NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ESTUDO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO• Ruy Jornada Krebs, Ph.D. Universidade do Estado de Santa Catarina Florianópolis, SC, Brasil _____________________________________________________________ A escola que enfatiza demais as inteligências lógico-matemática e verbal-linguística (aptidões básicas) nega ao aluno a oportunidade de desenvolver-se como ser humano integral, com diversos talentos Samples, 1987, p.128. __________________ As teorias do desenvolvimento humano têm abraçado a difícil tarefa de explicar o processo de interação recíproca entre o ser humano em desenvolvimento e seus múltiplos contextos. Se no início do século passado a grande discussão teórica do desenvolvimento humano estava polarizada entre os fatores inatos, herdados geneticamente, e os fatores ambientais, de natureza física e sócio-cultural, neste terceiro milênio, deparamo-nos com novas teorias desenvolvimentistas que centram seu foco de atenção bem além da dicotomia inato/adquirido. Nessas novas abordagens, identificadas por Krebs (1995 a) como novas tendências no estudo do desenvolvimento humano, despontam as teorias de Gardner, de Samples e de Sternberg, sobre modalidades de inteligência; a teoria dialética de Riegel; a teoria da personalidade em desenvolvimento de L’Abate; a teoria sócio-cultural de Valsiner; e a teoria da ecologia do desenvolvimento humano de Bronfenbrenner. De uma maneira geral, todas as teorias de desenvolvimento humano estruturam suas hipóteses e princípios a partir de estruturas teóricas, caracterizadas como modelos conceituais. Esses modelos conceituais possibilitam o estudo das diferentes variáveis que interagem no processo do desenvolvimento humano. Neste texto vamos discutir, brevemente, esses novos modelos conceituais teóricos, destacando a importância de cada um deles para a compreensão do desenvolvimento humano em contexto. 1-As novas teorias A área do desenvolvimento humano tem-se revelado uma fonte inesgotável de questionamentos. Como elementos instigadores desses questionamentos podemos destacar dois, os quais têm sido fundamentais na construção de novos paradigmas do desenvolvimento humano: (a) as múltiplas modalidades de inteligência e (b) a interação entre contexto e história-de-vida. O primeiro tópico será discutido com base nas proposições de Gardner (1983,1985), de Samples (1987) e de Sternberg (1992), enquanto o • Palestra proferida no V Encontro Internacional para Estudos da Criança segundo enfatizará as idéias de Riegel (1979), de Valsiner (1987) e de Bronfenbrenner (1979,1992, 1995). 1.1. As múltiplas inteligências Na década de oitenta um novo conceito de inteligência começou a emergir na literatura da psicologia do desenvolvimento. Esse novo conceito apresentava a inteligência como um construto multidimensional, e a cada dimensão era atribuída uma modalidade de inteligência. Dois teoristas merecem crédito pela difusão desse novo conceito de inteligências múltiplas, Howard Gardner e Bob Samples, ambos discípulos de Jerome Bruner. Samples (1987) comenta que no começo dos anos sessenta Gardner era aluno de Bruner no Centro de Estudos Cognitivos da Universidade de Harvard, enquanto ele trabalhava com Bruner em dois projetos da Fundação Nacional de Ciência. Se compararmos as propostas de Gardner e Samples, veremos que elas são bastante semelhantes. Enquanto Samples descreve uma modalidade como abstrato-simbólica, Gardner subdivide essa modalidade em duas, a verbal-linguística e a lógico-matemática. O que Samples chama de visual-espacial Gardner refere-se como espacial, simplesmente. A inteligência motora é denominada como cinestésica por Samples, e por cinestésicocorporal por Gardner. Samples refere-se a uma inteligência auditiva, enquanto Gardner enfatiza uma inteligência musical. E, finalmente, a inteligência sinérgica, que Samples subdivide em pessoal e natural, e sua correspondente na interpretação de Gardner, a inteligência pessoal, subdividida em interpessoal e