Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho
ACR 10534/RN
(0008260-27.2011.4.05.8400)
APTE
: ANDRÉ LUIS DE MEDEIROS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE
ADV/PROC : FRANCISCO GUILHERME DE ARAÚJO FREIRE
APDO
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ORIGEM
: 14ª Vara Federal do Rio Grande do Norte - Natal
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVALHO
(Relatório)
O desembargador federal Vladimir Souza Carvalho: Apelação criminal desafiada
pelo réu, André Luis de Medeiros Cavalcanti de Albuquerque, atacando a sentença
proferida pelo juízo da 14ª Vara da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, que o
condenou como incurso no tipo penal previsto no artigo 68, da Lei 9.605/98.
Narra a denúncia que, à míngua de prévia licença ambiental, o Departamento de
Estradas e Rodagens potiguar realizou, entre os anos de 2009 e 2010, a construção de uma
estrada de piçarro, destinada a ligar a comunidade de Morro dos Martins a Reduto, no
Município de São Miguel do Gostoso, em área de patrimônio da União.
Consta, outrossim, que, em 13 de setembro de 2010, a servidora do Idema, e
também denunciada, Ivanosca Rocha de Miranda, na qualidade de Coordenadora de Meio
Ambiente, com base em parecer emitido pelo ora apelante, dispensou, indevidamente, o
licenciamento ambiental da obra, calcada no entendimento de que não ocasionaria impacto
ambiental significativo, malgrado este dano fosse evidente, por se tratar de estrada paralela
à praia e em local de desova de tartarugas marinhas.
Por fim, atroa que ainda mais grave é o fato de haver sido decidida a dispensa da licença
ambiental quando os denunciados estavam cientes de que a obra já havia sido iniciada e concluída pelo
DER/RN, tornando inclusive inócuos diversos dos condicionantes colocados na Comunicação
510/2010-CMA (fls. 91/91v. do IPL), expedida pela denunciada Ivanosca Rocha Miranda ao
DER/RN e que pressupunham uma obra ainda não iniciada, f. 04.
O édito condenatório esgrimido deu parcial provimento à exordial acusatória,
para absolver a ré varoa, mas condenar o réu varão à pena de um ano de reclusão,
substituída por duas sanções restritivas de direitos, cumuladas com o pagamento de
quantia correspondente a dez dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário
mínimo vigente à época dos fatos, monetariamente corrigida na forma legal, f. 450-464.
Nas razões recursais, o apelante clama pela absolvição, alegando a atipicidade da
conduta, f. 478-488.
Contrarrazões coligidas às f. 492-502.
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Subiram os autos a esta instância revisora, donde foram à Procuradoria Regional
da República, que ofertou parecer opinando pelo improvimento do apelo, f. 514-517.
É o que importa relatar.
Ao douto Revisor, na forma regimental.
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(0008260-27.2011.4.05.8400)
APTE
: ANDRÉ LUIS DE MEDEIROS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE
ADV/PROC : FRANCISCO GUILHERME DE ARAÚJO FREIRE
APDO
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ORIGEM
: 14ª Vara Federal do Rio Grande do Norte - Natal
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVALHO
(Voto)
O desembargador federal Vladimir Souza Carvalho: De logo, salta à vista que
não está, aqui, sendo o julgado o real interessado e responsável pela obra, por ser este o
Estado do Rio Grande do Norte, que, através do seu Departamento de Estradas e Rodagens,
construiu a questionada estrada de piçarro em área da União.
Tampouco está sendo trazida a julgamento a verdadeira responsável pela
expedição da licença ambiental atacada, exatamente a ré Varoa, Ivanosca Rocha de
Miranda, que, na condição de Coordenadora de Meio Ambiente, subscreveu o
licenciamento em questão – conquanto arrimada em elementos consignados pelo ora
apelante –, já que fora absolvida pela sentença verberada e não houve recurso do Ministério
Público Federal.
Quem está, pois, sendo trazido a julgamento, é o servidor André Luis de Medeiros
Cavalcanti de Albuquerque, acusado de, na qualidade de engenheiro civil e analista
ambiental do Idema, haver lavrado Parecer Técnico, datado de 10 de setembro de 2010,
atestando a desnecessidade da licença para a obra controvertida.
