Quinta-feira 22 de Outubro de 2015 Jornal do Comércio - Porto Alegre 29 Geral SEGURANÇA PÚBLICA Brasil é campeão em superlotação de prisões Rio Grande do Sul tem taxa de 418 presos para cada 100 mil pessoas FREDY VIEIRA/JC Isabella Sander [email protected] O relatório final da subcomissão sobre as condições do sistema prisional formada na Assembleia Legislativa foi apresentado ontem pelo presidente do grupo, deputado estadual Jeferson Fernandes (PT). O documento, que levou 120 dias para ser elaborado, apresenta 21 propostas para a melhoria do sistema. O Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo, com 300 pessoas presas a cada 100 mil habitantes. No Rio Grande do Sul, a média é ainda maior, chegando a 418 para cada 100 mil. O País só perde para Estados Unidos (campeão), China e Rússia. Em 2014, a quantidade de presos no Brasil superou, pela primeira vez, os 600 mil – entre 2008 e 2013, a população prisional aumentou em 33%. O alto índice de presos não foi acompanhado, contudo, pelo aumento de vagas nas cadeias. O descompasso trouxe ao País o primeiro lugar em superlotação no mundo, com 161% da capacidade de vagas ocupadas. “Mais lamentável ainda é que há casas prisionais onde essa superlotação é muito maior. Aqui no Estado, temos unidades com 500% de taxa de ocupação. É assustador”, ressalta Fernandes. Dos detidos, 41% estão presos sem condenação. No Estado, o percentual de prisões provisórias subiu, em quatro anos, de 24% para 35%. Cerca de 73% dos presos aguardam mais de 30 dias para uma primeira audiência. O Rio Grande do Sul contabiliza, hoje, mais de 31 mil pessoas aprisionadas, correspondendo a uma taxa de crescimento de 11% do ano passado para este e superando a média dos últimos períodos. O Estado conta com 96 estabelecimentos prisionais. Desses, 27% têm mais de 50 anos. “A situação Relatório de subcomissão da Assembleia foi elaborado em 120 dias desses prédios é deplorável, mesmo que se faça consertos ou reformas. Para se ter uma ideia, eu não consegui visitar uma casa sequer que tivesse Plano de Prevenção Contra Incêndios (PPCI). Não raro, há fiação exposta e infiltrações”, relata o deputado estadual. Das prisões que ocorrem no Brasil, 49,7% são por tráfico, 9% por porte ilegal de armas, 7% por furto, 6,9% por roubo, 6% por latrocínio, 4,6% por homicídio e 19,6% por outros crimes. Atualmente, tramitam mais de 600 mil feitos criminais na Justiça em 1º Grau e mais de 62 mil processos de Execução Criminal estão ativos. Para o juiz da Vara de Execuções Criminais Sidinei Brzuska, que acompanha as condições dos presídios no Rio Grande do Sul, os dados apresentados mostram que o Brasil está andando por um caminho errado no que diz respeito à situação carcerária. “Aumentamos absurdamente nossa taxa de encarceramento e, ao mesmo tempo, aumentam do lado de fora os índices de violência, homicídio e roubo. Estamos gastando mal os nossos pou- cos recursos. O sistema prisional, nos moldes que está hoje, talvez seja a forma mais cara de piorar as pessoas”, afirma. Brzuska destaca que, há 15 anos, o percentual de presos por tráfico era 5%. Hoje, bate na casa dos 50%. “Três anos atrás, fiz uma pesquisa interna nas guias de execução penal, que concentram as condenações de cada preso. Tínhamos 16 mil guias. Dessas, apenas 5% apresentavam duas condenações ou mais por tráfico, ou seja, a maioria arrasadora dos condenados é de réus primários, sem antecedentes ou condenações”, aponta. Mais de 90% dos presos foram encaminhados pela Brigada Militar (BM). “A BM prende só quem ela enxerga. Então, prende quem está na ponta do iceberg, fazendo trabalho para o tráfico nas ruas. Aqui, eles são jogados no Presídio Central de Porto Alegre, onde, nos últimos cinco anos, foram retirados 9,6 mil telefones celulares, 112 kg de drogas e 58 armas industriais. O réu primário é retirado de uma ‘boquinha’ na rua e vai para uma ‘bocona’ no presídio”, observa o juiz. Defensoria pede habeas corpus para presos das delegacias O Núcleo de Defesa em Execução Penal da Defensoria Pública do Estado (Nudep) impetrou ontem um habeas corpus coletivo em nome de todos os sentenciados que se encontram irregularmente recolhidos nas Delegacias de Polícia da Região Metropolitana de Porto Alegre, sujeitos à competência das varas de Execuções Criminais da Capital. O pedido é de que seja determinada a imediata remoção dos apenados das delegacias de polícia para um estabelecimento penal compatível com suas situações carcerárias. Na hipótese de ausência de