Uma ameaça silenciosa Avaliação do histórico familiar de hemorragia cerebral em que há suspeita de aneurisma é essencial para prevenção O curto espaço de tempo entre as mortes de Laura Ribeiro Cardoso, em 25 de julho, e Victória Corrêa da Camara Gerstner, cinco dias depois, levantou suspeitas de que a incidência de aneurismas cerebrais rotos (que se rompem) entre jovens teria aumentado. Especialistas advertem, no entanto, que qualquer faixa etária pode ser atingida, e os mais propensos estão entre 50 e 60 anos. O aneurisma cerebral é a formação de uma bolha na parede de uma artéria que irriga o cérebro. A maior parte das pessoas só descobre a doença quando essa bolha explode, causando uma hemorragia que pode matar em minutos, dependendo da extensão do Dor de cabeça sangramento. No Brasil, típica de um aproximadaaneurisma mente 15 mil rompido pacientes por têm hetem início ano morragia causúbito e forte sada por aneuQuando intensidade risma. ocorre o rompimento, 10% morrem antes de chegar ao hospital, e entre 30% e 40% não resistem apesar do tratamento. Para o chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Mãe de Deus, na Capital, e presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, Luiz Carlos de Alencastro, existem formas de se prevenir: – Podemos reduzir o número dessas hemorragias catastróficas reconhecendo os fatores de risco. É preciso diminuir o fumo e controlar a pressão alta. Além disso, quando mais de uma pessoa da família tiveram hemorragia cerebral 4 VIDA em que há suspeita de aneurisma, o indivíduo deve investigar com exames. Ao se descobrir a doença precocemente, as chances de contornála são muito maiores. E, mesmo quando a bolha se rompe, muitos casos são operáveis e permitem uma vida normal. A neurologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e do Hospital Moinhos de Vento e coordenadora da Rede Brasil AVC, Sheila Cristina Ouriques Martins, alerta para a importância do diagnóstico correto na primeira ida ao médico. – O maior problema é que, dos que chegam vivos ao hospital, 12% não são diagnosticados imediatamente. Isso ocorre porque, geralmente, quem procura a emergência por dor de cabeça tem, na verdade, enxaqueca. Mas essa dor não pode ser subestimada – diz Sheila. É preciso estar atento às características da dor de cabeça típica de um aneurisma cerebral rompido: muito intensa, iniciada subitamente, descrita pelo paciente como a pior de sua vida e, na maior parte das vezes, associada a vômitos. Depois de identificado o problema, o procedimento mais indicado é a cirurgia, em que se coloca um miniclipe metálico na base do aneurisma, e o paciente fica curado. O método não impede, entretanto, que a doença volte a aparecer em outros pontos da artéria nos anos seguintes. Por isso, deve-se manter uma rotina de exames preventivos para evitar um outro susto. – Descobrir um aneurisma antes que ele rompa é uma sorte grande. Se conseguir, os índices de mortalidade são extremamente baixos – indica Alencastro. Saiba mais PERFIL Casos de aneurisma roto (rompido): > São mais frequentes entre mulheres > O risco de rompimento aumenta com a idade (a média é aos 55 anos) > Histórico familiar de aneurismas cerebrais rompidos também eleva as chances O QUE É Aneurisma cerebral é a dilatação anormal de uma artéria que irriga o cérebro, geralmente localizado nos pontos em que ela se bifurca (mais frágeis). Pode se romper e causar uma hemorragia cerebral ou permanecer sem estourar durante toda a vida. Os aneurismas também podem ocorrer em qualquer artéria do corpo, como as de coração, rim e abdômen. Os do tipo cerebral e da aorta torácica e abdominal apresentam altas taxas de mortalidade. FATORES DE RISCO Os dois principais fatores de risco para formação e/ou ruptura de um aneurisma são o fumo e a pressão alta não controlada. Doenças que aumentam o risco de fragilidade das artérias cerebrais, como as do colágeno (síndromes de Marfan e de Ehler Danlos) e a renal policística, também influenciam. CAUSAS O aneurisma surge pelo enfraquecimento ou defeito da parede arterial. A pessoa pode nascer com o problema ou adquiri-lo com o passar do tempo, a partir de fatores como hipertensão (não controlada com medicamentos), tabagismo ou traumatismo (golpes ou ferimentos penetrantes na cabeça). Hemorragia AVC OU ANEURISMA CEREBRAL? O acidente vascular cerebral (AVC) pode ser de dois tipos: > Isquêmico: é o mais comum e ocorre pelo entupimento de um vaso sanguíneo cerebral, resultando em falta de sangue no cérebro por trombose ou embolia. SINTOMAS No cérebro, surgem sinais geralmente quando há ruptura. Em alguns casos, ocorre um sangramento inicial no cérebro, acompanhado de dor de cabeça súbita e intensa, antes do rompimento definitivo (figura). Esta é a hora de procurar uma emergência. Em outras situações, quando o aneurisma se rompe totalmente, dependendo da intensidade do sangramento, a pessoa tem desde dor de cabeça até perda dos sentidos e coma. Deve-se ir ao hospital imediatamente. > Hemorrágico: ocorre quando um vaso sanguíneo se rompe, espalhando sangue pelo cérebro. Uma das causas dessa hemorragia é o aneurisma cerebral rompido. PREVENÇÃO Avaliação o mais cedo possível de pessoas que tenham dois ou mais familiares com histórico de aneurisma rompido, controle da hipertensão