILIDADE JURÍDICA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CF/88. PREVISÃO ABSTRATA. SERVIDORES PÚBLICOS. REVISÃO GERAL. ART. 37, X, DA CF/88. ADIN 2061. STF. MORA LEGISLATIVA. OMISSÃO DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. DANOS MATERIAIS. INPC. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICES. 1. Nos termos em que formulado o pedido - indenização por danos causados pela mora legislativa - não se vislumbra óbice legal à pretensão, porquanto há previsão abstrata no ordenamento jurídico da responsabilização do Estado em face de danos causados a terceiros - art. 37, § 6º, da CF/88, donde surge amparado juridicamente o pleito trazido a desate. 2. A diretriz confinada no art. 37, X, da CF/88, com redação fornecida pela EC n. 19/98, garantiu aos servidores públicos o direito à revisão geral anual das suas remunerações, a ser promovida mediante lei específica de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo. Precedente do STF. 3. A ausência de revisão geral, por omissão do Poder Executivo em promovê-la, pretextou significativa lesão ao patrimônio dos servidores públicos, que não tiveram a recomposição da força aquisitiva das suas remunerações. 4. Considerando que o prejuízo dos servidores públicos tem conexão direta com a omissão da autoridade estatal que não adotou medidas, afetas à sua esfera de competência, para realização concreta do preceito constitucional, resta identificado o nexo entre o dano dos servidores públicos e a conduta omissiva do agente estatal, conformando- se os pressupostos da responsabilidade civil e do conseqüente dever de indenizar, nos moldes que concebido no § 6º do art. 37 da CF/88. 5. Adoção da variação do INPC como critério de cálculo da indenização, porque é o índice que melhor reflete a perda inflacionária experimentada pelos servidores públicos e pela grande massa populacional. 6. Mora legislativa constatada a partir de junho de 1999, consoante expressamente reconhecido pelo Pretório Excelso na ADIN n. 2061. 7. Indevida a compensação dos aumentos posteriores com aqueles devidos sob pretexto indenizatório. 8. Os juros de mora são contados a partir do dano, conforme se infere da Súmula 54 do egrégio STJ. 9. Levando-se em conta que o evento danoso ocorreu anteriormente ao Novo Código Civil, deve ser observada a disposição do art. 1.602 do Código Civil revogado, que fixava os juros de mora em 6% ao ano. 10. Em relação à correção monetária, incidirão sobre o montante devido os índices previstos para atualização dos débitos judiciais - Lei n. 6.899/81 -, assim entendidos aqueles havidos por oficiais, com exclusão dos que hajam sido criados com finalidade específica de atualização de determinadas espécies de débitos/créditos, v.g., a UFIR, que era parâmetro de atualização monetária de tributos (art. 1º da Lei n. 8.383/91), e o IGP-DI, eleito como índice de atualização monetária dos benefícios previdenciários pagos em atraso (art. 10 da Lei n. 9711/98). In casu, aplicável o INPC. 86 11. Não se conhece do apelo no ponto em que já atendido pela sentença 179 . Compulsando o inteiro teor do julgado acima relacionado180, verifica-se que, no caso em comento, os danos tiveram lugar tão-somente em razão da negligência administrativa do Chefe do Poder Executivo em dar eficiência à norma contida no artigo 37, inciso X, da Constituição Federal181, uma vez que o aludido dispositivo exige a formulação de lei específica para tanto. Diante dessa conduta, verifica-se a ocorrência de omissão específica do agente público, devendo ser imputada ao Estado a responsabilização objetiva, prevista no artigo 37, parágrafo 6º, do diploma legal já mencionado. 4.2 Decisões Judiciais em que a responsabilidade civil do Estado foi considerada subjetiva No caso da responsabilização subjetiva do Estado por omissão, em que pese não estar pacificado o tema, vê-se que esta será aplicada sempre o dever de agir do Ente Público, contrariamente ao que se observa na responsabilização objetiva nos casos em que há omissão, for genérico, ou seja, sempre que o Estado seja o responsável por evitar o dano em tese, que ocorrido, não decorreu diretamente da inação estatal ou de qualquer de seus agentes e encontra seu fundamento na culpa (negligência, imprudência ou imperícia) do serviço em sua totalidade. _____________ 179 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2005.71.00.016129-0. Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 03 out. 2006. 180 Anexo E. 181 Art.37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] _____________ 87 4.2.1 Por danos causados à propriedade privada Preceitua a Declaração Universal dos Direitos Humanos em seu artigo 17 que “Toda pessoa tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros”, nossa Constituição Federal estabelece a propriedade como direito fundamental e garantia individual em seu artigo 5º, inciso XXII182, consagrando-o como direito inalienável do ser humano. Em que pese ser este um dos bens jurídicamente mais protegidos no nosso sistema, quando se trata de imputar responsabilidade civil ao Estado, gestor de dinheiro público, ainda assim é possível demandá-lo com fundamento na sua culpa relativamente à falta de proteção da propriedade, quando se trata da inércia diante da inobservância de um dever genérico de proteção, em que a omissão estatal figurou somente como causa mediata do dano. Entretanto, sendo específica a omissão do Estado, ou seja, quando havia o dever objetivo e delimitado de agir e não o fez, é de ser aplicado o disposto no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, como se viu anteriormente no item 3.1.1. Nesse sentido e, tendo em vista, inclusive, os princípios que regem a Administração Pública, concorda-se plenamente com o posicioamento adotado na demanda, cujo julgado segue abaixo transcrito: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ASSENTAMENTO IRREGULAR PELO ESTADO EM TERRAS INDÍGENAS. INSEGURANÇA GERADA PELA SITUAÇÃO. MANIFESTAÇÕES VIOLENTAS EXERCIDAS PELOS ÍNDIOS. OMISSAO ESTATAL. FATO DO SERVIÇO. INEFICIENCIA. PRELIMINAR DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO. AFASTADA. ACORDO EXTRAJUDICIAL QUE NÃO ABARCA OS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. 1) O Estado, pelos danos que causar aos particulares, devido a sua omissão, responde subjetivamente, e em conformidade a teoria da responsabilidade subjetiva decorrente da faute du service. _____________ X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; 182 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXII - é garantido o direito de propriedade; 88 2) O valor da indenização deve atender o caráter compensatório e punitivopedagógico, sem se tornar fonte de enriquecimento ilícito. Valor da 183 indenização reduzido. DERAM PROVIMENTO AO APELO. Vale transcrever trechos do voto prolatado no acórdão em tela: O fato ensejador dos alegados danos morais sofridos pela autora diz com a ausência de prestação de serviços adequadamente pelo ente estatal, que não garantiu a segurança que dele se esperava em confronto dos indígenas com os agricultores que moravam na 4ª Seção de Planalto. [...] frente à demonstração do dano, a omissão do Estado em zelar pela segurança dos indivíduos, principalmente, porque a situação foi gerada por ato seu, e ainda, presente o nexo causal entre o omissão e o dano, imperiosa a responsabilização do ente estatal em indenizar os autores. Nesse sentido já houve manifestação deste Tribunal no julgamento das apelações cíveis números 70014597603, 70015832686, 70012670493 e 70011125515, dos quais peço vênia para transcrever as ementas, in verbis: RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. DANO MORAL E MATERIAL. ALIENAÇÃO DE TERRAS DEVOLUTAS DA UNIÃO. TERRAS INDÍGENAS. RESPONSABILIDADE CIVIL COMPROVADA. Responsabilidade objetiva do Estado, fundada na teoria do risco administrativo, que impõe a obrigação de indenizar sem cogitar sobre a identificação do causador do dano, porque a indagação de culpa ou dolo do agente da autoridade é justificável apenas em se tratando de ação de regresso contra o responsável. O valor fixado pelo juízo monocrático, em 100 salários mínimos, mostra-se suficiente, pois atende à dupla finalidade a que se propõe a reparação de danos morais: compensar o efeito nefasto acarretado à vítima e reprimir esse tipo de acontecimento, já que o caráter da reparação é compensatório e educativo. APELO DESPROVIDO. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70014597603, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio dos Santos Caminha, Julgado em 21/09/2006) [...] O Estado, pelos danos que causar aos particulares, devido a sua omissão, responde subjetivamente, e em conformidade a teoria da responsabilidade subjetiva decorrente da faute du service. Celso Antônio Bandeira de Mello ensina que “em face dos princípios publicísticos não é necessária a identificação de uma culpa individual para deflagrar-se a responsabilidade do Estado. Esta noção civilista ultrapassada pela idéia denominada faute du service entre os franceses. Ocorre a culpa do serviço ou falta de serviço, quando este não funciona, devendo funcionar, funciona mal ou funciona atrasado. Esta é a tríplice modalidade pela qual se apresenta e nela se traduz um elo entre a personalidade tradicional do direito civil e a responsabilidade objetiva” Conforme entendimento do autor supracitado e dos Tribunais Superiores a responsabilidade civil do Ente Estatal baseada na omissão, como é o caso dos autos, é fundamentada na culpa do Estado e se caracterizará sempre que este, devendo atuar segundo certos critérios e padrões mínimos, não o faz, ou, ainda, atua de modo insuficiente. É exatamente o caso dos autos. O Estado tinha ciência da situação estabelecida na região. Sabia da conflituosidade, dos precedentes de violência, enfim, da intenção dos indígenas. E o que fez? Encaminhava ao local insignificante número de policiais, que não tinham condições nenhuma para impedir os atos de violência. Justificava a precariedade da segurança _____________ 183 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70017007303. Órgão Julgador: Sexta Câmara Cível. Julgado em 22 mar. 2007. 89 na 4ª Secção pela falta de policiais, mas não demonstrou em momento algum que estava tentando tomar providências para alterar a situação. Diante de tais fatos, tenho que a questão posta encontra guarida na referida teoria da responsabilidade subjetiva pela falha do serviço. Em verdade o caso, além de configurar-se em omissão do Estado, também denota a falha do serviço público, a ineficiência da segurança oferecida, seja pela falta mesmo de pessoal, seja pelo desinteresse das autoridades em resolver o conflito. [...] Ora, só para argumentar, não é questão de querer um Estado unipresente, mas o que se verificou no caso desses agricultores foi que o Estado era sabedor da dimensão dos conflitos que nas referidas terras ocorriam. Sabia que precisava montar uma estratégia para conter a violência e os moradores clamavam por isso. Porém, o que se percebe é que o ente estatal ficava inerte, só agindo quando a situação já estava inviável de ser contornada. Assim, frente à demonstração do dano, a omissão do Estado em zelar pela segurança dos indivíduos, a deficiência do serviço por culpa, e ainda, presente o nexo causal entre a omissão e o dano, imperiosa a responsabilização do ente estatal em indenizar a autora. Aqui se verificou um caso típico de falta do serviço por ineficiência, em que o Estado restou responsabilizado civilmente de maneira subjetiva, em função da conduta culposa da administração e da configuração do nexo de causalidade entre a omissão e o dano. 4.2.2 Por danos causados em virtude de acidentes: RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. LEGITIMIDADE ATIVA DO CONDUTOR DO VEÍCULO. OMISSÃO DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. CULPA DEMONSTRADA NA ESPÉCIE. ACIDENTE DE VEÍCULOS EM CRUZAMENTO. SEMÁFORO DEFEITUOSO. CULPA CONCORRENTE DO MUNICÍPIO E DO MOTORISTA QUE TRAFEGAVA NA VIA EM QUE O SINAL ESTAVA INOPERANTE. AUSÊNCIA DE CULPA DO CONDUTOR DO VEÍCULO QUE TRANSITAVA PELA RUA EM QUE O SEMÁFORO ESTAVA VERDE. "Tem legitimidade ativa ad causam para o pleito o motorista que se achava ao volante do veículo quando do evento e padeceu o prejuízo dele advindo, pois detém a posse do veículo e pode responsabilizar-se perante o proprietário" (AGA 556.138/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 5.4.2004). No campo da responsabilidade civil do Estado, se o prejuízo adveio de uma omissão do Estado, ou seja, pelo não-funcionamento do serviço, ou seu funcionamento tardio, deficiente ou insuficiente, invoca-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Na espécie, a colisão entre os veículos, ocorrida no cruzamento entre duas ruas, deveu-se ao fato de que um dos semáforos do cruzamento estava verde e o outro, inoperante; ausente qualquer sinalização sobre o defeito no semáforo. Assim, como bem enfatizou a Corte de origem, "evidente a responsabilidade do Município pelo dever de conservar a sinaleira em regular estado de funcionamento. No caso dos autos, deveria ter