Bando é preso
em flagrante
com drogas
segunda
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aderem a
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A GAZETA - 1B
CUIABÁ, 25 DE FEVEREIRO DE 2013
ROTINA DE MEDO
Agentes relatam clima de tensão
Responsáveis por vigiar os 1,9 mil detentos da maior unidade prisional do
Estado detalham o dia a dia de stress, pressão e dificuldades para trabalhar
GLÁUCIO NOGUEIRA
DA REDAÇÃO
U
m verdadeiro caos. Desta forma,
agentes prisionais relatam o
cotidiano da Penitenciária Central
do Estado (PCE), maior unidade
prisional de Mato Grosso. De ausência de
estrutura a ameaças diárias, recebidas dos cerca
de 1,9 mil presos, os servidores são obrigados a
enfrentar as mais variadas dificuldades para
evitar maiores problemas com os reeducandos e
com a Justiça. Para piorar, reclamam que são
marginalizados pela sociedade, taxados de
corruptos e não enxergam melhorias concretas
no futuro.
Para ouvir os relatos dos agentes e também de
presos que aceitaram falar na condição do
anonimato, a reportagem esteve na PCE
acompanhando a visita do juiz da 2ª Vara
Criminal de Cuiabá, Geraldo Fidélis, que foi à
unidade para ouvir as reclamações e buscar
formas de melhorar as condições do sistema
prisional em Cuiabá que, a exemplo de todo o
Brasil, passa por graves problemas.
O silêncio que toma conta da entrada nos dias
em que não há visita não é capaz de esconder a
tensão que reina na PCE. Em uma sala, policiais
militares atendem as pessoas que vão até a
penitenciária, advogados, oficiais de Justiça,
parentes dos presos levando produtos e
medicamentos e fornecedores de serviços
contratados pelo Estado.
Enquanto aguarda a autorização para a
entrada na unidade, a reportagem acompanha, à
distância, uma mulher que trazia consigo uma TV
LCD de 14 polegadas, um fogareiro elétrico e um
ventilador, produtos novos, que seriam entregues
a um dos presos. O nome do reeducando vai
anotado na caixa do ventilador, Sandro da Silva
Rabelo, o “Sandro Louco”, assaltante de banco e
latrocida, condenado a mais de 150 anos de
prisão. Após uma minuciosa inspeção, o policial
autoriza a entrada do material e da mulher,
possivelmente familiar de Sandro.
Depois de passar pela entrada, uma rua larga,
com aproximadamente 150 metros de extensão é
trajeto obrigatório para quem vai à unidade. À
Fotos: Marcus Vaillant
esquerda, o acesso aos raios e alas onde estão os
prisioneiros mais perigosos do Estado. Basta estar
ali para sentir a tensão aumentar. Neste sentido, a
agente prisional Cássia Nascimento ajuda a
colocar ainda mais medo no visitante. “Isso aqui
só parece calmo, mas não é. Esse sentimento, essa
sensação é constante”.
Outro agente prisional, que acompanha a
conversa, entrega. “São poucos policiais nas
torres. Se eles (os presos) vierem, acha que vão
conseguir conter toda essa gente? Já era”.
Enquanto do lado direito está a entrada das alas,
do lado direito ficam obras abandonadas, que
possivelmente em outros tempos serviam à parte
administrativa da unidade.
No caminho, a reportagem encontra 5, 6
pessoas com roupas de cor amarela, os
“amarelinhos”, presos com baixo potencial
ofensivo que trabalham na unidade prisional. Em
tese, eles deveriam ser monitorados de perto pelos
agentes, mas o efetivo reduzido, cerca de 150
servidores, impede que isso ocorra.
Antes de entrar na parte administrativa, um
portão sem nenhum agente ou policial de guarda,
fato destacado por outro agente prisional, estão a
unidade móvel, local onde ficam os amarelinhos e
a ala psiquiátrica da cadeia. No entorno da
unidade móvel, muito entulho e pedaços de ferro,
que em uma rebelião poderiam ser usados pelos
presos. Parte do telhado do prédio, que na verdade
mais se parece com um galpão, foi levado por
uma das fortes chuvas que castigaram a cidade no
início do ano.
