ASSÉDIO MORAL e SEXUAL nas Relações de Trabalho Assédio Processual na Justiça do Trabalho José Affonso Dallegrave Neto Amatra IX 2/setembro/2009 I –Conceito legal de ASSÉDIO SEXUAL: - Art. 216-A do Código Penal: “Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo, ou função. Pena: detenção de 1 a 2 anos.” II – REQUISITOS DE CONFIGURAÇÃO: a) constrangimento provacado por agente que assim age favorecido pela ascendência exercida sobre a vítima; b) ação dolosa e reiterada que visa vantagem sexual. Observações: - Agente: sempre o empregador ou colega que seja superior hierárquico da vítima; - Agente e vítima poderão ser do sexo masculino ou feminino, hetero ou homossexual. III – CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL: (Márcia Novaes Guedes) - mobbing (ou bullying) significa todos aqueles atos e comportamentos provindos do patrão, do superior hierárquico ou dos colegas, que traduzem uma atitude de contínua e ostensiva perseguição que possa acarretar danos relevantes de ordem física, psíquica e moral da vítima. (*) Terror psicológico no trabalho. SP: LTr, 2003, pág. 33. To mob – cercar; agredir; emboscar -Fundamento: O constituinte guindou o meio ambiente (art. 225) à categoria de bem de uso comum, impondo ao empregador a obrigação de assegurar um ambiente de trabalho hígido e equilibrado (art. 200, VIII,CF). “Ao empregador incumbe a obrigação de manter um ambiente de trabalho respeitoso, pressuposto mínimo para a execução do pacto laboral. A sua responsabilidade pelos atos de seus prepostos é objetiva (Súmula 341 do STF), presumindo-se a culpa” (TRT 3ª R., 5a. T., RO n . 4269/2002, Rogério Valle Ferreira, DJMG: 06-07-2002, p. 14) - Requisitos de configuração: -O assédio moral agrega 3 elementos: A) abuso de poder; B) manipulação perversa; C) discriminação; Cláudio Couce de Menezes: “aquele que assedia busca desestabilizar a sua vítima. Por isso mesmo, o processo é continuado e de regra sutil, pois a agressão aberta desmascara a estratégia insidiosa de expor a vítima a situações incômodas e humilhantes”. “A tortura psicológica, destinada a golpear a auto-estima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar a sua dispensa através de métodos em que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassada o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corrói a sua auto-estima. No caso dos autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do CT, e por conseqüência, descumprindo a sua obrigação principal que é a de fornecer o trabalho, fonte de dignidade do empregado.” (TRT, 17a. R., RO 1315/2000.00.17.00-1, Rel. Sonia das Dores Dionísia) - OBSERVAÇÕES: Tanto o assédio sexual, quanto o moral, só são admitidos: a) de forma dolosa; b) pelo comportamento reiterado do agente e pela postura indesejada da vítima. IV – DISTINÇÃO: - AS: o agente visa dominar a vítima pela chantagem, visando vantagens sexuais; - AM: o assediante visa a eliminação da vítima do mundo do trabalho através do psicoterror; (*) É comum que o AS constitua a razão para desencadear uma ação de AM; - AS: o agente é sempre um superior hierárquico da vítima - AM: a vítima poderá ser o próprio chefe e o agente um grupo de subalternos. Assédio moral organizacional “conjunto de condutas abusivas, ostensivas e continuadas, em que o empregador objetiva a sujeição de um trabalhador, ou de um grupo de trabalhadores, à sua exorbitante política de produtividade.” Adriane de Araújo AM: objetiva discriminar e estigmatizar a vítima, visando a sua exclusão do mundo do trabalho; AM Org: objetiva submeter, a força, o trabalhador à rigorosa política de resultado; vídeo: aumento de produtividade Saiu na Folha de São Paulo: No PR, o Sindicato dos Metalúrgicos acusa a multinacional Bosh de utilização do assédio moral para pressionar os empregados a aceitar redução salarial em troca da manutenção do emprego. Fonte:www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi3001200923.ht m - março/2009 Casos de