providenciado alguma indicação do defeito que tornou 90 inoperante o semáforo, porquanto há notícia de que dois outros acidentes ocorreram no mesmo local, fato que não é impugnado na contestação" (fl. 122). In casu, portanto, restou caracterizada a culpa do Município recorrido ao não ter colocado sinalização evidenciando que naquele cruzamento um dos semáforos não estava acionado. Não se deve deixar de considerar, contudo, que o recorrente Jorge Luiz Lourenço deveria ter sido atento ao cruzar a rua, uma vez que o sinal não estava operante e naquele local não há vias preferenciais devido à existência dos dois sinais. Dessa forma, quanto a esse recorrente, deve ser mantido o raciocínio da Corte Estadual de que "há concorrência de culpas: a do motorista por atravessar o cruzamento simplesmente ignorando a ausência da sinalização que ali deveria existir, a da Municipalidade em decorrência de omissão que permitiu e contribuiu para um tal proceder" (fl. 123). Fincado nessa premissa, cumpre dar provimento in totum ao recurso no que concerne ao pedido de danos materiais de Anilto Klein de Oliveira, uma vez que quando do acidente trafegava na via em que o semáforo estava verde, não lhe sendo cobrado qualquer dever de diligência quanto ao provável surgimento de veículos provenientes das outras ruas. Recurso especial provido em parte, para condenar o Município de Canoas/RS ao pagamento de danos materiais a Anilto Klein de Oliveira, no 184 valor do menor orçamento juntado aos autos . Traçando um comparativo entre esta decisão e aquela apresentada na página 62, em que foi aplicada a responsabilização objetiva, entende-se que aqui também havia um dever individualizado de agir, em que pese a coexistência do dever genérico do Estado de assegurar a trafegabilidade com segurança em vias públicas. Veja-se parte do voto que fundamentou tal decisão: No campo da responsabilidade civil do Estado, a regra é a responsabilidade objetiva, cujo corolário é a teoria do risco administrativo, segundo a qual está o Poder Público obrigado a reparar o dano por ele causado a outrem por meio de uma ação lícita ou ilícita de seus agentes. Bastará, nessa hipótese, comprovar a ocorrência do prejuízo e o nexo causal entre a conduta e o dano, para que assista ao lesionado o sucedâneo indenizatório. Por outro lado, se o prejuízo adveio de uma omissão do Estado, ou seja, pelo não-funcionamento do serviço, ou seu funcionamento tardio, deficiente ou insuficiente, invoca-se a teoria da responsabilidade subjetiva. A esse respeito, pontifica o professor Celso Antonio Bandeira de Mello que, “se o Estado não agiu, não pode logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo” (in "Curso de direito administrativo ", Malheiros Editores, São Paulo: 2002, p. 855). Raciocínio contrário levaria à insensatez de atribuir ao Estado a responsabilidade por todo e qualquer ato danoso causado por terceiro. Ao comentar o tema, referido doutrinador, com a ênfase que lhe é peculiar, pondera que, "em princípio, cumpre ao Estado prover a todos os interesses da coletividade. Ante qualquer evento lesivo causado por terceiro, como um assalto em via pública, uma enchente qualquer, uma agressão sofrida em local público, o lesado poderia sempre argüir que o 'serviço não funcionou'. A admitir-se a responsabilidade objetiva nestas hipóteses, o Estado estaria erigido em segurador universal! Razoável que responda pela lesão _____________ 184 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 2005/0004734-7. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 21 jun. 2005. 91 patrimonial da vítima de um assalto se agentes policiais relapsos assistiram à ocorrência inertes e desinteressados ou se, alertados a tempo de evitá-lo, omitiram-se na adoção de providências cautelares. Razoável que o Estado responda por danos oriundos de uma enchente se as galerias pluviais e os bueiros de escoamento das águas estavam entupidos ou sujos, propiciando o acúmulo da água. Nestas situações, sim, terá havido descumprimento do dever legal na adoção de providências obrigatórias. Faltando, entretanto, este cunho de injuridicidade, que advém do dolo, ou da culpa tipificada na negligência, na imprudência ou na imperícia, não há cogitar de responsabilidade pública" (op. cit., p. 857). Nesse diapasão, salientei, no julgamento do Recurso Especial 44.500/MG (DJ 9.9.2002), em que fui designado Relator para acórdão, que, "para que haja responsabilidade objetiva do Estado, forçoso reconhecer que os atos lesivos devem ser praticados por agentes públicos, por comissão. Se houve omissão, sua responsabilidade será por culpa subjetiva (cf. Lúcia Valle Figueiredo, in Curso de Direito Administrativo, Malheiros Editores, 4a ed., p. 255)". O entendimento que ora se defende situa-se no campo da responsabilidade subjetiva pela faute du service ou culpa do serviço, existente quando o Estado, devendo atuar com base em certos critérios, não o faz, ou quando peca por omissão ou atua de modo deficiente ou insuficiente. Na espécie, a colisão entre os veículos, ocorrida no cruzamento de duas vias, deveu-se ao fato de que um dos semáforos do cruzamento estava verde, e o outro, inoperante; ausente qualquer sinalização sobre o defeito no semáforo. Assim, como bem enfatizou a Corte de origem, "evidente a responsabilidade do Município pelo dever de conservar a sinaleira em regular estado de funcionamento. No caso dos autos, deveria ter providenciado alguma indicação do defeito que tornou inoperante o semáforo, porquanto há notícia de que dois outros acidentes ocorreram no mesmo local, fato que não é impugnado na contestação" (fl. 122). In casu, portanto, restou caracterizada a culpa do Município recorrido por não ter colocado sinalização evidenciando que naquele cruzamento um dos semáforos não estava acionado. Não se deve deixar de considerar, contudo, que o recorrente Jorge Luiz Lourenço deveria ter sido atento ao cruzar a rua, uma vez que o sinal não estava operante e naquele local não há vias preferenciais devido à existências dos dois sinais. Dessa forma, quanto a esse recorrente, deve ser mantido o raciocínio da Corte Estadual de que "há concorrência de culpas: a do motorista por atravessar o cruzamento simplesmente ignorando a ausência da sinalização que ali deveria existir, a da Municipalidade em decorrência de omissão que permitiu e contribuiu para um tal proceder” (fl. 123). Compulsando a decisão supra transcrita, verifica-se que dois outros acidentes já haviam ocorrido no mencionado cruzamento, podendo-se inferir que se deram justamente pela falta de sinalização adequada. Nesse caso, é inadmissível a negligência do Estado, que, tendo ciência do problema, tinha o dever legal objetivo de resolvê-lo. Assim, entende-se ser equivocada a decisão em comento, na medida em que foi adotado um posicionamento inflexível no sentido de sempre aplicar a teoria subjetiva nas hipóteses de omissão. Diferentemente do que ocorre no precedente que segue: 92 RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE EM BURACO (VOÇOROCA) CAUSADO POR EROSÃO PLUVIAL. MORTE DE MENOR. INDENIZAÇÃO. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. INEXISTÊNCIA. SÚMULA 7/STJ. NÃOINCIDÊNCIA. 1. Ação indenizatória proposta em face do Município de Costa Rica/MS, em que se pleiteia pensão vitalícia no montante de dois salários mínimos mensais e despesas de funeral, pela morte de filho menor, em decorrência de acidente em buraco (voçoroca) causado pelas águas da chuva. 2. A instância especial, por suas peculiaridades, inadmite a discussão a respeito de fatos narrados no processo - vale dizer, de controvérsias relativas à existência ou inexistência de fatos ou à sua devida caracterização -, pois se tornaria necessário o revolvimento do conjunto probatório dos autos. 3. Entretanto, a qualificação jurídica de fatos incontroversos, ou seja, seu devido enquadramento no sistema normativo, para deles extrair determinada conseqüência jurídica, é coisa diversa, podendo ser aferida neste âmbito recursal. Não-incidência da Súmula 7/STJ. 4. Segundo o acórdão recorrido, a existência da voçoroca e sua potencialidade lesiva era de "conhecimento comum", o que afasta a possibilidade de eximir-se o Município sob a alegativa de caso fortuito e força maior, já que essas excludentes do dever de indenizar pressupõem o elemento "imprevisibilidade". 5. Nas situações em que o dano somente foi possível em decorrência da omissão do Poder Público (o serviço não funcionou, funcionou mal ou tardiamente), deve ser aplicada a teoria da responsabilidade subjetiva. Se o Estado não agiu, não pode ser ele o autor do dano. Se não foi o autor, cabe responsabilizá-lo apenas na hipótese de estar obrigado a impedir o evento lesivo, sob pena de convertê-lo em "segurador universal". 6. Embora a municipalidade tenha adotado medida de sinalização da área afetada pela erosão pluvial, deixou de proceder ao seu completo isolamento, bem como de prover com urgência as obras necessárias à segurança do local, fato que caracteriza negligência, ensejadora da responsabilidade subjetiva. 7. Em atenção à jurisprudência da Corte e aos limites do recurso especial, deve a indenização ser fixada no montante de 2/3 do salário mínimo, a partir da data em que a vítima completaria 14 anos de idade (28 de agosto de 1994) até o seu 25º aniversário (28 de agosto de 2005), calculado mês a mês, com correção monetária plena. 8. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor atualizado da condenação, a ser apurado em liquidação de sentença. 185 9. Recurso especial conhecido e provido em parte . Vale analisar parte do voto proferido, para que se entenda melhor a decisão: Noticiam os autos que Maria Aparecida da Silva propôs em face do Município de Costa Rica, Estado do Mato Grosso do Sul, ação indenizatória, em que pleiteia pensão vitalícia no montante de 02 (dois) salários mínimos mensais e despesas de funeral pela morte de seu único filho, de 11 (onze) anos, em decorrência de acidente em buraco (voçoroca) causado pelas águas da chuva, o que veio a vitimar o menor por asfixia. O acórdão recorrido traz como fundamento de exclusão da responsabilidade municipal as hipóteses de caso fortuito e força maior, bem como a culpa in vigilando da mãe do menor vitimado. Cinge-se a questão em averiguar a existência de responsabilidade do Município pelos prejuízos advindos do acidente, tendo em vista a suposta _____________ 185 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1997/0040014-0. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 19 out.2004. 93 omissão da Prefeitura em conter o processo erosivo decorrente das fortes chuvas que afetaram a região. Em regra, a responsabilidade do Estado é de natureza objetiva (art. 37, § 6º, da CF/88), quando o dano decorre de ato comissivo, lícita ou ilicitamente praticado. Nas situações em que o dano somente foi possível em decorrência da omissão do Poder Público (o serviço não funcionou, funcionou mal ou tardiamente), deve ser aplicada a teoria da responsabilidade subjetiva. Se o Estado não agiu, não pode ser ele o autor do dano. Se não foi o autor, cabe responsabilizá-lo apenas na hipótese de estar obrigado a impedir o evento lesivo, sob pena de convertê-lo em "segurador universal". Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo dá-se por força de um comportamento ilícito, quando o Estado, devendo atuar segundo certos critérios ou padrões, não o faz, ou atua de modo insuficiente. Nesse caso, a comprovação de dolo ou culpa mostra-se necessária. Na hipótese, a existência da voçoroca e sua potencialidade lesiva era, segundo o acórdão recorrido, de “conhecimento comum”, o que afasta a possibilidade de eximir-se o Município sob a alegativa de caso fortuito e força maior, já que essas excludentes do dever de indenizar pressupõem o elemento "imprevisibilidade". Assim, afastadas essas excludentes, resta aferir se a omissão do Município reveste-se de dolo ou culpa, necessários à conformação da responsabilidade subjetiva do Poder Público. Nesse particular, colho como argumentos a preciosa manifestação do Ministério Público Federal, por meio do Subprocurador-Geral da República Dr. Benedito Izidro da Silva: "Na espécie, é de fácil inferência que existia para a Administração Pública Municipal o seu dever de zelar pela segurança dos que por ali passavam, pois é seu dever conservar vias públicas em bom estado, ao não fazê-lo ou fazê-lo de modo paliativo deixando que um 'buracão' tomasse conta, descumpriu com esse dever. Dos elementos de convicção reunidos nos autos, constata-se notória deficiência nas condições de segurança pois que a voçoroca avançava a cada chuva e, como dito pelos peritos, 'aumentando a probabilidade de desmoronamento dos taludes com a inevitável queda de postes de energia elétrica, árvores e até mesmos das casas ali próximas localizadas'. A omissão do Município, in casu, se consubstancia na negligência no emprego de medidas de segurança plenamente adequadas às circunstâncias específicas do caso. Não se diga, que a municipalidade não tenha adotado qualquer medida de segurança no local, mas o fez de forma insatisfatória e há muito tempo antes do infortúnio, de modo que à época do acidente não se distinguia a rua da voçoroca. Assim, deve ser responsabilizado, eis que incorreu em 'ilicitude, por não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente neste mister, em razão de comportamento inferior ao padrão legal exigível'. Afirma o Professor Celso Antônio que 'não há resposta a priori quanto ao que seria o padrão normal tipificador da obrigação a que estaria legalmente adstrito. Cabe indicar, no entanto, que a normalidade da eficiência há de ser apurada em função do meio social, do estágio de desenvolvimento tecnológico, cultural, econômico e da conjuntura da época, isto é, das possibilidade reais médias dentro do ambiente em que se produziu o fato danoso'. Nesse contexto, poder-se-ia questionar: na hipótese dos autos vislumbra-se cuidados que se observados pela Municipalidade em atuação diligente evitaria a morte do menor? Não há outra resposta a não ser a afirmativa, tendo em conta o descrito no Laudo Pericial que ao final requer providências para a contenção da voçoroca, bem assim a ausência na localidade de isolamento da zona de perigo. 