intrapessoal. Além dos dois teoristas acima citados, Robert Sternberg também se envolveu com o estudo da multiplicidade da inteligência: Embora ele não denomine sua teoria como de inteligências múltiplas, é o próprio Samples que o inclui nesse grupo: Robert Sternberg, da Universidade de Yale, é outro defensor da teoria das inteligências múltiplas. Embora sua visão se afaste do elo inteligência-modalidade, ele acata a modalidade sinérgica, descrevendo três qualidades da inteligência, que se entremeiam nas modalidades, de forma a corporificar uma síntese (SAMPLES, 1987, p.126) A proposta de Sternberg apoia-se num modelo triárquico , com três tipos de inteligência. O primeiro é o tipo contextual, que diz respeito à capacidade que uma pessoa tem para adaptar-se ao contexto em que está inserida. Samples (1987) comenta que “indivíduos que a possuem são extremamente adaptáveis, moldam seletivamente o ambiente relacionado com suas vidas , aproveitando ao máximo o que têm (p.126)”. O segundo tipo de inteligência é denominado como experiencial. Krebs e colaboradores (1996) destacam que esse tipo de inteligência flui entre dois pólos, o da novidade da tarefa e o da automatização, e é na fluência do primeiro polo para o segundo que acontece a aprendizagem. “Indivíduos com esse tipo de inteligência são capazes de ocupar-se com algo novo e entendê-lo, transformando o automática e rapidamente em algo útil” (SAMPLES, 1987, P. 126). O terceiro tipo é o da inteligência componencial, que explica os mecanismos do processamento de informações. Esse tipo está estruturado em três elementos: os metacomponentes, que são os processos de decisão e seleção, os componentes de desempenho, que são os processos efetores, e os componentes de aquisição de conhecimento, que são os processos utilizados para adquirir novas informações (KREBS & cols. 1996). Embora a proposta de Sternberg (1992) apresente explicitamente esses três tipos de inteligência, ela é, também, semelhante às abordagens de Samples e Gardner. Essa afirmação está apoiada nas observações do próprio Samples (1997): Sob vários aspectos, as visões de inteligência de Gardner e Sternberg são compatíveis. Usando a definição de inteligência de Gardner como a capacidade de fazer algo útil na sociedade em que se vive, fica claro que ela é multifacetada, multissensorial e multidimensional. Já Sternberg nos dá uma idéia mais analítica das aplicações da entrada e saída de dados e do processamento que ocorre entre uma e outra. Ambas são úteis e esclarecedoras e nos afirmam que muita coisa está acontecendo durante o uso que fazemos de nosso sistema cérebro-mente. (p.127) 1.2. O contexto sócio-cultural Assim com a abordagem de modalidades múltiplas de inteligência, os anos oitenta revelaram outro ponto de convergência entre teoristas do desenvolvimento humano, a importância do contexto sócio-cultural para a compreensão das relações homem-mundo. Thomas (1992) ao organizar a terceira edição de seu clássico Comparing Theories of Child Development (Comparando Teorias de Desenvolvimento da Criança) incluiu novas teorias, dentre as quais a Teoria Dialética de Klaus Riegel, a Teoria Histórico-Cultural de Jaan Valsiner, e a Teoria dos Sistemas Ecológicos de Urie Bronfenbrenner. Nessas três teorias, seus autores criticam a ênfase que os psicólogos tradicionais atribuem a construtos fixados ao desenvolvimento – traços, capacidades, habilidades, destrezas e impulsos motivacionais. Eles defendem que a ênfase deveria ser sobre as interações concretas da criança em suas atividades cotidianas. A teoria de Riegel Ao delinear a sua teoria, Riegel (1976) apoiou-se nos princípios da dialética do filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel, que mostrava que a uma proposição – tese haveria sempre uma proposição contraditória – antítese , e, essas duas proposições, evoluiriam a uma terceira e nova proposição mediadora – síntese. Riegel propõe que os eventos na vida da criança que efetivamente contribuem para o seu desenvolvimento, são melhor explicados