ENCONTROS DE DIREITO AMBIENTAL
Aspectos atuais do Direito Ambiental
Por Santos Silveiro Advogados
Os Encontros de Direito Ambiental, realizados entre os meses de
junho e outubro de 2011, sempre após as 18h, em datas previamente fixadas,
resultaram da iniciativa do Santos Silveiro Advogados em destacar o papel do
Direito Ambiental em nossos dias. O evento contou com a participação de todos
os integrantes da equipe jurídica do escritório , de Porto Alegre e de Curitiba,
bem como de convidados que abrilhantaram nossas atividades com sua honrosa
participação.
Os temas dos encontros foram orientados pela necessidade de
conscientização sobre os desafios da preservação do meio ambiente e pela
aproximação do direito imobiliário e urbanístico ao direito ambienta l. Desde a
ética ambiental até o direito ambiental municipal, passando pelos
licenciamentos e estudos ambientais, os encontros tiveram por objetivo uma
abordagem ao mesmo tempo teórico-conceitual e pragmática do direito
ambiental no sistema jurídico pátrio .
1) Da consciência ambiental aos princípios fu ndamentais do
direito ambiental
Em 07 de junho de 2011, foi feita a abertura dos encontros com a
apresentação de pesquisa realizada pelo advogado Dr. Fabio Caprio Leite de
Castro e pelo estagiário João Paulo Santos Silveiro . Nesse encontro, colocou-se
inicialmente a questão sobre a origem histórica e a fundamentação do direito
ambiental.
O direito ambiental é bastante recente se comparado às outras
disciplinas jurídicas. Isso pode ser e xplicado, em certa medida, pelo fato de a
consciência ambiental ter se desenvolvido e ganhado novas proporções com a
globalização econômica e cultural. Uma ética ambiental voltada para a natureza
e para as novas gerações humanas apareceu como uma verdadeira necessidade
de nossa sociedade globalizada. Desde a Convenção Internacional para a
Prevenção da Poluição do Mar por Óleo, realizada em Londres, em 1954;
passando pela Conferência de Estocolmo, em 1972; e pelo Rio -92; até nossos
dias, há uma crescente mobilização política para tratar de assuntos ambientais,
como a poluição, o desmatamento e os resíduos inorgânicos. Em outros termos,
o direito ambiental nasce de uma preocupação com problemas de ordem
ambiental que podem colocar em risco as formas d e vida no planeta. O
enfrentamento desse risco está na base do direito ambiental, cujos princípios
ideais e fundantes são o princípio da prevenção, o princípio da precaução e o
princípio do poluidor pagador.
O princípio da prevenção visa evitar riscos conhecidos, a fim de
limitar ou combater a poluição já existente, enquanto o princípio da precaução
indaga o grau de perigo na ação iniciada, independentemente da existência de
estudo comprovando a sua potencialidade nociva. O princípio do poluidor
pagador impõe a quem lesa o meio ambiente o dever de arcar com despesas de
prevenção e reparação pelo dano. Tais princípios, solicitados por uma nova
perspectiva de valoração do meio ambiente, formam a base de todo o direito
ambiental.
2) Estudos ambientais e licenciamento ambiental
Em 21 de junho de 2011, os advogados Dr. Roberto Santos
Silveiro e Dra. Mariana Borges Altmayer apresentaram pesquisa desenvolvida
acerca dos estudos ambientais e do licenciamento ambiental. A questão
levantada diz respeito ao modo como é feito o diagnóstico do risco ambiental ,
de forma a antever o dano e preveni-lo. Com base nessa problemática, fez-se um
exame de um importante instrumento do Estado na prevenção ao meio
ambiente, o licenciamento ambiental.
A Constituição Federal prevê, em seu art. 225, §1 º, IV, a
exigência, na forma da lei, “para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente” , com a devida
publicidade, o estudo prévio de impacto ambiental (EIA ou EPIA), consolidando a
determinação da Resolução do CONAMA n º 01/86. O EIA constitui uma avaliação
abrangente do risco da atividade, incluindo um estudo amplo do impacto,
definição da área, trabalho de campo e as possíveis medidas compensatórias.
Neste estudo é baseado o relatório de impacto ambiental (RIMA) que apresenta,
sinteticamente, as conclusões auferidas.