94 O entendimento que ora se defende localiza-se no âmbito da responsabilidade subjetiva pela faute du service ou culpa do serviço, existente quando o Município, devendo atuar com base em certos critérios, não o faz, ou quando peca por omissão ou atua de modo deficiente ou insuficiente. Neste caso, conforme o Prof. Bandeira de Mello, "necessariamente haverá de ser admitida uma 'presunção de culpa', pena de inoperância desta modalidade de responsabilização, ante a extrema dificuldade (às vezes intransponível) de demonstrar-se que o serviço operou abaixo dos padrões devidos, isto é, com negligência, imperícia ou imprudência, vale dizer culposamente. Em face da presunção de culpa, a vítima do dano fica desobrigada de comprová-lo'. Portanto, não prevalece a afirmação do v. acórdão de que o infortúnio ocorreu por culpa da mãe do menor, 'por não vigiar seu infante, pois sabia da existência da erosão nas proximidades de sua casa e, mesmo assim, permitia-lhe brincar longe de seus olhos e cuidados'. Veja-se que os Desembargadores deixam claro no aresto que 'era, porém, da ciência de todos os moradores da região tal periculosidade'. Portanto, o perigo era comum a qualquer morador da região. Poder-se-ia admitir a culpa exclusiva da vítima, na espécie, se, atendidas as exigências de segurança, a vítima, por vontade própria, violasse as regras de fruição do serviço. Como tal não se deu, resta concluir que a omissão e a negligência municipal foi a causa para a ocorrência do dano. Assim, conjugam-se a omissão e a negligência do Município, consubstanciado no artigo 159 do Código Civil, à época, e não em caso fortuito ou força maior, a configurar o ato lesivo e conseqüente obrigação de indenizar à ora recorrente" (fls. 222/225). É possível concluir, assim, que a municipalidade, embora tenha adotado medida de sinalização da área afetada pela erosão pluvial, deixou de proceder ao seu completo isolamento, bem como de prover com urgência as obras necessárias à segurança do local, fato que caracteriza negligência, ensejadora da responsabilidade subjetiva. Caracterizada a responsabilidade por omissão do Município, resta a tarefa de quantificar a indenização. Veja-se que era de conhecimento comum o buraco existente na via pública, assim como o seu potencial lesivo. No entanto, no caso em tela, a municipalidade adotou diversas posturas no sentido de evitar a ocorrência de qualquer dano, o fazendo, no entanto, de maneira insatisfatória, ou seja, o serviço foi ineficiente, funcionou mal. Assim, foi aplicada a teoria subjetiva, baseada na culpa anônima, já que estava obrigado o Ente Público a impedir a ocorrência do evento lesivo. Entendimento acertado também foi aplicado no caso da ementa abaixo transcrita: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS PATRIMONIAIS, MORAIS E LUCROS CESSANTES. OMISSÃO DO MUNICÍPIO. AUSÊNCIA DE SINALIZAÇÃO NA ÁREA EM QUE RETIRADAS AS ÁRVORES. O autor ajuizou a presente ação visando à condenação do réu ao pagamento de indenização a título de danos materiais e lucros cessantes. Fundou sua pretensão nos danos causados em veículo de sua propriedade, ocasionados pela queda de um eucalipto sobre o mesmo, na ocasião em que prepostos do réu retiravam árvores que representavam riscos a moradores de determinada localidade. 95 A regra decorrente de disposição constitucional é que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos são responsáveis objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Há, dessarte, evidente responsabilidade objetiva do Poder Público para atos comissivos de seus agentes. Todavia, o mesmo não ocorre no que concerne à omissão, em que, conforme o mais recente entendimento do Supremo Tribunal Federal e doutrina consolidada, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, exigindo dolo ou culpa, esta numa de suas três vertentes, a negligência, a imperícia ou a imprudência. Não é necessário individualizá-la, porém, dado que pode ser atribuída, de forma genérica, à falta do serviço - faute du service -. Com efeito, o réu contribuiu para a ocorrência do sinistro, ao não empregar as cautelas necessárias ao caso concreto, uma vez que, na área em que seus prepostos cortavam e retiravam as árvores que representavam riscos aos moradores da localidade, não sinalizou os locais de risco, impossibilitando a ciência destes locais àqueles que, por um motivo ou por outro, precisavam acessá-los. Reconhecido o dever do réu de indenizar os danos patrimoniais causados no veículo de propriedade do autor. Não incluídos na condenação as despesas diárias e os lucros cessantes, uma vez que ausente substrato probatório robusto e consistente. Sucumbência recíproca das partes que autoriza a distribuição dos ônus de sucumbência de maneira proporcional entre os litigantes. Honorários advocatícios reduzidos para 10% sobre o valor da condenação, com amparo nos §§ 3º e 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil. Compensação dos honorários advocatícios viável, nos termos da Súmula 306 do Superior Tribunal de Justiça. APELO DO RÉU 186 PROVIDO EM PARTE. APELO DO AUTOR DESPROVIDO. UNÂNIME. Nesse caso, importa salientar a falta efetiva do serviço de conservação da via pública que figurou como causa mediata da ocorrência do dano, pois, havia o dever genérico de conservação da via pela autarquia, que, sendo negligente nesse tocante proporcionou que tivesse lugar o dano experimentado. Verificando-se, novamente aqui, a figura da culpa anônima por “faut du service”, como se pode observar na fundamentação dessa decisão187 . 4.2.3 Por danos causados por falta de segurança pública: Conforme anteriormente referido, a responsabilização civil do Estado pela inobservância do disposto no artigo 144 da Constituição Federal vem sendo tratada pela jurisprudência majoritária sob o ângulo subjetivo, fundamentada na falta genérica desse serviço. _____________ 186 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70018624692. Órgão Julgador: Nona Câmara Cível. Julgado em 18 abr.2007. 187 Anexo F. 96 EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO EM ESTACIONAMENTO. RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO. INEXISTÊNCIA DE ADMINÍCULO PROBATÓRIO A ENSEJAR A RESPONSABILIZAÇÃO. 1. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO. O sistema jurídico brasileiro adota a responsabilidade patrimonial objetiva do Estado e das prestadoras de serviço público sob a forma da Teoria do Risco Administrativo. Tal assertiva encontra respaldo legal no art. 37, § 6º, da CF. 2. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ENTE PÚBLICO POR OMISSÃO. FAUTE DU SERVICE. No entanto, a parte autora sustenta a pretensão reparatória em virtude da omissão da municipalidade diante da negligência na vigilância dos veículos estacionados nas proximidades do baile organizado pelo município. Logo, descartada a hipótese de responsabilidade objetiva, emerge a responsabilidade subjetiva do Município, a teor do art. 186 do Código Civil. Incide, portanto, o princípio geral da culpa civil, nas modalidades de imprudência, negligência ou imperícia na realização do serviço público que causou o dano, daí exigir-se a prova da culpa da Administração ¿ falta do serviço. 3. Contudo, para restar verificada a responsabilidade, necessária, pois, a existência de prova da existência de agir por parte do Município, o que não se verifica nos autos, não restando comprovado sequer que o furto do veículo deu-se nas dependências do Parque Municipal. NEGARAM 188 PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. Neste julgado, se depreende da sua fundamentação que os Desembargadores acolheram a tese da responsabilidade subjetiva do Estado, mesmo em se tratando de caso bem específico e delimitado objetivamente de falta de segurança: [...]descartada a hipótese de responsabilidade objetiva, emerge a responsabilidade subjetiva do Município, a teor do art. 186 do Código Civil. Incide, portanto, o princípio geral da culpa civil, nas modalidades de imprudência, negligência ou imperícia na realização do serviço público que causou o dano, daí, exigir-se a prova da culpa da Administração. No entanto, foi negado provimento ao recurso em razão da não comprovação do nexo de causalidade entre a omissão do ente público e o dano perpetrado, elemento indispensável à responsabilização civil em ambas as modalidades. Veja-se o caso que segue: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 131, 165 e 458, II, DO CPC CONFIGURADA. APLICAÇÃO DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. PLEITO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. MORTE DE FUNCIONÁRIO EM HOSPITAL PÚBLICO. FATO PRESUMÍVEL. ONUS PROBANDI. 1.É cediço no Tribunal que: "ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – ATO OMISSIVO – MORTE DE PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL INTERNADO EM HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DO ESTADO. 1. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art. 37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever _____________ 188 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70017235359. Órgão Julgador: Nona Câmara Cível. Julgado em 28 fev.2007. 97 de indenizar se se verificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto. 2. Somente se afasta a responsabilidade se o evento danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima. 3. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam a responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a só ser possível indenização quando houver culpa do preposto. 4. Falta no dever de vigilância em hospital psiquiátrico, com fuga e suicídio posterior do paciente. 5. Incidência de indenização por danos morais. 6. Recurso especial provido.(REsp 602102/RS; Relatora Ministra ELIANA CALMON DJ 21.02.2005 ); "RECURSO ESPECIAL. ASSALTO À INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. MORTE DA VÍTIMA. INDENIZAÇÃO. NÃOCONFIGURAÇÃO DE CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR. PREVISIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Cuida-se de recurso especial (fls. 351/357) interposto por FÁTIMA TERESINHA SEMELER e OUTROS com fulcro no art. 105, III, alínea "c", da Constituição Federal de 1988, em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, em sede de apelação, por unanimidade de votos, restou assim ementado (fl. 337): "Apelação cível. Reexame necessário. Responsabilidade civil. Ação indenizatória por dano moral. Assalto à mão armada. Agência bancária. Falecimento do esposo/pai dos autores. Primeiro apelo. Ausência de nexo de causalidade entre o evento danoso e a conduta do réu, considerando que o roubo à mão armada corresponde à força maior, excludente de responsabilidade. Ao exame do caso concreto, verifica-se que não houve falha de segurança, sendo questão de fato que não restou comprovada, sendo esse ônus dos autores, que alegaram o fato. Segundo apelo, para majorar o valor da indenização, que resta prejudicado, em face da improcedência do pedido. Primeiro apelo provido. Segundo apelo prejudicado. sentença modificada em reexame necessário." 2. Em sede de recurso especial alega-se a necessidade de reforma do acórdão e restabelecimento da sentença, pois, conforme o entendimento deste STJ, é obrigação da instituição bancária no caso de morte por assalto, devendo ser afastada a afirmativa de caso fortuito e de força maior. 3. Restando incontroverso nos autos a ocorrência de assalto em agência bancária, que resultou na morte do genitor dos autores da ação indenizatória e, evidente a total ausência de oferecimento, pela instituição financeira, das mínimas condições de segurança aos seus clientes, afigurase inafastável o dever de indenizar pelo Estado do Rio Grande do Sul (sucessor da extinta Caixa Econômica Estadual). In casu, o único guarda armado omitiu-se no cumprimento do dever que lhe era afeto, correndo a esconder-se no banheiro enquanto que o Gerente fugia pela porta dos fundos, deixando seus subordinados e os clientes completamente entregues à própria sorte. 