A IMPORTÂNCIA DA MEDICINA LEGAL NO CURSO DE DIREITO ANTONIO ALVES MADRUGA INTRODUÇÃO A presente monografia, como Trabalho de Conclusão do Curso de PósGraduação (latu sensu) em Docência Universitária, prende-se ao interesse de colaboração acadêmica no sentido de coletar estudos sobre matéria tão pouco divulgada até o presente momento, mas que, dada a sua importância, motivou o autor a um estudo bibliográfico acerca desta temática. Nesta pesquisa, será abordado o tema A importância do estudo da Medicina Legal no curso de direito no qual consiste em específica abordagem deste assunto e seus reflexos nas audiências dos futuros formandos em Direito, tanto nos fóruns criminal e civil. A pesquisa foi desenvolvida observando as regras da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) e o método de abordagem utilizado foi o dedutivo por tornar explícitas verdades particulares contidas em verdades universais: foram empregados os métodos de procedimento comparativo, monográfico e analítico interpretativo. Esta pesquisa justifica-se, primeiramente, pela sua aplicabilidade no dia-a-dia, uma vez que, muito embora este tema esteja sendo extinto da grade curricular da maioria das faculdades brasileiras, é de suma importância a sua compreensão para todos estudiosos e militantes do Direito. Por ter sido criado o Código penal como um dos instrumentos de controle da conduta humana, é preciso que se esclareça a divisão em capítulos da Medicina Forense, em que se acham os atos de violência ou agressões com as Normas Legais do Direito, principalmente em alguns artigos do Código supracitado e seus parágrafos que se dirigem a estes danos e suas conseqüências para auxiliar os magistrados do Poder Judiciário. Então, é oportuno descrever a Importância do estudo da Medicina Legal no Curso de Direito, com a finalidade de capacitar os futuros profissionais nas suas atividades no campo jurídico. Esse trabalho é de suma importância, pois vê-se que os acadêmicos terão uma maior visão da realidade prática do que simples teorias e criará maior segurança para os mesmos nas audiências judiciais. Este estudo terá uma repercussão ampla em todos os setores da sociedade, pois haverá uma participação efetiva do futuro profissional na área judiciária, com as interpretações dos laudos periciais e com isso tomando decisões que irão ajudá-los nas suas audiências e conseqüentemente a aplicação da justiça nos casos consumados. O acadêmico aprenderá noções de como os crimes são consumados, os meios utilizados nestes e as conseqüências dos instrumentos usados pelos agentes que figuram no setor da não juridicidade. Marcos Rovinski (Professor de Medicina da ULBRA): Importante assinalar que ao médico legista cabe um viés diferente da Medicina tradicional: enquanto nesta o médico atua no sentido de assegurar a saúde à sociedade e ao indivíduo, quer na prevenção, no tratamento ou na reabilitação do doente, na Medicina Legal o profissional usa todo o conhecimento médico disponível no sentido de esclarecer aos órgãos de segurança e de Justiça fatos criminosos ou suspeitos que tenham vitimado o ser humano. A partir do crescimento da violência e da criminalidade, que lamentavelmente vem ganhando espaço na mídia e na vida das nossas ruas e dos nossos lares, a Medicina Legal assume maior importância na sociedade. Cada vez mais as autoridades de Justiça e Segurança vêm assegurando, à elaboração da prova técnica, um papel fundamental para os inquéritos e processos. Ao mesmo tempo, o avanço da ciência e da tecnologia tem sido vertiginoso, de forma a exigir do profissional um conhecimento sempre atualizado da área médica para que essa venha a acrescentar mais recursos na investigação pericial. MEDICINA LEGAL: Conceitos e objetivos A Medicina Legal caracteriza-se por ser um conjunto de conhecimentos médicos e paramédicos que, no âmbito do Direito, concorrem para a elaboração, interpretação e execução das leis existentes e ainda permite, por meio da pesquisa científica, o seu aperfeiçoamento. É a medicina a serviço das ciências jurídicas e sociais. 1 Ao jurista é necessário seu estudo a fim de que saiba a avaliar os laudos que recebe, suas limitações, como e quando solicitá-los, além de estar capacitado a formular quesitos procedentes em relação aos casos em estudo. É imprescindível que tenha noções sobre como ocorrem as lesões corporais, as conseqüências delas decorrentes, as alterações relacionadas com a morte e os fenômenos cadavéricos, conceitos diferenciais em embriaguez e uso de drogas, as asfixias mecânicas e suas características, os crimes sexuais e sua análise pericial etc. 1 1 – BENFICA, Francisco Silveira; Vaz, Márcia, Medicina Legal Aplicada a Direito, São Leopoldo, RS, Unisinos, 2003, p. 11. Divisão da Medicina Legal O estudo da Medicina Legal divide-se em dois segmentos: a) Parte Geral, que inclui a introdução ao seu estudo, conceitos, importância para o estudante de direito e de medicina, sua divisão, relações com outras ciências, perícias e peritos. 