assédio moral crescem na crise Desde fim de 2008, mais de mil trabalhadores entraram na Justiça paulista alegando humilhações e ameaças no emprego. Dificuldades nas empresas por causa da crise podem gerar situações de assédio. Fonte: Folha SP: 23 de março de 2009 Dra. Margarida Barreto, em artigo no portal www.adital.org.br: "Ferramenta utilizada por muitos empregadores na busca da motivação de atos de gestão. Assim, algumas empresas têm adotado, de forma reiterada, prendas e castigos como forma de forçar os trabalhadores a atingirem metas estabelecidas em seus cronogramas de produção. Normalmente a penalidade para aqueles que não atingem os patamares fixados, é a exposição vexatória perante os demais integrantes do grupo tais como, vestir-se com roupas do sexo oposto, dançar ao som de músicas de conotação erótica, submeter-se a corredor polonês, etc". V – INDENIZAÇÃO em caso de Assédio: O assédio: - ofende a dignidade do trabalhador (1º, III,CF); - afeta a honra objetiva e subjetiva (5º, X, CF); Indenização por dano material e moral Art. 5º, X, da CF dispõe: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” Dupla função do dano moral: a) Compensatória (necessidade da vítima); b) Pedagógica-preventiva (capacidade da empresa) “A indenização por dano moral deve ser fixada em valor razoável, de molde a traduzir uma compensação, para a vítima (empregado) e, concomitante, punir patrimonialmente o empregador, a fim de coibir a prática reiterada de atos dessa natureza.” (TRT – 3ª R – 5ª T – RO nº 9891/99 Taísa Mª. M. de Lima – DJMG 20.05.2000 – p. 16) Jurisprudência: “Demonstrada a conduta de conotação sexual não desejada, praticada pelo chefe, de forma repetida, acarretando conseqûências prejudiciais ao ambiente de trabalho da obreira e atentando contra sua integridade física, psicológica e, sobretudo, a sua dignidade, resta caracterizado o assédio sexual, sendo devida a correspondente indenização por danos morais.” (TRT, 17a. R., RO 1118/97, Ac. 02/07/98, Rel. Carlos Rizk) 2. Indenização por Dano Material Além do dano moral, cabe reparar os prejuízos materiais: - de eventual rebaixamento funcional; - desconto indevido de faltas; - despesas com remédios e psicólogo; - incapacidade decorrente de doença ocupacional (arts. 948 a 950 do CC) Síndrome de ”burn-out”: combustação completa (esgotamento) do trabalhador decorrente de intenso estresse no ambiente do trabalho; VI – EFEITOS CONTRATUAIS do Assédio: 1. Rescisão Indireta, art. 483, da CLT: O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: d – não cumprir o empregador as obrigações do contrato; e – praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e da boa-fama. Jurisprudência: “Considerando os fatos e circunstâncias constantes dos autos a respaldar a narrativa da inicial no sentido da prática de assédio sexual pelo gerente da reclamada, sem que esta tomasse providência acerca do noticiado pela autora, plenamente justificado o motivo da rescisão indireta do contrato de trabalho, com o conseqüente deferimento das verbas rescisórias pertinentes, bem como de indenização por danos morais.” (TRT 3ª Região, 4a. T., RO 8703/2001, Rel. Caio L.de A.Vieira de Mello, DJMG: 15-09-2001, pág 10) VII – JUSTA CAUSA DO ASSEDIANTE: Art. 482 – Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador: b) incontinência de conduta ou mau procedimento; j) ato lesivo da honra ou da boafama praticado no serviço contra qualquer pessoa ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem. Jurisprudência: “Assédio sexual. Tipificação como incontinência de conduta. Requisitos. O assédio sexual grosseiro, rude e desrespeitoso, concretizado em palavras ou gestos agressivos, já fere a civilidade mínima que o homem deve à mulher, principalmente em ambientes sociais de dinâmica rotineira e obrigatória e que nestes ambientes (trabalho, clube, etc.) o constrangimento moral provocado é maior, por não poder a vítima desvencilhar-se definitivamente do