O art. 2º da Resolução do CONAMA n º 01/86 elenca de forma não
taxativa casos onde se faz necessária a elaboração de EIA e respectivo RIM A,
dentre eles, no inciso XV, “projeto urbanísticos acima de 100 h ectares ou em
áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos
órgãos municipais e estaduais competentes”. No Estado do Rio Grande do Sul, o
EIA/RIMA está previsto no Código Estadual do Meio Ambiente, art. 71 e
seguintes, com a possibilidade de audiência pública . O art. 78 determina os
tópicos que deverão constar no RIMA. 1 Vale lembrar que o estudo não vincula o
órgão à eventual concessão de licença.
O licenciamento ambiental é um procedimento administrativo
previsto na Resolução do CONAMA nº 237/97 e funciona como um instrumento
de gestão preventivo de controle à poluição e degradação ambiental. Toda
licença ambiental depende de EIA/RIMA, nos termos d o art. 3º da Resolução
citada. O Anexo I da resolução traz uma lista de atividades industriais e outras
onde o licenciamento ambiental é obrigatório, dentre elas as obras civis e
parcelamento do solo. O art. 10 da mesma Resolução prevê o procedimento de
licenciamento ambiental, que deve cumprir as etapas de requerimento, análise
pelo órgão licenciador, esclarecimentos (e complementações) com a emissão
1
Art. 78 - O Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) refletirá as conclusões do Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EIA) e
conterá, no mínimo:
I – os objetivos e justificativas do projeto, sua relação e compatibilidade com as políticas setoriais, planos e programas
públicos;
II – a descrição do projeto e suas alternativas tecnológicas e locacionais, especificando para cada uma delas, nas fases de
construção e operação, a área de influência, as matérias primas e mão-de-obra, as fontes de energia, os processos e
técnicas operacionais, os prováveis efluentes, emissões, resíduos e perdas de energia, os empregos diretos e indiretos a
serem gerados, planos e programas públicos;
III – a síntese dos resultados dos estudos de diagnóstico ambiental da área de influência do projeto;
IV – a descrição dos prováveis impactos ambientais da implantação e operação da atividade, considerando o projeto, suas
alternativas, os horizontes de tempo de incidência dos impactos e indicando os métodos, técnicas e critérios adotados para
sua identificação, quantificação e interpretação;
V – a caracterização da qualidade ambiental futura da área de influência, comparando as diferentes situações de adoção do
projeto e suas alternativas, bem como com a hipótese de sua não realização;
VI – a descrição do efeito esperado das medidas mitigadoras previstas em relação aos impactos negativos, mencionado
aqueles que não puderem ser evitados, e o grau de alteração esperado;
VII – o programa de monitoramento e acompanhamento dos impactos;
VIII – recomendações quanto à alternativa mais favorável (conclusões e comentários de ordem geral).
final do parecer. A competência dos licenciamentos está igualmente prevista na
referida resolução, podendo ser esta do IBAMA, do órgão ambiental estadual ou
municipal - quando as atividades de impacto ambiental forem de âmbito local ou
lhe forem delegadas pelo Estado.
Nos empreendimentos imobiliários, a licença divide -se em três
tipos sucessivos: a licença prévia, onde são determinadas a localização e a
concepção do empreendimento; a licença de instalação, cujo objetivo é o
consentimento para a implementação do empreend imento; a licença de
operação, para dar início à atividade licenciada. Ao final, foi oportunizado ao
grupo um debate com enfoque nos precedentes dos Tribunais analisados na
apresentação.
3) Perícia Ambiental
Em 05 de julho de 2011, no auditório do Edifício Corporate
Station, os Encontros de Direito Ambiental contaram com a ilustre participação
do convidado Dr. Manuel Luiz Leite Zurita, renomado perito e professor de
perícia ambiental. Do escritório Santos Silveiro Advogados, os advogados Dr.
Eduardo Oliva Palma e a Dra. Flávia Tellechea elaboraram estudo específico
sobre o mesmo tema, com a finalidade de promover debate com o convidado. A
grande contribuição do professor Zurita levou a uma reflexão do grup o sobre a
função essencial da perícia ambiental como estratégia de defesa em processos
envolvendo a questão ambiental.
Distinguindo o perito do assistente técnico, o palestrante frisou a
importância deste último para o acompanhamento do advogado desde a
concepção da petição inicial ou da contestação, assim como na elaboração dos
quesitos. Na seara do direito ambiental, é necessário determinar com clareza
quais são os problemas enfrentados e a concepção que se quer apresentar, a fim
de se obter uma posição segura no processo. O conjunto de quesitos constitui
verdadeira estratégia no confronto com a outra parte.
