CONCURSO DE CRIMES
Concurso de crimes é a expressão utilizada para
designar as hipóteses em que o agente, mediante
uma, duas ou mais condutas, comete duas ou
mais infrações penais.
 Quando se fala em concurso de crimes, significa
que o agente efetivamente cometeu e, por isso,
responderá pelas diversas infrações, não se
confundindo com as situações relacionadas ao
princípio da consunção em que, embora as
condutas se amoldem em mais de um tipo penal,
o agente só responde por um delito, ficando os
demais absorvidos, quer por se tratar de crimemeio, quer por ser considerado post factum
impunível.


Aplica-se, por exemplo, o princípio da consunção
quando o agente falsifica um cheque para
cometer estelionato, ficando a falsificação do
documento absorvida pelo crime contra o
patrimônio por se tratar de crime-meio (Súmula
n. l7 do Superior Tribunal de Justiça), ou quando
o agente, após furtar um quadro, nele ateia fogo,
ficando o delito de dano absorvido por se tratar de
post factum impunível.
Em suma, para que se possa cogitar de concurso
de crimes, é preciso que não se mostrem
presentes os requisitos para a aplicação do
princípio da consunção.
 Quando há dois delitos em apuração em uma
mesma ação penal, porém, cada um deles sendo
atribuído a réu diverso, não se está diante de
concurso de crimes. Esta expressão somente é
usada para se referir a dois ou mais crimes
cometidos pela mesma ou pelas mesmas pessoas,
mediante uma ou mais condutas.


À primeira vista, se o agente cometeu dois ou
mais delitos, deveria responder por todos,
somando-se as penas. O legislador, contudo,
percebendo que ocorreriam inúmeros exageros no
montante da reprimenda, estabeleceu regras
quanto à sua fixação nos casos de concurso de
crimes, visando tornar mais justa a pena final.
Suponha-se que o motorista de um ônibus,
distraidamente, avance um sinal vermelho e
colida com outro ônibus, provocando a morte de
60 pessoas.

Caso sobrevivesse e as penas fossem somadas,
estaria incurso em uma pena mínima de 160 anos
de detenção (art. 302, parágrafo único, IV, do
Código de Trânsito Brasileiro) - homicídio culposo
na direção de veículo praticado por motorista
profissional. Para tal situação, entretanto, o
legislador previu o concurso formal de crimes, em
que o piloto só recebe uma pena, aumentada de
1/6 até 1/2, de modo que, no exemplo acima, a
pena máxima seria de 9 anos.
ESPÉCIES
 As modalidades de concurso de crimes previstas
no Código Penal são:
 a) concurso material (art. 69);
 b) concurso formal (art. 70);
 c) crime continuado (art. 71) .

CONCURSO MATERIAL
 Dá-se o concurso material, nos termos do art. 69
do Código Penal, quando o agente, mediante duas
ou mais ações ou omissões, comete dois ou mais
crimes, idênticos ou não. Nesses casos, as penas
são somadas.
 O concurso material é também chamado de
concurso real ou cúmulo material. Só se pode
cogitar de soma de penas na sentença se ambos
os delitos estiverem sendo apurados na mesma
ação penal. Para tanto, é necessária a existência
de alguma forma de conexão entre eles, pois só
assim se justifica a apuração no mesmo feito.


É o que acontece, por exemplo, se o agente mata o
marido para estuprar a esposa, quando se mostra
presente a conexão teleológica. Em tal caso, os
crimes são apurados em conjunto e o juiz, ao
sentenciar o acusado, deve somar as penas dos
crimes de homicídio qualificado e de estupro. Por
sua vez, se os delitos não são conexos, cada qual
deve ser apurado em um processo distinto e
receber pena isoladamente (uma sentença para
cada
crime).
A
soma
só
acontecerá
posteriormente, no juízo das execuções criminais.
Ex.: um criminoso que pratica crimes de estupro
e homicídio contra vítimas diversas e em locais
distintos, não havendo qualquer ligação entre os
delitos.

Importante salientar que, também no crime
continuado, o sujeito comete dois ou mais crimes
por meio de duas ou mais ações. Neste,
entretanto, o juiz aplica uma só pena, aumentada
de 1/6 a 2/3, porque os crimes são da mesma
espécie e cometidos nas mesmas circunstâncias
de tempo, local e modo de execução. Assim, a
regra do concurso material só pode ser aplicada
quando faltar algum dos requisitos do crime
continuado.
Espécies
 O concurso material pode ser:
 a) homogêneo: quando os crimes cometidos
forem idênticos (dois roubos, dois estupros etc.).
Para o reconhecimento desta modalidade de
concurso material, em que as infrações penais são
da mesma espécie, é preciso que sejam diversas
as circunstâncias de tempo, local ou modo de
execução, pois, caso contrário, a hipótese seria de
crime continuado. Haverá, portanto, concurso
material, se os dois roubos foram cometidos em
datas distantes um do outro, ou em cidades
diferentes, ou, ainda, se foram cometidos por
modos de execução distintos;


b) heterogêneo: quando os crimes praticados
não forem idênticos (um furto e um estelionato;
um estupro e um aborto etc.). Nestes casos, em
que os delitos não são da mesma espécie, é fácil a
distinção em relação ao crime continuado.
A soma das penas
 A soma das penas propriamente dita só é possível
quando os crimes cometidos forem apenados com
a mesma espécie de sanção. Assim, se o réu for
condenado por furto e estelionato (ambos
apenados com reclusão) a 1 ano por cada um dos
crimes, a pena final será de 2 anos de reclusão. O
mesmo raciocínio se aplica se os delitos forem
todos apenados com detenção. Se, entretanto, as
penas privativas de liberdade previstas forem
distintas, não haverá soma (no sentido
aritmético). Em tais casos, estabelece a parte
final do art. 69 que o juiz fixará as duas penas,
sem somá-las, e o réu cumprirá primeiro a pena
de reclusão e depois a de detenção .

Concurso material e penas restritivas de
direitos
 Estabelece o art. 69, § 1°, do Código Penal (já
revogado tacitamente), que, quando ao agente
tiver sido aplicada pena privativa de liberdade,
não suspensa, por um dos crimes, para os demais
será incabível a substituição por pena restritiva
de direitos. A finalidade deste dispositivo era
afirmar que, no caso de concurso material, se o
condenado tivesse de cumprir pena privativa de
liberdade por um dos delitos, em relação ao outro
não caberia pena restritiva de direitos.


Acontece que a Lei n. 9.714/98 alterou o capítulo
das penas, criando algumas novas modalidades
de penas restritivas de direitos, que podem ser
cumpridas concomitantemente com a pena de
prisão. Por isso, o art. 44, § 5°, do Código Penal
estabelece que, quando o condenado já estiver
cumprindo pena restritiva e sobrevier condenação
a pena privativa de liberdade por outro crime, o
juiz da execução deverá decidir a respeito da
revogação da pena restritiva, podendo deixar de
decretá-la, se for possível ao condenado cumprir a
pena substitutiva anterior.

Assim, atualmente é possível, ao contrário do que
diz o art. 69, § 1° (que sofreu revogação tácita),
que o juiz, em casos de concurso material, aplique
para um dos delitos pena privativa de liberdade a ser cumprida efetivamente em prisão - e, em
relação ao outro, realize a substituição por pena
restritiva de direitos compatível com o
cumprimento da pena privativa de liberdade. Ex.:
o juiz pode condenar o réu a 12 anos de reclusão,
em regime inicial fechado, por um crime de
homicídio, e, no que diz respeito ao crime de
estelionato apurado nos mesmos autos, aplicar a
pena restritiva consistente na perda de bens.

Após o advento da Lei n. 9.714/98, as penas
restritivas de direitos nos crimes dolosos
passaram a ser admitidas em condenações de até
4 anos, desde que não haja emprego de violência
contra pessoa ou grave ameaça. Além disso, de
acordo com a atual redação do art. 44, § 2°, do
Código Penal, dada por aquela lei, na condenação
superior a 1 ano (e inferior a 4), o juiz pode
substituir a pena por uma restritiva e outra de
multa, ou por duas restritivas de direitos.
Suponha-se, então, que o réu seja condenado a 2
anos por um furto qualificado e mais 1 ano e 6
meses por uma apropriação indébita.

A substituição por penas restritivas é cabível
porque as penas soma- das não superam 4 anos
(se superassem, o juiz deveria fixar pena
privativa de liberdade em regime inicial
semiaberto). Discute-se, na prática, se o juiz
ornará as penas e ao final as substituirá por duas
penas restritivas (ou por uma restritiva e outra
de multa), ou se fará duas substituições (a
primeira em relação ao furto e a segunda em
relação à apropriação indébita), podendo aplicar,
nesta hipótese, quatro penas restritivas ou duas
restritivas e mais duas multas.

