CONSTIPAÇÃO INTESTINAL MARIA LÚCIA SOUZA LIMA Introdução A constipação intestinal, também conhecida como prisão de ventre, não é uma doença, mas um sintoma e uma das queixas gastrointestinais mais freqüentes. Definição Por ser uma sensação subjetiva, tornando-se difícil uma definição adequada. Dificuldade para evacuar – 52 %. Fezes endurecidas – 44%. Diminuicão da frequência das evacuações – 32%. Muitas pessoas reclamam de evacuação incompleta. Acadêmicamente se poderia dizer que há constipação intestinal quando o número de evacuações é inferior a três vezes por semana cujas fezes têm conteúdo em água menor que 40%, com um peso diário total que não atinja 35g. Na prática número de evacuações é no mínimo inferior a três evacuações por semana e/ou quando estas são acompanhadas de esforço ou dificuldade para evacuar. O importante é que as fezes sejam normais, a evacuação ocorra sem esforço e a pessoa fique satisfeita. Essa definição é influenciada por variáveis como: cultura, educação, atividade física e fatores emocionais, personalidade, fatores étnicos, dietéticos, entre outros. Características das fezes O calibre das fezes não pode ser dimensionado adequadamente em razão da deformação do bolo fecal pelas estruturas constituintes da região anorretal. Pacientes constipados relatam fezes finas, volumosas ou em cíbalos ou fragmentadas em vários tamanhos. 90% das pessoas normais esvaziam apenas o reto, ao defecar. 10% esvaziam o cólon desde a flexura esplênica até o ânus. Peso das fezes: 35g a 450 g por evacuação (homens) e 5g a 335 g (mulheres). Média : 100g (Inglaterra e EUA) e 300g ( India) e 500g (Uganda). Consistência: Endurecidas ou amolecidas - Na prática é aferida pelo esforço a evacuação. Epidemiologia A constipação ocorre mais freqüentemente acima dos 40 anos. Três vezes mais freqüente na mulher. É mais comum nas famílias de baixa renda e baixo nível educacional. Pacientes idosos são particularmente propensos a constipação pela diminuição do tônus da musculatura, presença de doenças crônicas, debilidade e uso de medicações. Etiopatogenia 1-Primárias: Ingestão insuficiente de fibras – causa bastante frequente. Inatividade física – principalmente paciente idosos pela debilitação da musculatura abdominal e pélvica. A retenção voluntária – ( postural, viagens, pouca disponibilidade de sanitários) Não obediência ao reflexo da evacuação - bloqueio do reflexo gastro-cólico. Lesão dos nervos do cólon pelo uso crônico e abusivo laxantes. Etiopatogenia 2 –Secundárias: A - doenças do cólon – doenças que provocam estreitamentos ou bloqueio mecânico da luz intestinal: Extra intestinal: tumores, vólvulos e hérnias. Luminais: Tumores, estenoses, diverticulite, linfogranuloma, sífilis, tuberculose, etc. Alteraçao da musculatura e inervação: Dolicocólon, doença diverticular dos cólons, dermatomiosite, distrofia miotônica. Lesões do reto e ânus: prolapso, estenoses, tumores, fissuras. Diverticulose É definida pela presença de pequenas bolsas projetadas para a parte de fora da parede do intestino grosso. São os divertículos. É pouco comum nas regiões do mundo em que se consome uma dieta que contém alto índice de fibra, e que é mais rica em grãos, frutas e vegetais. Uma dieta com pouca fibra causa constipação, fazendo a pressão aumentar dentro do trato digestivo ao fazer esforço para defecar. A combinação da pressão e o esforço com o passar dos anos, muito provavelmente, evolue para a diverticulose. Etiopatogenia B – Neurogênicas: megacólon chagásico, Hirschsprung, parkison, AVC, esclerose múltipla, etc. C - Doenças endócrinas- doenças da tireóide, doenças do metabolismo do cálcio, diabetes,feocromocitoma, insuficiência renal, etc. D - Medicamentos - antidepressivos, antiespasmódicos, analgésicos opiáceos, anticonvulsivantes, antiácidos, antihipertensivos e antiinflamatórios. E - Psicogênica e psiquiátricos - pacientes que sofreram abuso sexual, ou ginecopatia, psicose, anorexia nervosa. F - Idiopáticas: de causa desconhecida, como os distúrbios motores não chagásico e da inércia colônica ou as que ocorrem na síndrome do intestino irritável. O problema terapêutico mais importante é evitar a impactação fecal e a formação de um fecaloma retal (acúmulo no reto de fezes desidratadas). Diagnóstico Na confirmação da constipação intestinal, a etapa inicial consiste na exclusão de causas orgânicas intestinais e sistêmicas. A avaliação deve sempre se basear na alteração em relação ao hábito intestinal prévio de cada indivíduo. História longa, sem a associação precisa a nenhum fator específico é sugestiva de maus hábitos alimentares e comportamentais. Introdução de algum medicamento. Início SÚBITO em pacientes idosos quando a presença de dor ou sangramento anorretal podem ser um indicativo câncer colorretal. A anamnese, o exame físico geral e o exame proctológico apontam o diagnóstico etiológico em uma grande maioria dos casos. Diagnóstico Avaliação Orgânica: Anamnese cuidadosa, atento ao início dos sintomas. De longo, médio prazo ou abrupto. Indagar sempre sobre os hábitos alimentares (qualidade e quantidade). Indagar sobre horário das evacuações e uso de medicamentos. Diagnóstico Sinais de alarme: Mudanca súbita de hábito