No que tange à perícia ambiental, o palestrante mostrou que a
atividade do perito deve contar com a necessária adoção de metodologia para
quantificação do dano ambiental e estimativa de valor, seja de caráter
compensatório, para a recuperação, seja condenatório, para fixar uma
condenação pelo dano ambiental. Os laudos e pareceres realizados dentro ou
fora de processo judicial servem, igualmente, para av aliar a possibilidade de
transigir ou assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o
Ministério Público, cujo acordo poderá importar em reconhecimento de culpa
perante terceiros. A apresentação de exemplos para todas as questões teóricas
apresentadas trouxe grande dinamicidade à apresentação, seguindo -se um
interessante debate sobre a realização de pareceres, contraprova e aspectos
relacionados aos casos concretos abordados.
4) Política Ambiental Nacional e Biossegurança
Em 18 de julho de 2011, o advogado Dr. Luiz Paulo Linhares
Nunes e o estagiário Octavio Chagas Soll da Silva fizeram apresentação sobre a
Política Ambiental Nacional e a Biossegurança, com base na Lei n º 6.938/81 e na
Lei nº 11.105/2005. O encontro iniciou-se com um exame histórico do Direito
Ambiental nas Constituições brasileiras, contextualizando, assim, o
funcionamento atual da Política Ambiental Nacional, criada pela Lei nº 6.938/81
e recepcionada pela Constituição Federal de 1988 , encontrando nova
regulamentação no Decreto nº 99.274/1990.
O Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), criado pela
referida lei, compõe-se, principalmente, por órgão consultivo e deliberativo, o
Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), vinculado ao Ministério do
Meio Ambiente; pelo órgão executor (IBAMA); além dos órgãos seccionais; como
a CONSEMA e a FEPAM, ligadas à Secretaria do Meio Ambiente do Rio Grande do
Sul; e locais, como a SMAM em Porto Alegre. 2
As competências do CONAMA estão arroladas no art. 7º do
Decreto nº 99.274/1990, dentre as quais se destaca a sua função normativa,
mediante proposta do IBAMA, para o licenciamento de atividades efetiva ou
potencialmente poluidoras. O IBAMA tem como finalidade exercer o poder de
polícia ambiental, bem como executar açõ es das políticas nacionais de meio
ambiente, referentes às atribuições federais, relativas ao licenciamento
ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos
2
Na Resolução CONSEMA nº 167/2007, foram estabelecidos os critérios e diretrizes para o exercício da competência do
licenciamento ambiental das atividades de impacto local. Atualmente, no Rio Grande do Sul, 292 Municípios estão
habilitados pelo CONSEMA para realizar o licenciamento ambiental.
recursos naturais e à fiscalização, monitoramento e controle ambiental,
observadas as diretrizes emanadas pelo Ministério do Meio Ambiente.
Além da análise do funcionamento do SISNAMA, foi apresentado
um estudo da Lei nº 11.105/2005, que trata das normas de segurança relativas
ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, verdadeiro marco
na legislação ambiental brasileira. Os apresentadores ressaltaram o
funcionamento do Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS) – composto por
Ministros de diferentes áreas, dentre elas a Justiça, a Saúde e o Meio Ambiente
–, bem como da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBIO), que
integra o Ministério da Ciência e Tecnologia.
5) Dano ambiental
No dia 02 de agosto de 2011, foram realizadas duas
apresentações com distintos enfoques sobre o Dano ambiental , trazendo notável
contribuição aos Encontros. Inicialmente, o advogado Dr. Marco Meimes e a
estagiária Daniela Druck apresentaram um estudo sobre o conceito de dano
ambiental e a responsabilidade ambiental no âmbito civil e administrativo. Em
um segundo momento, o advogado Dr. Sérgio Pedreira Vernetti e o estagiário
Fernando Oliva Palma apresentaram trabalho acerca da responsabilidade
ambiental no âmbito penal.
A dificuldade de se conceituar o dano ambiental deriva do
próprio conceito de “meio ambiente”, cuja abertura de sentido pode levar a uma
definição casuística conforme a realidade apresentada ao intérprete. Embora
não exista na legislação pátria um conceit o expresso de “dano ambiental”, podese encontrar uma definição das noções de degradação da qualidade ambiental e
da poluição, no art. 3º da Lei nº 6.938/81, já abordada no Encontro precedente.