Essa questão não seria relevante se todas as
penas restritivas substituíssem as privativas de
liberdade pelo mesmo tempo, pois seria
irrelevante cumprir 3 anos e 6 meses de
prestação de serviços à comunidade pela soma
das penas, ou cumprir 2 anos pelo furto
qualificado e depois mais 1 ano e 6 meses pela
apropriação indébita (lembre-se de que o prazo
prescricional é sempre individual em relação a
cada crime, mas não corre durante o
cumprimento da pena).

Contudo, se adotada a última corrente, o juiz
poderia fixar, por exemplo, penas de prestação de
serviços à comunidade (uma pelo furto e outra
pela apropriação) e mais duas prestações
pecuniárias (uma para cada crime), hipótese em
que o réu teria uma sanção a mais a cumprir
(uma prestação pecuniária a mais). Parece-nos
que esta é a orientação correta, pois é o que
ocorreria se o sujeito sofresse duas condenações
em processos distintos, não havendo razão para
ser beneficiado pelo mero fato de os crimes,
cometidos em concurso material, serem apurados
nos mesmos autos.
A soma das penas prevista em dispositivos
da Parte Especial do Código Penal
 Em diversos crimes previstos no Código
Penal, o legislador mencionou expressamente que
a violência utilizada pelo agente como meio de
execução não fica por ele absorvida, constituindo,
assim, exceção ao princípio da consunção.
Ademais, em tais casos, o legislador adotou
redação que leva à conclusão de que as penas
serão somadas, ainda que tenha havido uma
única ação criminosa.


Vejamos os seguintes exemplos: a) no crime de
injúria real (ofensa à honra por meio de
agressão), a pena é de detenção, de 3 meses a 1
ano, e multa, além da pena correspondente à
violência (art. 140, § 2°); b) no crime de
constrangimento ilegal, o art. 146, § 2°, prevê
que, além das penas cominadas, aplicam-se as
correspondentes à violência; c) no crime de
resistência, o art. 329, § 2°, estabelece que as
penas deste artigo são aplicadas sem prejuízo das
correspondentes à violência.
Note-se que a redação dos dispositivos dá a clara
noção de que as penas devem ser somadas, pois
dizem que uma pena será aplicada além da outra
ou sem prejuízo da outra. Por isso, se alguém
agride um policial para não ser preso e acaba
lesionando-o, serão somadas as penas dos crimes
de resistência e de lesão corporal, embora a
agressão tenha sido única.
 Regras idênticas são encontradas, dentre outros
crimes, nos de dano qualificado pelo emprego de
violência (art. 163, parágrafo único, II), atentado
contra a liberdade de trabalho (art. 197), coação
no curso do processo (art. 344), exercício
arbitrário das próprias razões (art. 345), evasão
mediante violência contra pessoa (art. 352),
arrebatamento de preso (art. 353), motim de
presos (art. 354) etc .

CONCURSO FORMAL
 Ocorre o concurso formal, nos termos do art. 70,
caput, do Código Penal, quando o agente,
mediante uma única ação ou omissão, pratica
dois ou mais crimes, idênticos ou não. É também
chamado de concurso ideal.
 Se os delitos forem idênticos, o dispositivo
determina que o juiz aplique uma só pena,
aumentada de 1/6 até 1/2 (sistema da
exasperação da pena). É o chamado concurso
formal homogêneo. Ex.: agindo com imprudência,
o agente provoca um acidente no qual morrem
duas pessoas. Nesse caso, o juiz aplica a pena de
um homicídio culposo, no patamar de 1 ano
(supondo-se que tenha optado pela pena mínima)
e, na sequência, aumenta-a de 1/6, chegando ao
montante final de 1 ano e 2 meses de detenção.


Se os delitos, todavia, não forem idênticos, temos
o concurso formal heterogêneo, em que a lei
determina que seja aplicada a pena do crime
mais grave, aumenta- da também de 1/6 até 1/2.
É o que ocorre, por exemplo, quando alguém,
agindo com imprudência, provoca a morte de uma
pessoa e lesões corporais na outra. Note-se que,
aplicando-se a pena do crime mais grave
(homicídio
culposo),
aumentada
de
1/6,
chegaremos à mesma pena do caso anterior (1
ano e 2 meses), muito embora, na situação
anterior, tivessem sido praticados dois homicídios
culposos.
Concurso material benéfico no concurso
formal heterogêneo
 Na hipótese de concurso formal heterogêneo, é
possível que ocorra uma distor- ção na aplicação
da pena. Com efeito, imagine-se um crime de
estupro de vulnerá- vel (art. 217-A) em concurso
formal com o de perigo de contágio de moléstia
vené- rea (art. 130, caputi, ou seja, um sujeito
acometido de sífilis que estupra uma jovem de 12
anos de idade. Suponha-se, então, que o juiz fixe
a pena mínima para os dois delitos. No estupro, o
mínimo é de 8 anos, e, no crime de perigo, é de 3
meses. Se as penas fossem somadas, atingiríamos
o total de 8 anos e 3 meses, mas, se aplicássemos
a regra do concurso formal, chegaríamos a uma
pena de 9 anos e 4 meses (8 anos mais 1/6).


Nesse caso, a regra do concurso formal, criada
para beneficiar o acusado e evitar penas
desproporcionais, estaria a prejudicá-la. Atento a
esse detalhe, o art. 70 do Código Penal, em seu
parágrafo único, estabeleceu que a pena
resultante da aplicação do concurso formal não
pode ser superior àquela cabível no caso de soma
das penas. Por isso, sempre que o montante da
pena decorrente da aplicação do au- mento de 1/6
até 1/2 (referente ao concurso formal) resultar em
quantum superior à soma das penas, deverá ser
desconsiderado tal índice e aplicada a pena
resultante da soma. A essa hipótese, dá-se o
nome de concurso material benéfico .
Critério para a exasperação da pena
 A jurisprudência pacificou entendimento no
sentido de que é o número de crimes praticados o
critério que deve ser levado em conta pelo juiz
para aplicar o índice de exasperação da pena.
Assim, quando o sujeito, mediante uma única imprudência, provoca a morte de duas pessoas, deve
ser aplicado o aumento mínimo de 1/6, porém, se
o número de vítimas for maior, o índice,
igualmente, deve ser maior. Quando o número de
vítimas for exorbitante, é evidente que o Índice
aplica- do deve ser o máximo previsto em lei (1/2).
Nesse sentido: "Crimes de roubo. Concurso
formal. Critérios de fixação da pena. Número de
crimes. CP. art. 70. I

NÚMERO DE CRIMES
ÍNDICE DE AUMENTO
2
1/6
3
1/5
4
1/4
5
1/3
6 OU MAIS
1/2
Concurso formal perfeito e imperfeito
 O instituto do concurso formal, com aplicação de
uma só pena exasperada, poderia servir de
estímulo a marginais inescrupulosos, que,
visando benefícios na aplicação da pena,
poderiam se utilizar de subterfúgios na execução
do delito. As- sim, se um desses bandidos
quisesse cometer três homicídios poderia colocar
fogo na casa onde estivessem as três vítimas ou
prendê-las dentro de um carro e jogá-lo de um
precipício. Teria, com isso, cometido três
homicídios com uma só ação e poderia receber
uma só pena com exasperação.


Atento a essa possibilidade, o legislador criou, na
2º parte do art. 70, caput, do Código Penal, o
concurso formal imperfeito (ou impróprio), no
qual as penas são somadas, como no concurso
material, sempre que o agente, com uma só ação
ou omissão dolosa, praticar dois ou mais crimes,
cujos resultados ele efetivamente visava
(autonomia de desígnios quanto aos resultados).
No exemplo acima, portanto, o criminoso teria
somadas as penas dos três homicídios cometidos
com a ação única, já que os delitos são dolosos e o
agente efetivamente queria matar as três
vítimas. Assim, pode-se dizer que o concurso
formal traz duas hipóteses de aplicação de pena:
a) concurso formal próprio (ou perfeito), no qual o
agente não tem autonomia de desígnios em
relação aos resultados e cuja consequência é a
aplicação de uma só pena aumentada de 1/6 até
1/2;
 b) concurso formal impróprio (ou imperfeito), no
qual o agente atua com dolo direto em relação aos
dois crimes, querendo provocar ambos os
resultados, hipó- tese em que as penas são
somadas.