1 b) Parte específica, onde estão incluídas as suas especialidades, citadas abaixo juntamente com o objeto de estudo de cada uma delas: Antropologia Forense: identidade e identificação; Psiquiatria Forense: doenças mentais; Psicologia Judiciária: psicologia dos depoimentos; Sexologia Forense: erotologia, himenologia e obstetrícia forense; Traumatologia Forense: lesões corporais e os agentes traumáticos; Asfixiologia: asfixias mecânicas; Toxicologia: envenenamentos e intoxicações; Tanatologia: morte e suas alterações; Jurisprudência médico-legal: estuda as decisões dos juízes relacionadas com a Medicina Legal; e Diceologia e Deontologia: direitos e deveres do médico. Perícia e peritos Segundo Francisco Silveira Benfica: As infrações penais podem deixar vestígios e são inúmeras as situações em que a justiça necessitará de exames especializados, as perícias, com o intuito de esclarecerem hipóteses e mesmo de servirem de prova, fundamentando uma sentença. A perícia é solicitada por autoridade competente (judiciária, policial ou militar) com a participação de peritos oficiais. Não havendo peritos oficiais, o exame será realizado por duas pessoas idôneas, escolhidas, de preferência, entre as que tiverem habilitação técnica. Estes últimos são chamados de peritos leigos ou nomeados. O perito médico-legista, médico com especialização em Medicina Legal, deve, no exercício de suas atribuições, evitar qualquer interferência que possa constrangê-lo em seu trabalho, não admitindo em qualquer hipótese subordinar sua apreciação a qualquer fato ou situação que possa comprometer sua independência intelectual e/ou profissional. As perícias podem ser feitas em pessoas vivas, cadáveres e coisas, sendo que ao perito são solicitados pareceres quanto à determinação de identidade, diagnóstico das lesões, conjunção carnal, gravidez, alterações mentais, determinação de data e causa mortis, diferenciação entre lesões in vivo e post mortem etc. as aplicações médico-legais concentram-se no exame clínico médico-legal, na necropsia pós-exumação, nas perícias diversas e nos exames laboratoriais pertinentes. As perícias poderão ser feitas em qualquer local, a qualquer dia ou hora, dando preferência aos Institutos de Medicina Legal ou hospitais públicos, durante o dia. A perícia pode ser requerida e realizada em qualquer fase, policial ou judiciária, do processo. Ao médico examinador, ou seja, ao médico-legista são formulados quesitos que serão específicos conforme a perícia a ser feita, seja ela sobre lesões corporais, conjunção carnal, ato libidinoso diverso da conjunção carnal, embriaguez, necropsia, exumação etc. Laudo pericial O laudo pericial é composto pelos seguintes itens: Preâmbulo; Histórico; Descrição; Discussão; Conclusão; e Respostas aos quesitos a) Preâmbulo – parte do laudo onde constam a data, hora e local do exame pericial, autoridade requisitante do exame, dados de identificação do periciando (examinado), peritos designados e os quesitos formulados. b) Histórico – dados relacionados com o fato, fornecidos pela autoridade requisitante e/ou pelo periciando. Deve ser sucinto e não envolver as circunstâncias do fato, que serão analisadas no decorrer do processo. A utilização de expressões como “história de [ ], “periciando refere que[ ], “fomos informados pela autoridade policial de que[ ] evitam a interpretação de que o perito médico está colaborando na confirmação de eventos falsos ou idealizados. 1 c) Descrição – descrição das lesões encontradas com clareza, em linguagem adequada, situando-as, ou seja, localizando-as com as dimensões e características, valendo-se muitas vezes do auxílio de fotografias e/ou desenhos gráficos (croquis). É o item mais importante do laudo pericial e aquela que deve ser considerada com maior atenção pelos interessados no caso. 1 d) Discussão – nem sempre presente, é a parte em que se realiza a análise minuciosa dos dados encontrados, esclarecendo hipóteses e divergências, trajeto de instrumentos etc., muitas vezes com auxílio de citações bibliográficas; é também a oportunidade para o esclarecimento de termos técnicos e siglas utilizadas no laudo. 1 e) Conclusão – também nem sempre presente é a informação essencial que resulta dos dados descritos e discutidos, representa o diagnóstico elaborado a partir dos exames realizados. 