ESTADO DA PARAÍBA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GAB. DES. SAULO HENRIQUES DE SÁ E BENE VIDES
DECISÃO TERMINATIVA
APELAÇÃO CÍVEL 098.2008.000871-11001— 2" Vara de Queimadas
RELATOR : Des. Saulo Henriques de Sá e Benevides
APELANTE : Maria de Fátima Rodrigues
ADVOGADO : Rinaldo Barbosa de Melo
:Carla Alissandra S. Rodrigues
APELADO
APELAÇÃO CINTEL - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE - GUARDA PRETENDIDA PELA TIA - PAIS
PRESENTES - FINALIDADE DE OBTENÇÃO DE BENEFÍCIO
PREVIDENCIÁRIO – IMPOSSIBILIDADE - EXEGESE DOS
ARTS. 23 E 33, § 2°, DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE - PEDIDO IMPROCEDENTE – SEGUIMENTO
NEGADO.
- Somente se justifica modificação de guarda de filho menor, em
tenra idade, do insubstituível convívio e afeto dos genitores, quando
demonstrado prejuízo à sua educação e desenvolvimento, com
ofensa à sua dignidade e aos direitos constitucionalmente
assegurados.
- Não é possível transferir-se a guarda e responsabilidade de menor
à tia para fins exclusivamente previdenciários, tendo os pais plenas
possibilidades de permanecer no seu exercício.
VISTOS, etc.
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta por Maria de Fátima
Rodrigues, contra a decisão de improcedência do pedido (fls. 24/25), proferida pelo MM.
Juiz de Direito da 2' Vara da Comarca de Queimadas, nos autos da Ação de Guarda de
Menor ajuizada em favor de Maria Bianca Rodrigues Macedo.
Naquela oportunidade, o magistrado de 1° grau entendeu não se
vislumbrar, no presente caso, a excepcional situação a ensejar a alteração na guarda da
menor. Asseverou o juiz, que o desejo da interessada não tem amparo legal, pois a
pretensão se reveste de interesses exclusivamente financeiros, tais como a colocação da
criança como dependente da tia para fins previdenciários.
A apelante, às fls. 27/29, pugna pela procedência da apelação, para
que seja reformada a sentença de 1° grau, de modo que se acolha o pedido inicial.
A douta Procuradoria de Justiça (fl. 40/43) opinou no sentido do
desprovimento do recurso.
É o relatório. Decido.
Is
•
Trata-se de recurso de apelação interposto por Maria de Fátima
Rodrigues, irresignada com a decisão proferida nos autos da Ação de Guarda proposta em
favor da menor Maria Bianca Rodrigues Macedo, que julgou improcedente o seu pedido.
Ressalta-se, primeiramente, que é pacificado tanto na
jurisprudência, quanto na doutrina, o entendimento de que o interesse do menor prevalece
sobre os dos seus progenitores.
Segundo dispõe o § 2° do art. 33 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, a guarda somente será deferida, excepcionalmente, fora dos casos de tutela e
adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou
responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos
determinados.
Estabelece ainda o art. 22 do mesmo diploma que a falta ou a
carência de recursos materiais dos genitores não constitui motivo suficiente a autorizar a
perda ou suspensão do pátrio poder.
Portanto, a guarda do menor somente deve ser modificada segundo
o precípuo interesse do infante e mediante comprovação de fatos relevantes que
desmereçam a atuação do guardião. E, não havendo provas de que a menor esteja passando
por dificuldades, a guarda não deve ser alterada.
Compulsando os autos, verifica-se que não há nenhuma prova cabal
que justifique a retirada da guarda da menor dos seus genitores, ao contrário, o estudo
social realizado demonstra que a intenção de modificar a guarda decorre apenas de
interesses financeiros.
A própria requerente, Sra Maria de Fátima Rodrigues, deixa claro
que o pedido de guarda se presta, principalmente, a fins previdenciários e não para suprir a
ausência dos pais ou qualquer ato de abandono.
Ressalta-se, ainda, que a genitora da menor informou que reside
com seus pais e que por possuir renda insuficiente para a manutenção da sua filha, conta
com as ajudas financeiras fornecidas pela tia, aqui apelante.
Imperioso salientar que a alteração da guarda conforme pretendida
pela apelante, só irá estabelecer uma situação jurídica que não corresponde à situação
fática, já que a guarda de fato continuará com a mãe.
•
Dessa forma não se faz necessária a transferência da guarda, pois a
intenção da tia com a presente demanda de garantir a assistência material da criança poderá
ser perfeitamente atingida se continuar auxiliando financeiramente a genitora daquela, sem
que haja a necessidade de mudança da guarda.