Saliente-se que o concurso formal perfeito não é
instituto exclusivo dos crimes culposos. Ao
contrário, é o concurso formal imperfeito que
pressupõe a existência de dolo direto, ou seja, a
intenção específica de cometer ambos os delitos.
Por exclusão, portanto, aplica-se a regra do
concurso formal perfeito, em todas as outras
hipóteses em que, com uma só ação ou omissão, o
agente tenha cometido dois ou mais crimes.
Existe, pois, concurso formal próprio: a) se os dois
(ou mais) delitos forem culposos; b) se um crime
for culposo, e o outro, doloso (como nas hipóteses
de aberratio ictus e aberratio criminis com duplo
resultado); c) se ambos os delitos forem fruto de
dolo eventual; d) se um dos crimes for resultado
de dolo direto, e o outro, decorrente de dolo
eventual.
Aberratio ictus com duplo resultado
 Aberratio ictus, ou erro de execução, existe
quando o agente, querendo atingir determinada
pessoa, efetua o golpe, mas, por má pontaria ou
outro motivo qualquer, acaba atingindo pessoa
diversa da que pretendia, hipótese em que o art.
73 do Código Penal prevê que o agente responde
como se ti- vesse atingido a pessoa visada. Pode
acontecer, todavia, de o sujeito atingir quem
pretendia e, por erro de execução, atingir também
outra pessoa. Nesse caso, o agente responde por
crime doloso em relação a quem pretendia matar
e por delito culposo em relação ao outro. Em tal
caso, a parte final do art. 73 diz que se aplica a
regra do concurso formal. Como o agente queria
apenas um dos resultados, aplica-se a regra da
exasperação da pena (concurso formal perfeito) .

A berra tio criminis com duplo resultado
 Nesta modalidade, o sujeito quer cometer um
crime e, por erro, comete outro. O exemplo
sempre lembrado é o do agente que atira uma
pedra querendo cometer crime de dano, mas, por
erro, acerta uma pessoa que passava pelo local,
causando-lhe lesões. Neste caso, o art. 74 do
Código Penal estipula que o agente só responde
pela lesão culposa, que absorve a tentativa de
dano. Caso, porém, o agente atinja o bem que
pretendia e, por erro, atinja também o outro,
responde pelos dois crimes em concurso formal,
conforme prevê a parte final do art. 74 do Código
Penal. No exemplo acima, o agente responderia
por crime de lesão culposa em concurso formal
perfeito com o crime de dano .

CRIME CONTINUADO
 O conceito de crime continuado encontra-se no
art. 71, caput, do Código Penal.
 De acordo com tal dispositivo, "quando o agente,
mediante mais de uma ação ou omissão, pratica
dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas
condições de tem- po, lugar, maneira de execução
e outras semelhantes, devem os subseqnentes ser
havidos como continuação do primeiro".


A finalidade do instituto é a de evitar a aplicação
de penas exorbitantes, pois a consequência do
reconhecimento da continuidade delitiva é a
aplicação de uma só pena, aumentada de 1/6 a
2/3 (sistema da exasperação). Assim, quando um
criminoso resolve, por exemplo, furtar estepes de
veículos estacionados na rua e, em uma sema- na,
consegue furtar 100 estepes de carros diferentes,
ele, em tese, teria que receber uma pena mínima
de 100 anos de reclusão, pois cometeu 100 crimes
de furto simples que têm pena mínima de 1 ano
cada.

Ao se reconhecer o instituto do crime continuado
em tal caso, a consequência será a aplicação de
uma só pena aumentada de 1/6 a 2/3.1 Por isso,
se aplicada a pena mínima ao furto (1 ano),
aumentada no patamar máximo de 2/3, a pena
final será de 1 ano e 8 meses. A diferença na
pena, portanto, é enorme .
Aplicação da pena
 No crime continuado, os delitos devem ser
necessariamente da mesma espécie.
 Não há dúvida de que crimes cometidos em sua
modalidade simples e também na qualificada,
quando atingem exatamente os mesmos bens
jurídicos, são tidos como da mesma espécie. É o
que ocorre entre os crimes de furto simples e
qualificado (o único bem jurídico atingido é o
patrimônio). Por isso, o próprio art. 71, caput, do
Código Penal, realça que, nas hipóteses de
continuação criminosa, aplica-se a pena de um só
dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se
diversas, aumentada, em qualquer caso, de 1/6 a
2/3.


Tal como ocorre no crime continuado, o juiz, na
escolha do quantum de exasperação, deve levar
em conta o número de infrações perpetradas.
Quanto maior o número de delitos componentes
da continuação, maior deverá ser o índice de
aumento. Há muito tempo, nossos tribunais
fixaram os seguintes critérios para servir de
parâmetro na aplicação da pena no crime
continuado:
NÚMERO DE CRIMES
ÍNDICE DE AUMENTO
2
1/6
3
1/5
4
1/4
5
1/3
6
1/2
7 OU MAIS
2/3
a) Teoria da unidade real. Essa teoria,
concebida por Bernardino Alimena, entende que
as hipóteses de crime continuado constituem, em
verdade, crime único.
 b)
Teoria da ficção jurídica. O crime
continuado é constituído por uma pluralidade de
crimes, mas, por ficção legal, é tratado como
delito único no momento da aplicação da pena.
Trata-se de teoria desenvolvida por Francesco
Carrara e nitidamente adotada pelo Código Penal
Brasileiro que, ao definir crime continuado,
menciona que o sujeito "pratica dois ou mais
crimes", mas devem os sub- sequentes ser
havidos como continuação do primeiro apenas
para a fixação da pena.

Tanto é verdadeira esta conclusão que o art. 119
do Código Penal prevê que, no caso de concurso
de crimes, a extinção da punibilidade incidirá
sobre a pena de cada um isoladamente.
 c) Teoria mista. Para esta teoria, o crime
continuado não constitui crime único nem
concurso de crimes, e sim outra categoria
(autônoma)

Requisitos
 O art. 71 do Código Penal expressamente exige os
seguintes requisitos para o reconhecimento do
crime continuado:
 a) Pluralidade de condutas. Tal como ocorre
no concurso material, o crime continuado
demanda a realização de duas ou mais ações ou
omissões criminosas, opondo-se, portanto, ao
instituto do concurso formal que exige conduta
única.


b) Que os crimes cometidos sejam da mesma
espécie. São aqueles previstos no mesmo tipo
penal, simples ou qualificados, tentados ou
consumados. Desse modo, pode haver crime
continuado entre furto simples e furto
qualificado, mas não entre furto e apropriação
indébita, entre furto e roubo ou entre roubo e
extorsão etc.

É de se ressalvar, outrossim, que existe corrente
que dá outra interpretação ao conceito de "crimes
da mesma espécie", argumentando que devem ser
assim entendi- dos aqueles cometidos mediante
os mesmos modos de execução e que atinjam o
mesmo bem jurídico. Para essa corrente, é
admissível o reconhecimento da continuidade
delitiva entre o roubo e a extorsão, já que ambos
são cometidos mediante violência ou grave
ameaça e atingem o mesmo bem jurídico
(patrimônio), e entre furto mediante fraude e
estelionato.
Saliente-se,
porém,
que
a
interpretação amplamente dominante em termos
doutrinários e jurisprudenciais é aquela
mencionada anteriormente, que interpreta que
são da mesma espécie apenas aquelas condutas
que integram o mesmo tipo penal- simples ou
qualificados, consumados ou tentados.

c) Que os crimes tenham sido cometidos
pelo mesmo modo de execução (conexão
modal). Por esse requisito, não se pode aplicar a
regra do crime continuado entre dois roubos
quando, por exemplo, um deles tiver sido
cometido mediante violência e o outro, mediante
grave ameaça.

d) Que os crimes tenham sido cometidos nas
mesmas condições de tempo (conexão
temporal). A jurisprudência vem admitindo o
reconhecimento do crime continuado quando
entre as infrações penais não houver decorrido
período superior a 30 dias.

e) Que os crimes tenham sido cometidos nas
mesmas condições de local (conexão
espacial). Admite-se a continuidade delitiva
quando os crimes forem pra- ticados no mesmo
local, em locais próximos ou, ainda, em bairros
distintos da mesma cidade e até em cidades
contíguas (vizinhas).
Unidade de desígnios como requisito do
crime continuado
 Existe séria divergência em torno de a unidade
de desígnios por parte do criminoso ser requisito
do crime continuado. As teorias sobre o tema são
as seguintes:
 a) teoria objetiva pura: o crime continuado
exige somente os requisitos de ordem objetiva
elencados no art. 71 do Código Penal que os
crimes sejam da mesma espécie e cometidos nas
mesmas circunstâncias de tempo, local e modo de
execução. A lei não exige qualquer requisito de
ordem subjetiva, dispensando a verificação
quanto à finalidade do agente ao reiterar a ação
delituosa;


b) teoria objetivo-subjetiva: a continuação
delitiva pressupõe a coexistência dos requisitos
objetivos e subjetivo (unidade de desígnios), ou
seja,
só pode ser reconhecida
quando
demonstrada a prévia intenção de cometer vários
delitos em continuação. Esta teoria é também
chamada de mista. De acordo com ela, existe
crime continuado quando, por exemplo, o caixa de
um estabelecimento subtrai diariamente certa
quantia em dinheiro da empresa, não o
configurando,
entretanto,
a
hipótese
de
assaltante que rouba aleatoriamente casas
diversas, sem que haja qualquer vínculo entre os
fatos, de forma a demonstrar que se trata de
criminoso contumaz, habitual, que não merece as
benesses legais.
Distinção
entre
crime
habitual
e
continuado
 No crime habitual, a tipificação pressupõe a
reiteração de condutas. A prática de um ato
isolado não constitui crime. Ex.: curandeirismo
(art. 284 do CP). a continuação delitiva, cada
conduta isoladamente constitui crime, mas, em
virtude de estarem presentes os requisitos legais,
aplica-se uma só pena seguida de exasperação.