1 f) Respostas aos quesitos – específica a cada perícia devem ser dadas de forma objetiva e, quando necessitar de algum complemento, este deve ser sucinto. Não devem ser deixados quesitos sem resposta, mesmo que o resultado seja “indeterminado” ou “sem elementos para responder”. 1 1 – BENFICA, Francisco Silveira; Vaz, Márcia, Medicina Legal Aplicada a Direito, São Leopoldo, RS, Unisinos, 2003, p. 13. A perícia deve ser realizada por dois peritos oficiais. Devido, no entanto, às peculiaridades de cada exame e à falta de peritos em muitas localidades, uma percentagem das perícias acaba sendo realizada apenas por um perito oficial. Mesmo nas localidades com dois peritos oficiais, na maioria dos casos, pelo volume do trabalho, não é possível manter dois peritos realizando todas os exames periciais em tempo integral. Nestes casos, muitas vezes, não é necessário que as perícias sejam realizadas “a quatro mãos”. A melhor interpretação da norma exige somente que o exame seja realizado por dois peritos, mas não impõe que ambos estejam no local dos vestígios concomitantemente. Poderá um profissional realizar o procedimento, vindo, após, outro ratificá-lo. (Parecer da Subprocuradoria Geral de Justiça para os Assuntos Institucionais do estado do Rio Grande do Sul). 2 E isto ocorre, praticamente, na maioria das perícias no estados brasileiros. “A lei não obriga que os dois peritos trabalhem, a quatro mãos. Basta que um efetue o exame e o outro confira o resultado, para satisfazer a formalidade legal”. 2 “É hábito ser o exame pericial realizado por um só perito e ser o laudo assinado também pelo segundo, que, depois de examinar suas conclusões, com elas concordando, o subscreve”. 2 É muito freqüente os pacientes comparecerem para a perícia fora de época, ou seja, quando as lesões corporais já desapareceram ou encontram-se consolidadas. O perito poderá, então, basear sua análise em documentos idôneos, como qualquer atestado ou boletim assinado por médico no exercício legal da profissão. O perito poderá em determinadas circunstâncias, no entanto, desconsiderar o que foi atestado nesse caso estão incluídos os documentos ilegíveis, aqueles em que não constam o nome e o CRM do médico e aqueles cujo diagnóstico o perito pode considerar errado ou absurdo. Caberá, em tais situações, uma “discussão”, na qual o perito explicará o motivo pelo qual o documento apresentado foi rejeitado. 1 1 – BENFICA, Francisco Silveira; Vaz, Márcia, Medicina Legal Aplicada a Direito, São Leopoldo, RS, Unisinos, 2003, p. 13. 2 – BENFICA, Francisco Silveira; Vaz, Márcia, Medicina Legal Aplicada a Direito, São Leopoldo, RS, Unisinos, 2003, p. 14. 3 – BENFICA, Francisco Silveira; Vaz, Márcia, Medicina Legal Aplicada a Direito, São Leopoldo, RS, Unisinos, 2003, p. 14 e 15. Genival Veloso França discorre sobre: 1. Decálogo ético do perito - 1. Evitar conclusões intuitivas e precipitadas. Conscientizar-se que a prudência é tão necessária quanto a produção da melhor e mais inspiradora perícia. Jamais se firmar no subjetivismo e na precipitada intuição para concluir sobre fatos que são decisivos para os interesses dos indivíduos e da sociedade. Concluir pelo que é óbvio e consensual. 2. Falar pouco e em tom sério. Convencer-se de que a discrição é o escudo com que se deve proteger dos impulsos irrefreáveis da vaidade, sobretudo quando a verdade que se procura provar ainda está sub judice ou quando ainda não se apresenta nítida e isenta de contestação. Fugir das declarações ruidosas e sensacionalistas em entrevistas espalhafatosas. Falar o imprescindível, com argumentação e na exata oportunidade. 3. Muita modéstia e pouca vaidade. Aprender a ser humilde. Controlar o afã ao vedetismo. O sucesso e a fama devem ser um processo lento e elaborado na convicção do aprimoramento e da boa conduta ética e nunca pela presença ostensiva do nome ou do retrato nas colunas dos jornais. Não há nenhum demérito no fato de as atividades periciais correrem no anonimato, delas tendo conhecimento às partes interessadas. 4. Manter o segredo exigido. O sigilo pericial deve manter-se na sua relativa guarda e na sua compulsória solenidade, não obstante os fatos que demandam perícias terem vez ou outra suas repercussões sensacionalistas e dramáticas, quase ao sabor do conhecimento de todos. Nos seus transes mais graves, deve o perito manter sua discrição, sua sobriedade, evitando que suas declarações sejam transformadas em ruidosos pronunciamentos. 