ENCONTROS DE DIREITO AMBIENTAL Aspectos atuais do Direito Ambiental Por Santos Silveiro Advogados Os Encontros de Direito Ambiental, realizados entre os meses de junho e outubro de 2011, sempre após as 18h, em datas previamente fixadas, resultaram da iniciativa do Santos Silveiro Advogados em destacar o papel do Direito Ambiental em nossos dias. O evento contou com a participação de todos os integrantes da equipe jurídica do escritório , de Porto Alegre e de Curitiba, bem como de convidados que abrilhantaram nossas atividades com sua honrosa participação. Os temas dos encontros foram orientados pela necessidade de conscientização sobre os desafios da preservação do meio ambiente e pela aproximação do direito imobiliário e urbanístico ao direito ambienta l. Desde a ética ambiental até o direito ambiental municipal, passando pelos licenciamentos e estudos ambientais, os encontros tiveram por objetivo uma abordagem ao mesmo tempo teórico-conceitual e pragmática do direito ambiental no sistema jurídico pátrio . 1) Da consciência ambiental aos princípios fu ndamentais do direito ambiental Em 07 de junho de 2011, foi feita a abertura dos encontros com a apresentação de pesquisa realizada pelo advogado Dr. Fabio Caprio Leite de Castro e pelo estagiário João Paulo Santos Silveiro . Nesse encontro, colocou-se inicialmente a questão sobre a origem histórica e a fundamentação do direito ambiental. O direito ambiental é bastante recente se comparado às outras disciplinas jurídicas. Isso pode ser e xplicado, em certa medida, pelo fato de a consciência ambiental ter se desenvolvido e ganhado novas proporções com a globalização econômica e cultural. Uma ética ambiental voltada para a natureza e para as novas gerações humanas apareceu como uma verdadeira necessidade de nossa sociedade globalizada. Desde a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição do Mar por Óleo, realizada em Londres, em 1954; passando pela Conferência de Estocolmo, em 1972; e pelo Rio -92; até nossos dias, há uma crescente mobilização política para tratar de assuntos ambientais, como a poluição, o desmatamento e os resíduos inorgânicos. Em outros termos, o direito ambiental nasce de uma preocupação com problemas de ordem ambiental que podem colocar em risco as formas d e vida no planeta. O enfrentamento desse risco está na base do direito ambiental, cujos princípios ideais e fundantes são o princípio da prevenção, o princípio da precaução e o princípio do poluidor pagador. O princípio da prevenção visa evitar riscos conhecidos, a fim de limitar ou combater a poluição já existente, enquanto o princípio da precaução indaga o grau de perigo na ação iniciada, independentemente da existência de estudo comprovando a sua potencialidade nociva. O princípio do poluidor pagador impõe a quem lesa o meio ambiente o dever de arcar com despesas de prevenção e reparação pelo dano. Tais princípios, solicitados por uma nova perspectiva de valoração do meio ambiente, formam a base de todo o direito ambiental. 2) Estudos ambientais e licenciamento ambiental Em 21 de junho de 2011, os advogados Dr. Roberto Santos Silveiro e Dra. Mariana Borges Altmayer apresentaram pesquisa desenvolvida acerca dos estudos ambientais e do licenciamento ambiental. A questão levantada diz respeito ao modo como é feito o diagnóstico do risco ambiental , de forma a antever o dano e preveni-lo. Com base nessa problemática, fez-se um exame de um importante instrumento do Estado na prevenção ao meio ambiente, o licenciamento ambiental. A Constituição Federal prevê, em seu art. 225, §1 º, IV, a exigência, na forma da lei, “para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente” , com a devida publicidade, o estudo prévio de impacto ambiental (EIA ou EPIA), consolidando a determinação da Resolução do CONAMA n º 01/86. O EIA constitui uma avaliação abrangente do risco da atividade, incluindo um estudo amplo do impacto, definição da área, trabalho de campo e as possíveis medidas compensatórias. Neste estudo é baseado o relatório de impacto ambiental (RIMA) que apresenta, sinteticamente, as conclusões auferidas. O art. 2º da Resolução do CONAMA n º 01/86 elenca de forma não taxativa casos onde se faz necessária a elaboração de EIA e respectivo RIM A, dentre eles, no inciso XV, “projeto urbanísticos acima de 100 h ectares ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes”. No