Crime continuado qualificado ou específico
 A reforma da Parte Geral decorrente da Lei n.
7.209/84 fez cessar discussão até então existente
em torno da possibilidade do reconhecimento da
continuação entre crimes violentos contra vítimas
diferentes, como em casos de homicídio, roubo,
estupro etc. Com efeito, a atual redação do art.
71,
parágrafo
único,
do
Código
Penal
expressamente admite a continuação delitiva
ainda que os crimes sejam dolos os, cometidos
contra vítimas diferentes e com emprego de
violência à pessoa ou grave ameaça. Ocorre que,
nesses casos, o juiz poderá até triplicar a pena de
um dos crimes (se idênticos) ou do mais grave (se
diversas as penas), considerando, para tanto, os
antecedentes do acusado, sua conduta social, sua
personalidade, bem como os motivos e as
circunstâncias dos crimes.


É evidente, todavia, que a hipótese de triplicação
da pena só existirá se forem cometidos três ou
mais crimes, pois, caso contrário, o crime
continuado poderia acabar implicando pena
maior do que a obtida com a soma delas. Assim,
se foram praticados dois crimes, o juiz, no caso
concreto, poderá apenas somar as respectivas
penas. O instituto do crime continuado
qualificado tem sido aplicado, por exemplo, em
situações de chacina, em que os assassinos
matam várias vítimas, ou de crimes de estupro
cometidos seguidamente contra vítimas diversas.
A propósito: "ao paciente foi reconhecida a
presença de continuidade específica nas
tentativas de homicídio duplamente qualificado.

O aumento da pena em razão do crime
continuado se fundamentou na regra consoante a
qual nos crimes dolosos, contra vítimas
diferentes, cometidos com violência ou grave
ameaça à pessoa, poderá o juiz aumentar a pena
de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais
grave, se diversas até o triplo (CP, art. 71,
parágrafo único), levando em consideração as
circunstâncias judiciais do art. 59, do Código
Penal, especialmente as de índole subjetiva.
• Concurso material benéfico
 Nos termos já explicitados no tópico anterior,
deve-se ressaltar que o próprio parágrafo único
do art. 71 do Código Penal ressalva, também em
relação à continuidade delitiva, o cabimento do
concurso material benéfico (para que as penas
sejam somadas), quando a aplicação do triplo da
pena (no crime continuado qualificado) puder
resultar em pena superior à eventual soma. É
que, de acordo com o dispositivo, o juiz pode
triplicar a pena do crime mais grave. Suponha-se,
assim, que haja continuidade entre dois
homicídios simples e um qualificado pelo motivo
torpe.


Se o juiz triplicar a pena do crime qualificado,
chegará a uma pena mínima de 36 anos. Todavia,
se somar as penas dos dois homicídios simples
com a do qualificado, a pena mínima será de 24
anos. Dessa forma, em tal situação as penas
devem ser somadas como no concurso material.
Denominações do crime continuado
 Existem, destarte, duas espécies de crime
continuado: a modalidade simples ou comum,
prevista no caput do art. 71, em que o juiz aplica
o sistema da exasperação da pena ao crime mais
grave, e a modalidade qualificada ou específica,
em que o juiz pode somar as penas até o triplo da
pena prevista, também para o crime mais grave.

Simples
Pena do
crime mais
grave
aumentada
de 1/3 a 2/3
crimes da mesma
espécie e mesmas
circunstâncias de
tempo, local e modo de
execução
Qualificado
Possibilidade
de ser
triplicada a
pena do
crime mais
grave
crimes dolosos,
cometidos com violência
ou grave ameaça contra
vítimas diferentes
Superveniência de lei nova mais gravosa no
interregno entre as condutas que compõem
o crime continuado
 Nos termos da Súmula n. 711 do Supremo
Tribunal Federal, a lei penal mais grave aplica-se
ao crime continuado, se a sua vigência for
anterior à cessação da continuidade. Assim, se
alguém cometeu três crimes de estelionato em
dias diversos e, ao praticar o último dos crimes, já
havia uma nova lei tornando mais alta a pena do
estelionato, a pena será aplicada com base na
nova lei. Não se trata de retroatividade de lei
mais grave, mas sim de aplicação da nova lei a
fato cometido já na sua vigência .

Unificação das penas
 Se na sentença não tiver sido possível aplicar o
sistema da exasperação da pena decorrente do
concurso formal ou do crime continuado por
terem sido instauradas ações penais distintas
para cada um dos fatos criminosos, será possível
que, no juízo das execuções, seja feita a
unificação. Assim, no momento em que o juiz de
referida vara verificar a presença dos requisitos
do concurso formal ou do crime continuado,
decorrentes de condenações lançadas em
sentenças diversas (por crimes distintos), deverá,
em vez de somar as penas, desprezar uma delas,
mantendo apenas a mais grave, e, em seguida,
aplicar o índice de exasperação de que tratam os
arts. 70 e 71 do Código Penal.

CONCURSO DE CRIMES E SUSPENSÃO
CONDICIONAL DO PROCESSO
 A suspensão condicional do processo é benefício
descrito no art. 89 da Lei n. 9.099/95, cuja
premissa é a pena em abstrato do delito não
superar 1 ano. A lei prevê ainda que o réu deve
ser primário e que não pode estar sendo
processado por outro crime, devendo, ainda,
serem favoráveis as demais circunstâncias
judiciais.


Em relação ao montante da pena mínima, leva-se
em conta o crime mais grave com a exasperação
mínima do concurso formal ou do crime
continuado, que é de 1/6, ou, no caso do concurso
material, as penas mínimas devem ser somadas.
Por isso, se alguém está sendo acusado por dois
crimes de furto simples, em concurso formal ou
em continuação delitiva, a pena mínima é de 1
ano e 2 meses (pena de 1 ano pelo furto simples
acrescida de 1/6), não cabendo a suspensão
condicional do processo. Da mesma maneira, se
alguém está sendo processado por três crimes que
possuem pena mínima de 6 meses, em concurso
material, a conclusão é de que igual- mente não
cabe o benefício porque o mínimo de pena é de 1
ano e 6 meses. Nesse sentido, foram aprovadas
duas súmulas:
1) Súmula n. 723 do Supremo Tribunal Federal:
"não se admite a suspensão condicional do
processo por crime continuado, se a soma da pena
mínima da infração mais grave com o aumento
mínimo de 1/6 for superior a 1 ano".
 2) Súmula n. 243 do Superior Tribunal de
Justiça: "o benefício da suspensão condicional do
processo não é aplicável em relação às infrações
penais cometi- das em concurso material,
concurso formal ou continuidade delitiva, quando
a pena mínima cominada, seja pelo somatório,
seja pela incidência da majorante, ultrapassar o
limite de 1 ano".

DIFERENÇA ENTRE PLURALIDADE DE
AÇÕES E PLURALIDADE DE ATOS E SUA
IMPORTÂNCIA NA CONFIGURAÇÃO DE
CRIME ÚNICO, CONCURSO FORMAL OU
CRIME CONTINUADO
 Atente-se ao fato de que o Código Penal, ao tratar
do concurso formal, exige unidade de ação (ou
omissão), enquanto ao regulamentar o concurso
material e o crime continuado exige pluralidade
de ações (ou omissões). Esta, todavia, não se
confunde com unidade ou pluralidade de atos.
Uma ação é sinônimo de contexto fático único,
que pode ser cindido em vários atos. Além disso,
na apreciação do concurso de crimes, deve-se
levar em conta a existência ou não de lesão a
mais de um bem jurídico. Vejamos os seguintes
casos:


a) Quando, em uma mesma ocasião, o agente
penetra diversas vezes o pênis na vítima do crime
de estupro, estamos diante de crime único (uma
ação e vários atos contra a mesma vítima). Se,
entretanto, o pai, valendo-se da convivência no
lar, estupra a própria filha em dias diversos,
temos crime continuado na modalidade simples
(mais de uma ação contra a mesma vítima). Se o
agente estupra mulheres diferentes em um
mesmo contexto fático (uma de cada vez,
evidente- mente) ou em ocasiões próximas, temos
pluralidade de ações, aplicando-se o crime
continuado qualificado.
b) Se o sujeito mata a vítima com várias facadas,
há crime único de homicídio, pois apenas uma
vida foi ceifada. Trata-se de ação única composta
de diversos atos (facadas). Não se caracteriza o
concurso formal por ter havido uma só mor- te
(um só resultado).
 Por sua vez, se, por imprudência, ele provoca, na
mesma colisão de veículos, a morte de duas
pessoas, incorre em concurso formal (ação única
com pluralidade de vítimas).

