MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
PROCURADORIA-GERAL
CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO
FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2120/2013
CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO
DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
Origem:
PRT 11ª Região
Interessado(s) 1:
Ministério Público no Estado do Amazonas –
MPE/AM
Interessado(s) 2:
A de P. M. Pinheiro / Município de Boca do Acre –
AM.
Interessado(s) 3:
Ministério Público do Trabalho
Assunto(s):
Trabalho na Administração Pública 04.06 / Temas
Gerais 09.04 / 09.10
Procuradora oficiante: Alzira Melo Costa
“REGISTRO EM CTPS – Necessidade de
início das investigações, visando melhor
instrumentalização do feito de forma a
subsidiar uma adequada e efetiva análise
revisional. Pela não homologação da
promoção de arquivamento sub examine.
RELATÓRIO
Trata-se de procedimento administrativo instaurado a
partir do encaminhamento de representação pelo Ministério Público do
Estado do Amazonas, em que noticiado o descumprimento deliberado de
normas trabalhistas pela empresa A. de P. M. Pinheiro, prestadora de
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serviços contratada pelo município de Boca do Acre, responsável pelos
serviços de limpeza pública na localidade.
Narra o ofício encaminhado pelo Parquet estadual ao
Ministério Público do Trabalho (fl. 10), verbis:
“Considerando as atribuições constitucionalmente
estabelecidas ao Ministério Público do Trabalho, venho
pelo presente informar, para as devidas providências
pertinentes à espécie, que os garis de Boca do Acre/AM,
que prestam serviço por meio da empresa A. deP. M.
Pinheiro, não estavam recebendo seus haveres
trabalhistas corretamente, circunstância que chegou a
meu conhecimento por comunicação direta dos
trabalhadores prejudicados.
No afã de ajudar no rápido recebimento das
verbas de natureza alimentar, encaminhei alguns
expedientes à Prefeitura Municipal, com os quais
também obtive algumas informações valiosas para o
encaminhamento jurídico da questão. Por meio dos
referidos expedientes, foi possível sanear atrasos que
estavam acontecendo, envolvendo salários do corrente
ano e, ainda, 13º salário do ano passado.
Contudo, a terceirizada se nega, ainda a assinar
as Carteiras de Trabalho e Previdência Social dos
empregados, havendo, também, muito provavelmente,
ausência de recolhimentos previdenciários e fundiários.
Durante as tratativas com a Prefeitura, houve
advertência de que toda a contração da empresa seria
investigada por esta Promotoria, sendo dever do
município, por sua administração, zelar pelo bom
dispêndio do dinheiro público, evitando futura
responsabilidade subsidiária perante a Justiça do
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Trabalho que, vindo a ocorrer, e já estando avisada a
Administração de tal possibilidade, poderia configurar
improbidade administrativa em face do descaso com o
dinheiro público”- grifos nossos.
Em sede de apreciação prévia (fls. 17/18), o i. Órgão
Ministerial oficiante promoveu o arquivamento do procedimento sob os
seguintes fundamentos, verbis:
“(...)
Considera-se,
prima
facie,
tratar-se
de
necessidade de atuação fiscalizatória, o que constituiria
função típica e regular do Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE), a quem cabe verificar, periodicamente,
o cumprimento da lei. Tal atividade é de constatação,
verificação in loco da adequação da conduta da empresa
à legislação pertinente.
A atuação do Ministério Público, por sua vez, é
essencialmente investigativa, sendo certo, porém, que
havendo reincidência, da conduta ilícita, remanescente
aos autos de infração porventura lavrados pelo auditor
fiscal, ai, sim, emergirá repercussão social suficiente a
demandar o exercício das atribuições do Órgão
Ministerial, que também revelam necessárias em
situações de gravidade e/ou urgência, especialmente
quando em risco iminente a vida e a integridade física
dos obreiros. Isto, adotando o entendimento de que os
fatos ora denunciados devem receber dos órgãos
competentes tratamento sistemático, seguindo ordem
lógica e racional de atuação.