Estado do Rio Grande do Sul, o EIA/RIMA está previsto no Código Estadual do Meio Ambiente, art. 71 e seguintes, com a possibilidade de audiência pública . O art. 78 determina os tópicos que deverão constar no RIMA. 1 Vale lembrar que o estudo não vincula o órgão à eventual concessão de licença. O licenciamento ambiental é um procedimento administrativo previsto na Resolução do CONAMA nº 237/97 e funciona como um instrumento de gestão preventivo de controle à poluição e degradação ambiental. Toda licença ambiental depende de EIA/RIMA, nos termos d o art. 3º da Resolução citada. O Anexo I da resolução traz uma lista de atividades industriais e outras onde o licenciamento ambiental é obrigatório, dentre elas as obras civis e parcelamento do solo. O art. 10 da mesma Resolução prevê o procedimento de licenciamento ambiental, que deve cumprir as etapas de requerimento, análise pelo órgão licenciador, esclarecimentos (e complementações) com a emissão 1 Art. 78 - O Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) refletirá as conclusões do Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EIA) e conterá, no mínimo: I – os objetivos e justificativas do projeto, sua relação e compatibilidade com as políticas setoriais, planos e programas públicos; II – a descrição do projeto e suas alternativas tecnológicas e locacionais, especificando para cada uma delas, nas fases de construção e operação, a área de influência, as matérias primas e mão-de-obra, as fontes de energia, os processos e técnicas operacionais, os prováveis efluentes, emissões, resíduos e perdas de energia, os empregos diretos e indiretos a serem gerados, planos e programas públicos; III – a síntese dos resultados dos estudos de diagnóstico ambiental da área de influência do projeto; IV – a descrição dos prováveis impactos ambientais da implantação e operação da atividade, considerando o projeto, suas alternativas, os horizontes de tempo de incidência dos impactos e indicando os métodos, técnicas e critérios adotados para sua identificação, quantificação e interpretação; V – a caracterização da qualidade ambiental futura da área de influência, comparando as diferentes situações de adoção do projeto e suas alternativas, bem como com a hipótese de sua não realização; VI – a descrição do efeito esperado das medidas mitigadoras previstas em relação aos impactos negativos, mencionado aqueles que não puderem ser evitados, e o grau de alteração esperado; VII – o programa de monitoramento e acompanhamento dos impactos; VIII – recomendações quanto à alternativa mais favorável (conclusões e comentários de ordem geral). final do parecer. A competência dos licenciamentos está igualmente prevista na referida resolução, podendo ser esta do IBAMA, do órgão ambiental estadual ou municipal - quando as atividades de impacto ambiental forem de âmbito local ou lhe forem delegadas pelo Estado. Nos empreendimentos imobiliários, a licença divide -se em três tipos sucessivos: a licença prévia, onde são determinadas a localização e a concepção do empreendimento; a licença de instalação, cujo objetivo é o consentimento para a implementação do empreend imento; a licença de operação, para dar início à atividade licenciada. Ao final, foi oportunizado ao grupo um debate com enfoque nos precedentes dos Tribunais analisados na apresentação. 3) Perícia Ambiental Em 05 de julho de 2011, no auditório do Edifício Corporate Station, os Encontros de Direito Ambiental contaram com a ilustre participação do convidado Dr. Manuel Luiz Leite Zurita, renomado perito e professor de perícia ambiental. Do escritório Santos Silveiro Advogados, os advogados Dr. Eduardo Oliva Palma e a Dra. Flávia Tellechea elaboraram estudo específico sobre o mesmo tema, com a finalidade de promover debate com o convidado. A grande contribuição do professor Zurita levou a uma reflexão do grup o sobre a função essencial da perícia ambiental como estratégia de defesa em processos envolvendo a questão ambiental. Distinguindo o perito do assistente técnico, o palestrante frisou a importância deste último para o acompanhamento do advogado desde a concepção da petição inicial ou da contestação, assim como na elaboração dos quesitos. Na seara do direito ambiental, é necessário determinar com clareza quais são os problemas enfrentados e a concepção que se quer apresentar, a