4. Descabido, ainda, o argumento de que houve força maior a ensejar a exclusão da responsabilidade do recorrente. Em diversos precedentes deste Pretório, restou assentada a orientação de que, em razão da previsibilidade, o roubo não caracteriza hipótese de força maior, capaz de elidir o nexo de causalidade, indispensável à configuração do dever indenizatório. 5. Recurso especial provido."(REsp 787124 / RS ; Relator Ministro JOSÉ DELGADO DJ 22.05.2006 ). 2. In casu, restou incontroverso que o referido estabelecimento hospitalar restou invadido em outras ocasiões com morte de 7 (sete) pessoas, caracterizando-se a culpa ensejadora da responsabilidade por omissão. 189 3. Recurso provido para acolher o pedido inicial . _____________ 189 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n º 2005/0050493-9. Órgão Julgador:Primeira Turma. Julgado em 08 ago.2006. 98 Explicativo, nesse sentido, é o voto proferido pelo Ministro Luiz Fux, nesta parte: O Juiz Singular julgou improcedente a demanda, por inexistência de provas da participação do agente público no evento danoso ao fundamento de que pela teoria do risco administrativo, adotada em nosso ordenamento jurídico no que tange à responsabilidade objetiva do Estado, o que se há de indagar é, tão somente, se quem causou o dano fê-lo no exercício de função pública. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro negou provimento à apelação dos ora recorrentes, porque "não configurada qualquer prática de conduta lesiva ou mesmo omissiva tendo em vista que não houve falta do serviço, tendo sido o dano causado por terceiro, o que é uma das causas de exclusão do nexo de causalidade, pois a invasão do hospital público por bandidos, já afasta, por si só a responsabilidade do Estado, constituindo-se em caso fortuito." A hipótese dos autos versa acerca da Responsabilidade Subjetiva do Estado, em que predomina a teoria da culpa do serviço público pelo seu mau funcionamento (faute du service ), aplicável às hipóteses em que o dano não decorre diretamente da atuação do agente público, mas da Omissão do Poder Público. Nesta esteira, é a lição da professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, in Direito Administrativo, 18ª Edição, Editora Atlas, página 569: "A mesma regra se aplica quando se trata de ato de terceiros, como é o caso de danos causados por multidão ou por delinquentes ; o Estado responderá se ficar caracterizada a sua omissão , a sua inércia, a falha na prestação do serviço público. Nesta hipótese, como na anterior, é desnecessário apelar para a teoria do risco integral;a culpa do serviço público demonstrada pelo seu mau funcionamento, não-funcionamento ou funcionamento tardio é suficiente para justificar a responsabilidade do Estado." Prima facie, cumpre ressaltar, a situação descrita nos presentes autos não desafia o óbice da Súmula 07 desta Corte. Isto porque, não se trata de reexame do contexto fático-probatório dos autos, mas sim da aplicação de tese jurídica versada no recurso especial, consubstanciada na Responsabilidade Civil do Estado, por danos materiais e morais, decorrente do falecimento de funcionário de hospital público ocasionado por ausência de segurança. A hipótese sub examine cinge-se à Responsabilidade Subjetiva do Estado, mais especificamente, por omissão do Poder Público em prestar segurança à sociedade, o que depende da comprovação da inércia na prestação do serviço público. Assim, imprescindível a demonstração do mau funcionamento do serviço, para que seja configurada a responsabilidade, somente aferível mediante a análise do fato concreto. Diversa é a circunstância em que se configura a Responsabilidade Objetiva do Estado, em que o dever de indenizar decorre do nexo causal entre o ato administrativo e o prejuízo causado ao particular, que prescinde da apreciação dos elementos subjetivos (dolo e culpa estatal), posto que referidos vícios na manifestação da vontade dizem respeito, apenas, ao eventual direito de regresso. In casu, as razões expedidas no voto condutor do acórdão hostilizado revelam a falta de apreciação das provas acostadas aos autos. Há manifesto descompasso das razões de julgar proferidas pelo Tribunal a quo e os elementos de prova juntados ao feito pelos recorrentes, tais como documentos que demonstram a habitualidade das ocorrências criminosas perpetradas contra os pacientes e funcionários públicos residentes no Hospital Estadual Curupaiti, localizado no Bairro de Jacarepaguá, no Estado do Rio de Janeiro, bem como depoimentos prestados pelas testemunhas do evento danoso, cujo resultado morte ensejou o pedido indenizatório. 99 Ademais, o Tribunal local adotou, como razão de julgar, o fundamento exarado pelo juízo a quo, o qual limitou-se a afastar a teoria da Responsabilidade Oobjetiva do Estado, sem contudo, apreciar qualquer prova juntada pelos autores. Com efeito, a 2ª Turma desta Corte no julgamento de hipótese análoga - em sede de Recurso Especial 433.514/MG, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 21.02.2005, decidiu, verbis : "ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – ATO OMISSIVO – MORTE DE PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL INTERNADO EM HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DO ESTADO. 1. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art. 37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se se verificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto. 2. Somente se afasta a responsabilidade se o evento danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima. 3. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam a responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a só ser possível indenização quando houver culpa do preposto. 4. Falta no dever de vigilância em hospital psiquiátrico, com fuga e suicídio posterior do paciente. 5. Incidência de indenização por danos morais. 6. Recurso especial provido.(REsp 602102/RS; Relatora Ministra ELIANA CALMON DJ 21.02.2005 )" Oportuno salientar outro aresto desta Corte Especial no sentido de que imprescindível à configuração da responsabilidade estatal por atos omissivos a análise das provas, sem a qual não se pode configurar a eventual culpa pela ausência do serviço: "RECURSO ESPECIAL. ASSALTO À INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. MORTE DA VÍTIMA. INDENIZAÇÃO. NÃO-CONFIGURAÇÃO DE CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR. PREVISIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Cuida-se de recurso especial (fls. 351/357) interposto por FÁTIMA TERESINHA SEMELER e OUTROS com fulcro no art. 105, III, alínea "c", da Constituição Federal de 1988, em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, em sede de apelação, por unanimidade de votos, restou assim ementado (fl. 337): "Apelação cível. Reexame necessário. Responsabilidade civil. Ação indenizatória por dano moral. Assalto à mão armada. Agência bancária. Falecimento do esposo/pai dos autores. Primeiro apelo. Ausência de nexo de causalidade entre o evento danoso e a conduta do réu, considerando que o roubo à mão armada corresponde à força maior, excludente de responsabilidade. Ao exame do caso concreto, verifica-se que não houve falha de segurança, sendo questão de fato que não restou comprovada, sendo esse ônus dos autores, que alegaram o fato. Segundo apelo, para majorar o valor da indenização, que resta prejudicado, em face da improcedência do pedido. Primeiro apelo provido. Segundo apelo prejudicado. sentença modificada em reexame necessário." 2. Em sede de recurso especial alega-se a necessidade de reforma do acórdão e restabelecimento da sentença, pois, conforme o entendimento deste STJ, é obrigação da instituição bancária no caso de morte por assalto, devendo ser afastada a afirmativa de caso fortuito e de força maior. 3. Restando incontroverso nos autos a ocorrência de assalto em agência bancária, que resultou na morte do genitor dos autores da ação indenizatória e, evidente a total ausência de oferecimento, pela instituição financeira, das mínimas condições de segurança aos seus clientes, afigurase inafastável o dever de indenizar pelo Estado do Rio Grande do Sul (sucessor da extinta Caixa Econômica Estadual). In casu, o único guarda 100 armado omitiu-se no cumprimento do dever que lhe era afeto, correndo a esconder-se no banheiro enquanto que o Gerente fugia pela porta dos fundos, deixando seus subordinados e os clientes completamente entregues à própria sorte. 4. Descabido, ainda, o argumento de que houve força maior a ensejar a exclusão da responsabilidade do recorrente. Em diversos precedentes deste Pretório, restou assentada a orientação de que, em razão da previsibilidade , o roubo não caracteriza hipótese de força maior, capaz de elidir o nexo de causalidade, indispensável à configuração do dever indenizatório. 5. Recurso especial provido."(REsp 787124 / RS ; Relator Ministro JOSÉ DELGADO DJ 22.05.2006 ) (grifou-se) Indubitável a necessidade de ser analisado o conjunto probatório dos autos, a fim de que seja delimitada as responsabilidades do Estado do Rio de Janeiro, bem como da empresa de vigilância, contratada pelo Estado para prestar serviços de segurança, por suposta negligência no cumprimento do dever de garantir o direito à segurança pública. Verifica-se, pois, que o cerne da questão é a omissão do Poder Público em prestar segurança à sociedade. No entanto, nesse caso específico, como constou na própria ementa do acórdão em tela, o mesmo estabelecimento público já havia sido invadido em outras ocasiões e sete outras pessoas já haviam sido mortas naquele local específico pela negligência do Estado. Parece um tanto desarrazoado aplicar a teoria subjetiva diante destas circunstâncias. Note-se que era pública e notória a situação de insegurança verificada naquele local. Ora, sete pessoas já haviam morrido em função disso! Ao menos previsível era que ocorressem outras tragédias. Entende-se, pois, que o mais correto seria aplicar ao referido caso a responsabilização objetiva do Estado, com base na infração objetiva de um dever que lhe incumbia de forma bem específica. Não é o que se observa no precedente que segue: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: DETENTO FERIDO POR OUTRO DETENTO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º. I. Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três vertentes -- a negligência, a imperícia ou a imprudência - não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. - A falta do serviço -- faute du service dos franceses -- não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro. III. - Detento ferido por outro detento: responsabilidade civil do Estado: ocorrência da falta do 101 serviço, com a culpa genérica do serviço público, por isso que o Estado 190 deve zelar pela integridade física do preso. IV. - RE conhecido e provido . Para entender o caso, vale colacionar parte do explicativo voto proferido pelo Ministro Carlos Veloso: [...] em caso de ato omissivo do poder público, o dano não foi causado pelo agente público. E o dispositivo constitucional instituidor da responsabilidade objetiva do poder público, art. 107 da CF anterior, art. 37, § 6º, da CF vigente, refere-se aos danos causados pelos agentes públicos, e não aos danos não causados por estes, 'como os provenientes de incêndio, de enchentes, de danos multitudinários, de assaltos ou agressões que alguém sofra em vias e logradouros públicos, etc.' Nesses casos, certo é que o poder público, se tivesse agido, poderia ter evitado a ação causadora do dano. A sua não ação, vale dizer, a omissão estatal, todavia, se pode ser considerada condição da ocorrência do dano, causa, entretanto, não foi. A responsabilidade em tal caso, portanto, do Estado, será subjetiva. (Celso Antônio Bandeira de Mello, 'Responsabilidade Extracontratual do Estado por Comportamentos Administrativos', em 'Rev. dos Tribs.', 552/11, 13 e 14; 'Curso de Direito Administrativo', em 'Rev. dos Tribs.', 552/11, 13 e 14; 'Curso de Direito Administrativo', Malheiros Ed. 5º ed., pp. 489 e segs.)’.