Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho ACR 11456/SE (0000477-72.2011.4.05.8500) APTE : PAULO SERGIO NUNES DE SANTANA ADV/PROC : CARLOS ALBERTO MENEZES APDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ORIGEM : 2ª Vara Federal de Sergipe RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVALHO (Relatório) O desembargador federal Vladimir Souza Carvalho: Apelação criminal desafiada pelo réu, atacando a sentença que o condenou pela prática dos crimes previstos nos artigos 293, § 1º, inciso III, alínea b, combinado com o artigo 334, § 1º, alínea c, todos do Código Penal. Narra a denúncia que, no dia 30 de setembro de 2008, através de autuação da Receita Federal, foi encontrada na empresa Santana Joias Ltda., administrada pelo ora recorrente, grande quantidade de relógios expostos à venda, destituídos do selo obrigatório de controle do IPI, fruto de introdução clandestina no território nacional. A sentença esgrimida, depois do provimento parcial dos embargos declaratórios (f. 443-445), cominou a pena mínima para ambos os ilícitos, totalizando, destarte, três anos de reclusão, substituídos por duas sanções restritivas de direitos, cumuladas com a obrigação de pagar quantia correspondente a trinta dias-multa, no valor unitário de um sexto do salário mínimo vigente à época dos fatos, com correção monetária, na forma legal, f. 410-419. Nas razões recursais, f. 468-481, o apelante aduz preliminar de nulidade, por falta de perícia na mercadoria apreendida, ao argumento da sua imprescindibilidade nos casos de crimes que deixam vestígios, conforme determina a norma abrigada no artigo 158, do Código Penal. No mérito, assevera existir um descompasso entre a acusação e a sentença, visto que a denúncia lhe imputa, apenas, o delito de vender mercadoria desprovida do selo de regularidade fiscal (artigo 293, § 1º, inciso III, alínea b, do Diploma Repressor), ao passo que o veredicto lhe impôs, também, a incursão no tipo de descaminho. Sustenta, ainda, que existe apenas um dolo, o de vender os produtos estrangeiros em questão, razão por que os fatos merecem apenamento, tão somente, pelo crime de descaminho, verificando-se a consunção, em lugar do concurso formal imperfeito. Invoca, outrossim, o princípio da insignificância e o instituto do arrependimento posterior, em razão de haver parcelado e pago o atinente débito tributário, consolidado em trinta e cinco mil, quinhentos e vinte e cinco reais e vinte e cinco centavos. Contrarrazões acostadas às f. 484-494, instando pela integral manutenção da sentença verberada. ACR 11456/SE AMPDC Pág. 1 Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho Subiram os autos a esta instância revisora, donde foram à Procuradoria Regional da República, que ofertou parecer opinando pelo improvimento do apelo, f. 500-503. É o Relatório. Ao douto Revisor, na forma regimental. ACR 11456/SE AMPDC Pág. 2 Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho ACR 11456/SE (0000477-72.2011.4.05.8500) APTE : PAULO SERGIO NUNES DE SANTANA ADV/PROC : CARLOS ALBERTO MENEZES APDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ORIGEM : 2ª Vara Federal de Sergipe RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVALHO (Voto) O desembargador federal Vladimir Souza Carvalho: Inicialmente, rejeito a arguição de nulidade por ofensa à norma abrigada no artigo 158, do Código de Processo Penal, a exigir a realização do exame de corpo de delito, por ter a infração deixado vestígios, exatamente, os relógios apreendidos. Isso porque a procedência estrangeira dos produtos ilícitos foi devidamente apurada, mediante prévio procedimento administrativo, no âmbito da Receita Federal (autos anexados), lavrando-se, ao final, o competente auto de infração. Não há espaço, pois, para a arguição da mácula procedimental, à vista da existência de avaliação escorreita sobre a mercadoria, inclusive, revestida de fé pública. Por outro lado, é fácil perceber que o caso não permite a aplicação do princípio da insignificância, uma vez que o débito tributário foi consolidado na significativa importância trinta e cinco mil, quinhentos e vinte e cinco reais e vinte e cinco centavos, bem acima, portanto, do limite para ser enquadrado como crime de bagatela. Entrementes, passando, doravante, ao conhecimento do mérito propriamente dito da irresignação, concluo que existe razão ao apelante, pelo menos, em parte. Em verdade, a ação penal foi deflagrada em virtude de o recorrente ter sido apanhado em flagrante quando vendia, na loja Santana Joias Ltda., duzentos e setenta e cinco relógios de procedência estrangeira, desprovidos do selo de regularidade fiscal. Desta narrativa, esposada na denúncia, é possível enxergar a consumação, apenas, de um único crime, exatamente o de descaminho, devendo, pois, o ilícito de falsificação de papeis públicos, na modalidade descrita no artigo 293, § 1º, inciso III, alínea b, do Código Penal, ser, por este, absorvido. A esse respeito, trago a lume precedente do Superior Tribunal de Justiça, afirmando que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende aplicável o princípio da consunção quando a falsificação do documento é apenas meio ou fase necessária para a sonegação fiscal, não configurando, portanto, crime autônomo (AGREsp 1416908, min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 17 de dezembro de 2013). No mesmo sentido, colaciono paradigma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, decidindo pela incidência do princípio da consunção quando o crime de falsificação de