Se o sujeito com uma única explosão mata,
concomitante e dolosamente, os dois ocupantes de
um carro, responde por dois crimes em concurso
formal (impróprio). Houve uma ação (explosão)
com duplo resultado morte.
 Se o sujeito, sucessivamente, atira e mata
pessoas diversas (várias ações e vítimas), incorre
no crime continuado qualificado.

Infrações penais com tipo misto alternativo
 Existem inúmeros crimes na legislação penal que
são formados por mais de um "verbo" (núcleo)
separados pela conjunção alternativa "ou". No
art. 122 do Código Penal, por exemplo, pune-se
quem induz, instiga ou auxilia outrem a cometer
suicídio. Nos crimes dessa natureza, a realização
de uma das condutas típicas já é sufi- ciente para
tipificar a infração penal, porém a realização de
mais de uma delas, desde que em relação à
mesma vítima, configura crime único e não
continuado. Ex.: pessoa que convence a vítima a
se matar (induzimento) e que, posteriormente,
fornece-lhe veneno para que seja utilizado no ato
suicida (auxílio) responde por um só delito.

Aborto de gêmeos
 O abortamento criminoso de gêmeos necessita de
apreciação em torno do dolo do sujeito ativo. Com
efeito, quando uma mulher anuncia a gestação,
há uma presunção de que se trata de feto único,
posto que a gravidez de gêmeos ocorre,
aproximadamente, na proporção de uma para
cada duzentas. É evidente, contudo, que, após a
realização de ultrassom ou outro exame
específico, torna-se conhecido o fato de a mulher
estar esperando dois bebês. Assim, a solução é
muito simples. Se o agente provoca o aborto em
gêmeos, sem conhecer este aspecto, responde por
crime único, pois puni-la pelos dois delitos seria
responsabilidade objetiva (não há dolo em relação
a um dos resultados e não existe crime culposo de
aborto).


Se o agente, contudo, sabia que eram gêmeos e,
ainda assim, realizou a manobra abortiva contra
ambos, responde por dois delitos em concurso
formal. Em tais casos, é possível dizer que houve
dolo direto (autonomia de desígnios) em relação
aos dois delitos, devendo o agente ter as penas
somadas por se tratar de concurso formal
imperfeito.
Lesões corporais e concurso de crimes
 Se, em contexto fático único, o agente desfere
inúmeros golpes contra a vítima, provocando
diversas lesões em seu corpo (no rosto, nas
pernas, no braço etc.), responde por crime único.
Se, entretanto, uma dessas lesões for grave e as
demais leves, o agente responderá somente pela
modalidade mais grave. Às vezes, ocorre de o
agente agredir a vítima em oportunidades
diversas, hipótese que configura o crime
continuado. Assim, se o marido agride a esposa
em dias seguidos, provocando-lhe lesões, comete o
crime de lesão corporal qualificado pela violência
doméstica (art. 129, § 9°, do CP), em continuidade
delitiva. Como se trata de uma só vítima, o juiz
deve aplicar uma só pena, aumentada de 1/6 a 2/3
(crime continuado simples).

Roubo e concurso de crimes
 Quando o roubador, com uma arma, ameaça duas
pessoas na rua, mas subtrai objetos de apenas
uma delas (sequer tentando levar pertences da
outra), responde por crime único de roubo, na
medida em que houve lesão patrimonial única.
Se, entre- tanto, leva bens das duas (duplo
resultado), responde por dois crimes de roubo em
concurso formal. A jurisprudência entende tratarse de ação única (grave ameaça concomitante
contra ambas), composta de dois atos
(subtrações).


Se os assaltantes fazem uma espécie de
"arrastão"
em
um
prédio,
adentrando
sequencialmente nos diversos apartamentos que
compõem o edifício e subtraindo pertences dos
moradores, respondem por delitos de roubo em
continuidade delitiva. A pluralidade de ações está
clara, na medida em que os ladrões realizaram
diversas
abordagens
e
ingressaram
sucessivamente nos apartamentos.

Latrocínio e roubo simples não são crimes da
mesma espécie porque, embora o latrocínio seja
uma das modalidades de roubo qualificado,
contém uma considerável diferença em relação à
figura simples, qual seja, afeta a vida além do
patrimônio. Os bens jurídicos atingidos, portanto,
não são exatamente os mesmos, de modo que
entre tais delitos há sempre concurso material.
Ex.: agente que rouba um banco e mata o
segurança e, na fuga, rouba também um carro
que estava nas proximidades.
Receptação e concurso de crimes
 Se o receptador compra vários bens furtados da
mesma vítima, incorre em crime único. Se,
todavia, compra, de uma só vez, objetos que
foram furtados de vítimas diversas, ciente disso,
responde pelos delitos em concurso formal.

Quadrilha e concurso de crimes
É
pacífico o entendimento doutrinário e
jurisprudencial no sentido de que o de- lito de
quadrilha (art. 288 do CP) é formal, isto é,
consuma-se no exato instante em que os seus
componentes entram em acordo e se associam
com a finalidade de come- ter crimes. Caso eles,
posteriormente,
cometam
efetivamente
as
infrações para as quais se uniram, responderão
por todas elas em concurso material com o delito
de quadrilha.

Coexistência de duas formas de concurso de
crimes
 Não existe grande dificuldade quando se trata de
coexistência de concurso material com uma das
outras modalidades de concurso. Assim, se uma
pessoa comete um estupro em concurso material
com dois crimes de furto, estes em concurso formal entre si, o juiz deve aplicar a pena de um dos
furtos, com o acréscimo de 1/6 a 1/2 (decorrente
do concurso formal) e, em seguida, somar com a
pena do estupro. O mesmo raciocínio vale quando
o agente comete um crime em concurso material
com outros em relação aos quais exista
continuidade delitiva.

CONCURSO
ENTRE
CRIMES
E
CONTRAVENÇÕES
 No concurso de infrações, executar-se-á inicialmente
a pena mais grave (art. 76). Esse dispositivo se
refere ao concurso entre crime e contravenção penal
em que as penas de reclusão ou detenção devem ser
executadas antes da pena de prisão simples
referente à contravenção.

SUSPENSÃO CONDICIONAL DA
PENA

A suspensão condicional da pena, ou sursis,
consiste na suspensão da execução da pena
privativa de liberdade aplicada pelo juiz na
sentença condenatória, desde que presentes os
requisitos legais, ficando o condenado sujeito ao
cumprimento de certas condições durante o
período de prova determinado também na
sentença, de forma que, se após seu término o
sentenciado não tiver dado causa à revogação do
benefício, será declarada extinta a pena .
NATUREZA JURÍDICA
 O sursis não é espécie de pena prevista no rol do
art. 32 do Código Penal. Trata- -se de medida
alternativa ao cumprimento da pena, sendo,
porém, condicionada. Cuida-se, inegavelmente,
de um benefício, pois, de modo indiscutível, é
mais vantajoso do que o cumprimento da pena
em regime prisional. O próprio Código Penal
denomina quem está em cumprimento de sursis
de beneficiário (art. 81). Por conta disso,
podemos, então, dizer que o sursis é um benefício
legal alternativo ao cumprimento da pena
privativa de liberdade. É, ao mesmo tempo, forma
de execução de pena, pois pressupõe decreto
condenatório e substituição da pena de prisão
pelo cumprimento de condições - inclusive
prestação de serviços à comunidade ou limitação
de fim de semana.

SISTEMAS
 São dois os principais sistemas de suspensão
condicional da pena:
 a) Sistema anglo-americano: o juiz reconhece
a existência de provas contra o acusado, mas não
o condena, submetendo-o a um período de prova.
Cumpridas as condições nesse período, o juiz
extingue a ação penal, mantendo o réu a sua
primariedade.
 b) Sistema belgo-francês: o juiz condena o réu,
mas suspende a execução da pena imposta, desde
que presentes certos requisitos. Este é o sistema
adotado no Brasil.

OPORTUNIDADE PARA A CONCESSÃO
 O sursis pressupõe a prolação de sentença
condenatória.
 O juiz deve julgar procedente a ação penal e fixar
a pena em sua integralidade, estabelecendo seu
montante final de acordo com o critério trifásico e
o regime prisional inicial. Somente depois disso
poderá ser concedido o sursis.
 A necessidade de prévia fixação da pena e de seu
regime inicial é evidente. Primeiro, porque o
sursis só pode ser concedido se a pena não
superar 2 anos, de modo que apenas com a
determinação efetiva do montante é que será
possível ao magistrado apreciar o cabimento do
benefício.