5. Ter autoridade para ser acreditado. Exige-se também uma autoridade capaz de se impor no que afirma e conclui, fazendo calar sua palavra. Tudo fazer para que seu trabalho seja admirado pelo cunho da fidelidade a sua arte, a sua ciência e à tradição legispericial. Decidir firmemente. A titubeação é sinal de insegurança e afasta a confiança que se deve ditar. Se uma decisão é vacilante, a arte e a ciência tornam-se temerárias e duvidosas. 6. Ser livre para agir com isenção. Concluir com acerto através de uma convicção, comparando os fatos entre si, relacionando-os e chegando à conclusões claras e objetivas. Não permitir que suas crenças, filosofias e paixões venham influenciar um resultado para o qual se exige imparcialidade e isenção. 7. Não aceitar a intromissão de ninguém. Não permitir a intromissão ou a insinuação de ninguém, seja autoridade ou não, na tentativa de deformar sua conduta ou dirigir o resultado para um caminho diverso das suas legítimas conclusões, para não trair o interesse da sociedade e os objetivos da justiça. 8. Ser honesto e ter vida pessoal correta. É preciso ser honesto para ser justo. Ser honesto para ser imparcial. Honestidade para ser respeitado. Ser íntegro, probo e sensato. Ser simples e usar sempre o bom senso. A pureza da arte pura é inimiga do artifício. Convém evitar certos hábitos, pois eles podem macular a confiança de uma atividade em favor de quem irremediavelmente necessita dela. 9. Ter coragem para decidir. Coragem para afirmar. Coragem para dizer não. Coragem para concluir. Coragem para confessar que não sabe. Coragem para pedir orientarão de um colega mais experiente. Ter a altivez de assumir a dimensão da responsabilidade dos seus atos e não deixar nunca que suas decisões tenham seu rumo torcido por interesses inconfessáveis. 10. Ter competência profissional para ser respeitado. Manter-se permanentemente atualizado, aumentando cada dia o saber. Para isso, é preciso obstinação, devoção ao estudo continuado e dedicação apaixonada ao seu mister, pois só assim seus laudos terão a elevada consideração pelo rigor e pela verdade que eles encerram. Documentos médico-legais Segundo Francisco Silveira Benfica: Quando se fala em documento-legal, diz-se de uma informação escrita por um médico, relatando assunto médico de interesse jurídico. Es documento pode ser resultado de pedido de pessoa interessada (atestado ou parecer) ou resultado do cumprimento de uma solicitação da autoridade competente (laudo). Na prática forense é reconhecida a existência de três tipos de documentos escritos: a) Atestado; b) Relatório (auto ou laudo); e c) Parecer Francisco Silveira Benfica define: “Atestado – é a afirmação por escrito de um fato médico e suas conseqüências, sem exigência de compromisso legal, implicando providências administrativas, judiciárias ou oficiosas”. E ainda, conceitua: Relatório (auto ou laudo) – é a narração escrita e minuciosa dos atos de um perito, determinada pela autoridade competente a um perito oficial ou compromissado, cujo objetivo é esclarecer um ou mais fatos de ordem médico-legal. Se é ditado para um escrivão, durante o próprio exame pericial, chama-se auto; se é redigido posteriormente pelos peritos, denomina-se laudo. Parecer – é um documento solicitado, pela parte ou por seu representante legal, a quem tenha competência especial no assunto, independentemente de qualquer compromisso legal, e que é aceito ou faz fé pelo renome de que o subscreve. Em tais pareceres, o médico age como profissional liberal, podendo combinar honorários com a parte interessada, aceitar ou negar o encargo. O parecer não tem uma forma fixa, seguindo aproximadamente, a mesma seqüência do relatório. Além desses, existem os esclarecimentos não-escritos de interesse dos tribunais, denominados depoimentos orais. O juiz pode convocar os peritos a fim de esclarecerem oralmente certos pontos duvidosos de perícias realizadas por eles ou por outrem ou mesmo qualquer assunto de interesse da justiça, o qual será registrado por termo de depoimento. Deontologia dos peritos Delton Croce, discorre: A missão dos peritos é sagrada. Subordinados a uma ética rigorosa, os peritos que faltarem com a verdade no exercício de sua nobre função, embaraçando a Justiça, respondem penal e civilmente por dolo ou culpa, consoante os arts. 342 do Código Penal e 147 do Código de Processo Civil. Os peritos não-oficiais também estão sujeitos à disciplina judiciária (art. 275 do Código de Processo Penal). Hélio Gomes sintetiza as três qualidades essenciais de um bom perito: 1) Ciência; 2) Consciência; e 3) Técnica. Segundo Delton Croce, “Com esses três sintéticos, mas fundamentais, requisitos estará sempre apto a