vagas, requereu que seja assegurado o direito de o preso aguardar o surgimento da vaga em regime mais brando e, se inexistente, em prisão domiciliar. Anteriormente a este habeas corpus, o Nudep protocolou pedido de providências junto à vara de Execuções Criminais, que não foi analisado pelos magistrados por entenderem ter sido feito pela via processual inadequada. Vários habeas corpus individuais vinham sendo impetrados desde a semana passada pelos Defensores Públicos que atuam no Plantão junto ao Palácio da Polícia. Dignidade da Palavra A palavra é a raiz de tudo. É também a raiz de toda transformação. Ela possui a força de trazer à fala tudo que existe. Ela cria! Mas também destrói! É por isso que, ao longo da história, sempre se exortou a cuidar da palavra. A palavra é a pequena diferença que permitiu a origem da linguagem, a possibilidade de o ser humano se interrogar sobre a vida e a morte, a capacidade de transformar a natureza em cultura. Não é demais afirmar que o destino da humanidade e de toda sua história está intimamente ligado à palavra. Isso porque as relações humanas em suas distintas dimensões são determinadas pela palavra. No início, dizem as Escrituras Sagradas, era a palavra. Ela pertencia a Deus. Deus tudo criou por meio da palavra. O poder de dizer foi, na origem, também concedido ao ser humano. Portanto, a palavra não é sua propriedade. É algo dado e, portanto, recebido. Tendo recebido, ele, por meio da palavra, participa da obra da criação. A própria palavra forma, ou deforma, o ser humano. Neste sentido, podemos dizer que ele se torna a palavra que escuta. Surge, pois, uma questão decisiva: qual palavra escutar? Que palavra escutamos? São Tiago afirma que o ser humano que é senhor da própria palavra é um ser humano perfeito (Tg 3,2). A palavra diz a coisa! Entretanto, hoje vivemos sob o signo da imagem. Os meios de comunicação sabem magistralmente fazer uso do poder da imagem em detrimento da palavra. Assim, eles nos induzem a entrar sempre menos em contato com a realidade e sempre mais com as imagens da realidade. Assim, o que aparece, reluz, brilha, toma o lugar do real. Desse modo, corremos o risco de nos deixar conduzir por ilusões. A partir da fé cristã, podemos dizer que a palavra não somente concede ao ser humano uma identidade, mas ela mesma possui uma identidade. Para o cristão, a palavra tem nome: Jesus. Jesus é a palavra eterna do Pai. Por isso, o cristão lê o Evangelho como palavra que cura, ergue, orienta, sustenta, corrige, alimenta, ilumina a vida co- tidiana. O Evangelho é palavra de saúde e salvação, e não narração de histórias edificantes. O ser humano marcado pela fé cristã sabe que a palavra é um instrumento formativo de primeira grandeza, é capaz de transformar a pessoa, pois permite fazer a experiência daquilo que diz. A palavra transmite uma recordação. Ou seja, ela faz com que algo caia no coração, e a partir disso o ser humano possa viver. A própria ciência nos diz que o ser humano vive de recordações! Assim, o cristão é convidado a constantemente recordar e cultivar os feitos de Deus. Isto fazendo, vai consolidando a sua identidade mais profunda, pois o modo como Deus agiu e age vai se tornando o seu modo de agir. Para nós que vivemos uma Mudança de Época, que experimentamos uma enorme crise de valores, essas indicações podem auxiliar-nos na tarefa de resgatar a nossa identidade originária: somos filhos da Palavra! E, sendo filhos, somos também irmãos! A palavra expressa a realidade entendida e sedimentada em nós como recordação; assegura o presente e descortina o futuro! Nós, cristãos, propomos a todos a Palavra de Deus, a fim de cooperar para que todos alcancem sua identidade originária: ser filhos de Deus! E São João dirá: e nós o somos (1Jo 3,1). Aquilo, pois, que anunciamos não pode ser reduzido a piedosas considerações, certamente belas e úteis. Isso qualquer religião pode oferecer! Aquilo que o cristão experimenta e anuncia é a liberdade própria dos filhos de Deus que Jesus Cristo ensina, concede e do qual ele participa. O cristão leva Jesus e, por isso, pode conviver em qualquer cultura e dialogar com distintos credos. O contrário disso se expressa no fanatismo! O fanático se caracteriza pela obtusidade; não consegue acolher o diferente; não é capaz de ouvir a Palavra; não se permite o diálogo! Quando não se pode mais dialogar, quando não é mais possível a palavra, quando não existe mais espaço para acolher o diferente, a catástrofe se impõe, a morte se faz presente!