ao longo de quatro dimensões, duas de natureza interna, nomeadas como interno-biológica e individual-psicológica, e duas de natureza externa, chamadas de cultural-sociológica e externo-física. Essas quatro dimensões compõem o modelo conceitual da teoria, conforme a figura abaixo. Figura 1: Modelo conceitual da Teoria Dialética Internobiológica Individualpsicológica Culturalsociológica Externofísica Internobiológica Individualpsicológica Culturalsociológica Externofísica Ao enfatizar o sentido dialético de sua teoria, Riegel diz que os conceitos como conflito e contradição deveriam receber a mesma atenção que os conceitos de atenção e estabilização, preconizados pela teoria de Piaget. Referindo-se à linguagem, Riegel comenta que haveria muito mais progresso nesse campo de estudo se os pesquisadores colocassem o foco de suas investigações no aspecto social da linguagem, especialmente na comunicação e na construção de significados que ocorrem nos diálogos (THOMAS, 1992). A teoria de Valsiner Na elaboração de sua teoria Valsiner (1987) destacou dois aspectos do desenvolvimento da criança. O primeiro refere-se à dinâmica da ação e do pensamento da criança em ambientes nos quais ela é confrontada com a necessidade de resolver alguma tarefa. Sobre isso o teorista comenta que essas tarefas são escolhidas pela criança ou são propostas por outros, e que normalmente essas tarefas desempenhadas pela criança, ocorrem de forma socialmente regulamentada. Sendo assim, a criança pode, por um lado, tentar ela própria encontrar soluções para os problemas relacionados com a tarefa, ou, por outro lado, pode ter seus esforços orientados e guiados por outras pessoas do contexto. O segundo aspecto de desenvolvimento considerado por Valsiner refere-se à ontogênese, e busca explicar o processo do desenvolvimento individual da criança em seus ambientes em constantes mudanças. Ao comentar os pressupostos básicos de sua teoria, o autor explicita a sua intenção de integrar os pressupostos de Lewin, Vygotsky e Piaget a noções da biologia evolucionista e da termodinâmica contemporânea do non-equilibrium. A teoria é um esforço de integrar as perspectivas teóricas de Lewin, Vygotsky e Piaget na psicologia, com algumas noções básicas da biologia evolucionista (as idéias de Waddington sobre canalização) e termodinâmica contemporânea do non equilibrium. O interacionismo dinâmico da presente teoria é explicitamente estruturalista – ele enfatiza o fato óbvio de que ambos o desenvolvimento da criança e seu ambiente são estruturalmente organizados. Essa natureza estruturada, criança e seu ambiente, não é estática nem imutável, mas é dinamicamente transformada, tanto microgeneticamente (como a criança e seus cuidadores agem dentro do ambiente) quanto ontogeneticamente (como a criança desenvolvese em transação com o ambiente) (1987, p.76). Ainda em relação aos pressupostos de sua teoria, Valsiner (1987) usa dois conceitos, que não podem ser tratados de forma independente, pois a compreensão de um depende da compreensão do outro: constraints e zona. Relativo ao primeiro conceito, que intencionalmente não o traduzimos, o autor faz uma fundamentada revisão da semântica do termo, e alerta para as suas diferentes interpretações. Na sua teoria, Valsiner prefere que o termo seja usado tal como ele foi utilizado por Lewin, dando a idéia de limite ou barreira. Dessa forma, os constraints delimitam diferentes áreas de um campo (zona) e assim canalizam o desenvolvimento de um organismo. “Nesse sentido os dois conceitos são relacionados um ao outro: zonas são especificadas pelos constraints, e os constraints definem as zonas” (p.90) Antes de explicar as propriedades de cada tipo de zona, Valsiner (1987) enfatiza que o quadro teórico que fundamenta a sua teoria é individual-socioecológico em sua natureza, pois o desenvolvimento da criança é conceitualizado no contexto de suas relações com um ambiente cultural e fisicamente estruturado, onde suas ações sobre esse ambiente são guiadas pela assistência de outras