Segundo, porque, em caso de revogação do sursis,
o condenado terá que cumprir a pena
originariamente imposta e, para que isso seja
possível, é preciso que estejam definidos seu
montante e o regime inicial.
ESPÉCIES
 O Código Penal prevê três modalidades de sursis:
 a) sursis simples (art. 77, caput);
 b) sursis especial (art. 78, § 2°);
 c) sursis etário e humanitário (art. 77, § 2°) .

Sursis simples
 A lei não define expressamente a modalidade
"simples" do sursis, porém, por exclusão, deve ser
assim considerada a modalidade em que o réu
ainda não reparou o dano causado pelo crime ou
quando não lhe forem inteiramente favoráveis os
requisitos do art. S9 do Código Penal, uma vez
que, se presentes estes requisitos, esta- remos
diante do sursis especial, definido no art. 78, § 2°,
do Código, que sujeita o condenado a condições
mais brandas .

Requisitos do "sursis" simples
 Seus requisitos estão elencados no art. 77 do
Código Penal.
 A doutrina costuma classificá-los em requisitos
objetivos e subjetivos .

Requisitos objetivos são os seguintes:
 a) Que o réu seja condenado a pena privativa de
liberdade não superior a 2 anos (art. 77, caput, do
CP).
 Pressupõe-se, portanto, que haja condenação, que
a pena aplicada seja privativa de liberdade
(reclusão ou detenção) e que seu montante não
ultrapasse 2 anos.

De acordo com o art. 80 do Código Penal, o sursis
não se estende a pena restritiva de direitos ou
multa. Por isso, se alguém for condenado a 1 ano
de reclusão, e multa, o juiz poderá aplicar o sursis
em relação à pena privativa de liberdade, mas a
multa deverá ser paga, uma vez que não pode ser
objeto da suspensão.
 Nos casos de concurso de crimes, o limite de 2
anos deve ser apreciado em relação ao montante
total aplicado na sentença, e não em relação a
cada delito individualmente. No concurso
material, se as penas somadas ultrapassarem 2
anos, não será cabível o benefício. Da mesma
forma, se for aplicada pena originária de 2 anos,
mas, em razão de acréscimo decorrente do crime
continuado ou do concurso formal, o montante
final for de 2 anos e 4 meses.


No caso de aplicação de medida de segurança ao
inimputáve1 ou semi-imputável, evidentemente
não será cabível o sursis. Primeiro, porque o texto
legal se refere expressamente à suspensão
condicional da pena (e não da medida de
segurança). Segundo, porque a medida de
segurança tem finalidades especiais - tratamento
do agente e prevenção em relação ao doente
mental considerado perigoso -, sendo incompatível com o sursis.



b) Que não seja indicada ou cabível a
substituição por pena restritiva de direitos
ou multa (art. 77, IH, do CP).
É evidente que se forem cabíveis tais substituições por
penas alternativas (restritiva de direitos ou multa),
deve o juiz aplicá-las, restando prejudicado o sursis.
Antes do advento da Lei n. 9.714/98, as penas
restritivas de direitos só eram viáveis em condenações
em que a pena não superasse o limite de 1 ano. Por
isso, quando a pena estava contida nesse patamar, os
juízes aplicavam a pena restritiva, incidindo o sursis,
na maioria das vezes, em condenações superiores a 1
ano e não superiores a 2. Após referida lei, as penas
restritivas passaram a ser possíveis em condenações
não superiores a 4 anos (nos crimes dolosos), desde
que cometidos sem violência ou grave ameaça.

Por isso, considerando que o sursis só é cabível
em condenações não superiores a 2 anos, sua
incidência
perdeu
consideravelmente
a
importância, sendo aplicado, em regra, somente
em crimes que envolvem violência ou grave
ameaça, nas quais a condenação não supera 2
anos. Ex.: crimes de lesão corporal de natureza
grave ou gravíssima, tentativa de homicídio
simples com a redução máxima da tentativa (2/3)
etc. É que, se a pena aplicada não superar a 2
anos e o delito doloso não envolver violência ou
grave ameaça, a substituição por pena restritiva
de direitos terá preferência em relação ao sursis .
Requisitos subjetivos
 São considerados de ordem subjetiva os seguintes
requisitos:
 a) Que o réu não seja reincidente em crime doloso
(art. 77, I, do CP).
 Somente se o acusado for condenado por um
crime doloso após a condenação por outro crime
da mesma natureza é que o benefício se mostra
inviável. Se qualquer deles for culposo, ou ambos,
o sursis mostra-se viável. Além disso, se a
condenação anterior quanto ao crime doloso
gerou aplicação exclusiva de pena de multa,
igual- mente se mostra possível a suspensão
condicional da pena, nos exatos termos do art. 77,
§ 1°, do Código Penal.

b) Que a culpabilidade, os antecedentes, a
conduta social e a personalidade do agente,
bem como os motivos e as circunstâncias do
crime, autorizem a concessão do benefício
(art. 77, lI, do CP).
 Ainda que o réu seja primário, o juiz poderá
negar-lhe o sursis, caso ostente maus
antecedentes e o magistrado entenda que a
conjugação das condenações denote que a
suspensão da pena não se mostra suficiente. É
claro, porém, que o julgado anterior deve ser
referente a crime doloso e que não deve ter
havido aplicação exclusiva de pena de multa, pois
até para os casos de reincidência é assim.
Lembre-se, ainda, do teor da Súmula n. 444 do
Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual "é
vedada a utilização de inquéritos policiais e ações
penais em curso para agravar a pena-base".

Por lógica, também não poderão ser consideradas
como fator impeditivo do sursis.
 O benefício poderá ainda ser negado se o juiz
entender que o acusado tem personalidade
violenta ou que os motivos do crime são
incompatíveis com a suspensão da pena (ex.:
agressão de integrantes de torcida organizada a
torcedor de outra equipe com a provocação de
lesão grave ou gravíssima).
 O fato de o réu se tornar revel durante o tramitar
da ação penal não impede o sursis.

Direito subjetivo do condenado
 Presentes os requisitos elencados no texto legal, a
obtenção do sursis é direito público subjetivo do
acusado, não podendo o juiz negar-lhe o benefício
sem qualquer fundamentação ou sem razão
plausível para tanto.

Que o réu seja
condenado a pena
privativa de liberdade
não superior a 2 anos
Objetivos
Requisitos
do Sursis
Subjetivos
Que não seja indicada
ou cabível a
substituição por pena
restritiva de direito ou
multa
Que o réu não seja
reincidente em crime
doloso salvo se a pena
antes aplicada for
somente de multa
Que as circunstâncias
judiciais do art.59 do
CP autorizem a
concessão do benefício
"Sursis" e crimes hediondos, tortura e
terrorismo
 Devido às altas penas previstas aos delitos de
natureza hedionda e equiparados, normalmente
não há que se cogitar de aplicação do sursis.
Excepcionalmente, contudo, a hipótese se
apresenta em casos práticos, como, por exemplo,
quando alguém é condenado por crime de estupro
simples tentado (art. 213, cc. art. 14, II, do CP) e
o juiz reduz a pena em seu montante máximo de
2/3, alcançando o patamar de 2 anos, ou, ainda,
quando alguém é condenado por crime de tortura,
cuja pena mínima é exatamente de 2 anos (art.
1°, da Lei n. 9.455/97).


Esses crimes são praticados com emprego de
violência ou grave ameaça e, por isso, incabível
quanto a eles a substitui- ção por penas
restritivas de direitos (se fosse cabível tal
substituição, automaticamen- te estaria afastado
o sursis). Em razão disso, duas correntes
surgiram:

a) O sursis é incompatível com o sistema mais
severo vislumbrado pelo legislador para os crimes
hediondos e equiparados, que prevê, no art. 2°, §
1°, da Lei n. 8.072/90, que tais delitos serão
cumpridos em regime inicialmente fechado.
Ademais, a própria Constituição Federal, em seu
art. 5°, XLIII, determinou tratamento mais
gravoso aos delitos hediondos, o que decorre
justamente da necessidade de o regime inicial ser
o fechado e da progressão se dar com prazo mais
longo. Se, todavia, a pena for suspensa, o autor do
crime hediondo recebe- rá o mesmo tipo de sanção
destinada aos criminosos comuns.