papeis públicos, conduta anterior, foi excluída pela conduta final, consistente na prática do crime de ACR 11456/SE AMPDC Pág. 3 Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho descaminho. Absorção do crime do art. 293, § 1º, “a”, do CP, pelo crime de descaminho quando os selos forem falsificados exclusivamente com o fim de iludir impostos (RSE 27681620104013804, des. Tourinho Neto, julgado em 29 de maio de 2012). Nessa esteira, delimitado o foco, a condenação ressai inafastável. Aliás, o próprio réu confessou, em juízo (mídia acostada à f. 317), a prática do crime de descaminho esquadrinhado, assumindo que expôs à venda os relógios introduzidos ilegalmente no território nacional, conquanto sabendo serem provenientes da China. Dessa forma, não há como excluir esta conduta típica, mesmo diante da circunstância de o recorrente haver, no curso do processo, quitado seu débito fiscal, exatamente na data de 30 de setembro de 2013, depois de exitoso parcelamento, consoante testifica a Receita Federal, através do Ofício acostado à f. 516. A esse respeito, a Primeira Turma desta Corte registra precedente a afirmar que não podendo ser classificado como crime contra a ordem tributária, o pagamento ou o parcelamento do tributo não resulta, como efeito, na extinção ou na suspensão da punibilidade (RSE 1791, des. José Maria Lucena, julgado em 23 de maio de 2013). Sendo assim, considero que a circunstância de haver o réu efetuado o pagamento, bem como de haver confessado a prática do crime, além de outras circunstâncias favoráveis, serviria, exclusivamente, para reduzir a pena. Todavia, observo que, depois do manejo dos embargos declaratórios (f. 429-431), a sanção, decorrente da prática do crime de descaminho, já foi reduzida para o mínimo legal de um ano de reclusão (f. 443-445), em regime aberto, inexistindo margem, pois, para que seja reduzida ainda mais. Melhor dizendo, há lugar para se reduzir, também, a pena de multa, na mesma proporção, pelo que a fixo em dez dias-multa, com arrimo no artigo 49, do Diploma Repressor, bem como atento às condições financeiras do réu, no valor unitário de um décimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, com correção monetária, na forma legal. As demais cominações constantes da sentença devem permanecer incólumes, inclusive, a substituição da reprimenda privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (artigo 44, do Código Penal). Por esse entender, dou parcial provimento à apelação. É como voto. ACR 11456/SE AMPDC Pág. 4 Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho ACR 11456/SE (0000477-72.2011.4.05.8500) APTE : PAULO SERGIO NUNES DE SANTANA ADV/PROC : CARLOS ALBERTO MENEZES APDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ORIGEM : 2ª Vara Federal de Sergipe RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVALHO (Ementa) Penal e processual penal. Apelação desafiada pelo réu, atacando a sentença que o condenou pela prática dos crimes previstos nos artigos 293, § 1º, inciso III, alínea b, combinado com o artigo 334, § 1º, alínea c, todos do Código Penal. Recorrente apanhado em flagrante, quando vendia, em sua loja, duzentos e setenta e cinco relógios provenientes da China, desprovidos do selo de regularidade fiscal. Rejeição da preliminar de nulidade por ofensa à norma abrigada no artigo 158, do Código de Processo Penal, a exigir a realização do exame de corpo de delito, por ter a infração deixado vestígios, visto que a procedência estrangeira dos produtos ilícitos foi devidamente apurada, mediante prévio procedimento administrativo, no âmbito da Receita Federal (autos anexados), lavrando-se, ao final, o competente auto de infração. Caso que não permite a aplicação do princípio da insignificância, uma vez que o débito tributário foi consolidado na significativa importância trinta e cinco mil, quinhentos e vinte e cinco reais e vinte e cinco centavos, bem acima, portanto, do limite para ser enquadrado como crime de bagatela. Entretanto, quanto ao mérito propriamente dito, o apelo merece melhor sorte. Decerto, da narrativa esposada na denúncia é possível enxergar a consumação, apenas, de um único crime, exatamente o de descaminho, devendo, pois, o ilícito de falsificação de papeis públicos, na modalidade descrita no artigo 293, § 1º, inciso III, alínea b, do Código Penal, ser, por este, absorvido. Precedentes (AGREsp 1416908, min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 17 de dezembro de 2013; RSE 27681620104013804, des. Tourinho Neto, julgado em 29 de maio de 2012). Todavia, a circunstância de o réu, no curso da ação penal, haver quitado o débito tributário, depois de exitoso parcelamento, não exclui a conduta típica. Paradigma da Primeira Turma desta Corte (RSE 1791, des. José Maria Lucena, julgado em 23 de maio de 2013). Pena, exclusivamente quanto ao crime de descaminho, mantida no mínimo legal de um ano de reclusão, em regime aberto, substituída por duas sanções restritivas de direitos, a cargo do juízo da execução. Sanção pecuniária diminuída na mesma proporção, ou seja, para dez dias-multa, no valor unitário de um décimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, com correção monetária, na forma legal. Apelação parcialmente provida. ACR 11456/SE AMPDC Pág. 5 Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho (Acórdão) Vistos, etc. Decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos. Recife, 24 de março de 2015. (Data do julgamento) Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho Relator ACR 11456/SE AMPDC Pág. 6