pessoas. São três os tipos de zona definidos nessa teoria: zona de movimento livre (ZML) , zona das ações promovidas (ZAP) e zona de desenvolvimento proximal (ZDP). Para caracterizar a zona de movimento livre, Valsiner (1987) faz menção à teoria de campo de Lewin, e comenta que essa zona estrutura (a) o acesso da criança às diferentes áreas do ambiente, (b) a disponibilidade dos diferentes objetos dentro de uma área acessível e (c) as maneiras de agir com os objetos disponíveis dentro da área acessível. Como marca de seu desenvolvimento, a criança aprende a organizar a zona de movimento livre conforme seus próprios pensamentos e sentimentos – essa zona torna-se internalizada. A ZML é uma estrutura funcional, ela é constantemente criada e recriada à medida que a criança e seu cuidador mudam de uma estrutura ambiental para outra e da busca de um conjunto de objetivos na busca de alcançar outros fins. Assim a estrutura da ZML é dinâmica; dada à mudança de objetivos e condições, as delimitações da ZML estão constantemente sendo reorganizadas. Essa reorganização pode ser iniciada pela criança ou pelo cuidador, ou por ambos ao mesmo tempo. A ZML é também episódica. Qualquer particular ZML é construída de acordo com as condições do ambiente em que está localizada, da criança, do(s) adulto (s), e serve a seus objetivos sob essas condições. Uma vez que a zona não tenha mais uma função, ela pode ser abandonada, substituída por outra, ou gradualmente transformada em outra. (p.232) Valsiner (1987) enumera quatro propriedades para a zona de desenvolvimento livre. A primeira estabelece que a zona é sempre baseada nos relacionamentos da criança (ou do adulto) com as estruturas de uma dada organização ambiental. A segunda diz que a zona é baseada no significado dos diferentes ambientes para o “outro social” (pais, irmãos, professores, etc.), o qual é o organizador principal (mas não o único a determinar) da zona de desenvolvimento livre. A terceira mostra que a zona é geralmente organizada com base no entendimento que os outros têm sobre o que a criança pode fazer em determinado ambiente, relacionado ao que ela está fazendo ou fez no passado. A quarta e última propriedade enfatiza que a zona é reconstruída quando o adulto e a criança entram em um novo ambiente. O adulto analisa o novo ambiente com base em seu conhecimento das ações passadas da criança, bem como no potencial para futuras ações oportunizadas à criança pelo novo ambiente. O autor reforça que a zona de desenvolvimento livre é um meio e não um fim em si própria, assim, é possível que, depois de um determinado tempo de convivência com a criança, uma zona torne-se obsoleta. Uma vez que isso aconteça, a zona é substituída por outras. Esse desequilíbrio dentro da zona de desenvolvimento livre leva ao conceito do outro tipo de zona, a zona da ação promovida. Enquanto a zona de desenvolvimento livre foi caracterizada como um mecanismo psicológico inibitório, o segundo tipo de zona caracteriza a promoção de aquisição de novas habilidades, por isso esse tipo é denominado como zona da ação promovida. Essa zona envolve um conjunto de atividades, objetos ou áreas do ambiente, onde as ações da criança são promovidas. Nesse caso, as outras pessoas significantes para a criança devem envolverse com o objetivo de direcionarem a ação da criança para aqueles objetos e atividades que eles considerarem importantes para o desenvolvimento da criança. Deve-se salientar que nem sempre a criança estará envolvida com as ações intencionalmente promovidas pelo adulto, e nesse caso a zona volta a ser caracterizada como de movimento livre Valsiner (1987) enfatiza que: O segundo conceito de zona usado na teoria é zona da ação promovida (ZAP). Essa, em contraste com a ZML, é um conceito inclusivo. Ela ilustra o esforço dirigido das pessoas em torno da criança para orientar suas ações a uma direção.