(grifos nossos) Em segundo lugar, tendo em vista que o Estado tem o dever de zelar pela integridade dos presos, parece evidente que disso decorre o dever de se implementarem os meios correspondentes, com vistas a que essa finalidade seja alcançada. Ora, ‘um preso recolhido a um estabelecimento penitenciário, encontra-se no mesmo, não por vontade própria, mas sim por condução coativa do Estado, com a finalidade de cumprir pena que decorre de uma sentença criminal condenatória. Cabe, portanto, ao Estado, o dever intransferível de garantir a integridade física daquele preso’. (grifos nossos) Sendo assim, é imperativo que esses estabelecimentos sejam capazes de gerar um mínimo de segurança, com suficiente vigilância, apta a impedir fugas e revoltas que poderiam redundar em represálias e, em última análise, possivelmente, na ofensa à própria integridade física dos que ali estão custodiados. Conforme parecer ministerial (381/389), ‘é dentro desse contexto que surge, óbvia, a constatação: impedir que arma de fogo utilizada por policial dentro do presídio, como também, impedir que as chaves que abririam as portas das celas, engrossando o número de presos que participariam do conflito, sejam subtraídas pelos presos amotinados, são exigências mínimas de segurança que se impõem ao Estado, o qual, desatendendo a esse dever, incorre em omissão intimamente relacionada com os eventos que culminaram no dano causado ao ora recorrente’. O próprio Supremo Tribunal tem entendido que é responsabilidade dos agentes policiais evitar situações que possam colocar os presos em risco. Nesse sentido: RE 222.795, RE 170.014 e RE 215.981. Ora, conforme relatam as instâncias ordinárias, os presos tiveram acesso a armas de fogo e às chaves de carceragem. Com isso, obviamente, ocorreu omissão e negligência do serviço policial do Estado, criando situação perigosa aos que ali se encontravam. Dessa forma, pode-se afirmar que tal negligência foi condição sine qua non da ação de terceiros (motim), que veio a causar os danos ao recorrente. _____________ 190 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 382.054-1/RJ. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 03 ago.2004. 102 [...] No julgamento do RE 372.472/RN, por mim relatado, decidiu o Supremo Tribunal Federal: “EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: DETENTO MORTO POR OUTRO PRESO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º. I. – Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três vertentes —— a negligência, a imperícia ou a imprudência ——, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. – A falta do serviço —— faute du service dos franceses —— não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro. III. – Detento assassinado por outro preso: responsabilidade civil do Estado: ocorrência da falta do serviço, com a culpa genérica do serviço público, dado que o Estado deve zelar pela integridade física do preso. IV. – R.E. conhecido e não provido.” (“DJ” de 28.11.2003) [...] O Supremo Tribunal Federal, pela sua 1ª Turma, no RE 109.615/RJ, Relator o Ministro Celso de Mello, decidiu no sentido de que é objetiva a responsabilidade do Estado ‘pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão.’ (RTJ 163/1.107). III No caso, o acórdão decidiu pela ocorrência da falta do serviço. A falta do serviço decorre do não funcionamento ou do funcionamento insuficiente, inadequado, tardio ou lento do serviço que o poder público deve prestar. No RE 179.147/ SP, por mim relatado, decidiu esta 2ª Turma que ‘tratandose de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, numa de suas três vertentes, negligência, imperícia ou imprudência, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a faute du service dos franceses.’ (RTJ 179/791). [...] No caso, a sentença do Juízo de 1º grau, confirmada pelo acórdão recorrido, reconheceu: [...] Indubitável a responsabilidade do Estado por culpa in vigilando, pois arca com sua própria incúria em matéria de política penitenciária, incapaz de desarmar presos, inclusive, por temor de alguns guardas que, constantemente, não fazem uma revista cuidadosa no detento ou em sua cela. A Constituição Federal preserva, claramente, a integridade do detento e do presidiário [...] No caso em comento, foi considerada causa imediata do dano, ato comissivo de terceiro, ou seja, de outro custodiado que participava da rebelião noticiada. No entanto, não houve dúvida que o fator decisivo para sua ocorrência foi a deficiência do serviço de segurança penitenciária, que permitiu que circulassem armas dentro daquele local. Em que pese ser indiscutível o dever de preservar a integridade física do preso pelo Estado, devendo os estabelecimentos penitenciários serem capazes de gerar essa segurança, é desarrazoado pretender exigir do Estado que preveja todas as 103 condutas humanas possíveis, obstando sempre a ocorrência de danos, responsabilizando-o objetivamente cada vez que isso ocorra. Assim, acertada foi a decisão em voga, que concedeu somente parcial provimento ao recurso interposto, na medida em que subjetivamente não há como responsabilizar o Estado pela integralidade dos danos ocasionados quando somente concorreu para a produção desse resultado por sua negligência. O mesmo ocorre no caso do precedente da ementa abaixo calacionada, em que houve concorrência de culpas para a eclosão do dano: RECURSO ESPECIAL - ALÍNEAS "A" E "C" - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - ATO OMISSIVO - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA NEGLIGÊNCIA NA SEGURANÇA DE BALNEÁRIO PÚBLICO MERGULHO EM LOCAL PERIGOSO - CONSEQÜENTE TETRAPLEGIA IMPRUDÊNCIA DA VÍTIMA - CULPA RECÍPROCA - INDENIZAÇÃO DEVIDA PROPORCIONALMENTE. O infortúnio ocorreu quando o recorrente, aos 14 anos, após penetrar, por meio de pagamento de ingresso, em balneário público, mergulhou de cabeça em ribeirão de águas rasas, o que lhe causou lesão medular cervical irreversível. Para a responsabilização subjetiva do Estado por ato omissivo, “é necessário, que o Estado haja incorrido em ilicitude, por não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente neste mister, em razão de comportamento inferior ao padrão legal exigível” (Celso Antônio Bandeira de Mello, "Curso de Direito Administrativo", Malheiros Editores, São Paulo, 2002, p. 855). Ao mesmo tempo em que se exige da vítima, em tais circunstâncias, prudência e discernimento - já que pelo senso comum não se deve mergulhar em local desconhecido -, imperioso reconhecer, também, que, ao franquear a entrada de visitantes em balneário público, sejam eles menores ou não, deve o Estado proporcionar satisfatórias condições de segurança, mormente nos finais de semana, quando, certamente, a freqüência ao local é mais intensa e aumenta a possibilidade de acidentes. "Não há resposta a priori quanto ao que seria o padrão normal tipificador da obrigação a que estaria legalmente adstrito. Cabe indicar, no entanto, que a normalidade da eficiência há de ser apurada em função do meio social, do estágio de desenvolvimento tecnológico, cultural, econômico e da conjuntura da época, isto é, das possibilidades reais médias dentro do ambiente em que se produziu o fato danoso” (Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit., loc. cit.). Há, na hipótese dos autos, cuidados que, se observados por parte da Administração Pública Estadual, em atuação diligente, poderiam ter evitado a lesão. A simples presença de salva-vidas em locais de banho e lazer movimentados é exigência indispensável e, no particular, poderia ter coibido a conduta da vítima. Nem se diga quanto à necessidade de isolamento das zonas de maior risco, por exemplo, por meio de grades de madeira, cordas, corrimãos etc. Em passeios dessa natureza, amplamente difundidos nos dias atuais sob a denominação de “turismo ecológico”, não somente para as crianças, como para jovens e adultos, é de se esperar, conforme as circunstâncias peculiares do local, a presença de cabos de isolamento e a orientação permanente de guias turísticos e funcionários que conheçam o ambiente visitado. Segundo a lição do notável Aguiar Dias, doutrinador de escol no campo da responsabilidade civil, “a culpa da vítima, quando concorre para a produção do dano, influi na indenização, contribuindo para a repartição proporcional dos prejuízos” (in “Da responsabilidade civil”, Forense, Rio de Janeiro, 1960, Tomo II, p. 727). Recurso especial provido em parte para reconhecer a culpa recíproca e, como tal, o rateio das verbas 104 condenatórias e das despesas e custas processuais meio a meio, arcando 191 cada parte com a verba honorária advocatícia do respectivo patrono . EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. LEGITIMIDADE PASSIVA ¿AD CAUSAM¿ DO ESTADO-MEMBRO. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. FALTA DO SERVIÇO. ¿FAUTE DU SERVICE.¿ RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Não é a simples presença da entidade estatal que impõe a necessidade de intervenção do ¿parquet¿, sendo necessário o efetivo exame do interesse público, caracterizado pela natureza da lide, ou pela qualidade da parte. Leitura do artigo 82 do Código de Processo Civil à luz do artigo 127 da Constituição. Assiste legitimidade passiva ¿ad causam¿ ao Estado-Membro quando o pedido indenizatório se volta à prestação de serviço público de sua competência, mesmo tendo o fato danoso ocorrido sobre local considerado como bem da União. A responsabilidade objetiva do Estado, prevista no artigo 37, parágrafo 6°, da Con stituição, aplica-se frente a situações comissivas praticadas pelo agente público, ou pelas pessoas jurídicas privadas prestadoras de serviços públicos. Estando-se diante de omissão do poder público, aplica-se a responsabilidade subjetiva, fazendose necessário o exame da culpa, ou do dolo. Caso em que os autores visam à condenação do Estado do Rio Grande do Sul a somas ressarcitórias pelo evento de que seus filhos faleceram afogados em praia sem salva-vidas e sem placas indicativas do perigo do mar no local. Tratando-se de responsabilidade subjetiva, não se verificou, nos autos, prova de agir 192 culposo do réu. Apelo provido. Ao lado da negligência da vítima tem-se a falta do serviço público, diante da não adoção de medidas de segurança do balneário que fossem eficazes. Nesse sentido, insta salientar que, em função da própria disposição geográfica do local era previsível a ocorrência de danos, em razão dos riscos que este próprio oferece. Desse modo, compulsando o inteiro teor do acórdão em tela, verifica-se que não restou inerte o Estado com relação a isso, adotando medidas de segurança insatisfatórias. Quanto à responsabilização civil do Estado pela sua omissão, interessante é analisar partes do voto proferido no precedente supramencionado: [...] No campo da responsabilidade civil do Estado, a regra é a responsabilidade objetiva, cujo corolário é a teoria do risco administrativo, segundo a qual está o Poder Público obrigado a reparar o dano por ele causado a outrem por meio de uma ação lícita ou ilícita de seus agentes. Bastará, nessa hipótese, comprovar a ocorrência do prejuízo e o nexo causal entre a conduta e o dano, para que assista ao lesionado o sucedâneo indenizatório. Por outro lado, se o prejuízo adveio de uma omissão do Estado, ou seja, pelo não funcionamento do serviço, ou seu funcionamento tardio, deficiente ou insuficiente, invoca-se a teoria da responsabilidade subjetiva. [...] Raciocínio contrário levaria à insensatez de atribuir ao Estado a responsabilidade por todo e qualquer ato danoso causado por terceiro. _____________ 191 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 2002/0027129-0. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 20 mai. 2003. 192 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70017117821. Órgão Julgador: Quinta Câmara Cível. Julgado em 28 mar.2007. 105 [...] No caso vertente, é de fácil inferência que existia para a Administração Pública Estadual, ao colocar à disposição da comunidade a entrada onerosa no parque para fins de lazer, o dever de zelar pela segurança adequada dos visitantes. [...] Dos elementos de convicção reunidos nos autos, constata-se notória deficiência nas condições de segurança do Balneário. Não contesta a Fazenda Estadual, por exemplo, a circunstância de que não havia ambulância e enfermeira no local no domingo em que ocorreu o sinistro. Ao mesmo tempo em que se exige da vítima, em tais circunstâncias, prudência e discernimento - já que pelo senso comum não se deve mergulhar em local desconhecido -, imperioso reconhecer, também, que, ao franquear a entrada de visitantes em balneário público, sejam eles menores ou não, deve o Estado proporcionar satisfatórias condições de segurança, mormente nos finais de semana, quando, certamente, a freqüência ao local é mais intensa e aumenta a possibilidade de acidentes. A omissão do Estado, na espécie, se consubstancia na negligência no emprego de medidas de segurança plenamente adequadas às circunstâncias específicas do caso. Não se afirma, assim, que a Administração Pública não tenha adotado qualquer medida de segurança no local, mas o fez de forma insatisfatória, dada a distância entre a sinalização de perigo e o local do sinistro, controvérsia não arredada de forma satisfatória pela Fazenda Pública. [...] O entendimento que ora se defende situa-se no campo da responsabilidade subjetiva pela faute du service ou culpa do serviço, existente quando o Estado, devendo atuar com base em certos critérios, não o faz, ou quando peca por omissão ou atua de modo deficiente ou insuficiente. Nessas hipóteses, como bem pondera o professor Celso Antônio Bandeira de Mello, não raro, “necessariamente haverá de ser admitida uma “presunção de culpa”, pena de inoperância desta modalidade de responsabilização, ante a extrema dificuldade (às vezes intransponível) de demonstrar-se que o serviço operou abaixo dos padrões devidos, isto é, com negligência, imperícia ou imprudência, vale dizer, culposamente “. E continua: “Em face da presunção de culpa, a vítima do dano fica desobrigada de comprová-la. Tal presunção, entretanto, não elide o caráter subjetivo desta responsabilidade, pois, se o Poder Público demonstrar que se comportou com diligência, perícia e prudência – antítese de culpa -, estará isento da obrigação de indenizar, o que jamais ocorreria se fora objetiva a responsabilidade ” (op. cit., p. 846). [...] Assim, conjugam-se, na espécie, a imprudência do recorrente e a negligência do Estado, a configurar a culpa concorrente, identificada quando “paralelamente à conduta do agente causador do dano, há também conduta culposa da vítima, de modo que o evento danoso decorre do comportamento culposo de ambos” (Sergio Cavalieri Filho, in "Programa de Responsabilidade Civil", Malheiros Editores, São Paulo, 2002, p. 53). (...). O precedente supra colacionado tratou de uma questão típicamente de falta de serviço por sua ineficiência. 