b) Como não há vedação expressa no texto legal,
não cabe ao juiz negar o benefício se o acusado
preencher os requisitos genéricos do art. 77 do
Código Penal. É a opinião que tem prevalecido na
doutrina e na jurisprudência. Damásio de Jesus'
assim se pronunciou: "Crimes hediondos - a
execução da pena imposta em face de sua prática,
presentes
seus
pressupostos
objetivos
e
subjetivos, não é incompatível com o sursis (. .. ).
Ocorre que o sursis constitui uma medida penal
sancionatória de natureza alternativa, não se
relacionando com os regimes de execução".
"Sursis" e tráfico ilícito de entorpecentes
 Apesar de o tráfico de drogas ser delito
equiparado a hediondo, a análise do cabimento do
sursis quanto a tal crime possui aspectos
diferenciados, por haver vedação expressa à
suspensão condicional da pena no art. 44, caput,
da Lei Antidrogas (Lei n. 11.34312006). O
Supremo
Tribunal
Federal
declarou
a
inconstitucionalidade do referido art. 44 no
tocante à vedação da conversão da pena privativa
de liberdade em restritiva de direitos (ver item
22.4), mas não fez o mesmo em relação ao sursis,
que, no regime atual, constitui benefício de maior
grandeza, pois só obriga à prestação de serviços à
comunidade ou limitação de fim de semana no
primeiro ano de cumpri- mento, podendo ser
ainda menos restritivo caso se trate de sursis
especial. Por essa razão, os tribunais não têm


Em suma, o que se percebe na jurisprudência dos
tribunais superiores é a possibilidade da
substituição da pena privativa de liberdade por
restritivas de direitos nos crimes de tráfico
(quando a pena não superar 4 anos e o delito não
envolver violência ou grave ameaça). Já em
relação aos crimes hediondos, tortura e
terrorismo, que, em regra, envolvem violência ou
grave ameaça, sendo, por isso, incompatíveis com
as penas restritivas de direitos, há julgados
admitindo a aplicação do sursis (em- bora o tema
seja ainda controvertido), desde que a pena não
supere 2 anos .
Condições
 Presentes os requisitos legais, o acusado tem
direito ao benefício. Deve, por isso, o magistrado,
concomitantemente à concessão, fixar as
condições a que fica subordinado o agente
durante o período de prova.

De acordo com o art. 157 da Lei de Execuções
Penais, o Juiz ou Tribunal deverá, na sentença
que aplicar pena privativa de liberdade no limite
de 2 anos, pronunciar- -se, motivadamente, sobre
a suspensão condicional da pena, quer a conceda,
quer a denegue.
 Já o art. 158 estabelece que, concedida a
suspensão, o Juiz especificará as condições a que
fica sujeito o condenado, pelo prazo fixado,
começando este a correr da audiência
admonitória.

As condições do sursis são classificadas em legais
e judiciais.
 a) Condições legais.
 São obrigatórias e encontram-se expressamente
elencadas no texto da lei, isto é, no art. 78, § 1°,
do Código Penal, que dispõe que, no primeiro ano
do período de prova, deverá o condenado prestar
serviços à comunidade ou submeter-se a
limitação de fim de semana.

b) Condições judiciais.
 De acordo com o art. 79 do Código Penal, o juiz
pode especificar outras condições a que fica
subordinada a suspensão, desde que adequadas
ao fato e à situação pessoal do condenado. Essas
condições evidente- mente não podem ser
vexatórias nem atingir direitos fundamentais do
indivíduo (obrigação de doar sangue, de
frequentar cultos religiosos etc.). Poderão,
outrossim, ser estabelecidas condições como as de
sujeição a tratamento para toxicômanos,
frequência a aulas sobre normas de trânsito,
obrigação de comparecimento ao juízo para
justificar suas atividades etc.


Durante o período de prova, o sentenciado fica
obviamente proibido de realizar condutas que
causem a revogação do benefício. São as
chamadas condições indiretas do sursis .
Omissão na fixação das condições pelo juiz
ou tribunal
 No atual sistema penal, não existe sursis
incondicionado. Se o juiz, ao sentenciar, omitir-se
na fixação das condições, deverão ser interpostos
embargos de declaração. O mesmo deve ocorrer se
o Tribunal conceder o sursis e não fixar as
condições e nem conferir expressamente ao juízo
das execuções a incumbência de fazê-lo, conforme
permite o art. 159, § 1°, da Lei de Execuções
Penais.

Sursis especial
 Nos termos do art. 78, § 2°, do Código Penal, se o
condenado houver reparado o dano, salvo
impossibilidade de fazê-lo, e se as circunstâncias
do art. 59 lhe forem inteiramente favoráveis, o
juiz poderá aplicar o sursis especial, no qual o
condenado terá de se submeter a condições menos
rigorosas, a saber;
 a) proibição de frequentar determinados lugares
(bares, boates, locais onde se vendem bebidas
alcoólicas etc.);
 b) proibição de ausentar-se da comarca onde
reside, sem autorização do juiz;
 c)comparecimento pessoal e obrigatório a juizo,
mensalmente, para informar e justificar suas
atividades.

Sursis etário e sursis humanitário
 Se o condenado tiver idade superior a 70 anos na
data da sentença e for conde- nado a pena não
superior a 4 anos, o juiz poderá também conceder
o sursis, mas, nesse caso, o período de prova será
de 4 a 6 anos. Este é o chamado sursis etário. Do
mesmo modo poderá proceder o juiz, se razões de
saúde do acusado justificarem a suspensão no
caso de ser aplicada pena não superior a 4 anos,
hipótese conhecida como sursis humanitário
(doença grave, invalidez etc.).
 Essas modalidades de suspensão condicional da
pena estão previstas no art. 78, § 2°, do Código
Penal.
 As demais regras são idênticas (condições a que
deve se submeter o condenado, hipóteses de
revogação etc.).

EXECUÇÃO DO SURSIS
 Nos termos do art. 160 da Lei de Execuções
Penais, após o trânsito em julgado da sentença, o
condenado será notificado para comparecer à
audiência admonitória, na qual será lida a
sentença condenatória pelo juiz, sendo o acusado,
assim, cientificado das condições impostas e
advertido
das
consequências
de
seu
descumprimento e da prática de nova infração.
 A ausência injustificada do condenado, notificado
pessoalmente ou por edital pelo prazo de 20 dias,
ou, ainda, sua recusa em aceitar o cumprimento
das condições (manifestada na audiência), obriga
o juiz a tornar sem efeito o benefício e determinar
o cumprimento da pena privativa de liberdade
originariamente imposta na sentença (art. 161 da
LEP). É o que se chama da cassação do sursis.

A fiscalização do cumprimento das condições é
atribuída ao serviço social, penitenciário,
Patronato, Conselho da Comunidade ou à
instituição beneficiada com a prestação de
serviços. Estes órgãos serão inspecionados pelo
Ministério
Público
ou
pelo
Conselho
Penitenciário, ou por ambos.
 Os órgãos responsáveis pela fiscalização deverão
comunicar imediatamente ao juízo das execuções
qualquer fato capaz de acarretar a revogação do
benefício, a prorrogação do período de prova ou a
modificação das condições (art. 158, § 5°, da
LEP).


O juiz poderá, a qualquer tempo, de ofício, a
requerimento do Ministério Público ou mediante
proposta do Conselho Penitenciário, modificar as
condições e regras estabelecidas na sentença,
ouvido previamente o condenado (art. 158, § 2°,
da LEP) .
PERÍODO DE PROVA
 Conforme acima mencionado, se o réu não
comparecer à audiência admonitória ou recusar
as condições impostas, o sursis será tornado sem
efeito pelo juiz, expedindo-se mandado de prisão
para o cumprimento da pena. Se, entretanto, for
realiza- da a audiência e o réu aceitar as
condições, terá início o período de prova. A
audiência admonitória, portanto, é o marco que
dá início à execução do sursis.
 Período de prova é o montante de tempo fixado
pelo juiz na sentença, no qual o condenado deve
dar mostras de boa conduta, não provocando a
revogação do benefício. Ao seu término, se o
condenado não tiver dado causa à revogação ou
prorrogação do sursis, o juiz decretará a extinção
da pena (art. 82 do CP).

A duração do período de prova em regra é de 2 a 4
anos, porém existem algumas exceções como no
sursis etário ou humanitário em que pode ser de
4 a 6 anos, ou nas contravenções penais em que
varia entre 1 e 3 anos.
 Para estabelecer o quantum do período de prova
entre seus montantes mínimo e máximo, o juiz
deve levar em conta a gravidade do crime
cometido e as circunstâncias do art. 59 do Código
Penal. Se o magistrado optar por fixá-lo acima do
mínimo legal, deverá expressamente mencionar
as razões de tal proceder, sob pena de nulidade
da sentença neste aspecto e consequente redução
ao patamar básico.

REVOGAÇÃO DO SURSIS
 A revogação do benefício pressupõe que o
condenado esteja em período de prova, isto é, que
já tenha sido realizada a audiência admonitória.
A
revogação implicará a necessidade de
cumprimento integral da pena originariamente
imposta na sentença, não havendo desconto
proporcional ao tempo já cumprido antes da
revogação.
 O art. 81, caput, do Código Penal, elenca as
hipóteses em que a revogação é obrigatória,
enquanto em seu § 1° encontram-se os casos de
revogação facultativa .