(p.232) A complexidade das ZML (zonas de movimento livre) e ZAP (zona da ação promovida) é dependente do contexto cultural em que estão inseridas. Isso quer dizer que os significados que determinada cultura atribui aos objetos e atividades, são fundamentais para a definição das ZML e ZAP. O que pode ser observado é uma relação de interdependência entre essas duas zonas, é essa relação pode ser interpretada como um sistema. No entanto, esse sistema formado pela ZDL e ZAP não explica a progressão envolvida no desenvolvimento da criança, o que justifica a inclusão de um terceiro tipo de zona ao sistema, a zona de desenvolvimento proximal. Esse terceiro conceito de zona Valsiner (1987) foi buscá-lo na teoria de Vygotsky, para evidenciar o pressuposto de que a limitação seletiva de variabilidade é um mecanismo de desenvolvimento. A zona de desenvolvimento proximal envolve o conjunto de ações que a criança pode desempenhar quando ajudada por outra pessoa. Com a inserção dessa terceira zona , completa-se o modelo sistêmico que dá suporte à teoria. Para um melhor entendimento desse modelo teórico, Thomas (1992) fez uma síntese de algumas idéias centrais à teoria de Valsiner: Os fatores histórico-culturais que ocupam um papel central no esquema de Valsiner operam em diversos níveis. No nível mais amplo, as pessoas de uma determinada sociedade compartilham de uma organização física influente (edifícios, montanhas, oceanos, etc,), itens materiais da cultura (casas, automóveis, livros, etc.), costumes (hábitos alimentares, educação, cerimônias religiosas, etc.), corpo de conhecimento (científico, social, artístico, etc.) e valores (moral, monetário, estético, etc.). A padronização desses elementos culturais numa sociedade é um produto da evolução cultural dessa sociedade. (p.256) Embora Valsiner não tenha feito um esboço gráfico de seu modelo teórico, percebese as características de um sistema dinâmico.. Cabe ressaltar que, ao invés de estruturar o desenvolvimento como uma seqüência ordenada de estágios e/ou características, ele preferiu destacar as interações da criança e seus contextos. A teoria de Bronfenbrenner Ao publicar seu livro The Ecology of Human Development (A Ecologia do Desenvolvimento Humano), Bronfenbrenner (1979) não se referiu ao mesmo como sendo uma teoria de desenvolvimento, preferindo denominar suas idéias como “o estudo científico da acomodação progressiva e mútua entre um ser humano ativo em crescimento e as propriedades em mudança dos ambientes imediatos nos quais a pessoa em desenvolvimento vive, como esse processo é afetado pelas relações entre aqueles ambientes, e pelos contextos mais amplos nos quais os ambientes estão envolvidos” (p.21). E 1992 ele publicou um capítulo no livro Six Theories of Child Development: Revised formulations and current issues (Seis teorias de Desenvolvimento da Criança: Formulações revisadas e temas atuais), editado por Vasta. Nesse capítulo, Bronfenbrenner enuncia a sua Teoria dos Sistemas Ecológicos. Assim como Valsiner, Bornfenbrenner também se fundamentou nas idéias de Lewin, Piaget e Vygotsky para esboçar alguns de seus conceitos teóricos: Mais uma vez, essa formulação mostra a influência de Lewin, especialmente da sua ênfase numa interconexão e isomorfismo entre a estrutura da pessoa e da situação. A concepção proposta também apoia-se fortemente nas idéias de Piaget (Bronfenbrenner, 1979, p.9) Outro conceito importante é atividade recíproca , originalmente inspirado em Vygotsky (Bronfenbrenner, 1995,p 613) A teoria de Bronfenbrenner pode ser apresentada em duas partes que, pela sua própria natureza, não podem ser tomadas separadamente. A primeira refere-se às propriedades da pessoa numa perspectiva ecológica e a segunda refere-se aos parâmetros do contexto numa abordagem desenvolvimentista. Bronfenbrenner não inclui em sua teoria uma relação específica das características individuais, como por exemplo inteligência, caráter, etc., que foram amplamente discutidas em outras teorias do desenvolvimento. Essa sua omissão não deve ser tomada como uma negligência, pois ele próprio admite concordar com outros autores que tratam desses temas. (KREBS, 1995 a). No