servir à Justiça com imparcialidade e exemplar ética profissional. Com essas três armas, saberá sempre cumprir com o seu dever”. Da Medicina Legal Delton Croce em sua obra, comenta: Antes de descrevermos sobre o assunto, discorrer-se-á sobre as várias denominações desta disciplina como: Medicina Legal Forense (A. Paré); Questões Médico-Legais (P. Zacchias); Medicina Judiciária (Lacassagne); Medicina Judiciária ou dos Tribunais (Prunelle); Jurisprudência Médica (Alberti); Medicina Política (Marc); Medicina Forense (Sydney Smith); Antropologia Forense (Hebenstreit); Bioscopia Forense (Meyer); Medicina Forense Jurídica (sábios de Roma); e, ainda, Medicina Pericial; Medicina Criminal; Medicina da Lei; Biologia Legal; Medicina Crítica; Biologia Forense; Medicina Política e Social (França). A Medicina Legal, França no-lo afirma, é uma disciplina de amplas possibilidades e grande dimensão pelo fato de não se ater somente ao estudo da ciência hipocrática, mas de se constituir na soma de todas as especialidades médicas acrescidas de fragmentos de outras ciências acessórias, sobrelevando-se entre elas a ciência do Direito. O perito médico-legal há de possuir, portanto, amplos conhecimentos de Medicina, dos diversos ramos do Direito e das ciências em geral. Hélio Gomes asseverava ter o perito indispensável educação médicolegal, conhecimentos da legislação que rege a matéria, noção clara de maneira como deverá responder aos quesitos, prática na redação dos laudos periciais, sem esses conhecimentos puramente médico-legais, toda a sua sabedoria será improfícua e perigosa. E, mais, “o laudo pericial, muitas vezes, é o prefácio de uma sentença”. Com efeito, informações periciais desencontradas, ainda que involuntariamente, podem constituir-se na chave da porta das prisões para a saída de marginais ou para nelas trancafiar inocentes, pois, conforme Ambroise Paré, in Oeuvres completes, os juízes julgam segundo o que se lhes informa. O perito médico-legal há de ter, ainda, uma conceituação universitária dos seres humano, auxiliar, por sua cultura, indispensável que é da Justiça, herói anônimo capaz de deslindar crimes indecifráveis através de paciente e penoso trabalho só conhecido das autoridades policial-judiciárias. 2 A Medicina-Legal é arte estritamente científica que estuda os meandros do ser humano e sua natureza, desde a fecundação até depois de sua morte. Exige dos seus obstinados professorados de Medicina do direito, o de outras ciências, para emitirem pareceres minudentes, claros, concisos e racionais, objetivando criar, na consciência de que tem por missão julgar, um quadro o mais preciso da realidade. Relações da Medicina Legal com as demais ciências médicas e jurídicas Para Hélio Gomes em sua obra Medicina Legal: Os primeiros sinais de uma relação íntima entre a Medicina e o Direito remontam aos registros da Antiguidade. No seio dos povos antigos, o poder era exercido pela força, mas também emanava de líderes que ostentavam poderes especiais, fruto de seu alegado relacionamento com os deuses – os sacerdotes. Sendo considerados representantes divinos e agentes da sua vontade, ditavam normas que deveriam ser obedecidas para que os bons fados acompanhassem o grupo. Pelos poderes sobrenaturais de que se diziam possuidores eram chamados a intervir com freqüência, quando a cólera dos deuses, externada sob a forma de doenças, abatia-se sobre os membros daquelas comunidades. Neste momento, o sacerdote, intérprete da vontade divina, invocava a mesma relação para afugentar os maus espíritos e curar os enfermos. Para isso, valia-se de orações, ofertava sacrifícios e usava o que realmente detinha da arte de curar, através do uso de ervas medicinais. O arauto das leis divinas era, a um só tempo, legislador, juiz e médico. Nos documentos mais remotos da história humana, são inúmeros os exemplos da influência mútua entre a Medicina e o Direito. O código penal mais antigo de que se tem notícia, o de Hamurabi, da Babilônia, promulgado no século XVIII a.C., contém dispositivos concernentes à relação jurídica entre médico e paciente. Estabelecia em um dos seus artigos: “Se um médico tratou um ferimento grave de um escravo de um homem pobre, com uma lanceta de bronze, e causou a morte do escravo, deve pagar escravo por escravo”. Contudo, as penas relativas a tratamentos malsucedidos variavam desde multas até a amputação das mãos do médico, na dependência da importância social do paciente. Este código fazia referência, inclusive, à anulação de contratos de compra e venda de escravos por estarem doentes. Representa, pois, o primeiro marco da relação