Enquanto aguardam o início da reunião com o
magistrado, os agentes passam a contar como
funciona o cotidiano dos raios e alas. “Em uma
hora de plantão já fui ameaçado e xingado
diversas vezes pelos presos e isso ocorre com
todos os agentes, todos os dias”, explica, com
naturalidade um dos servidores, que diz não sentir
medo dentro da unidade. “Aqui eu pelo menos sei
quem é o bandido, na rua não”.
Mas essa tranqüilidade não atinge a todos os
agentes prisionais. Pedro Vieira, técnico
ambiental e estudante de Direito, revela que a
constante tensão faz, entre os servidores, muitas
vítimas de álcool e drogas. “Não são casos
isolados, infelizmente. E aqui tentamos
administrar isso. Tem gente que não pode dirigir,
gente que não pode estar em contato direto com
os presos, gente que sai daqui com uma roupa e
volta para o outro plantão, 2 dias depois, com a
mesma roupa, sinal de que estava em bares todo o
período. Não é fácil viver isso aqui todo dia e, o
que é pior, não enxergar a saída”.
‘Bereu’ - Todos os dias, os agentes
movimentam cerca de 100 presos, para
audiências, julgamentos, atendimentos médico e
psicossocial, entre outros serviços, direitos
assegurados dos presos. Ao receberem a ordem
para a retirada de um destes reeducandos,
procedimento feito manualmente, Cássia conta
que os agentes preenchem um bilhete com o nome
do reeducando, o “bereu” e seguem para o raio.
“Lá, chamamos um dos presos e entregamos o
bereu, pedindo para que ele acione o preso que irá
sair. E ele sai de lá na hora que quiser e se quiser.
Quem vai entrar lá, desarmado, no meio de
dezenas de presos?”.
O bereu também é usado para o cumprimento
Para avisar os presos sobre
alvarás de soltura, visitas ou
atendimentos médicos, agentes
não se arriscam por faltar segurança
Josilene Rodrigues (em pé) relatou os
problemas encontrados para trabalhar ao
juiz, juntamente com os colegas agentes
de alvarás de soltura, sempre acompanhados por
oficiais de Justiça, a qualquer hora do dia. “Se
vem durante o dia, tudo bem, mas tem oficial que
chega aqui de madrugada e quer liberar o preso.
Levamos ele junto para a cela, só para ele ‘sentir o
drama’. Tem oficial que treme só de entrar lá. Isso
porque ele entra uma vez e nós que fazemos isso o
dia inteiro”, diverte-se um agente.
A questão dos alvarás também é um problema
a ser administrado dentro da unidade. Josilene
Rodrigues, uma das funcionárias que trabalha no
setor, explica que após a expedição do alvará de
soltura, é necessário se fazer uma checagem,
verificar se pesa contra o reeducando outra prisão
preventiva ou condenação, o que inviabilizaria a
saída da unidade.
“Isso é algo que leva um certo tempo. O preso
não pode voltar para o convívio, mas tem que
permanecer encarcerado, por horas e até mesmo
de um dia para o outro”. Um preso que já passou
pela experiência conta que a cela-camburão,
como é conhecido o local onde se aguarda a
liberdade possui sérias deficiências. “Não tem
ventilação adequada, a gente sofre muito lá”.
Se os presos recebem equipamentos
modernos de familiares, os agentes são obrigados
a caminhar 100, 200 metros para encontrar um
banheiro ou tomar um copo d’água. “Eles
possuem um monte de regalias e nós temos que
comer em pé”, desabafa um agente, contando que
as cadeiras existentes no refeitório dos
funcionários, inacabado, foram frutos de doações.
Ao final da conversa, muitos daqueles que
contaram histórias do cotidiano da PCE
agradecem a reportagem por ouvir seus relatos.
Pedem que os fatos relatados sejam tornados
públicos, mais uma tentativa de reverter a
situação. “Já ouvimos muitos discursos, muitas
conversas, mas nada mudou aqui. Somos
invisíveis, mas não deixamos de lutar. Quem
sabe, um dia, antes que seja tarde, nos ouçam”.
goutro lado
Secretaria de Estado de Justiça e Direitos
Humanos (Sejudh/MT) esclarece o que
segue sobre os questionamentos em relação a
Penitenciária Central do Estado (PCE) busca
ampliar a capacidade do sistema por meio novas
unidades e reforma e ampliação de unidades
penais. A pasta reconhece parte dos problemas
enfrentados e busca a convocação de novos
servidores classificados no concurso público, o
que garantiria maior eficiência na demanda
interna da unidade.
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