Sob esse prisma, conquanto reconheça ser judicioso o entendimento exarado no
édito condenatório esgrimido, concluo que o apelo merece provimento, revelando-se
imperiosa a necessidade de absolvição do recorrente.
De início, é fácil perceber que o apelante nunca teve poder de mando dentro da
Idema, sendo apenas um técnico parecerista, com a função de produzir laudos que, de
modo algum, vinculavam a autarquia ambiental.
Esta tarefa, de, realmente, dar a palavra final, subscrevendo o veredicto
autorizador, cumpria à ré absolvida, e não há mais nada que possa ser feito para alterar a
sorte que lhe fora reservada em primeiro grau.
Por outro lado, a defesa logrou comprovar, cabalmente, que o Estado do Rio
Grande do Norte foi o verdadeiro responsável pelos possíveis danos ambientais
reclamados.
Isso porque restou incontroverso que a construção da estrada de piçarro, ligando
a comunidade de Morro dos Martins a Reduto, no Município de São Miguel do Gostoso,
iniciou-se, ainda, no ano de 2009, à míngua do cumprimento das exigências necessárias,
que somente foram buscadas no ano subsequente. E não há como responsabilizar o
apelante pelo fato de o DER não ter perseguido a obtenção da licença no devido tempo.
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Desse modo, quando o vindicante apresentou seu laudo, mais precisamente, no
dia 10 de setembro de 2010, a estrada já estava praticamente pronta, faltando, apenas, o
chamado corpo d’
água, e, nesta condição, é que lhe foi dado observar a ocorrência dos
questionados danos à fauna e à vegetação local, isto é, em área não mais virgem, mas, sim,
degradada por uso contínuo, durante anos.
Nessa vereda, ressai dos autos a certeza de que a obra em questão foi executada
em local já utilizado pela população para as necessidades de locomoção, atingindo
vegetação parca e escassa, formada, principalmente, por arbustos e plantas rasteiras, típicas
de área de praia, consoante é possível depreender das fotografias reproduzidas em cópias
coligidas pelo próprio Idema (f. 92-96, do volume 1, dos autos de inquérito).
Ademais, há de ressaltar que a indigitada estrada, longe de significar um
empreendimento privado, objetivando o lucro, foi de grande importância para a população
local, representando um avanço significativo para os beneficiados.
A propósito, a defesa logrou trazer diversas declarações prestadas por moradoras
da região, a testemunharem, conquanto extrajudicialmente, que a estrada que liga as
Comunidades de Reduto à Morro dos Martins existe há vários anos; que por essa estrada só passava
bugres, carroças, cavalos e bicicletas, antes dos melhoramentos realizados pelo DER; que a melhoria
foi feita para atender aos interessados das comunidades, pois a estrada antiga não atendia às condições
de tráfego e que, depois da colocação do piçarro há mais segurança e conforto para as pessoas, f. 204256.
Aliás, o próprio julgador de primeiro grau cuidou de anotar na sentença que não
se discute a relevância social que pode ter sido gerada pela construção ou pelo simples melhoramento
da eventual trilha já existente no local em que foi traçada a estrada de piçarro, contudo a falta de
licenciamento impossibilitou que se apurasse a existência de local mais apropriado à instalação que
atendesse concomitantemente aos interesses da comunidade local e à necessidade de preservar a
higidez do meio ambiente, f. 456.
Cumpre destacar, ainda, que, se o recorrente agira de modo equivocado, ao
produzir laudo autorizando obra que já estava concluída, na há como se inferir a existência
de dolo eventual na sua conduta, consoante registrado na sentença.
Antes, entretanto, representaria a hipótese uma mera falha administrativa, que
não tem o condão de chegar à esfera do direito criminal, até porque, consoante já
registrado, as informações prestadas pelo apelante não vinculavam, de modo algum, a
autarquia ambiental.
