PARTE 4 Neurociência dos Estados Corporais Capítulo 16 A Consciência Regulada Os Níveis de Consciência e os seus Mecanismos de Controle. O Ciclo Vigília-sono e outros Ritmos Biológicos Clique nas setas verdes para avançar/voltar ou ESC para retornar ao menu geral Muitos são os ritmos da vida. A apresenta a variação circadiana de um parâmetro comportamental (grau de alerta) e índices fisiológicos (temperatura corporal, concentrações sanguíneas de hormônios e a excreção urinária de K+). Em B, constata-se que a temperatura corporal das mulheres, quando medida sempre à mesma hora, apresenta também uma variação infradiana que atinge o pico no período da ovulação. C apresenta a ritmicidade ultradiana da concentração sanguínea do hormônio luteinizante, medida na mulher no décimo-quinto dia do ciclo mensal, após a ovulação. Neste experimento, um indivíduo submeteu-se ao registro diário de seus períodos de sono (barras pretas). Inicialmente, dormia regularmente à meianoite e acordava em torno das 8 da manhã. No sexto dia, todas as pistas que pudessem indicar-lhe o andamento do tempo foram retiradas (relógios, sons externos, variações de luminosidade etc.). Seus períodos de sono foram então se afastando gradativamente, passando a obedecer a um ciclo em torno de 26 horas No 84o dia os pesquisadores lhe forneceram pistas invertidas da sequência dia-noite, e ele voltou ao ciclo de 24 horas, mas passou a dormir ao meio-dia, acordando às 8 da noite. No centésimo dia o experimento se encerrou, e o indivíduo voltou ao ritmo circadiano normal Componentes básicos dos sistemas temporizadores que sincronizam os ritmos internos de cada indivíduo com os ciclos naturais. Os componentes neurais do sistema temporizador circadiano dos mamíferos incluem um marcapasso no hipotálamo (o núcleo supraquiasmático), seus aferentes provenientes das células ganglionares fotorreceptoras e do tálamo (núcleo geniculado lateral ventral), eferentes ao prosencéfalo basal e ao tálamo, e eferentes a outros núcleos do hipotálamo (não ilustrados). O ritmo circadiano da atividade locomotora de um animal de laboratório pode ser registrado através de dispositivos simples como o que está ilustrado em A: trata-se de uma roda que o animal utiliza com muita frequência, cujas rotações são registradas em um computador, indicando a atividade locomotora diária do animal. Os registros diários são então compostos em sucessão de cima para baixo pelo computador, gerando o gráfico mostrado em B. Neste experimento (B), o animal mostra um ritmo circadiano bastante regular até o momento da remoção bilateral dos núcleos supraquiasmáticos (seta), quando sua atividade se torna totalmente irregular. O núcleo supraquiasmático funciona ciclicamente mesmo quando é isolado do cérebro e cultivado em laboratório por alguns dias. Neste experimento, os pesquisadores inseriram um gene que produz uma substância luminescente sob controle de um generelógio dos neurônios do núcleo. A expressão cíclica desse generelógio era indicada pela bioluminescência do núcleo (A), e representada pela curva azul em B. A luminescência crescente mostrou-se correlacionada com o número também crescente de neurônios ativos, como mostra o gráfico de barras. Observando o núcleo em maior aumento (C), foi possível identificar os neurônios, cinco dos quais tiveram a sua luminescência registrada individualmente (D, curvas de diferentes cores). O sistema temporizador circanual reconhece as estações do ano por meio da monitoração da duração dos dias, feita pelo núcleo supraquiasmático com informações da retina, e das noites pelo aumento da concentração sanguínea do hormônio melatonina. Seus componentes envolvem um longo circuito que termina na glândula pineal, que por sua vez secreta melatonina. Este hormônio parece ser o efetuador dos fenômenos fisiológicos que variam com as estações do ano. Quanto mais longa a noite (no inverno), maior fica a concentração de melatonina no sangue, e mais intenso o seu efeito sobre os órgãos e tecidos periféricos. Produção diária de melatonina pineal, avaliada por microdiálise da glândula de um animal antes e após a indução do quadro de diabetes por estreptozotocina. A utilização do aparelho estereotáxico para a localização precisa de regiões intraencefálicas não evitou o erro virtuoso de Horace Magoun (foto) e seu colega Giuseppe Moruzzi. Foto de 1957 publicada em L. H. Marshall e H. W. Magoun (1998) Discoveries in the Human Brain. Humana Press, EUA. A. A posição relativa dos núcleos que participam dos sistemas moduladores difusos pode ser representada em uma vista dorsal do tronco encefálico (como indica a luneta, acima). B. Muitos neurônios desses núcleos emitem fibras extensas, frequentemente bifurcadas, com ramos ascendentes e descendentes. Neste exemplo, um neurônio da formação reticular está representado em vista lateral do tronco encefálico (como indica a luneta correspondente), rodado 90 graus em relação a A. Os sistemas moduladores noradrenérgicos (grupo A) e adrenérgicos (grupo C) originam-se no tronco encefálico. Em A, os sistemas noradrenérgicos estão representados em azul e os adrenérgicos, em vermelho. B representa em separado as extensas conexões noradrenérgicas do locus ceruleus (A4 e