médico-legal, embora não estipulasse que os juízes teriam que ouvir médicos ao julgarem os feitos. O Código de Manu, na Índia do período budista, proibia que crianças, velhos, embriagados, débeis mentais e loucos pudessem ser ouvidos como testemunhas. No mundo ocidental, tal interdição só aparece no Império Romano, com a Lei das XII Tábuas (449 a.C.). Esta lei determinava, entre outras coisas, que a duração máxima aceita para a gravidez seria de 10 meses, o que coincide com o nosso atual prazo de viuvez como impedimento matrimonial. Além disso, um julgamento poderia ser adiado por doença do juiz ou de qualquer das partes. As leis da antiga Pérsia preconizavam uma classificação das lesões corporais por ordem de gravidade, o que só vem a aparecer novamente na lex alemanorum, no século V da era cristã, com a finalidade de se arbitrar a multa a ser paga pelo agressor. A primeira citação do exame médico de uma vítima de homicídio refere-se à morte de Júlio César, cujo corpo foi examinado por um médico seu amigo, de nome Antistius, no ano 44 a.C.. Ele constatou a presença de 23 golpes, dos quais apenas uma era mortal. Mas o exame não foi feito como perito médico, sim na qualidade de cidadão do Império Romano. O reconhecimento de que os médicos são testemunhas especiais em juízo deve-se a Justiniano (483 a 565) ; mas, apesar disto, os juízes não eram obrigados a ouvi-los. A obrigatoriedade só aparece na referida Lex alemanorum dos povos bárbaros germânicos. Com o passar do tempo, este reconhecimento vai se tornando mais freqüente. Carlos magno (742 a 814), nas Capitulárias, instrui os juízes a ouvi-los em casos de lesão corporal, infanticídio, suicídio, estupro, impotência etc. A primeira permissão para realizar necropsias foi dada pelo papa, na França, à faculdade Montpellier em 1374. Até então, os corpos não eram abertos. Contudo, a obrigatoriedade da perícia médica em casos de morte violenta só é decretada, pela primeira vez, pelo Código Bambergense de 1507, na Alemanha, mas sem a evisceração. Ainda não chagara a vez da necropsia forense. Segundo Hélio Gomes, existe valor desigual do estudo da Medicina Legal para o advogado e para o médico: Valor do estudo da Medicina Legal para o advogado - Sendo o Direito uma ciência humana, é preciso, em primeiro lugar, que o profissional do Direito tenha bom conhecimento do que é o ser humano em sua totalidade – uma unidade biopsicossosial. Para isto, não é necessário que possua o saber de um profissional da área biomédica, mas tem que conhecer as bases daquela unidade. E a Medicina Legal lhe provê os elementos necessários a esta compreensão. Se incursionar na elaboração e discussão das leis, terá que ter rudimentos de Biologia para que não proponha normas impossíveis de serem praticadas, por exemplo, no campo da legislação sanitária. Em se tratando de normas penais, o desconhecimento das peculiaridades da personalidade, conforme o biótipo individual, pode levá-lo a querer criar um padrão geral de comportamento pouco flexível e no que não caibam as variações individuais. Na prática forense, muitas vezes terá que se deparar com casos em que certos conhecimentos da área médica serão indispensáveis para poder elaborar quesitos, saber quando apresentá-los e como tirar proveito da resposta dos peritos. No campo do direito penal, são inúmeras as situações que ilustram esta necessidade. Nos casos de aborto, por exemplo, deverá saber que há casos em que ocorre espontaneamente, sem ação criminosa. Havendo suspeita de infanticídio, terá que saber o que é nascer com vida; do contrário aceitará a possibilidade do crime praticado contra um natimorto. Precisará estar atento para os desvios de conduta dos psicopatas, sabendo que não são, na realidade, doentes mentais conforme requer o artigo 26 do Código Penal. Ao ler um laudo cadavérico, ou de lesão corporal, poderá estabelecer associações entre as lesões e as alegações do indiciado. E assim por diante. No direito civil, ressaltam as causas de interdição, de anulação de casamento por impotência, de determinação de paternidade, em que far-se-á necessidade saber que tipos de exame poderá solicitar aos peritos de modo a esclarecer os fatos. Com um mínimo conhecimento de biologia, evitará formular quesitos impossíveis de serem respondidos. Por exemplo, a partir de que dia estaria uma pessoa incapacitada de gerir seus bens. Nas causas de acidentes de trabalho, terá que saber que há doenças que são típicas de certas profissões, como a silicose, que ocorre nos trabalhadores em pedreiras. Valor do estudo da Medicina Legal para o médico – A Medicina Legal é a única disciplina