Crônicas de um entrevistador Tentativa de homicídio Na cidade de Nova Friburgo ainda faltava entrevistar um homem com idade acima de cinquenta anos e fosse trabalhador no setor da indústria de transformação. É sabido que as pequenas indústrias naquela cidade são, em sua maioria, fabricantes de lingerie, setor que não empregava muitos homens até então. Era final de tarde e a situação ficava preocupante. A tática utilizada era abordar qualquer pessoa, explicar do que se tratava e perguntar se ela conhecia alguém com aquele perfil. Como de costume, a tática deu certo: havia um senhor nas redondezas que “fabricava” gaiolas. Após bater palmas ao portão, um senhor veio atender. O entrevistador, sem dizer o motivo pelo qual veio, sem ao menos um “Olá!”, “Boa tarde!” ou “Como vai?”, simplesmente disparou: - É o senhor que faz gaiolas? A pergunta soou como uma acusação e deixou o idoso na defensiva. - Não faço nada não moço, sou aposentado. - Mas me disseram que o senhor fabrica gaiolas. A partir dali o senhor começou a ficar pálido. - Eu vivo da aposentadoria, meu filho! Não fabrico nada não. O entrevistador tentou então remediar a situação. - É que nós estamos fazendo uma pesquisa e precisamos entrevistar um homem que trabalhe na indústria de transformação. O bom senso definitivamente havia abandonado o dedicado profissional. A palavra indústria levou o trabalhador informal ao desespero. O que só agravou ainda mais e a situação estava saindo do seu controle. - Pelo amor de deus! Vá embora que eu tô passando mal. | 15 | Dilson dos Santos Vaz O entrevistado estava realmente passando mal. A coisa ficou tão feia que a acompanhante do entrevistador, (colega, que o acompanhava e até então era somente uma testemunha), sentiu-se obrigada a ignorar a ética profissional (um entrevistador não deve intervir na abordagem de outro, principalmente, se o outro for mais experiente, que era o caso) e resolveu interceder para evitar uma tragédia. Depois que ela explicou com calma, e pausadamente, porque precisavam tanto entrevistá-lo, ele se acalmou. Disse que era aposentado e fazia umas gaiolinhas para aumentar a renda. Aceitou ser entrevistado dizendo: - Tá bom, minha filha, eu até dou a entrevista, mas tira esse moço daqui pelo amor de Deus! | 16 |