106 4.2.4 Por danos causados por falta de fornecimento de medicamentos De acordo com o artigo 196 da Constituição Federal193 incumbe ao Estado promover a saúde pública. Entretanto, assim como ocorre com a segurança, se trata de uma obrigação muito ampla e genérica. Assim, eventuais casos de responsabilização civil por omissão de determinado Ente Público, nesse sentido, devem ser muito bem analisados, levando-se sempre em consideração os princípios que regem a Administração Pública e a realidade fática do Estado brasileiro, por medidas de eqüidade e justiça. Normalmente, nos casos que envolvem omissão relativamente a saúde pública se verifica a falta do serviço em função de sua ineficiência, pois, não se trata de uma ausência efetiva, mas apenas de uma indisponibilidade momentânea. Analisa-se o caso, cuja ementa segue: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATRASO NO FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO A PACIENTE ACOMETIDO DE DOENÇA GRAVE. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ESTADO. INOCORRÊNCIA DO DANO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA. FALTA DE SIMILITUDE FÁTICA. I - Não ficou configurado o dissídio jurisprudencial entre o acórdão recorrido e os julgados apontados como paradigma, porquanto não existe similitude fática entre eles, sendo inadmissível o apelo nobre com base no permissivo constitucional da alínea "c". II - A hipótese dos autos trata da indenização por danos morais em razão do atraso em fornecimento de medicamento a paciente pelo Estado. Em contrapartida, os acórdãos apontados como paradigma, ainda que digam respeito à responsabilidade civil do Estado, tratam de questão diversa, acerca da omissão do Estado quanto ao descumprimento de decisão que determinou a reintegração de posse, em face da ocupação da propriedade por trabalhadores "sem-terra", e a respeito da indenização por danos morais em decorrência da morte da vítima em acidente automobilístico envolvendo viatura policial. III - A lide em questão trata de ação ordinária de reconhecimento de direito c/c obrigação de fazer, com o ressarcimento de danos morais, em que a recorrente, acometida de tumor de hipófise, a qual gera, entre outras conseqüências, o gigantismo, pugna pela condenação do Estado no fornecimento de medicação para a cura da referida doença, bem como no pagamento de danos morais, em razão da demora na consecução desse direito. _____________ 193 Art.196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 107 IV - No caso de ato omissivo praticado pelo Estado, por serviço que não funcionou ou funcionou de forma tardia ou ineficaz, deve-se enquadrar a responsabilidade estatal como subjetiva, mormente não ter sido o autor do dano, sendo necessário, para tanto, a comprovação do comportamento ilícito praticado pela Administração Pública. Precedentes: REsp nº 639.908/RJ, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 25/04/05 e REsp nº 602.102/RS, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJ de 21/02/05. V - Por meio da valoração do conjunto fático dos autos, não se vislumbra a ocorrência de ato culposo por parte do Estado, nem de prova do dano moral, tendo em vista que o tempo que durou a demora na entrega do medicamento à paciente restou razoável, mormente o remédio requisitado não ser, a princípio, destinado à doença da recorrente e em razão do número elevado de pedidos, no mesmo sentido, feitos à Secretaria Estadual de Saúde. 194 VI - Recurso especial conhecido em parte e, nesse ponto, improvido . No caso em tela, além de não ter sido verificado o nexo de causalidade entre a suposta inércia Estatal e o dano perepetrado, foram claramente levadas em consideração para o desprovimento do recurso também as condições reais da Administração Pública e os princípios que a norteiam, na medida em que sequer foi reconhecida a culpa administrativa na conduta, conforme se verifica no inteiro teor da decisão que segue em anexo195. 4.2.4 Por danos causados por falta de fiscalização Na hipótese de dano causado pela falta de fiscalização, é pacífica a jusrisprudência no sentido de que há necessidade de que esta figure como a causa determinante do dano, ou seja, nexo causal direto entre a conduta e o resultado, ou seja, condição sine qua non para a eclosão do evento danoso. SENTENÇA. NULIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. DESCARACTERIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR CONDUTA OMISSIVA. FISCALIZAÇÃO DE CONSÓRCIOS PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA E PARCIAL. SINDICÂNCIA ADMINISTRATIVA. NATUREZA INQUISITIVA. DISPENSA DO CONTRADITÓRIO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RETARDAMENTO DE ATO DE OFÍCIO. CARACTERIZAÇÃO. PENAS. APLICAÇÃO CUMULATIVA. DESNECESSIDADE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. _____________ 194 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n º 2004/0096291-4. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 02 mai.2006. 195 Anexo G. 108 1. Não é nula por ausência de fundamentação a sentença onde estão expressos os fundamentos fáticos e jurídicos que conduziram a convicção do julgador. 2. É subjetiva a responsabilidade do Estado por sua conduta omissiva, precedentes do STF. 3. Ao Banco Central do Brasil, responsável pela autorização, normatização e fiscalização do sistema de consórcios, não pode ser atribuída a causa direta do prejuízo advindo da má administração da empresa que explora a atividade. A responsabilidade do BACEN limita-se aos prejuízos supervenientes ao momento em que já podia e devia decretar a liquidação extrajudicial, adotando a medida adequada a obstar a prática danosa ao consumidor. 4. A responsabilidade do Banco Central do Brasil é subsidiária, restando limitada à diferença entre o prejuízo causado, nos termos antes referidos, e o montante arrecadado na liquidação extrajudicial e na ação civil que tramita na Justiça Estadual. 5. A sindicância administrativa, de que não resulta qualquer punição, tem natureza tipicamente inquisitiva, dispensando o contraditório. 6. A procrastinação da prática de ato em razão de interesses alheios aos interesses do público, configura o indevido retardamento previsto na Lei de Improbidade Administrativa situação agravada por se tratar de matéria de relevância pública, a proteção do consumidor e a poupança dos consorciados (art. 129, II, da CF/88). 7. Não há obrigatoriedade de que as sanções previstas no inciso III, artigo 12 da Lei nº 8.429/92 sejam aplicadas sempre de forma cumulativa. A aplicação depende do juízo de proporcionalidade e de razoabilidade. 8. Caso em que o valor da multa, fixada em vinte vezes os proventos atualizados do servidor, mostra-se demasiado levando-se em conta a condenação cumulada à perda do cargo público. 9. Parcialmente providas a remessa oficial e a apelação do Banco Central do Brasil, reconhecendo-se sua responsabilidade parcial e subsidiária, e parcialmente provida a apelação do co-réu, reduzindo-se o valor da multa 196 para cinco vezes os proventos atualmente percebidos . Nota-se que, analisando o inteiro teor do acórdão em comento197, verifica-se que a atuação do Banco Central se prestou para afastar o elemento subjetivo de sua conduta, ou seja, a culpa “lato sensu”, já que restou considerada regular a atuação do Ente Público. Restou afastado, também, o nexo causal entre sua atuação e o dano ocasionado, o qual foi gerado por força alheia. No mesmo sentido, é o teor da jurisprudência que segue: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. BANCO CENTRAL DO BRASIL. CONSÓRCIOS. ENTIDADE FISCALIZADORA. AUSÊNCIA DE ELEMENTO SUBJEITIVO E DO NEXO DE CAUSALIDADE. - A legislação confere ao BACEN (art. 10, IX, da Lei nº 4.595/64 c/c arts. 10 e 7º, da Lei nº 5.768/71) atribuição para fiscalizar e promover intervenções/liquidações extrajudiciais com o intuito de manter a regularidade das administradoras de consórcios. - No entanto, ao contrário do que afirma a apelante, não se trata de responsabilidade objetiva da Administração, consoante prevê o art. 37, § 6º, da Constituição Federal. A doutrina e a jurisprudência pátrias afirmam que é _____________ 196 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2002.04.01.035946-9. Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 05 ago. 2003. 197 Anexo H. 109 subjetiva responsabilidade do Estado por sua conduta omissiva. Assim, além do nexo de causalidade entre a conduta omissiva e o resultado, exigese a comprovação do elemento subjetivo, representado pela culpa ou dolo do Poder Público. - In casu, antes de se cogitar a responsabilidade da ré por falhas no controle e fiscalização do mercado financeiro, os danos acarretados à autora foram originados pela má-gestão de seus administradores. - Não haveria óbice para se reconhecer a responsabilidade do BACEN uma vez configurada a possibilidade de decretação da liquidação extrajudicial no momento oportuno. Contudo, a parte autora não logrou comprovar a indevida omissão da ré no seu dever legal. 198 - Apelação improvida . E seus fundamentos A parte autora busca o pagamento de indenização pelos prejuízos causados em face da autorização para funcionamento conferida ao Consórcio Nasser S/C Ltda pelo Banco Central. Diz que com a liquidação extrajudicial da empresa de consórcio, não conseguiu adquirir o veículo, cabendo reconhecer a responsabilidade objetiva da ré por sua posição de garantidor como órgão de regulação e fiscalização do Sistema Financeiro. Com efeito, o art. 10, IX, da Lei nº 4.595/64 estabelece a competência do BACEN para "exercer a fiscalização das instituições financeiras e aplicar as penalidades previstas". Complementando esse dispositivo, e considerando as circunstâncias do presente caso, a Lei nº 5.768/71 dispõe que: Art 10. O Banco Central do Brasil poderá intervir nas emprêsas autorizadas a realizar as operações a que se refere o artigo 7º, e decretar sua liquidação extrajudicial na forma e condições previstas na legislação especial aplicável às entidades financeiras. Art 7º Dependerão, igualmente, de prévia autorização do Ministério da Fazenda, na forma desta lei, e nos têrmos e condições gerais que forem fixados em regulamento, quando não sujeitas à de outra autoridade ou órgãos públicos federais: I - as operações conhecidas como Consórcio, Fundo Mútuo e outras formas associativas assemelhadas, que objetivem a aquisição de bens de qualquer natureza; Nesse contexto, com o intuito de manter a regularidade das administradoras de consórcios, depreende-se a atribuição do BACEN como entidade competente a fiscalizar e promover intervenções/liquidações extrajudiciais. Ao contrário do que afirma a apelante, não se trata, por ora, de responsabilidade objetiva da Administração, consoante prevê o art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Na verdade, a suposta conduta ilícita imputada ao BACEN teria se dado pela omissão no dever de fiscalizar. A doutrina e a jurisprudência pátrias afirmam que é subjetiva responsabilidade do Estado por sua conduta omissiva. Assim, além do nexo de causalidade entre a conduta omissiva e o resultado, exige-se a comprovação do elemento subjetivo, representado pela culpa ou dolo do Poder Público. In casu, o problema que surge é justamente essa caracterização do nexo causal bem como da conduta negligente do BACEN decorrente do seu poder fiscalizador. Nesse contexto, tenho que, antes de se cogitar a responsabilidade da ré por falhas no controle e fiscalização do mercado financeiro, os danos acarretados à autora foram originados pela má-gestão de seus administradores. _____________ 198 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2001.70.01.009217-7. Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 13 fev. 2006. 