Entender de forma diversa importaria em
sobreposição das atribuições dos procuradores do
trabalho e dos auditores discais do Ministério do
Trabalho e Emprego, já que a ambos caberia apurar
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todas e quaisquer denúncias de irregularidades
trabalhistas supostamente praticadas pelas empresas.
Na prática, inclusive, não é raro duplicidade de
denúncias feitas ao MPT e ao MTE, o que gera a
instauração de inquérito civil no Ministério Público do
Trabalho e de outro procedimento administrativo na
Gerência Regional do Trabalho e Emprego em face da
mesma empresa e com o mesmo objeto, o que atenta
contra o princípio da eficiência, consagrado no art. 37
da Constituição Federal.
Nesse passo, tem-se que no caso em apreço a
providência imediata assume nítidos contornos de
fiscalização, podendo eventuais
irregularidades
existentes serem regularizadas através de procedimentos
próprios do Ministério do Trabalho e Emprego...”
Por distribuição deste feito na CCR/MPT, vieram
os autos a esta Relatora.
É o relatório.
VOTO-FUNDAMENTAÇÃO
Data venia dos argumentos expedidos pela digna
Procuradora oficiante neste feito, entendo não caiba, por ora, a cessação da
tarefa persecutória ao encargo do Ministério Público do Trabalho.
A gravidade dos fatos denunciados salta aos olhos,
porquanto relacionados, em suma, ao registro em CTPS, com evidentes
contornos de precarização do trabalho.
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A ausência de anotação em CTPS deve ser
vigorosamente combatida pelo Parquet laboral, pois é situação que elimina
o direito mais
fundamental do trabalhador,
consubstanciado no
reconhecimento da relação de emprego a que está submetido.
A inexistência de oficialização dos contratos
individuais de trabalho impede a obtenção, pelo trabalhador, de plenos
direitos trabalhistas e previdenciários a que faz jus, e mais as práticas
cotidianas da vida civil, onde a identidade laboral é exigida. Ademais, o
descumprimento às regras dos arts. 29 a 40 da CLT podem induzir à prática
da sonegação fiscal e da concorrência desleal.
A situação vivenciada nos autos apresenta-se como
uma das nefastas formas de precarização do trabalho, ou seja, um método
brutal de sonegação de direitos trabalhistas, consubstanciado na estratégia
empresarial de redução dos custos com a produção e com a contratação de
trabalhadores, gerando com isso uma gama enorme de obreiros que são
obrigados a se sujeitarem a condições cada vez mais precárias, com perda
de direitos trabalhistas constitucionalmente assegurados.
O termo precarização do trabalho tem relação com
um conjunto de mudanças econômicas e sociais no mundo do trabalho,
geralmente caracterizado pela desqualificação nas relações de contrato
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trabalhista. Essa questão situa-se num contexto de mudança no padrão de
acumulação de capital, que engendra transformações importantes na
organização da produção de mercadorias. O fenômeno demonstra, mais
uma vez, a velha tendência do processo de produção capitalista quando,
diante das contradições sistêmicas que impedem a manutenção das taxas de
lucro, intensifica a produtividade do trabalho vivo, potencializando um
nível mais elevado de exploração da mais-valia do trabalhador.
Contrário à precarização, nosso direito pátrio
incorporou a concepção de valorização do trabalho humano. Assim, a
centralidade do trabalho na vida pessoal e comunitária da ampla maioria
das pessoas humanas é percebida pela Carta Magna, que, com notável
sensibilidade social e ética, erigiu-a como um dos pilares de estruturação da
ordem econômica, social e, por consequência, cultural do país. A
Constituição Federal estabelece, em seu preâmbulo, que é seu dever
instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos
direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma
sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias. Os direitos sociais e individuais são, assim, o
destino e o principal objetivo de todo o trabalho do Estado Democrático de
Direito.