entanto, Bronfenbrenner alerta que todas as características individuais não podem ser interpretadas sem uma perspectiva ecológica, ou seja, sem estabelecer-se a relação entre as características do ser humano ativo em desenvolvimento com seus respectivos contextos, entendidos como ambientes dinâmicos em constantes transformações. Para designar as propriedades da pessoa Bronfenbrenner usou, inicialmente, o termo competências . Em relação à avaliação dessas competências, nas quais está incluída a cognição, Krebs e colaboradores (1997) fazem a seguinte observação: Bronfenbrenner destaca uma variada gama de testes para a avaliação da inteligência, da personalidade, dos estágios do desenvolvimento cognitivo e moral, etc. Tais medidas baseiam-se em padrões de respostas experimentais em situações laboratoriais. Para ele essas medidas não têm dado a devida consideração ao status real dessas capacidades nas situações de vida cotidiana da pessoa em desenvolvimento (p.18) Para avaliar as competências individuais dentro do contexto, Bronfenbrenner (1992) mostra que o resultado muitas vezes depende de como tenha sido organizada a compreensão dessa competência. De uma maneira geral ele comenta que uma das abordagens refere-se a uma avaliação da competência como um status adquirido dentro do contexto. Isso significa atribuir certas competências à pessoa em função de seu status social, como por exemplo: um professor, pelo seu status, receberia uma avaliação superior a de seus alunos em competência cognitiva. Esse nível de avaliação é denominado como competência em função do status pessoal. Uma outra maneira de avaliar-se competência em contexto, é pelo julgamento da capacidade da pessoa solucionar satisfatoriamente os problemas relativos ao contexto. Voltando ao exemplo anterior, do professor e seus alunos, nesse tipo de avaliação, o mais competente, independente do status, é quem obtiver mais sucesso na solução de problemas inerentes ao contexto da aula. Esse segundo nível de avaliação, é denominado de competência avaliada dentro do ambiente Nesses dois níveis de avaliação, a competência é vista em termos mais pragmáticos. Para definir um terceiro tipo de avaliação de competência , Bronfenbrenner estabelece relações com a visão de Vygotsky, que ressalta que a espécie humana é a única que cria e elabora seu próprio ambiente em forma de cultura. Assim, esse terceiro nível é denominado de competência como uma maestria culturalmente definida. Nesse último caso, a avaliação de competência não se limita ao status da pessoa, nem a sua competência limitada a um contexto específico, mas, considera a competência como um fator relacionado a toda a cultura que permeia os contextos em que a pessoa esteja inserida, desde os mais imediatos até aos mais abrangentes. (KREBS,1997) Em relação aos parâmetros do contexto, Bronfenbrenner (1979, 1992, 1995) propõe um modelo sistêmico em que os ambientes em que a pessoa em desenvolvimento participa ativamente constituem a dimensão mais imediata, nomeados como microssistemas. A rede sistêmica que é formada pelos microssistemas que uma pessoa vivencia é chamada de mesossistema. Os contextos em que a pessoa em desenvolvimento não participa ativamente, mas aos quais esteja indiretamente relacionada são chamados de exossistema. E, finalmente, a dimensão mais abrangente do modelo, que envolve todos os níveis de contextos caracterizados como micro- meso- e exossistemas, é denominado como macrossistema . Por ser russo de nascimento, Bronfenbrenner faz uma analogia de seu modelo de sistemas aninhados a um conjunto de bonecas russas. Um tema constante em todos os livros e artigos que Bronfenbrenner tem produzido, diz respeito à pesquisa em desenvolvimento humano, Suas críticas não têm poupado os delineamentos reducionistas que tentam investigar o desenvolvimento humano numa perspectiva não-ecológica, essas pesquisas foram classificadas por ele como de desenvolvimento mas sem contexto. Ele também tem criticado aqueles delineamentos que investigam as características