intestinal. Perda de pêso inexplicavel. Perda de sangue nas fezes. História familiar de câncer de cólon ou doenças inflamatórias. Idade acima de 50 anos. Anemia ao exame físico. Dor no baixo ventre, além da constipação. Exame físico Distensão abdominal, massas ou tumores abdominais; cicatrizes abdominais de traumas e ou cirúrgicas. Inspeção da região perineal - fístulas,fissuras e aspectos de doenças sexualmente transmissíveis, trauma ou abuso sexual. Toque retal- avaliar tônus do esfíncter, calibre do canal anal, presença de lesões e abscessos e estruturas extra retais como próstata e útero. Exames complementares Não existe nenhum exame “padrão ouro”, para o diagnóstico de constipação intestinal. Exames bioquímicos: Hemograma,glicemia, perfil bioquímico, SU,Urocultura, função da tireóide. Colonoscopia – principalmente em pacientes com sinais de alarme. Enema opaco – avalia o tamanho e morfologia do intestino. Defecografia – Anatomia e dinâmica da evacuação. Avaliação funcional Determinação do tempo colônico – A administração de um marcador radiopaco e radiografias diárias- retenção de 20% do contraste no quinto dia. Eletromiografia de cólon – Introdução de eletrodos na forma de anel via colonoscopia - Muita trabalhosa do ponto de vista prático. Manometria anoretal – Medição da pressão anorretal – diferenciar a constipação idiopática da doença de Hirschsprung, que nem a radiologia nem a histopatologia conseguiu diferenciar. Eletromiografia do esfíncter anal – Detecta dissinergia da musculatura da região anal. Avaliação da personalidade É essencial obter uma história de vida do paciente, a fim de detectar “traumas emocionais” e conflitos mal resolvidos. Detectar possível ocorrência de abuso sexual. Tratamento Medidas gerais: Abolir o uso de medicamentos. Tratar doenças metabólicas. Relação médico paciente – Conquistar a confiança do paciente. Tentar manter um horário para evacuar (após café da manhã). Tratar parasitoses. Tratar as afecções ano- retais. Prática de exercicios físicos ( reforço da musculatura abdominal). Coibir o uso de laxantes, principalmente os irritantes da mucosa. Dieta rica em fibras. (Historicamente os alimentos industrializados permitiram maior conservação dos alimentos porém foram desprovidos de fibras). Tomar bastante líquido. Psicoterapia. Medicamentos Incrementadores do bolo fecal: são substâncias que retêm água, aumentam o volume fecal, diminuindo sua consistência e facilitando a evacuação. São as fibras alimentares e podem ser usado por tempo indeterminado. As fibras podem ser solúveis e insolúveis,( metilcelulose, semente de plântago, ágar e farelode trigo). Lubrificantes: são substâncias oleosas que facilitam o deslizamento das fezes. Diminui a absorção de vitaminas lipossolúveis. Não são recomendadas para o uso prolongado. O mais comum é o óleo mineral. Agentes osmóticos: são substâncias que retiram a água do sangue e da luz intestinal. Sais de magnésio e os açúcares inabsorvíveis como a lactulose, o sorbitol e a glicerina ( Sigmalac, manitol, Lactulona, etc) Os inconvenientes são o custo e o risco de desenvolvimento de distensão e flatulência devido a fermentação destes açúcares pelas bactérias do cólon. Laxantes estimulantes - são substâncias que aumentam a motilidade intestinal. Tais como senna, cáscara-sagrada, fenolftaleína e bysacodil, podem levar a complicações, como a destruição do plexo mioentérico e portanto devem ser evitados. DICAS PRÁTICAS: Uma vez que a avaliação inicial tenha afastado uma possível causa orgânica institui-se um esquema terapêutico inicial durante trinta dias, o qual inclui dieta rica em fibras. Permite excluir as formas menos graves e relacionadas à deficiência de fibras na dieta, responsável por grande parte dos casos. Em boa parte dos casos, as medidas dietéticas e comportamentais não resultam no efeito desejado, pois implicam em mudanças nos hábitos de vida e os pacientes frequentemente retornam com os antigos hábitos após a normalização das evacuações. O uso abusivo e crônico de laxantes, principalmente nos idosos, torna esses pacientes mais difíceis de tratar. A fisiologia normal pode levar semanas para retornar a sua normalidade. Tratamento Cirúrgico: Miotomia anorretal ( Hirschsprung). Colectomia total e parcial com ileorretoanastomose ( 25% permanecem constipados; 22% apresentaram diarréia e 11% incontinência fecal). Complicações Diverticulose: saculações do revestimento interno do intestino para fora de suas paredes. Hemorróidas: dilatações tortuosas dos vasos sanguíneos da região anal, que podem sangrar, além de causar dor e coceira, provocada por fezes ressecadas e esforço exagerado ao evacuar. Fissuras anais: pequenos "cortes" na região anal, provocada por fezes ressecadas e esforço ao evacuar, gerando dor, sangramento e ardência ao evacuar. Câncer do Intestino: com o aumento do tempo do trânsito intestinal há aumento da formação econtato de substâncias cancerígenas encontradas nas fezes, além da alteração da flora intestinal. Incontinência Fecal - o prolongado esforço evacuatório leva a descida excessiva do períneo e flacidez pélvica, acarretando uma constante sensação de evacuação incompleta, que resulta em esforço evacuatório adicional.