agressor.” (TRT, 3a. Reg. RO 2211/94, Rel. Maurício Godinho Delgado. DJMG: 23/04/94) “Mau procedimento. Constitui justa causa para a dissolução do contrato laboral a violação não consentida da privacidade de uma colega de trabalho.” (TRT, 12a. Reg., RO 596/85, 12/05/85, Rel. Câmara Rufino) VIII – RESPONSABILIDADE DIRETA E INDIRETA DA EMPRESA: Assediante = pessoa do empregador = responsável direto pela reparação; Art. 927: Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Assediante = superior hierárquico Empresa = responde por ato de 3o.; Art. 932: São também responsáveis pela reparação civil: III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; Teoria da representação delitual: empregado = longa manus do empregador presunção juris et de jure de culpa - Art. 933, Código Civil: responsabiliza o empregador “ainda que não haja culpa direta) de sua parte”. - O assediante é como um animal que ameaça e cerca a vítima (to “mob”) até conseguir devorá-la. - Ao empregador cabe elidir a prática do assédio, protegendo a vítima Culpa in eligendo e in vigilando (*vídeo) IX – AÇÃO DE REGRESSO: - Cabe denunciação à lide: Art. 70, CPC: – A denunciação da lide é obrigatória: III – àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda. Art. 934, NCC: Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz - Art. 462, § 1º da CLT: desconto salarial para compensar dano “desde que tal tenha sido acordado ou praticado dolosamente pelo empregado”; X – EFEITOS CRIMINAIS: - Assédio sexual, art. 216-A do C. Penal Pena: 1 a 2 anos de detenção. - A condenação criminal é exclusiva da pessoa do assediante, não havendo responsabilidade indireta de que trata o art. 932, III, CC. -Com base na legislação penal (art. 43, CP), o criminoso estará, no máximo, submetido à pena alternativa. - A competência para apreciar o crime de assédio sexual é do Juizado Especial (pg único do art. 2o. da L. 10.259/01). O caso do médico Abdelmassih Estupro ou assédio sexual? Crime de Estupro: - Redação velha: Art. 213 - Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça: Pena - reclusão, de 6 a 10 anos. - Redação nova (L. 12015/09): Art. 213: Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, de 6 a 10 anos. § 1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 ou maior de 14 anos: Pena - reclusão, de 8 a 12 anos. § 2o Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 a 30 anos. - Assédio moral = não há tipificação penal, contudo o assediante pode incorrer nas seguintes figuras do Código Penal: - crimes contra a honra (arts. 138 a 140); crimes contra a liberdade individual (arts. 146 a 149); perigo de vida e da saúde (arts. 130 a 136); induzimento ao suicídio (art. 122); lesão corporal e homicídio (arts. 129 e 122). - Art. 935 CC: “a responsabilidade civil independe da criminal, não se podendo, contudo, questionar mais sobre a existência do fato ilícito ou sobre sua autoria, quando estas questões já estiverem decididas no juízo criminal.” XI – PROVA JUDICIAL DO ASSÉDIO: - De extrema dificuldade para a vítima, vez que o assediante “age às portas fechadas”; “A gravação da conversa de um dos interlocutores não configura interceptação, sendo lícita como prova no processo penal, aplicando-se, nesse caso, o princípio da proporcionalidade, que permite o detrimento de alguns direitos para que prevaleçam outros de maior valor.” (STJ, RHC, 7216/SP, 5a. T., RT n. 755/580) - O julgador deve ser sensível no momento de coligir a prova do assédio; “Exigir-se prova cabal e ocular para vislumbrar o assédio sexual é simplesmente impossibilitar a prova em Juízo, e assim contribuir para que ilicitude de tanta gravidade continue ocorrendo.” (TRT, 2ª Reg., 10a. T., Ac. n. 200105035302001, Rel. Vera Marta Publio Dias, DOE SP, PJ, 31/08/2001) XII – FALTA DE SENSIBILIDADE DO JULGADOR: “Não existindo promessa de vantagem ou ameaça de prejuízo, em câmbio de sexo, não se pode cogitar de assédio sexual, no âmbito das relações de trabalho, pois o intuito