do curso médico que vale mais para o médico do que para o paciente. Ao estudar clínica, ao se preparar para ser um cirurgião, o profissional visa basicamente promover o bem-estar do paciente. Como subproduto desta intenção, se atingido o objetivo, resulta o bom nome do médico. No caso da Medicina Legal, o seu conhecimento previne aborrecimentos com o cliente e questionamentos na Justiça. Por esemplo, o ginecologista tem que saber que não deve introduzir o especulo vaginal em uma paciente virgem, sob pena de romper-lhe a membrana himenal. Nos hospitais de pronto-socorro, a descrição das lesões apresentadas quando da admissão de pacientes traumatizados tem fundamental importância legal, já que poderá ser a única possibilidade de determinar o agente causal, se a vítima permanecer internada por vários dias; tempo suficiente para a descaracterização das feridas pelo processo cicatricial. Na eventualidade de vir a falecer, durante este período, seu corpo terá que ser transferido para exame por meço legista, o qual não disporá de elementos para dizer que instrumento ou meio teria causado as lesões. Para Delton Croce: A Medicina Legal serve mais ao Direito, visando defender os interesses dos homens e da sociedade, do que à Medicina. A designação legal emprestada a essa ciência indica que ela se serve, no cumprimento de sua nobre missão, também das ciências jurídicas e sociais, com as quais guarda, portanto, íntimas relações. É a Medicina e o Direito completando-se mutuamente, em engalfinhamentos. Ao Direito Civil empresta sua colaboração no que concerne a questões relativas a paternidade, impedimentos matrimoniais, erro essencial, limitadores e modificadores da capacidade civil, prenhez, personalidade civil e direitos do nascituro, comoriência etc. Ao Direito Penal, no que diz respeito a lesões corporais, sexualidade criminosa, aborto legal e ilícito, infanticídio, homicídio, emoção e paixão, embriaguez etc. Serve ao Direito Constitucional quando informa sobre a dissolubilidade do matrimônio, a proteção à infância e à maternidade etc.; ao Direito Processual Civil e Penal quando cuida da psicologia da testemunha, da confissão, da acareação do acusado e da vítima. Contribui com o Direito Penitenciário quando converge seus estudos para a psicologia do detento, no que tange à concessão de livramento condicional e à psicossexualidade das prisões.Entrosa-se com o Direito do trabalho quando estuda a infortunística, a insalubridade e a higiene, as doenças e a prevenção de acidentes profissionais; com a lei das Contravenções Penais, quando trata doa anúncios de técnicas anticoncepcionais, da embriaguez e das toxicomanias. A Medicina Legal engranza-se ainda, intimamente, com vários ramos do Direito, a saber: Direito dos desportos, Direito Internacional Público, Direito Internacional Privado, Direito Canônico, Direito Comercial. Ciência médico-jurídico-social indispensável em toda deligência que necessite de elucidação médica, em progressiva e franca ascensão, relacionase também com a Química, a Física, a Toxicologia, a Balística, a Dactiloscopia, a Economia e a Sociologia e com a História Natural (Entomologia e Antropologia). Luiz Carlos Leal Prestes Junior, afirma: A Medicina Legal brasileira, muito influenciada pela Escola francesa, teve como vigas mestras as Faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, em meados de 1832. Devido a indisponibilidade de peritos oficiais, as perícias eram realizadas por indivíduos nomeados pelas autoridades, sem que dominassem os conhecimentos da Medicina Forense. Os peritos de então não possuíam conhecimento de Medicina Legal e sem que existisse regulamentação que disciplinasse a prática pericial, os mesmos eram nomeados de forma parcial resultando em trabalhos primários e sem qualquer embasamento técnico. Com a criação do então Código de Processo Criminal e o ensino oficial da cadeira de Medicina Legal passou-se a estabelecer a perícia oficial, com regras jurídicas, modelos e quesitação oficial, utilizadas até hoje, encontradas no Código Penal, desde a sua criação em 1940. Á partir daí foram galgados importantes avanços no desenvolvimento dos estudos das ciências forenses, sobretudo aqueles originados nas Escolas de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, onde nomes como Raimundo Nina Rodrigues, Oscar Freire, Afrânio Peixoto, Flamínio Fávero entre outros contribuíram de forma marcante no desenvolvimento da Medicina Legal no Brasil. Já a introdução do ensino médico-legal nos currículos de Direito teve sua proposta relatada por Rui Barbosa e aprovada na Câmara dos Deputados, após o que o