arterial, não fumar, beber em excesso ou usar drogas. O risco é menor para quem tem apenas um caso familiar. ROMPIMENTO Pode ocorrer um sangramento espontâneo (quando a pessoa está sentada ou dormindo) ou em situações de aumento súbito de pressão, geralmente em momentos de esforço físico elevado, como durante a prática de exercícios físicos ou o orgasmo. DETECÇÃO O melhor exame para detectar o aneurisma é a arteriografia, uma espécie de cateterismo cerebral. Mas a doença também pode ser detectada por angiografia por tomografia computadorizada, que é um exame não invasivo e rápido. Por isso, geralmente, a angiografia por tomografia é o primeiro exame a ser feito. Se não mostrar um aneurisma, deve ser feita a arteriografia. TRATAMENTO Existem duas formas: > Cirurgia: coloca-se um clipe metálico (figura) na base do aneurisma, excluindo-o da circulação. O paciente fica curado. Miniclipe Embolização endovascular: leva-se um cateter até o aneurisma, no qual são introduzidas pequenas molas, fazendo-o coagular e cicatrizar. Cerca de 20% dos pacientes precisam de novo tratamento, pois o aneurisma pode voltar a se abrir. Fontes: Clovis Roberto Francesconi, neurologista do Hospital Moinhos de Vento, Luiz Carlos de Alencastro, chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Mãe de Deus e presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, e Sheila Cristina Ouriques Martins, neurologista e coordenadora da Rede Brasil AVC Hipertensão deve ser controlada Um enfraquecimento ao longo dos anos na parede da artéria é uma das causas da formação de um aneurisma cerebral. Existem fatores que podem influenciar esse processo. O neurologista Clovis Roberto Francesconi afirma que o tabagismo, a hipertensão não controlada (sem medicamentos) e o uso de anticoncepcional oral estão entre os maiores culpados. – A hipertensão arterial vai danificando a parede, e os vasos não são feitos para tolerar pres- sões elevadas. Podemos comparar o aneurisma a um balão. Quanto você assopra, se há uma área mais frágil, ela ficará dilatada – compara. Às vezes, um traumatismo na cabeça também pode causar o aparecimento da bolha. O álcool, segundo Francesconi, contribui, mas não chega a ter tanta importância quanto o cigarro ou a pressão alta. Para se prevenir, é essencial manter uma vida saudável, com boa alimentação e exercícios físicos. > O aneurisma cerebral afeta de 1% a 5% da população adulta > Em 50% dos casos, o aneurisma não se rompe – o que significa que a pessoa tem uma vida normal e pode nem ficar sabendo do problema > Menos de 1% dos aneurismas se rompe antes dos 20 anos > Quem tem dois ou mais familiares com aneurisma rompido apresenta 8% de risco de ter a doença > Quando o aneurisma é rompido, Outros inimigos sem sintomas 10% dos pacientes morrem antes de chegar ao hospital. Outros 30% a 40% também não resistem, apesar do tratamento hospitalar O aneurisma cerebral é considerado uma doença silenciosa, de difícil detecção. Outros problemas de saúde também não costumam apresentar sintomas, o que pode levar o paciente a ter complicações severas ou até mesmo à morte se não houver o diagnóstico correto. – Pressão alta, colesterol elevado e diabetes, na maior parte das vezes, não aparecem e vão lesando as artérias do corpo até que elas entopem, causando um AVC isquêmico ou um infarto do miocárdio – exemplifica Sheila Cristina Ouriques Martins, da Rede Brasil AVC. De acordo com o neurologista Clovis Roberto Francesconi, uma doença que causa sangramento no cérebro e pode permanecer “quieta” por anos, assim como o aneurisma, é a malformação arteriovenosa (MAV), quando o indivíduo nasce com os vasos sanguíneos anômalos formando uma espécie de novelo. – Esse novelo tem vasos mais frágeis, o que pode levar a uma hemorragia cerebral. Pode causar dores de cabeça, convulsões e, um dia, sangrar. No entanto, é mais difícil que seja uma hemorragia fatal, pois o vaso é mais fino – explica Francesconi. O sangramento de MAV geralmente acomete pacientes mais jovens do que aqueles atingidos pelo aneurisma. Cuidados essenciais > Controle a pressão alta > Evite fumar, beber ou usar drogas > Mantenha uma vida saudável, com boa alimentação e exercícios físicos > Se tiver suspeita de algum problema, consulte um médico > Em caso de dor de cabeça súbita e intensa, dirija-se a uma emergência ZERO HORA, SÁBADO, 7 DE AGOSTO DE 2010 Números da doença > Após o rompimento, dos pacientes que chegam com vida ao hospital, 12% não são diagnosticados na primeira visita à emergência > Dos pacientes que sobrevivem, 45% têm problemas de memória que prejudicam a qualidade de vida e 25% têm sequelas graves que os tornam dependentes de outras pessoas para as atividades do dia a dia > A ruptura de aneurisma é responsável por 5% do total de acidentes vasculares cerebrais (o aneurisma é um tipo de AVC hemorrágico). No Brasil, são aproximadamente 15 mil pacientes com hemorragia causada por aneurisma cerebral por ano, com uma taxa de mortalidade de 45%. > A chance de um aneurisma romper em um prazo de cinco anos depende do seu tamanho: Sete milímetros: chance de romper é próxima a zero em cinco anos Sete a 12 milímetros: 2,6% 13 a 25 milímetros: 14,5% 25 milímetros: 40% > Entre 5% e 40% das pessoas com rim policístico desenvolvem aneurisma VIDA 5