Na doutrina brasileira, a “degradação ao meio ambiente” aparec e como
elemento comum à definição do dano ambiental como, por exemplo, nos textos
de Paulo de Bessa Antunes, Édis Milaré, Patrícia F. I. Lemos e Álvaro L. Valery
Mirra, incluindo, neste último, os aspectos naturais, culturais e artificiais que
condicionam a vida. Buscou-se, com base na referida doutrina, apresentar a
seguinte definição de dano ambiental: “Dano ambiental é o prejuízo causado aos
recursos ambientais indispensáveis para a garantia de um meio ambiente
ecologicamente equilibrado, provocando a degradação e, consequentemente, o
desequilíbrio ecológico”.
A partir dessa definição, buscou -se enfatizar as classificações do
dano ambiental quanto aos interesses – enquanto dano ambiental coletivo ou
individual; as formas de reparação – restauração natural ou indenização em
dinheiro; a possibilidade de dano moral ambiental (cuja base legal é a Lei nº
7.347/85) – de natureza subjetiva ou objetiva. Apresentados importantes
precedentes sobre os diferentes tipos de dano ambiental, foram avaliad os
problemas práticos relativas ao tema, como a dificuldade de constatação do
nexo causal ou a adoção da teoria do risco integral.
Feito esse estudo abrangente do dano ambiental, passou -se,
então, a um exame da possibilidade de negociação com o Poder Público para a
devida compensação do dano produzido. Por excelência, o Termo de
Ajustamento de Conduta (TAC), título executivo extrajudicial, firmado com o
Ministério Público ou qualquer órgão público legitimado, é o meio mais utilizado
para o reconhecimento do dano, a fim de inibi-lo ou repará-lo. Além disso,
buscou-se mostrar como a compensação ambiental, prevista no art. 36 da Lei nº
9.985/2000, serve para uma finalidade compensatória de reparação de danos
(embora haja discussão doutrinária quanto à sua natureza jurídica) . Colocou-se,
ainda, o problema da imposição de medidas compensatórias no decorrer do
licenciamento ambiental, mesmo quando h á incidência de compensação
ambiental. Ficou evidenciada, através de precedentes coletados, uma
instabilidade na jurisprudência pát ria, pendendo, ora para distinção dos
institutos, ora para a consideração de que a medida compensatória configura
verdadeiro bis in idem quando incidente a compensação ambiental.
Em uma segunda parte do Encontro, o Dr. Sérgio Vernetti e o
estudante Fernando Oliva apresentaram um estudo sobre a responsabilidade
penal pelo dano ambiental. A título de introdução, retomou -se o fundamento da
tutela dos bens jurídicos pelo Estado, o princípio da dignidade da pessoa
humana. Além dos bens jurídicos individuais, também os bens jurídicos difusos
podem ser objeto da tutela penal, tendo em vista a sua influência no
desenvolvimento do ser humano.
A Lei dos Crimes Ambientais – Lei nº 9.605/98 visa à punição do
agente mesmo antes da configuração do d ano por meio dos tipos penais de
perigo, pode ser concreto ou abstrato. Enquanto os crimes de perigo concreto
referem-se a uma situação de real perigo ao bem jurídico tutelado, nos crimes
de perigo abstrato o perigo vem presumido na conduta narrada no tipo penal.
Tal distinção pode ser notada quando se observam os tipos da Lei nº 9.605/98.
Por exemplo, a poluição prevista no art. 54, constitui tipo diferente daqueles
que se constituem pela desatenção a permissão ou licença da autoridade
competente, como nos arts. 29 ou 39.
Com base em precedentes dos tribunais pátrios, foram
enfrentadas algumas dificuldades da seara criminal, como a responsabilização
penal da pessoa jurídica, admitida em alguns casos. Ao final, foi feito um exame
geral das penas previstas na lei, chegando-se à conclusão de que as penalidades
previstas são brandas e ineficazes se comparadas à amplitude do dano
ambiental causado.
6) Direito Ambiental Municipal
No dia 16 de agosto de 2011, no auditório do Edifício Corporate
Station, o Santos Silveiro Advogados contou com a honrosa participação da
professora e Procuradora do Município de Porto Alegre, Dra. Vanêsca Buzelato
Prestes, aportando aos Encontros de Direito Ambiental uma enorme
contribuição sobre o tema urbanístico-ambiental no âmbito do Direito
Municipal.