fim de se obter uma posição segura no processo. O conjunto de quesitos constitui verdadeira estratégia no confronto com a outra parte. No que tange à perícia ambiental, o palestrante mostrou que a atividade do perito deve contar com a necessária adoção de metodologia para quantificação do dano ambiental e estimativa de valor, seja de caráter compensatório, para a recuperação, seja condenatório, para fixar uma condenação pelo dano ambiental. Os laudos e pareceres realizados dentro ou fora de processo judicial servem, igualmente, para av aliar a possibilidade de transigir ou assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público, cujo acordo poderá importar em reconhecimento de culpa perante terceiros. A apresentação de exemplos para todas as questões teóricas apresentadas trouxe grande dinamicidade à apresentação, seguindo -se um interessante debate sobre a realização de pareceres, contraprova e aspectos relacionados aos casos concretos abordados. 4) Política Ambiental Nacional e Biossegurança Em 18 de julho de 2011, o advogado Dr. Luiz Paulo Linhares Nunes e o estagiário Octavio Chagas Soll da Silva fizeram apresentação sobre a Política Ambiental Nacional e a Biossegurança, com base na Lei n º 6.938/81 e na Lei nº 11.105/2005. O encontro iniciou-se com um exame histórico do Direito Ambiental nas Constituições brasileiras, contextualizando, assim, o funcionamento atual da Política Ambiental Nacional, criada pela Lei nº 6.938/81 e recepcionada pela Constituição Federal de 1988 , encontrando nova regulamentação no Decreto nº 99.274/1990. O Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), criado pela referida lei, compõe-se, principalmente, por órgão consultivo e deliberativo, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente; pelo órgão executor (IBAMA); além dos órgãos seccionais; como a CONSEMA e a FEPAM, ligadas à Secretaria do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul; e locais, como a SMAM em Porto Alegre. 2 As competências do CONAMA estão arroladas no art. 7º do Decreto nº 99.274/1990, dentre as quais se destaca a sua função normativa, mediante proposta do IBAMA, para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras. O IBAMA tem como finalidade exercer o poder de polícia ambiental, bem como executar açõ es das políticas nacionais de meio ambiente, referentes às atribuições federais, relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos 2 Na Resolução CONSEMA nº 167/2007, foram estabelecidos os critérios e diretrizes para o exercício da competência do licenciamento ambiental das atividades de impacto local. Atualmente, no Rio Grande do Sul, 292 Municípios estão habilitados pelo CONSEMA para realizar o licenciamento ambiental. recursos naturais e à fiscalização, monitoramento e controle ambiental, observadas as diretrizes emanadas pelo Ministério do Meio Ambiente. Além da análise do funcionamento do SISNAMA, foi apresentado um estudo da Lei nº 11.105/2005, que trata das normas de segurança relativas ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, verdadeiro marco na legislação ambiental brasileira. Os apresentadores ressaltaram o funcionamento do Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS) – composto por Ministros de diferentes áreas, dentre elas a Justiça, a Saúde e o Meio Ambiente –, bem como da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBIO), que integra o Ministério da Ciência e Tecnologia. 5) Dano ambiental No dia 02 de agosto de 2011, foram realizadas duas apresentações com distintos enfoques sobre o Dano ambiental , trazendo notável contribuição aos Encontros. Inicialmente, o advogado Dr. Marco Meimes e a estagiária Daniela Druck apresentaram um estudo sobre o conceito de dano ambiental e a responsabilidade ambiental no âmbito civil e administrativo. Em um segundo momento, o advogado Dr. Sérgio Pedreira Vernetti e o estagiário Fernando Oliva Palma apresentaram trabalho acerca da responsabilidade ambiental no âmbito penal. A dificuldade de se conceituar o dano ambiental deriva do próprio conceito de “meio ambiente”, cuja abertura de sentido pode levar a uma definição casuística conforme a realidade apresentada ao intérprete. Embora não exista na legislação pátria um conceit o expresso de “dano ambiental”, podese encontrar uma definição das noções de degradação da qualidade ambiental e da poluição, no