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Prova disso é que a Constituição estabeleceu, no seu
Título I, como princípio fundamental e como fundamento da República
Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana e o valor social do
trabalho e da livre iniciativa. No mesmo Título, nossa Carta Constitucional
definiu, como objetivo fundamental da República, a construção de uma
sociedade livre, justa e solidária, por meio da garantia do desenvolvimento
nacional, erradicação da pobreza e da marginalização, redução das
desigualdades sociais e regionais e promoção do bem de todos, sem
quaisquer formas preconceito ou discriminação.
Outros dispositivos Constitucionais que disciplinam
o princípio da valorização do trabalho são encontrados nos artigos 6º e 7º,
pois preveem os direitos sociais do trabalhador, garantindo condições
dignas de trabalho, bem-estar e lazer.
A Constituição Federal também determina que a
ordem econômica está fundada no trabalho humano e na livre iniciativa e
tem por finalidade assegurar a todos uma existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observando, dentre outros, o princípio da busca
pelo pleno emprego (art. 170, CF). Por fim, ao tratar da Ordem Social, a
Constituição estabelece que a ordem social tem como base o primado do
trabalho humano e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais (art. 193,
CF).
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A ausência, nestes autos, de ação persecutória do
Ministério Público do Trabalho, no que respeita à questão do não registro
das Carteiras de Trabalho e à dimensão das irregularidades denunciadas,
faz incompleta a necessária instrução investigatória.
Ainda, compulsando o feito, verifica-se que a i.
Colega oficiante promoveu o arquivamento do procedimento de forma
precoce, sob o argumento de que a atuação do Ministério Público do
Trabalho no presente caso assumiria nítidos contornos de fiscalização, não
restando devidamente dimensionadas as lesões atribuídas à empresa
investigada na peça de ingresso.
Com efeito, é indene de dúvidas a assertiva da i.
colega oficiante de que não se deve confundir ou misturar a atividade
fiscalizatória com a investigação, posto que cada atividade é exercida com
uma finalidade distinta e por agentes distintos, sendo a cometida ao MPT
mais ampla porque, da investigação, pode decorrer a adoção de medidas
administrativas e/ou judiciais que objetivam, de pronto, sanear o ilícito,
porventura, apurado.
Todavia, a afirmativa de que a adoção de
posicionamento diverso resultaria na sobreposição das atribuições dos
Procuradores do Trabalho e dos Auditores Fiscais do Ministério do
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Trabalho e Emprego, não se coaduna, data venia, com a afirmativa
imediatamente
anterior,
exatamente
concomitante e concorrentemente
porque,
mesmo
trabalhando
num mesmo caso, tem ambas as
instituições funções diversas. Assim, a competência e a conveniência para
agir do MPT em tais casos subsiste.
Logo, ainda que caiba à SRTE-MTE a fiscalização
de estabelecimentos e/ou instituições quanto à provável ocorrência de
ilícitos trabalhistas, não menos certo é que compete ao MPT a defesa da
ordem jurídica e dos direitos e/ou interesses tuteláveis na forma dos arts.
127 e 129 da Carta Constitucional brasileira.
Destarte,
não
tendo
o
d.
Órgão
oficiante
empreendido qualquer mínima diligência investigatória no intuito de apurar
a conduta da empresa A. de P. M. Pinheiro, não há como acolher a
promoção de arquivamento sub examine.
CONCLUSÃO
Pelo
exposto,
voto
no
sentido
de
NÃO
HOMOLOGAR o arquivamento proposto pela Exma. Procuradora do
Trabalho, Dra. Alzira Melo Costa, à fl. 17/18 do presente expediente
administrativo. Deixo, no entanto, de aplicar o inciso II, do §4º, do art.
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10 da Resolução CSMPT nº69/07, devendo a designação atender às
práticas da Regional.
Brasília, 22 de março de 2013.
VERA REGINA DELLA POZZA REIS
Subprocuradora-Geral do Trabalho
Coordenadora da CCR – Relatora
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