A palestra foi aberta com a retomada do conceito de meio
ambiente utilizado na contemporaneidade, compreendendo tanto o meio
ambiente natural quanto o meio ambiente artificial. Atualmente, o conceito de
meio ambiente inclui tudo que diz respeito ao âmbito das relações sociais e
culturais, como construções, trânsito e o patrimônio histórico-cultural. Na
linguagem do STJ, urbanismo e meio ambiente conjugam -se em expressões
como, por exemplo, “sustentabilidade urbanístico-ambiental”, evocando assim a
necessária relação entre o urbanismo e a natureza. A complexidade do tema
exige uma visão transdisciplinar, tomando -se os conhecimentos produzidos nas
várias ciências. É a partir dessa visão ampla do meio ambiente que se concebe
hoje a gestão ambiental de aterros e mangues, equilíbrio sonoro e visual,
resíduos sólidos urbanos, esgoto etc. São problemas ambientais eminentemente
urbanos o parcelamento do solo, a poluição sonora e visual, a contaminaçã o de
recursos hídricos, a destinação de resíduos sólidos, as redes de infraestrutura
aérea e subterrânea, a fiscalização da emissão de poluentes no ar.
Pode-se notar, na história brasileira, a falta de envolvimento dos
Municípios em questões ambientais, a excessiva centralização do poder, a
existência de uma cultura centrípeta e a atividade degradadora em nível local.
Esse panorama começou a mudar com o advento da Carta Magna de 1988. Pela
Constituição Federal, o Município é um ente federativo cuja competência segue
o princípio da subsidiariedade, cabendo a ele, juntamente com os outros entes
federativos, atuar nos termos do art. 23 ; bem como legislar sobre assuntos de
interesse local e suplementar a legislação federal e estadual, nos termos do art.
30, I e II; além da elaboração do plano diretor, obrigatório para cidades com
mais de vinte mil habitantes, segundo o art. 182, §1°. Mostra-se, com isso, o
quão importante é a participação do Município na gestão ambiental, sobretudo
através da regulamentação do plano diretor, instrumento básico da política de
desenvolvimento urbano, e do licenciamento ambiental.
O plano diretor é de competência exclusiva do Município e
constitui o principal instrumento de política urbana, cujo objetivo é ordenar o
pleno desenvolvimento da função social da cidade. É nesse contexto normativo
que se estabelecem as regras de zoneamento, do parcelamento compulsório, do
consórcio municipal, da reserva legal, do solo criado e outras questões atinentes
à limitação das construções. É no campo do direito municipal que se encontra
um grande fluxo de questões urbano-ambientais, no cruzamento do direito
imobiliário e do direito ambiental.
Ao final da exposição, a palestrante fez a análise de casos
paradigmáticos do STJ, como o RMS nº 9.279/PR, que firma posição no sentido
de que a competência para legislar sobre construção em área de preservação é
simultânea da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; o RESp
nº 226.858/RJ, onde se estabelece que a licença para constru ir não se modifica
em razão de alterações urbanísticas ditadas pelo interesse público em lei
municipal superveniente aos ajustes particulares; o RESp nº 302.906/SP, que
trata da aplicação do princípio da não-regressão ou da proibição de retrocesso
urbanístico-ambiental para invalidar alvará que acolheu estipulação contratual
em favor de terceiro em loteamento, contrariando as restrições convencionais
mais rígidas que as legais; bem como o REsp nº 858.547/MG e o RESp n°
1.051.306/MG, que tratam da legitimida de do Ministério Público para promover
ação civil pública em defesa do meio ambiente, inclusive na hipótese de
poluição sonora. Com uma crítica das decisões analisadas, a Dra. Vanêsca
Prestes realizou o fechamento da exposição, demonstrando com clareza os
pontos nodais do direito imobiliário onde se faz necessária uma atenção jurídica
voltada para a compreensão do direito ambiental municipal.
7) Ética ambiental
Em 22 de agosto de 2011, igualmente no auditório do Edifício
Corporate Station, os Encontros de Direito Ambiental contaram com a ilustre
presença do convidado professor Dr. Orci Bretanha Teixeira, que fez uma
esclarecedora exposição sobre a Ética ambiental, retomando e desenvolvendo
um tema tratado na primeira sessão. O palestrante fez a abertura da exposição
formulando uma questão teórica central no estudo do meio ambiente: É possível
estabelecer-se uma ética do Estado socioambiental?