art. 3º da Lei nº 6.938/81, já abordada no Encontro precedente. Na doutrina brasileira, a “degradação ao meio ambiente” aparec e como elemento comum à definição do dano ambiental como, por exemplo, nos textos de Paulo de Bessa Antunes, Édis Milaré, Patrícia F. I. Lemos e Álvaro L. Valery Mirra, incluindo, neste último, os aspectos naturais, culturais e artificiais que condicionam a vida. Buscou-se, com base na referida doutrina, apresentar a seguinte definição de dano ambiental: “Dano ambiental é o prejuízo causado aos recursos ambientais indispensáveis para a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, provocando a degradação e, consequentemente, o desequilíbrio ecológico”. A partir dessa definição, buscou -se enfatizar as classificações do dano ambiental quanto aos interesses – enquanto dano ambiental coletivo ou individual; as formas de reparação – restauração natural ou indenização em dinheiro; a possibilidade de dano moral ambiental (cuja base legal é a Lei nº 7.347/85) – de natureza subjetiva ou objetiva. Apresentados importantes precedentes sobre os diferentes tipos de dano ambiental, foram avaliad os problemas práticos relativas ao tema, como a dificuldade de constatação do nexo causal ou a adoção da teoria do risco integral. Feito esse estudo abrangente do dano ambiental, passou -se, então, a um exame da possibilidade de negociação com o Poder Público para a devida compensação do dano produzido. Por excelência, o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), título executivo extrajudicial, firmado com o Ministério Público ou qualquer órgão público legitimado, é o meio mais utilizado para o reconhecimento do dano, a fim de inibi-lo ou repará-lo. Além disso, buscou-se mostrar como a compensação ambiental, prevista no art. 36 da Lei nº 9.985/2000, serve para uma finalidade compensatória de reparação de danos (embora haja discussão doutrinária quanto à sua natureza jurídica) . Colocou-se, ainda, o problema da imposição de medidas compensatórias no decorrer do licenciamento ambiental, mesmo quando h á incidência de compensação ambiental. Ficou evidenciada, através de precedentes coletados, uma instabilidade na jurisprudência pát ria, pendendo, ora para distinção dos institutos, ora para a consideração de que a medida compensatória configura verdadeiro bis in idem quando incidente a compensação ambiental. Em uma segunda parte do Encontro, o Dr. Sérgio Vernetti e o estudante Fernando Oliva apresentaram um estudo sobre a responsabilidade penal pelo dano ambiental. A título de introdução, retomou -se o fundamento da tutela dos bens jurídicos pelo Estado, o princípio da dignidade da pessoa humana. Além dos bens jurídicos individuais, também os bens jurídicos difusos podem ser objeto da tutela penal, tendo em vista a sua influência no desenvolvimento do ser humano. A Lei dos Crimes Ambientais – Lei nº 9.605/98 visa à punição do agente mesmo antes da configuração do d ano por meio dos tipos penais de perigo, pode ser concreto ou abstrato. Enquanto os crimes de perigo concreto referem-se a uma situação de real perigo ao bem jurídico tutelado, nos crimes de perigo abstrato o perigo vem presumido na conduta narrada no tipo penal. Tal distinção pode ser notada quando se observam os tipos da Lei nº 9.605/98. Por exemplo, a poluição prevista no art. 54, constitui tipo diferente daqueles que se constituem pela desatenção a permissão ou licença da autoridade competente, como nos arts. 29 ou 39. Com base em precedentes dos tribunais pátrios, foram enfrentadas algumas dificuldades da seara criminal, como a responsabilização penal da pessoa jurídica, admitida em alguns casos. Ao final, foi feito um exame geral das penas previstas na lei, chegando-se à conclusão de que as penalidades previstas são brandas e ineficazes se comparadas à amplitude do dano ambiental causado. 