A6). Os sistemas moduladores dopaminérgicos também são incluídos no grupo A porque as técnicas histoquímicas iniciais não eram capazes de distingui-los dos noradrenérgicos e adrenérgicos. Os sistemas moduladores serotoninérgicos (grupo B) apresentam neurônios concentrados na linha média do tronco encefálico e do mesencéfalo. Os mais rostrais emitem axônios ascendentes, enquanto os mais caudais projetam para a medula. Os sistemas moduladores colinérgicos (A) têm neurônios situados no prosencéfalo basal (Ch1-Ch4) e no tronco encefálico (Ch5 e Ch6). Há também neurônios colinérgicos de axônios curtos no corpo estriado. Os sistemas histaminérgicos (B) têm origem no hipotálamo posterior (E1-E5). O EEG é o registro amplificado (em um formulário contínuo em movimento, ou em um monitor) das ondas produzidas pelas minúsculas variações de voltagem que ocorrem no cérebro de uma pessoa, captadas por pares de eletródios colocados em locais padronizados do couro cabeludo. O que o eletródio capta na superfície da cabeça é a soma algébrica, a cada momento, dos potenciais elétricos produzidos pela atividade sináptica no córtex cerebral. Esses fenômenos elétricos são conduzidos através do meio iônico que compõe os vários tecidos da cabeça, mas chegam muito atenuados ao eletródio, e por isso devem ser amplificados para visualização. Suponhamos que o EEG seja produzido pela soma algébrica da atividade dos neurônios numerados em A. Quando a atividade de cada neurônio é independente dos demais (B), a soma algébrica gera um traçado de baixa amplitude e alta frequência (EEG dessincronizado). Mas quando a atividade dos neurônios for sincronizada, simultânea, a soma algébrica produz um traçado © de alta amplitude e baixa frequência (EEG sincronizado). O mapa representa a distribuição espacial do ritmo α do EEG em um indivíduo normal. As cores correspondem às amplitudes dos traçados alinhados à esquerda, para cada região de posicionamento dos eletródios. As letras com números mostram o posicionamento dos eletródios. Observar que o ritmo α (mais sincronizado) predomina nas regiões posteriores (occipitais, parietais e temporais posteriores), com maior amplitude no lado direito. A transição da vigília para o sono de ondas lentas é registrada no eletroencefalogra ma (EEG) como a passagem de um ritmo rápido e de baixa amplitude (traçado superior) para ritmos cada vez mais lentos e de alta amplitude (estágios 1-4). O eletro-oculograma (EOG) e o eletromiograma (EMG) mostram a diminuição dos movimentos oculares e corporais. No entanto, tudo muda no sono paradoxal (traçados inferiores): o EEG torna-se novamente dessincronizado, aparecem movimentos oculares rápidos e ocorre atonia muscular. Uma típica noite de sono de um adulto jovem (A) se caracteriza por vários episódios de sono paradoxal (em vermelho) alternados com os estágios do sono de ondas lentas e alguns momentos fugazes de vigília (em laranja). O adulto idoso, entretanto (B), não chega aos estágios mais profundos do sono de ondas lentas, tem menos episódios de sono paradoxal e desperta um maior número de vezes durante a noite. Os neurônios talâmicos apresentam dois modos de operação. O modo de transmissão (A) é característico da vigília, como indica o traçado do EEG. O registro intracelular mostra que cada potencial pós-sináptico excitatório (PPSE) resulta em um potencial de ação (PA). O modo de disparo em salvas (B), característico do sono de ondas lentas, apresenta uma salva de PAs para cada PPSE, e depois um longo período de hiperpolarização. O núcleo reticular (em azul) forma uma espécie de “casca” que cobre o resto do tálamo (em violeta) lateralmente. Seus neurônios (em vermelho) emitem axônios inibitórios aos núcleos talâmicos específicos (como o núcleo geniculado lateral, por exemplo). Quando os neurônios reticulares estão ativos, os talamocorticais passam do modo de transmissão ao modo de disparo em salvas. O tálamo, bem como o prosencéfalo basal, é também modulado por aferentes aminérgicos e colinérgicos vindos do tronco encefálico. Esquema sumário dos circuitos envolvidos com o sono de ondas lentas e o sono paradoxal. Não estão representadas as projeções longas do locus ceruleus, dos núcleos da rafe e da formação reticular. Nestes experimentos, os pesquisadores registraram em gatos os potenciais de ação (representados por traços verticais) de diferentes neurônios cuja atividade pudesse estar relacionada com o sono. Os traçados alinhados horizontalmente (1 a 6) representam a atividade de neurônios individuais durante a vigília (à esquerda), o sono de ondas lentas (no meio) e o sono paradoxal (à direita). Os traçados polissonográficos estão representados acima, em vermelho. Em uma noite de sono, ciclos de sono de ondas lentas e de sono paradoxal alternam-se, em consonância com os ciclos de disparo dos neurônios colinérgicos (geradores de sono paradoxal), e neurônios aminérgicos (geradores de sono de ondas lentas). Com o animal acordado (A), aplica-se uma estimulação elétrica no hipocampo através de finos eletrodos. Algum tempo depois (B), o animal revela expressão do gene imediato zif-268 no hipocampo (seta). Quando o animal adormece (C), a expressão do gene desloca-se para o córtex cerebral (setas).