Com base na filosofia de Hans Jonas, particularmente no tocante
à responsabilidade ética para com as gerações futuras, o palestrante articulou
argumentos que acenam para uma resposta ao problema colocado. A
responsabilidade ética é o que fundamenta as noções de preservação, proteção
e recuperação da natureza. No campo do meio ambiente estão em jogo
interesses difusos que se desdobram em uma solidariedade das gerações. Há um
dever do Estado de garantir o valor histórico, cultural e paisagístico das cidades.
Na base do Estado de direito, encontra -se uma ética ambiental
que dá fundamento axiológico ao direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado. O grande debate da doutrina segue -se como uma tentativa de
definir e legitimar esta ética, seja através de um antropocentrismo, seja através
de um viés ecológico antagônico, o biocentrismo.
8) Estatuto da Cidade e Plano Diretor
Os Encontros de Direito Ambiental tiveram o seu grande fecho
com a palestra intitulada “Estatuto da Cidade e Plano Diretor”, proferida pela
Dra. Lourdes Helena Rocha dos Santos e pela a Dra. Deborah Axelrud, em 24 de
outubro de 2011. Na sua exposição, as palestrantes fizeram um apanhado dos
principais conceitos do direito ambiental que foram tratados ao longo dos
Encontros, buscando aprofundar o estudo sobre o estatuto da cidade e o plano
diretor à luz do direito imobiliário, com enfoque nas cidades de Porto Alegre e
de Curitiba.
As palestrantes retomaram inicialmente a ideia de uma
transformação, na contemporaneidade, da concepção de meio ambiente, cuja
preservação passou a ser considerada como condição para a concretização da
dignidade da pessoa humana. Com a ótica do princípio da prevenção, são
desenvolvidas ações antecipadas para proteger o meio ambiente. Em nosso
sistema jurídico pátrio, o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, das presentes e futuras ge rações, é alçado ao nível constitucional,
nos termos do art. 225. Para dar efetividade à tutela constitucional, o Poder
Público deve editar normas legais protetivas, a Administração Pública deve atuar
de forma vinculada às normas constitucionais ambientais e os Tribunais pátrios
devem concretizar os princípios de direito ambiental. O princípio de prevenção
orienta o próprio direito de propriedade, na medida em que a propriedade deve
realizar a sua função socioambiental.
O instrumento mais importante na concretização da função
socioambiental da propriedade é o plano diretor, previsto na Constituição
Federal. As diretrizes do plano diretor estão previstas na Lei nº 10.257/2001, o
Estatuto da Cidade, aprovada em 10 de julho de 2001. Este importante marco na
legislação urbano-ambiental nacional dispõe sobre a política urbana brasileira,
determinando diretrizes para a regulamentação do uso da propriedade em prol
do bem coletivo e do equilíbrio ambiental. Além do plano diretor, o Estatuto da
Cidade regulamenta outros importantes institutos, como: o zoneamento
ambiental; o IPTU progressivo; a contribuição de melhoria; os incentivos e
benefícios fiscais e financeiros; a desapropriação; a instituição de zonas
especiais de interesse local; a concessão de direito real de uso; a concessão de
uso especial para moradia; parcelamento, edificação e utilização compulsórios;
usucapião especial de imóvel urbano; direito de superfície; direito de
preempção; operações urbanas consorciadas; outor ga onerosa do direito de
construir; transferência do direito de construir; instituição de unidades de
conservação; gestão democrática da cidade; estudo prévio do impacto de
vizinhança.
Ao término da exposição, foi dada a palavra ao Dr. Fabio Caprio
Leite de Castro, que teceu um comentário sobre a sua participação no Congresso
Comemorativo dos 10 anos do Estatuto da Cidade, com a apresentação do
trabalho intitulado “A função social da cidade e da propriedade urbana
enquanto princípio orientador da regulamentação do solo criado no
planejamento urbanístico porto-alegrense”, texto que se encontra disponível
nas publicações do site do Santos Silveiro Advogados.
Após a abertura para o debate, a Dra. Lourdes Helena Rocha dos
Santos fez oficialmente o encerramento dos Encontros de Direito Ambiental, que
contaram com a participação dos advogados e estagiários do escritório Santos
Silveiro Advogados, além dos convidados que honraram e prestigiaram o evento,
trazendo uma grande contribuição para o debate sobre a importância do Direito
Ambiental para o Direito Imobiliário na atualidade.
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