6) Direito Ambiental Municipal No dia 16 de agosto de 2011, no auditório do Edifício Corporate Station, o Santos Silveiro Advogados contou com a honrosa participação da professora e Procuradora do Município de Porto Alegre, Dra. Vanêsca Buzelato Prestes, aportando aos Encontros de Direito Ambiental uma enorme contribuição sobre o tema urbanístico-ambiental no âmbito do Direito Municipal. A palestra foi aberta com a retomada do conceito de meio ambiente utilizado na contemporaneidade, compreendendo tanto o meio ambiente natural quanto o meio ambiente artificial. Atualmente, o conceito de meio ambiente inclui tudo que diz respeito ao âmbito das relações sociais e culturais, como construções, trânsito e o patrimônio histórico-cultural. Na linguagem do STJ, urbanismo e meio ambiente conjugam -se em expressões como, por exemplo, “sustentabilidade urbanístico-ambiental”, evocando assim a necessária relação entre o urbanismo e a natureza. A complexidade do tema exige uma visão transdisciplinar, tomando -se os conhecimentos produzidos nas várias ciências. É a partir dessa visão ampla do meio ambiente que se concebe hoje a gestão ambiental de aterros e mangues, equilíbrio sonoro e visual, resíduos sólidos urbanos, esgoto etc. São problemas ambientais eminentemente urbanos o parcelamento do solo, a poluição sonora e visual, a contaminaçã o de recursos hídricos, a destinação de resíduos sólidos, as redes de infraestrutura aérea e subterrânea, a fiscalização da emissão de poluentes no ar. Pode-se notar, na história brasileira, a falta de envolvimento dos Municípios em questões ambientais, a excessiva centralização do poder, a existência de uma cultura centrípeta e a atividade degradadora em nível local. Esse panorama começou a mudar com o advento da Carta Magna de 1988. Pela Constituição Federal, o Município é um ente federativo cuja competência segue o princípio da subsidiariedade, cabendo a ele, juntamente com os outros entes federativos, atuar nos termos do art. 23 ; bem como legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e estadual, nos termos do art. 30, I e II; além da elaboração do plano diretor, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, segundo o art. 182, §1°. Mostra-se, com isso, o quão importante é a participação do Município na gestão ambiental, sobretudo através da regulamentação do plano diretor, instrumento básico da política de desenvolvimento urbano, e do licenciamento ambiental. O plano diretor é de competência exclusiva do Município e constitui o principal instrumento de política urbana, cujo objetivo é ordenar o pleno desenvolvimento da função social da cidade. É nesse contexto normativo que se estabelecem as regras de zoneamento, do parcelamento compulsório, do consórcio municipal, da reserva legal, do solo criado e outras questões atinentes à limitação das construções. É no campo do direito municipal que se encontra um grande fluxo de questões urbano-ambientais, no cruzamento do direito imobiliário e do direito ambiental. Ao final da exposição, a palestrante fez a análise de casos paradigmáticos do STJ, como o RMS nº 9.279/PR, que firma posição no sentido de que a competência para legislar sobre construção em área de preservação é simultânea da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; o RESp nº 226.858/RJ, onde se estabelece que a licença para constru ir não se modifica em razão de alterações urbanísticas ditadas pelo interesse público em lei municipal superveniente aos ajustes particulares; o RESp nº 302.906/SP, que trata da aplicação do princípio da não-regressão ou da proibição de retrocesso urbanístico-ambiental para invalidar alvará que acolheu estipulação contratual em favor de terceiro em loteamento, contrariando as restrições convencionais mais rígidas que as legais; bem como o REsp nº 858.547/MG e o RESp n° 1.051.306/MG, que tratam da legitimida de do Ministério Público para promover ação civil pública em defesa do meio ambiente, inclusive na hipótese de poluição sonora. Com uma crítica das decisões analisadas, a Dra. Vanêsca Prestes realizou o fechamento da exposição, demonstrando com clareza os pontos nodais do direito imobiliário onde se faz necessária uma atenção jurídica voltada para a compreensão do direito ambiental municipal. 