Por fim, destaco que, mediante informação colhida junto ao site do Ministério
Público Federal do Rio Grande do Norte (http://www.prrn.mpf.mp.br/grupoasscom/noticias-internet/mpf-rn-obtem-acordo-e-der-ira-substituir-estrada-a-beira-mar-dapraia-de-tourinhos), foi possível concluir que já há um acordo com o Departamento de
Estradas e Rodagens, firmado em audiência na Justiça Federal, para a substituição desta
estrada por outra, mais distante da beira-mar, cuja obra será devidamente precedida da
imprescindível licença ambiental, razão pela qual há é autorizado concluir que o dano já foi
reparado, ou se encontra em vias de ser solucionado.
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Em resumo, sopesados todos os elementos carreados à instrução processual,
concluo inexistir margem para se chegar a qualquer outro resultado diverso da absolvição
do apelante, pois a conduta perquirida não se adéqua ao tipo penal esquadrinhado, mas, ao
revés, é atípica, encerrando um mero juízo tomado dentro dos limites das atividades
funcionais do recorrente e que, jamais, foi dotado do poder de vincular a administração.
Por este entender, dou provimento à apelação, para absolver o recorrente, com
fulcro no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal.
É como voto.
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(Ementa)
Penal e processual penal. Apelação do réu, desafiando a sentença que lhe condenou,
como incurso no tipo penal previsto no artigo 68, da Lei 9.605/98, à pena de um ano
de reclusão, substituída por duas sanções restritivas de direitos, cumuladas com o
pagamento de quantia correspondente a dez dias-multa, no valor unitário de um
trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Apelante acusado de, na condição de engenheiro civil e analista ambiental do
Idema, haver lavrado Parecer Técnico, datado de 10 de setembro de 2010, atestando
a desnecessidade de licença para a construção de uma estrada de piçarro, destinada
a ligar a comunidade de Morro dos Martins a Reduto, no Município de São Miguel
do Gostoso, realizada pelo Departamento de Estradas e Rodagens potiguar, iniciada
entre os anos de 2009 e 2010.
Entrementes, restou patente que o apelante nunca teve poder de mando dentro da
Idema, sendo apenas um técnico parecerista, com a função de produzir laudos que,
de modo algum, vinculavam a autarquia ambiental.
Por outro lado, a defesa logrou comprovar, cabalmente, que o Estado do Rio Grande
do Norte foi o verdadeiro responsável pelos possíveis danos ambientais
reclamados.
Decerto, revelou-se incontroverso que a construção da referida estrada de piçarro se
iniciou, ainda, no ano de 2009, à míngua do cumprimento das exigências
necessárias, que somente foram buscadas no ano subsequente. E não há como
responsabilizar o apelante pelo fato de o DER potiguar não ter perseguido a
obtenção da licença no devido tempo.
Desse modo, quando o vindicante apresentou seu laudo, mais precisamente, no dia
10 de setembro de 2010, a estrada já estava praticamente pronta, faltando, apenas, o
chamado corpo d’
água, e, nesta condição, é que lhe foi dado observar a ocorrência
dos questionados danos à fauna e à vegetação local, isto é, em área não mais
virgem, mas, sim, degradada por uso contínuo, durante anos.
Ademais, há de ressaltar que a indigitada estrada, longe de significar um
empreendimento privado, objetivando o lucro, foi de grande importância para a
população local, representando um avanço significativo para os beneficiados.
Por fim, impende destacar que, mediante informação colhida junto ao site do
Ministério
Público
Federal
do
Rio
Grande
do
Norte
(http://www.prrn.mpf.mp.br/grupo-asscom/noticias-internet/mpf-rn-obtem-acordoe-der-ira-substituir-estrada-a-beira-mar-da-praia-de-tourinhos), foi possível concluir
que já há um acordo com o Departamento de Estradas e Rodagens, firmado em
audiência na Justiça Federal, para a substituição desta estrada por outra, mais
distante da beira-mar, cuja obra será devidamente precedida da imprescindível
ACR 10534/RN
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Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho
licença ambiental, razão pela qual é autorizado concluir que o dano já foi reparado,
ou se encontra em vias de ser solucionado.
Apelação provida, para absolver o recorrente, com fulcro no artigo 386, inciso III, do
Código de Processo Penal.
(Acórdão)
Vistos, etc.
Decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por
maioria, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas
constantes dos autos.
Recife, 13 de maio de 2014.
(Data do julgamento)
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