110 Observo que não haveria óbice para se reconhecer a responsabilidade do BACEN uma vez configurada a possibilidade de decretação da liquidação extrajudicial no momento oportuno, anterior àquele efetivamente ocorrido. Contudo, a parte autora não logrou comprovar a indevida omissão da ré no seu dever legal, visto que o ônus de tal prova lhe era imputável. Dessa forma, deve ser mantida a sentença para julgar improcedente o pedido da parte autora. Diversos julgados vêm sendo apreciados pelos Tribunais pátrios nesse sentido: [...] SUBSTITUIÇÃO DE PRESTAÇÕES - CONSÓRCIO UNIVERSAL – LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL - BACEN - INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE – FALTA DE PROVAS DO NEXO CAUSAL. I - As atribuições exercidas pelo Banco Central do Brasil, consistentes no controle e na fiscalização do mercado financeiro e das atividades das instituições que ali atuam; não acarretam, responsabilidade pelos danos causados pela má gestão do grupo empresarial que se vê decretada, e por isso sua liquidação extrajudicial. II - Não há responsabilidade da Autarquia, uma vez que inexiste a prova do nexo de causalidade entre o insucesso da instituição financeira e as alegadas insuficiências ou omissões de fiscalização. (TRF 2ª Região, AC 9602338725, Terceira Turma, Rel. Juiz Wanderley de Andrade Monteiro. DJU de 19/03/2004, p. 165) [...] Observe-se que a única possibilidade de ser considerada a responsabilização civil do BACEN seria na hipótese que que restasse cabalmente comprovado o liame causal imediato entre eventual conduta culposa e o dano, o que não ocorreu. Até mesmo porque, produzir tal prova, pelo que se percebe da análise dos casos de responsabilização subjetiva do Estado por sua omissão, é tarefa demasiadamente difícil. O mesmo se verifica no precedente seguinte: RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL COLETIVO. GRAMPOS TELEFÔNICOS. FALHA NO SERVIÇO. LESÃO AO PATRIMÔNIO MORAL DE UMA COMUNIDADE. VIOLAÇÃO AO DIREITO DO CONSUMIDOR. DESCABIMENTO. 1. A partir de 1946, adotou-se, no Brasil, no que concerne às entidades de direito público, a responsabilidade objetiva, com fulcro na teoria do risco administrativo, sem, no entanto, adotar a posição extremada dos adeptos da do risco integral, em que a Fazenda Pública responderia sempre, mesmo presentes as excludentes da obrigação de indenizar (CF de 1946, art. 194 e seu § único; CF de 1967 , art. 105 e seu § único; CF de 1969, art. 107 e seu § único e CF de 1988, art. 37, § 6º). A Suprema Corte, em mais de uma oportunidade, fixou o exato alcance do comentado dispositivo constitucional. Assim o fez no RE nº 68.107-SP, julgado pela 2ª Turma, verbis: [...] II. A responsabilidade objetiva, insculpida no art. 194 e seu parágrafo único, da CF de 1946, cujo texto foi repetido pelas Cartas de 1967 e 1969, arts. 105-7, respectivamente, não importa no reconhecimento do risco integral, mas temperado. [...] (In RTJ 55/50). Em seu voto, o relator, o eminente Ministro THOMPSON FLORES, exPresidente da Excelsa Corte, salientou, verbis: "... embora tenha a Constituição admitido a responsabilidade objetiva, aceitando mesmo a teoria do risco administrativo, fê-lo com temperamentos, para prevenir excessos e a própria injustiça. 111 Não obrigou, é certo, à vitima e aos seus beneficiários, em caso de morte, a prova de culpa ou dolo do funcionário para alcançar indenização. Não privou, todavia, o Estado do propósito de eximir-se da reparação, que o dano defluíra do comportamento doloso ou culposo da vítima. Ao contrário senso, seria admitir a teoria do risco integral, forma radical que obrigaria a Administração a indenizar sempre, e que, pelo absurdo levaria Jean Defroidmont (La Seience du Droit Positif, p. 339) a cognominar de brutal. [...] (In RTJ 55/52-3). Outro não foi o entendimento adotado por um dos mais conceituados administrativistas do país, o eminente e saudoso Ministro THEMÍSTOCLES CAVALCANTI, ao votar no julgamento do RE nº 61.387-SP, verbis: [...] Partindo da teoria da igualdade dos encargos e das finalidades essenciais do Estado, o clássico Tirard chegava à responsabilidade do Estado pela falta verificada no serviço (De la responsabilité du service publique, 1906). Neste particular, a variedade na aplicação dos casos é muito grande. Principalmente a jurisprudência francesa se detém no exame das hipóteses. É assim que são mencionados casos de responsabilidade, ou por não se ter evitado um perigo por meio de obras necessárias, como a construção de um parapeito na estrada; de não se ter impedido a circulação em um trecho perigoso; de não se ter retirado um obstáculo em um rio canalizado etc. ou por omissão material, por falta de sinalização, de abandono de trecho da estrada, abertura de trincheira em uma estrada etc. Essa teoria não é talvez suficiente para prever todas as hipóteses de responsabilidade do Estado, mas a sua aplicação deve ser casuística para não envolver a responsabilidade do Estado em todos os casos em que age dentro de sua finalidade própria. Assim, nem sempre se verifica essa responsabilidade, de acordo com a boa doutrina, quando há escassez de abastecimento de água, interrupção de energia elétrica, o mal calçamento de uma estrada. Depende sempre das circunstâncias. [...] (In RTJ 47/381. No mesmo sentido, RTJ 71/99, bem como julgado do extinto Tribunal Federal de Recursos no julgamento da Ap. Cív. nº 33.552, rel. Ministro CARLOS MÁRIO VELLOSO, in RDA 137/233 ). Na doutrina nacional, a jurisprudência do Pretório Excelso é respaldada, como se verifica, entre outros, dos seguintes autores: HELY LOPES MEIRELLES, in Direito Administrativo Brasileiro. 14. ed., Rev. dos Tribs., 1989. p. 551; CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, in Responsabilidade Civil. 1. ed., Forense, 1989. p. 143. n. 105. Da mesma forma, a idêntica solução é adotada na França, como leciona o clássico LAUBADÈRE, verbis: "La jurisprudence a consacré, au-delá de la responsabilitè pour faute, une responsabilitè de l'administration pour risque; elle admet que, dans certains cas, les collectivités publiques sont tenues de réparer les dommages entrainés par leur activité même non fautive. La responsabilité pour risque est, rappelons-le, celle qui est engagée dès lors qu est établie une relation de cause a effet entre l'activité de l'auteur du dommage et ce dommage lui même" (In ANDRÉ DE LAUBADÈRE, Traité Élémentaire de Droit Administratif. Libr. Générale, Paris, 1953. p. 490, nº 892. Igualmente, JEAN RIVERO, in Droit Administratif. Huitième édition, Dalloz, Paris, 1977. p. 274, nº 284). Assim, como restou demonstrado, a teoria do risco administrativo, adotada pelas Constituições brasileiras, a partir de 1946, não implica no reconhecimento de que a Administração Pública tenha que indenizar sempre, mesmo quando presentes as excludentes dessa responsabilidade. Ora, analisando-se o caso dos autos constata-se, em primeiro lugar, que a parte autora não comprovou sequer o dano que alegadamente lhe teria acarretado, pois configura o primeiro e fundamental pressuposto da responsabilidade civil (v.g. HENRI LALOU, in Traité Pratique de la Responsabilité Civile. 4. ed., Dalloz, Paris, 1949, p. 97 nº 142), ônus que, aliás, lhe cabe, a teor do disposto no art. 333, I, do CPC. 112 In casu, consoante bem assinalado na r. sentença, não se encontram presentes os pressupostos do art. 37, § 6º, da CF/88. Nesse sentido, anotou, com inteiro acerto, o eminente Magistrado, Dr. Fernando Quadros da Silva, a fls. 2.433/7, verbis: "A presente demanda coletiva procura demonstrar que as rés Brasil Telecom S/A e Anatel são responsáveis pela falência geral do sistema de proteção do sigilo das comunicações a cargo da primeira ré, concessionária de serviço público de telefonia. Efetivamente a Constituição Federal assegura a inviolabilidade das comunicações telefônicas (art. 5°, XII), sendo que o art. 3°, da Lei n.º 9.472/97 (Lei Geral das Telecomunicações) prevê a inviolabilidade e o segredo como direito do usuário de serviços de telecomunicações. Os atos normativos da Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel também reproduzem o dever da prestadora de serviço zelar pelo sigilo das comunicações (Resoluções 73/98 e 85/98). A presente ação não busca analisar e fazer amplo diagnóstico do sistema de comunicações a cargo da concessionária de serviço público. A área de concessão é grande e os equipamentos abrangidos nesse tipo de serviço não permitem que numa ação judicial se levante aspectos profundos quanto ao funcionamento do sistema de telefonia que abrange todo o Estado do Paraná. No magistério de Carlos Alberto Bittar Filho pode ser encontrada a precisa definição de dano moral coletivo: 'Consiste o dano moral coletivo na injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, na violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico. Tal como se dá na seara do dano moral individual, aqui também não há que se cogitar de prova da culpa, devendo-se responsabilizar o agente pelo simples fato da violação (damnum in re ipsa)" ,.(Revista Consultor Jurídico - http:conjur.estadao.com.br, 25/02/2004, in Coletividade também pode ser vítima de dano moral: O mesmo doutrinador prossegue: 'Para a perfeita compreensão da matéria, podem ser citados dois exemplos bem claros de dano moral coletivo: a) o dano ambiental, que não consiste apenas e tão-somente na lesão ao equilíbrio ecológico, afetando igualmente outros valores precípuos da coletividade a ele ligados, ou seja, a qualidade de vida e a saúde; b) a violação da honra de determinada comunidade (a negra, a judaica, etc.) através de publicidade abusiva.' A questão central a ser perquirida na presente demanda é se a atuação das rés produziu o dano moral apontado na petição inicial. Apenas se demonstrado esse dano moral, de natureza extrapatrimonial, surgirá o liame obrigacional entre a coletividade e os réus causadores do evento danoso. Adicione-se, ainda, que não é qualquer dano que faz nascer o dever de indenizar. Deve ser o dano injusto, contrário ao ordenamento. Na presente ação, há que ser perquirido se ocorreu tal dano coletivo e em qual extensão. Do exame do contexto probatório, vê-se que efetivamente houve episódio denominado /I grampo no Palácio Iguaçu" que foi noticiado pela imprensa e foi apurado, tanto pelo inquérito policial como pelo procedimento instaurado no âmbito do Ministério Público Federal. A descoberta de grampos telefônicos ilegais não conduz por si à responsabilização das demandadas. Tais condutas dever ser imputadas aos seus responsáveis diretos. O exame das provas documentais e orais, bem como o subsídios colhidos diretamente na inspeção judicial realizada nas dependências da ré, Brasil Telecom S/A, revelam que a empresa adotou procedimentos de segurança compatíveis com o nível de exigência de serviços destas natureza. 113 A Anatel, por sua vez, tem realizado constantes verificações nos procedimentos da empresa e os equipamentos técnicos adotados atendem às especificações recomendadas pelo órgão regulador. Não restou demonstrado que os atos criminosos envolvendo escuta telefônica clandestina são de responsabilidade das rés. No que diz respeito à segurança é impossível evitar condutas que busquem violar o sigilo das comunicações. O ordenamento jurídico exige, contudo, que a empresa prestadora do serviço público adote procedimentos que busquem impedir violações. É evidente que os atos de violação do sigilo, chamados nas peças investigatória de "grampo do Palácio Iguaçu", violam o direito ao sigilo das comunicações assegurado constitucionalmente. Daí não se extrai, contudo, que a sociedade sofreu um dano moral coletivo decorrente de um estado geral de insegurança na proteção do sigilo das comunicações. O uso criminoso da escuta telefônica ou colocação de dispositivos de escuta na rede interna não pode ser atribuído genericamente a empresa prestadora ou imputado à falha na atividade fiscalizadora da agência federal encarregada de regular o setor. Oportuno destacar o depoimento do técnico Jamil Silvestri, fiscal de rede, que ouvido em juízo afirmou: "Que no caso do grampo do Palácio foi-lhe pedido para verificar se o cabo tinha continuidade e para onde ele ia, se ia para a casa de algum usuário, por exemplo, sem que tal usuário soubesse disso. Que a partir do exame da caixa geral dentro do prédio identificou que a linha ia para um cabo que atendia o outro apartamento. Que o cabo atendia um único apartamento" (fl. 2314). A Anatel tem realizado atividades fiscalizatórias constantes. Exemplificativamente, pode ser apontado o relatório de fiscalização juntado às fls. 1702/1721 que conclui, em 11/06/2003, pela insuficiência de segurança no que se refere ao sigilo das comunicações. O relatório aponta principalmente necessidade de mudanças nos armários de rua. A conclusão, contudo, aponta que o descumprimento de algumas normas foi involuntário, sendo a infração classificada como leve (fl.1966), sendo a prestadora advertida. Do relatório do órgão regulador extrai: "parece-nos assim que a prestadora, apesar de seu aparente insucesso, tem procurador implementar medidas para assegurar a adequada prestação do serviço", Em suma, as provas carreadas aos autos não demonstram que foi atingido o sentimento geral de segurança em relação ao sistema de telefonia fixa. Sendo certo que a confiabilidade no sigilo é impossível de ser avaliada objetivamente, não menos certo é que a simples cobertura negativa pelos meios de comunicação não é sinônimo de dano moral coletivo. No caso em exame, houve divulgação ampla de fatos criminosos que estavam sendo apurados pela imprensa. Diariamente os jornais e telejornais divulgam fatos desabonadores praticados por agentes políticos e nem por isso pode-se dizer que o Poder Público