de sedução, que é inato ao ser humano, por si só não implica reparação, em caso de resistência, uma vez que a subsistência da espécie humana – abstraída a hipótese da clonagem – depende dos acasalamentos.” (TRT, 6a. R., RO 41302,Ac.1075/2002-906-06-00-7, 1a. T., DJ: 14/05/02) Assédio Processual "Praticou a ré 'assédio processual', uma das muitas classes em que se pode dividir o assédio moral. Denomino assédio processual a procrastinação por uma das partes no andamento de processo, em qualquer uma de suas fases, negando-se a cumprir decisões judiciais, amparando-se ou não em norma processual, para interpor recursos, agravos, embargos, requerimentos de provas, petições despropositadas, procedendo de modo temerário e provocando incidentes manifestamente infundados, tudo objetivando obstaculizar a entrega da prestação jurisdicional à parte contrária." (Mylene Pereira Ramos, Juíza da 63ª VT de São Paulo, Processo nº 02784200406302004) Assédio processual: é o exercício abusivo e reiterado das faculdades processuais, em especial do direito de ampla defesa e contraditório, objetivando: - retardar a prestação jurisdicional e/ou - prejudicar dolosamente o ex-adverso. Distinção com a Litigância de má-fé: - LMF: caracteriza-se pela simples incidência de uma das hipóteses expressas em lei (art. 17 e 600, CPC). - AP: é uma espécie de litigância de má-fé mais ampla e que se caracteriza pela sucessão de atos processuais que, em conjunto, colimam obstruir a prestação jurisdicional e/ou prejudicar a parte exadversa. Fundamento para aplicar a multa e a indenização em ambos os institutos: Art 18, CPC: 1% a 20% do valor da causa “e indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e despesas que efetuou”; Art. 601, CPC: multa de até 20% do valor atualizado da execução, “sem prejuízo de outras sanções de natureza processual ou material” No AP a indenização também se fundamenta na regra do art. 927 do CC: “Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” A multa processual deriva do dever do Estado de zelar pelo rápido andamento das causas (arts. 765, CLT e 125, II, CPC) e de prestar jurisdição em tempo razoável (CF, art. 5º, LXXVIII). Em ambos os casos (LMF e AP), o juiz poderá fixar ex officio a multa e/ou a indenização as quais serão, a rigor, revertidas em prol da parte prejudicada (art. 601, CPC, in fine) e, excepcionalmente em prol do FAT (vg: litigante de má-fé em ACP; analogia do art. 13, L. 7347/85); “Assédio processual. Indenização. Retardamento do processo. Conduta reprovável”. (TRT, 9a. R., 1a. T. Processo 00511-2006-562.09.00-3, Rel. Tobias de Macedo Filho, DJPR: 16/09/2008) “A prática do assédio processual deve ser rechaçada com toda a energia pelo Judiciário. Os Tribunais brasileiros, sobretudo os Tribunais Superiores, estão abarrotados de demandas retóricas, sem a menor perspectiva científica de sucesso. Essa prática é perversa, pois além de onerar sobremaneira o erário público torna todo o sistema brasileiro de justiça mais lento e por isso injusto. Não foi por outro motivo que a duração razoável do processo teve de ser guindado ao nível constitucional. Os advogados, públicos e privados, juntamente com os administradores e gestores, têm o dever de se guiar com ética material no processo. (...) A legitimação para o processo impõe o ônus público da lealdade processual, lealdade que transcende em muito a simples ética formal, pois desafia uma atitude de dignidade e fidelidade material aos argumentos. O processo é um instrumento dialógico por excelência, o que não significa que possa admitir toda ordem de argumentação”. (TRT, 3ª. R., 4ª. T., Processo : 00760-2008-112-03-00-4 RO, Rel. Jose Eduardo de RC Junior, DJMG 21/2/09) Bibliografia: - GUEDES, Marcia Novaes. Terror psicológico no trabalho. LTr. - PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Assédio sexual. LTr - DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade Civil no DT. 3a. ed., 2a. Tir., março de 2009. LTr