Revogação obrigatória
 Em tais casos, o juiz não tem discricionariedade,
de modo que, constatada a hipótese de revogação,
cabe-lhe compulsoriamente proferir decisão
revogando o sursis.
 As hipóteses de revogação obrigatória são as
seguintes:
 a)
Superveniência
de
condenação
irrecorrível pela prática de crime doloso
(art. 81, I, do CP).
 Pouco importa se a condenação se refere a crime
anterior ou posterior ao início do período de
prova. O que se mostra necessário é que a
condenação tenha transita- do em julgado e que
se refira a crime doloso.
 Na prática, entretanto, os juízes pro- ferem tal
decisão, na medida em que, sem ela, o cartório

b) Frustração da execução da pena de multa,
embora solvente o condenado (art. 81, lI, Ia parte,
do CP).
 É praticamente pacífico o entendimento de que
houve revogação tácita deste dispositivo em razão
do advento da Lei n. 9.268/96, que não mais
permite a prisão como consequência do não
pagamento da pena de multa, que, de acordo com
a atual redação do art. 51 do Código Penal,
considera-se dívida de valor, sendo-lhe aplicável a
legislação tributária.

c) Não reparação do dano provocado pelo
delito, sem motivo justificado (art. 81, II 2ª
parte).
 Nesse caso, o condenado deve ser ouvido antes de
ser decretada a revogação, a fim de que possa
justificar a falta de reparação do prejuízo.
Poderá, assim, demonstrar, dentre outros
motivos, que não possui condições financeiras
para arcar com os valores, que a vítima
renunciou à indenização, que ela se encontra em
local desconhecido, hipóteses em que não haverá
revogação.

d) Descumprimento da prestação de
serviços à comunidade ou limitação de fim
de semana no primeiro ano do período de
prova (art. 81, III, do Código Penal).
 O juiz deve também dar oportunidade ao
sentenciado para justificar o descumprimento, só
declarando a revogação do sursis se não for
apresentada escusa satisfatória .

Revogação facultativa
 Verificada uma das situações previstas em lei,
caberá ao juiz, de acordo com as circunstâncias do
caso concreto, proferir decisão revogando o sursis,
mantendo-o ou, ainda, prorrogando o período de
prova até o seu limite máximo, se este não foi O
fixado na sentença (art. 81, § 30, do CP).
 As hipóteses de revogação facultativa são as
seguintes:

a)
Superveniência
de
condenação
irrecorrível,
por
crime
culposo
ou
contravenção, a pena privativa de liberdade
ou restritiva de direitos (art. 81, § 10, do
CP).
 É evidente que o juiz deve verificar a viabilidade
de o acusado prosseguir cumprindo as condições
do sursis, precipuamente se o período de prova
encontrar-se no primeiro ano, quando o acusado é
obrigado a prestar serviços à comunidade ou
sujeitar-se a limitação de fim de semana.
Obviamente se, na nova condenação, for fixado o
regime inicial semiaberto (o mais rigoroso cabível
em relação a crimes culposas ou contravenções),
não será possível a manutenção do sursis, pois
será inviável que o sujeito continue cumprindo as
condições referentes à primeira condenação.


Sendo fixado o regime inicial aberto ou sendo a
pena substituída por restritiva de direitos, poderá
o juiz, se assim entender pertinente, manter o
sursis, revogá-lo ou prorrogar o período de prova.
b) Descumprimento de qualquer das
condições judiciais fixadas no "sursis"
simples ou das condições do "sursis"
especial (art. 81, § 1°, do CP).
 O juiz deve também dar oportunidade ao
sentenciado para justificar o descumprimento, só
declarando a revogação do benefício se não for
apresentada escusa satisfatória ou se o
descumprimento for reiterado.

Relevância da distinção entre cassação e
revogação do sursis
 A cassação se dá antes da realização da audiência
admonitória (réu que não comparece ao juízo ou
que recusa o benefício). Ocorre, portanto, antes
do início de execução do sursis. A revogação,
conforme já estudado, ocorre depois. No primeiro
caso, o termo a quo da prescrição da pretensão
executória é o trânsito em julgado da sentença
para a acusação (art. 112, I, 1ªa parte, do CP),
enquanto, no segundo, é a data da revogação do
sursis (art. 112, I, 2ª parte, do CP) .

PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE PROVA
 Se o condenado, durante o período de prova,
passa a ser processado por outro crime ou
contravenção, considera-se prorrogado o prazo
até o julgamento definitivo (trânsito em julgado)
da nova acusação (art. 81, § 2°). Assim, se o
agente vier a ser condenado, poderá dar-se a
revogação do sursis, hipótese em que o agente
terá de cumprir a pena privativa de liberdade
suspensa
condicionalmente
na
sentença
originária. Se, entretanto, vier a ser absolvido, o
juiz decretará a extinção da pena referente ao
processo no qual foi concedida a suspensão
condicional.

Obrigatória
e
automática
Prorrogaçao
do período
de prova
Facultativa
Se o condenado estiver
sendo processado por
outro crime ou
contravenção
Nos casos em que a
revogação do sursis é
facultativa, o juiz em
de decretá-la, prorroga
o período de prova até
o máximo
SURSIS SIMULTÂNEOS
 Existe
a
possibilidade
do
cumprimento
simultâneo de dois sursis nas seguintes
hipóteses:
 a) Se o réu, já condenado por um crime no qual foi
concedido o sursis, for nova- mente condenado por
crime doloso, e a nova sentença for proferida
antes da audiência admonitória referente ao
primeiro delito. É necessário que, quanto à
última condenação, a pena não supere 2 anos e
que o acusado tenha sido considerado primário
(crime cometido antes da primeira condenação,
por exemplo).
 Nesta hipótese, a nova condenação não gera a
revogação do primeiro sursis por- que proferida
antes do início do período de prova.


b) Se o sentenciado, durante o período de prova,
for condenado por crime culposo ou contravenção
penal a pena não superior a 2 anos, e o juízo das
execuções não revogar o sursis em relação ao
primeiro delito (a hipótese é de revogação
facultativa). Note-se que, em relação à segunda
infração, o réu não está impedido de obter o
sursis, por não ser reincidente em crime doloso .
SURSIS E DETRAÇÃO PENAL
 A detração é incabível porque o sursis é benefício
que não guarda proporção com a pena privativa
de liberdade fixada na sentença. Assim, se
alguém for condena- do a 1 ano e 4 meses de
reclusão e o juiz conceder o sursis por 2 anos, não
poderão ser descontados desse período de prova,
por exemplo, os 3 meses em que o réu
permaneceu preso durante o tramitar da ação. É
claro, entretanto, que a consequência de eventual
revogação do sursis é a obrigação de o
sentenciado cumprir a pena originariamente
imposta na sentença e, em tal caso, deverá ser
descontado o tempo de prisão processual.

SURSIS E LEI DAS CONTRAVENÇÕES
PENAIS
 O art. 11 da Lei das Contravenções Penais
permite a aplicação do sursis quando reunidas as
condições estabelecidas no Código Penal. O
período de prova, entretanto, será fixado entre 1
e 3 anos.
 No que diz respeito à execução do benefício,
causas de revogação e prorrogação, dentre outras,
aplicam-se os mesmos dispositivos do Código
Penal, uma vez que não há regramento especial
sobre o assunto na lei própria .

DISTINÇÃO
ENTRE
A
SUSPENSÃO
CONDICIONAL DA PENA (SURSIS) E A
SUSPENSÃO
CONDICIONAL
DO
PROCESSO (SURSIS PROCESSUAL)
 Na suspensão condicional da pena, o réu é
condenado a pena privativa de liberdade e, por
estarem presentes os requisitos legais, o juiz
suspende essa pena, submetendo o sentenciado a
um período de prova, no qual ele deve observar
certas condições. Se o benefício for revogado, será
expedido mandado de prisão, mas se as condições
forem integralmente cumpridas, o juiz extinguirá
a pena.

Como existe condenação, caso o sujeito venha a
cometer novo crime, será considerado reincidente.
 Na suspensão condicional do processo, criada pelo
art. 89 da Lei n. 9.099/95, o agente é acusado da
prática de infração penal cuja pena mínima não
excede a 1 ano e, desde que não esteja sendo
processado, que não tenha condenação anterior
por outro crime e que estejam presentes os
demais requisitos que autorizariam o sursis (art.
77 do CP), deve o Ministério Público fazer uma
proposta de suspensão do processo, por prazo de 2
a 4 anos, no qual o réu terá de submeter-se a
algumas condições:


reparação do dano, salvo impossibilidade de fazêlo; proibição de frequentar determinados locais;
proibição de ausentar-se da comarca onde reside
sem autorização do juiz; e comparecimento
mensal e obrigatório a juízo, para informar e
justificar suas atividades.
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Concurso de crimes - Corrêa & Corrêa Advogados