7) Ética ambiental Em 22 de agosto de 2011, igualmente no auditório do Edifício Corporate Station, os Encontros de Direito Ambiental contaram com a ilustre presença do convidado professor Dr. Orci Bretanha Teixeira, que fez uma esclarecedora exposição sobre a Ética ambiental, retomando e desenvolvendo um tema tratado na primeira sessão. O palestrante fez a abertura da exposição formulando uma questão teórica central no estudo do meio ambiente: É possível estabelecer-se uma ética do Estado socioambiental? Com base na filosofia de Hans Jonas, particularmente no tocante à responsabilidade ética para com as gerações futuras, o palestrante articulou argumentos que acenam para uma resposta ao problema colocado. A responsabilidade ética é o que fundamenta as noções de preservação, proteção e recuperação da natureza. No campo do meio ambiente estão em jogo interesses difusos que se desdobram em uma solidariedade das gerações. Há um dever do Estado de garantir o valor histórico, cultural e paisagístico das cidades. Na base do Estado de direito, encontra -se uma ética ambiental que dá fundamento axiológico ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O grande debate da doutrina segue -se como uma tentativa de definir e legitimar esta ética, seja através de um antropocentrismo, seja através de um viés ecológico antagônico, o biocentrismo. 8) Estatuto da Cidade e Plano Diretor Os Encontros de Direito Ambiental tiveram o seu grande fecho com a palestra intitulada “Estatuto da Cidade e Plano Diretor”, proferida pela Dra. Lourdes Helena Rocha dos Santos e pela a Dra. Deborah Axelrud, em 24 de outubro de 2011. Na sua exposição, as palestrantes fizeram um apanhado dos principais conceitos do direito ambiental que foram tratados ao longo dos Encontros, buscando aprofundar o estudo sobre o estatuto da cidade e o plano diretor à luz do direito imobiliário, com enfoque nas cidades de Porto Alegre e de Curitiba. As palestrantes retomaram inicialmente a ideia de uma transformação, na contemporaneidade, da concepção de meio ambiente, cuja preservação passou a ser considerada como condição para a concretização da dignidade da pessoa humana. Com a ótica do princípio da prevenção, são desenvolvidas ações antecipadas para proteger o meio ambiente. Em nosso sistema jurídico pátrio, o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, das presentes e futuras ge rações, é alçado ao nível constitucional, nos termos do art. 225. Para dar efetividade à tutela constitucional, o Poder Público deve editar normas legais protetivas, a Administração Pública deve atuar de forma vinculada às normas constitucionais ambientais e os Tribunais pátrios devem concretizar os princípios de direito ambiental. O princípio de prevenção orienta o próprio direito de propriedade, na medida em que a propriedade deve realizar a sua função socioambiental. O instrumento mais importante na concretização da função socioambiental da propriedade é o plano diretor, previsto na Constituição Federal. As diretrizes do plano diretor estão previstas na Lei nº 10.257/2001, o Estatuto da Cidade, aprovada em 10 de julho de 2001. Este importante marco na legislação urbano-ambiental nacional dispõe sobre a política urbana brasileira, determinando diretrizes para a regulamentação do uso da propriedade em prol do bem coletivo e do equilíbrio ambiental. Além do plano diretor, o Estatuto da Cidade regulamenta outros importantes institutos, como: o zoneamento ambiental; o IPTU progressivo; a contribuição de melhoria; os incentivos e benefícios fiscais e financeiros; a desapropriação; a instituição de zonas especiais de interesse local; a concessão de direito real de uso; a concessão de uso especial para moradia; parcelamento, edificação e utilização compulsórios; usucapião especial de imóvel urbano; direito de superfície; direito de preempção; operações urbanas consorciadas; outor ga onerosa do direito de construir; transferência do direito de construir; instituição de unidades de conservação; gestão democrática da cidade; estudo prévio do impacto de vizinhança. Ao término da exposição, foi dada a palavra ao Dr. Fabio Caprio Leite de Castro, que teceu um comentário sobre a sua participação no Congresso Comemorativo dos 10 anos do Estatuto da Cidade, com a apresentação do trabalho intitulado “A função social da cidade e da propriedade urbana enquanto princípio orientador da regulamentação do solo criado no planejamento urbanístico porto-alegrense”, texto que se encontra disponível nas publicações do site do Santos Silveiro Advogados. Após a abertura para o debate, a Dra. Lourdes Helena Rocha dos Santos fez oficialmente o encerramento dos Encontros de Direito Ambiental, que contaram com a participação dos advogados e estagiários do escritório Santos Silveiro Advogados, além dos convidados que honraram e prestigiaram o evento, trazendo uma grande contribuição para o debate sobre a importância do Direito Ambiental para o Direito Imobiliário na atualidade.