do contexto sem considerar a pessoa em desenvolvimento como um ser ativo capaz de interferir em seus próprios contextos. Essas pesquisas ele denominou como de contexto mas sem desenvolvimento. Para oportunizar um avanço nas pesquisas de desenvolvimento humano, Bronfenbrenner (1988) propôs dois modelos: (a) pessoa-processo-contexto e (b) do cronossitema. Mais recentemente, em uma publicação de 1995, ele integra seus dois modelos em um só, e nomeia-o como pessoa-processocontexto-tempo. Esse modelo integra as características biológicas e sociais (pessoa), as mudanças que foram ocorrendo ao longo da vida (processo), as características físicas, políticas, econômicas, culturais, etc. dos ambientes (contexto) e os eventos de ordem biológica e sócio-cultural que tiveram impacto na vida da pessoa (tempo). Esses elementos todos constituem o que Bronfenbrenner propõe como Paradigma Bioecológico. Considerações finais Nesta breve apresentação de algumas teorias emergentes, preocupadas em oferecer novos paradigmas para o estudo do desenvolvimento humano, não foi possível um aprofundamento em seus principais conceitos. Cada uma das teorias discutidas poderia ser um tema único para discussão. A pretensão de apresentá-las juntas, ainda que brevemente, teve a intenção de sublinhar algumas de suas características que permitam evidenciar a importância de buscar-se novos marcos teóricos para o estudo e a compreensão do desenvolvimento da criança. O leitor atento poderá estranhar a ausência de algumas outras teorias, também emergentes, nessa discussão, mas a escolha dessas obedeceu a alguns critérios que, nessa conclusão, tornam-se mais explícitos. Antes de escolhermos as teorias, buscamos apontar as novas tendências no estudo do desenvolvimento infantil, por isso a apresentação das teorias em função de dois temas aglutinadores: a tendência de apontar-se novas perspectivas para o estudo da inteligência humana, e a abordagem ecológica. Ao organizarmos o primeiro momento da discussão, chamou-nos a atenção que duas das teorias que propunham novas modalidades de inteligência, eram propostas por discípulos de Bruner. A inclusão da teoria de Sternberg nesse grupo baseou-se nos comentários feitos por Samples, quando comparou as teorias de Sternberg e de Gardner. A não inclusão da teoria de Goleman, propondo a inteligência emocional deveu-se ao reduzido número de publicações que o autor fez sobre o assunto. Na organização do segundo momento, partimos do critério que, tanto Valsiner quanto Bronfenbrenner partiram da teoria de campo de Lewin para estruturarem seus modelos teóricos, além de ambos terem mencionado a influência que tiveram de Piaget e Vygotsky. A inclusão da teoria de Rigel foi pela possibilidade de interpretarmos o seu modelo dialético como, também, ecológico, uma vez que ele contém tanto os elementos da pessoa quanto os do contextos em um constante entrejogo. Como conclusão deste ensaio, podemos traçar alguns caminhos para o estudo do desenvolvimento humano. Em primeiro lugar, queremos salientar a necessidade urgente de se repensar os programas de educação elaborados a partir de modelos teóricos descontextualizados. É preciso que se perceba o aluno como um ser interativo que, na mesma medida em que sofre as influências do contexto, tem o potencial para modificá-lo. É preciso que as diferenças individuais e as do contexto sejam consideradas como elementos instigativos ao desenvolvimento, e não como barreiras. Devemos abandonar a idéia de construirmos modelos padronizados para a educação, mas apostarmos nos modelos que induzem a um constante reconstruir. Referências Bibliográficas BRONFENBRENNER, U. Ecological system theory. In VASTA, R. Six theories of child development: Revised formulations and current issues. Jessica Kningsley Publishers:London, 1992 ----------------------------- Interacting systems in human development. In: BOLGER, N., CASPI, A, DOWNEY, G. & MOOREHOUSE, M. Person in context: Developmental process. 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