tem o dever de indenizar em face de um sentimento geral de desconfiança nas instituições. E inegável que as escutas telefônicas clandestinas têm se multiplicado. Contudo, tal fato não pode ser imputado às prestadoras de serviço. Talvez seja caso de aperfeiçoamento na legislação relativa à quebra do sigilo nos casos de investigação que motivou o Poder Executivo a preparar projeto-delei que busca alterar dispositivos de tal legislação. O reconhecimento de que não houve dano moral coletivo não implica dizer que a demandada está no nível de excelência técnica no que se refere à segurança de rede de telefonia. Os documentos trazidos pela Anatel e pela própria prestadora revelam que há muito por ser feito e que investimentos de vulto são imprescindíveis. Não restou demonstrado, contudo, que o sigilo nas comunicações tenha sido lesado de maneira generalizada ou ainda que a confiança na 114 segurança do serviço público de telecomunicações tenha sido abalado pelas condutas das rés.: Incide, aqui, a lição do Mestre da hermenêutica jurídica francesa, FABREGUETTES, quando pontifica: "Tout fait quelconque (4), allégué en justice, contraire à l'état normal ou habituel des choses, ou à une situation acquise, DOIT ÊTRE PROUVÉ" (M.P. FABREGUETTES, La Logique Judiciaire et L'Art de Juger, 2ª ed., Librairie Générale, Paris, 1926, p. 55). A propósito, convém recordar a velha, mas sempre nova lição de Henri de Page, in De L'interprétation des Lois, éditions Swinnen, Bruxelles, 1978, t. II, pp. 22/3, verbis: "Dans le domaine de l'application de la loi, le juge, peutêtre, en tempérera ou en élargira l'exercice. Il usera d'une certaine souplesse suivant les circonstances. Mais son oeuvre, quelque large ou discrète qu'elle soit, devra demeurer compatible avec les pouvoirs limités de juge qui lui donne la division du travail. Il n'est que juge et non pas législateur. Prisonnier de la décision d'espèce, il lui est impossible de s'en évader. Par définition, il est incapable de créer des règles générales, de "légiférer". 199 2. Improvimento da apelação . Observe-se, ainda, o teor da seguinte ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL. TOTO BOLA. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. LEGITIMIDADE PASSIVA. DEVER DE FISCALIZAÇÃO DE SERVIÇO. MANIPULAÇÃO DE MÁQUINA DE SORTEIO. SUSPEITA DE FRAUDE. OCORRÊNCIA DE DANO MATERIAL. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. 1 O Estado do Rio Grande do Sul é parte legítima para figurar no pólo passivo, pois é o responsável pela fiscalização das atividades por ele autorizadas, em virtude do poder de polícia afeto à Administração Pública. 2 A responsabilidade civil do Estado que advém da omissão do poder público é conceituada como subjetiva, havendo a necessidade da demonstração dos pressupostos do dolo ou da culpa para incidir o dever de indenizar. 3 Devido o dano material, comprovado pelas cartelas adquiridas para a participação nos sorteios. 4 Dano moral não configurado. A suspeita de fraude em certame de múltiplas chances não gera, per si, abalo moral à esfera íntima do participante. No caso, constata-se mero dissabor, aborrecimento que não pode ser classificado como dor percuciente a ponto de gerar direito à 200 reparação pecuniária. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. Segue também partes do voto proferido nessa decisão: [...] Para averiguação da legitimidade processual do Estado para composição da lide, mister analisar a causa de pedir deduzida pela autora. Dessarte, ela se baseia na responsabilidade da Administração Pública por falha na fiscalização da prestação do serviço. Afirma a demandante que a loteria foi aprovada pela LOTERGS, órgão oficial do Estado que tinha a incumbência de fiscalizar as atividades praticadas pela demandada, de ser realizada em condições imunes a fraudes. Analisando as questões postas, concluo que deve ser considerado que ao Poder Público cabe o exercício do poder de polícia, decorrendo deste a obrigação de fiscalizar as atividades autorizadas, evitando o acontecimento de falhas do serviço ou de sua má atuação. _____________ 199 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2003.70.00.034361-7. Orgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 13 mar. 2007. 200 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70018230847. Órgão Julgador: Sexta Câmara Cível. Julgado em 29 mar. 2007. 115 Assim sendo, constata-se que inegavelmente houve a referida omissão estatal, não havendo que se falar em ilegitimidade passiva do Estado para integrar a presente lide. Saliento que eventual discussão acerca da espécie da responsabilidade civil do Estado (objetiva ou subjetiva), foge a seara dessa condição de ação (legitimatio ad processum). Nessa linha de entendimento, colaciono jurisprudências deste Tribunal: RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO CONTRA A DECISÃO QUE ACOLHEU A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO. FRAUDE À LOTERIA. TOTO BOLA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO DE FISCALIZAÇÃO. Se a pretensão do demandante está embasada na faute du service, incidindo a responsabilidade subjetiva, a manutenção do Estado no pólo passivo da demanda é medida que se impõe, pelo menos até que se perquira a sua concorrência para o evento. Agravo de Instrumento a que se dá provimento, em decisão monocrática. (Agravo de Instrumento Nº 70014487771, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 06/03/2006). [...] 1) Conforme exposto na peça exordial, a autora imputa responsabilidade ao Estado do Rio Grande do Sul pelo fato desse ter-se omitido no controle do serviço público outorgado à empresa Kater – culpa esta denominada in vigilando e in eligendo. A disposição constitucional relativa a este tema roga que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos são responsáveis objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Conforme se estrai da presente redação, há evidente responsabilidade objetiva do Poder Público para atos comissivos praticados por seus agentes. Todavia, o mesmo regramento não pode ser aplicado no que concerne à omissão praticada pelos agentes públicos, pois, conforme se extrai do entendimento atualizado do Supremo Tribunal Federal, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, exigindo a presença dos elementos dolo ou culpa. [...] Diante disto, tenho que, no caso dos autos, não restou comprovada a falta do serviço do Estado do Rio Grande do Sul. O fato de tal ente político, por meio da LOTERGS (órgão da Administração Pública Estadual), ter aprovado o jogo TOTO BOLA, credenciado-o e autorizado-o, demonstra o que serviço foi efetivamente prestado. Se houve efetivamente a fraude, tal fato não significa que houve defeito na atuação do Estado. Assim sendo, tenho que não restando comprovada a ausência ou máprestação do serviço por parte do Estado do Rio Grande do Sul, deve ser julgado improcedente o pedido indenizatório a ele referente. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho monográfico teve por escopo propor a discussão acerca das teorias a serem adotadas no caso de responsabilização civil extracontratual do Estado por omissão, assim como aclarar a delimitação de cada um dos elementos que a envolvem, para que sejam mais facilmente identificados. Note-se que o instituto da responsabilidade civil é essencial à construção do Estado Democrático de Direito, na medida em que tem por finalidade precípua o restabelecimento do equilíbrio violado pelo dano. Por essa razão, prevê o nosso ordenamento jurídico a responsabilização civil não só por ato ilícito, mas também relativamente ao ressarcimento de prejuízos em que não se cogita da ilicitude da conduta ou até mesmo da ocorrência de ilícito, o que se garante pela Teoria do Risco, tendo em vista a idéia de reparação ser mais ampla do que meramente o ato ilícito. A responsabilidade do Estado, como se verificou, obedece a um regime próprio, compatível com sua situação jurídica. Potencialmente o Estado detém o condão de ocasionar prejuízos macroscópicos aos cidadãos, até mesmo porque estes não possuem poderes para diminuir a atuação daquele no âmbito dos seus direitos individuais. Assim sendo a responsabilização estatal é considerado na maioria das vezes pela Teoria do Risco Administrativo, que conduz a pessoa jurídica de direito público à reparação do dano sofrido pelo particular, por conta da sua atuação ou não, independentemente da ocorrência de culpa, dolo ou qualquer ilicitude. Não há dúvida quanto ao cabimento da aplicação desta teoria objetiva na responsabilização decorrente de condutas comissivas dos entes públicos. 117 Entretanto, diversamente ocorre com relação às condutas omissivas, pois, surgiu na doutrina e jurisprudência brasileiras polêmica discussão a respeito do seu cabimento nesses casos. Já é pacífico o entendimento de que o ordenamento jurídico pátrio admite que o Estado possa causar prejuízos aos seus administrados através da sua atuação, seja ela lícita ou ilícita comissiva ou omissiva, resultando-lhe a obrigação de recompor tais danos. Porém, nos casos de conduta omissiva, há entendimentos diversos, inclusive no sentido de que esta não constituiria fato gerador da responsabilidade civil do Estado. Atualmente, essa divergência vem alcançando o Poder Judiciário, em razão das discussões sobre qual a natureza jurídica da responsabilidade do Estado por condutas omissivas que geram danos. Desse modo, é imperioso que a Responsabilização Civil do Estado por suas Omissões seja efetivamente delimitada, unificando-se, assim, os entendimentos a respeito do referido tema, com o fito de trazer maior segurança jurídica às relações do administrado com o Estado, bem como relativamente às decisões judiciais nesse sentido. No mais, cumpre salientar que, ao final do presente trabalho, é imperioso reconhecer a surpresa que configurou a pesquisa sobre o tema escolhido. Isso porque, ao se iniciarem os trabalhos, havia a idéia de que existiria uma gama imensa de materiais à disposição, que fizesse alusão à matéria, o que não se verificou. Muito antes pelo contrário, tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátrias, a discussão se dá de forma restrita, não acolhendo boas possibilidades à pesquisa sobre a questão abordada. Em que pese a polêmica escolhida demonstrar-se rica na capacidade de aguçar os ânimos dos juristas para o debate, até mesmo as decisões dos Tribunais se mostram muito limitadas, não explicitando de forma satisfatória todas as vertentes do tema central da presente monografia. Além disso, foram elaboradas poucas decisões abordando de forma clara as omissões genérica e específica. Na maioria dos julgados, as decisões foram embasadas nos argumentos literais de outras decisões. Ademais, não há qualquer obra doutrinária específica a respeito do tema em comento de que se tenha notícia no mercado. 118 Assim, recorreu-se à doutrina francesa, cujo entendimento daquelas lições representou tarefa demasiadamente árdua, em razão do desconhecimento do idioma. Confrontando a monografia com o projeto dela elaborado inicialmente, verificase que algumas das hipóteses previstas restaram confirmadas. Assim, tratando-se de omissão específica do Estado, a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido a Teoria do Risco Administrativo, portanto, no âmbito da responsabilidade civil objetiva, como a aplicável ao caso concreto. Todavia, a análise fática, envolvendo o Estado e a vítima é o grande vetor para a aplicação da responsabilidade civil objetiva ou subjetiva, quando da conduta omissiva do Estado. REFERÊNCIAS ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva. 9.ed. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1998. ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito Administrativo. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004. AMARAL NETO, Francisco dos Santos. Direito Civil Brasileiro: Introdução. Rio de Janeiro: Forense, 1999. AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2003. AMARAL, Francisco. Direito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa. Manual de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2005. 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Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 06 ago.2002. 126 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2002.04.01.047232-8. Órgão Julgador: Quarta Turma. Julgado em 20 fev.2003. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2003.04.01.029648-8. Órgão Julgador: quarta Turma. Julgado em 11 out. 2006. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2005.71.00.016129-0. Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 03 out. 2006. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2002.04.01.035946-9. Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 05 ago. 2003. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2001.70.01.009217-7. Órgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 13 fev. 2006. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 2003.70.00.034361-7. Orgão Julgador: Terceira Turma. Julgado em 13 mar. 2007. 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