A propósito, Antônio Chaves leciona:
O que se deve evitar é a constituição de guardas somente com
vistas à percepção do beneficio previdenciário, pois o encargo é muito mais amplo,
conferindo a seu detentor a responsabilidade de prestar assistência moral, material e
educacional à criança ou adolescente. É comum os avós postularem a guarda do neto,
quando a mãe (ou o pai) com eles reside, trabalha, mas só tem a assistência médica do
INSS e quer beneficiar seu filho com o IPE ou com outro convênio. Entendo, respeitando
posições em contrário, que tais pedidos devem ser indeferidos, porque a situação fcitica,
nesses casos, estará em discrepância com a jurídica. Em suma, é uma simulação, com a
qual o MP, como custoslegis, e o Juiz competente não podem ser coniventes, sob pena de
se fomentar o assistencialismo às custas de entidades não destinadas a esse fim'
(Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, LTr, São Paulo, 1994, n. 53, p.
150).
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1 1.
No Supericir Tribunal de Justiça já se fixou:
CIVIL. VIOLAÇÃO. LEI FEDERAL. PREQUESTIONAMENTO.
AUSÊNCIA. SÚMULA N. 282 E 356/STF. GUARDA DE MENOR.
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PAIS
PRESENTES. FINALIDADE DE OBTENÇÃO DE BENEFÍCIO
PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. I. Ausente o
prequestionamento da questão federal, impossível suplantar o óbice das
Súmulas n. 282 e 356/STF. II. Não é possível conferir-se a guarda de
menor à avó para fins exclusivamente previdenciários, se os pais têm
plena possibilidade de permanecer no seu exercício. III. Precedentes do
STJ. IV. Recurso especial conhecido em parte, pela divergência, e
improvido. (REsp n. 87900/RJ, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Quarta
Turma, j. 4-6-02)
No mesmo sentido, colacionam-se precedentes do Tribunal de
Justiça de Santa Catarina:
APELAÇÃO CÍVEL - PEDIDO DE GUARDA DE MENOR
FORMULADO PELA BISAVÓ MATERNA - FINS MERAMENTE
PREVIDENCIÁRIOS - AUSÊNCIA DE REQUISITO ENSEJADOR INTELIGÊNCIA DO ART. 33, § 2°, DO ECA - IMPOSSIBILIDADE PRESENÇA DOS PAIS - ALEGAÇÃO DE NULIDADE - APLICAÇÃO
DO PRINCÍPIO PAS DE NULITÉ SANS GRIEF RECURSO
DESPROVIDO. O sistema de nulidades processuais rege-se pelos
princípios da finalidade e da ausência de prejuízo, de modo que a
mitigação do rigor formal em prol da final. O sistema de nulidades
processuais rege-se pelos princípios da finalidade e da ausência de
prejuízo, de modo que a mitigação do rigor formal em prol da finalidade é
critério que se impõe por imperativo da missão constitucional desta Corte
e observância aos métodos de exegese que devem nortear a conduta do
hermeneuta (STJ, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). - Não há de ser
deferida a guarda de menor à terceiro, mesmo que parente próximo e com
a anuência dos pais, se mencionada mudança tem por único escopo meros
efeitos previdenciários, a despeito da redação contida no art. 33, § 2°, do
Estatuto da Criança e do Adolescente.(Apelação Cível n. 03.004148-6, de
Tubarão, rel. Des. Dionízio Jenczak, Primeira Câmara de Direito Civil, j.
22-3-03).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE GUARDA E RESPONSABILIDADE
DE MENOR. PEDIDO FORMULADO PELO AVÔ MATERNO.
ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DA MÃE.
REQUERIMENTO COM FINS PREVIDENCIÁRIOS.
IMPOSSIBILIDADE. EXEGESE DOS ARTIGOS 23 E 33, § 2°, DA LEI
8.069/90, C/C ARTIGO 16, § 2°, DA LEI 8.213/91, COM REDAÇÃO
AL IERADA PELA T PI 9.528/97. APELO DESPROVIDO. O
entendimento jurisprudencial dominante nesta Casa é no sentido de afastar
a possibilidade de transferência de guarda de menor com fins
exclusivamente previdenciários. Outrossim, o artigo 16, §2°, da Lei
8.213/91, com redação alterada pela Lei 9.528/97, expressamente prevê
que, para fins de recebimento de pensão, somente serão reconhecidos
como dependentes do beneficiário o enteado e o menor tutelado, não se
prestando o instituto da guarda para tal finalidade. (Apelação Cível n.
2002.015904-8, de Brusque, rel. Jorge Schaefer Martins, Segunda Câmara
Civil, j. 29-8-02).
Destarte, diante da ausência dos requisitos necessários, não se
justifica a transferência da guarda da menor à tia, apenas com objetivos de obter benefícios
da Previdência.
Ante o exposto, com fulcro no art. 557 do CPC, NEGO
SEGUIMENTO ao recurso de apelação, para manter a sentença de 1° grau em todos os seus
termos.
3i.
Publique-se e intime-se.
João Pessoa, 04 de maio de 2010.
Des. Saulo
Relator
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