Governo brasileiro determinou a criação da cátedra de Medicina Legal nas Faculdades de Direito do país à partir de 1891. Ao longo de muitos anos foi Disciplina obrigatória nos cursos de Direito transparecendo a importância da matéria na formação dos profissionais, mormente àqueles que militam na esfera criminal. À despeito da evolução das ciências forenses, que introduziram no século XXI, novos horizontes no contexto Jurídico, ressalto ainda a própria cobrança, da matéria, nos concursos, para aqueles que almejam a carreira Policial. Entretanto o Ministério da Educação decidiu estabelecer a Medicina Legal como disciplina optativa nos cursos de Direito. Ensinar Medicina Legal, hoje, é uma árdua tarefa pois há necessidade de valorizar mais a atividade docente e proporcionar meios para que esse ensino seja amplamente desenvolvido no Direito e na Medicina. Não podemos conceber que uma especialidade médica de tal relevância, não tenha cursos de especialização, mestrado e doutorado privando com isso, uma melhor qualificação do corpo docente. A perícia médico-legal no Brasil é uma atividade oficial e pública, exercida nos Institutos Médico-Legais, sejam nas capitais, sejam no Interior, onde a estrutura técnica geralmente não reúne condições ideais de trabalho. A maioria dos 27 Institutos Médico-Legais vinculados as capitais, estão subordinados as Secretarias de Segurança, sendo que, à partir das reformas constitucionais da União e dos Estados em 1988, a autonomia dos Institutos passou, lentamente, a vigorar. No Estados do Amapá o IML tem independência administrativa e orçamento próprio. No Rio Grande de Sul o IML se acha vinculado a Secretaria de Estado de Justiça, Trabalho e Cidadania. Na maioria dos países da América Latina as chamadas "Polícias Técnicas" estão administrativamente vinculadas ao Poder Executivo, sejam ao Ministério da Justiça ou ao Ministério da Saúde ou ainda ligada ao Poder Judiciário. Apenas no Brasil e no Equador as Polícias Civis abraçam o trabalho pericial, muitas vezes gerando questionamentos quanto a produção de provas que o próprio aparelho policial requisita e a quem são destinadas as conclusões. A tecnologia médica evoluiu muito nos últimos anos e com ela Medicina Legal, entretanto são raros os centros em que o desenvolvimento bio-tecnológico disponibiliza os seus avanços em prol da Justiça. A realidade se faz presente dentro das salas de necropsia. A falta de material, as precárias instalações, enfim o sucateamento dos Institutos Médico-Legais ofusca o brilho da ciência forense. Já dizia o professor e colega Oscar Cirne Neto "... enquanto nós tivermos que dividir nosso orçamento com munição, armamentos e viaturas, jamais teremos condições ideais de trabalho.” Acreditamos que a importância da legisperícia, como elemento probatório, no contexto Judicial, nos leva a acreditar que a mais adequada vinculação funcional das Perícias Médico-legais ou Criminais seja ao Ministério Público ou até como uma sub-secretaria. Existe hoje, no nosso País, uma mobilização liderada pela Sociedade Brasileira de Medicina Legal e pela Associação Brasileira de Criminalística a favor da autonomia das perícias. A falta de recursos orçamentários oriundos dos governos estaduais, os quais sempre priorizando outros setores, levam à Sociedade uma idéia distorcida da Medicina Legal que atribui aos mortos o motivo da total ineficácia da especialidade " ... mortos não falam, portanto não reclamam." Resta-nos acreditar que os próximos governantes, imbuídos do mais sincero sentimento de cidadania possam nos ajudar a resgatar a Medicina Legal, no patamar que ela merece, com a importância que lhe é devida e para que aqueles que a praticam, com seriedade e dedicação, possam, com dignidade afirmar, sem ressentimentos, sou Médico-Legista. Delton Croce afirma: A Medicina Legal nacional desfruta da admiração e respeito do mundo, conforme ficou patenteado (1985) na perícia de determinação da identidade, por especialistas do IML de São Paulo e da Unicamp, do carrasco nazista Joseph Mengele, conhecido pelos prisioneiros de Auschwitz como o “anjo da morte”, cuja ossada foi encontrada sepulta em Embu, São Paulo. Na época colonial, a Medicina Legal nacional foi decisivamente influenciada pelos franceses e, em menor escala, pelos italianos e alemães, sendo praticamente nula a participação portuguesa, estando representada por esparsos documentos médico-legais, compilados de trabalhos referentes à Toxicologia e por “um ou outro laudo pericial feito por leigos, mais interessantes pelo lado pitoresco do que pelo aspecto médico propriamente dito” (Pedro Sales). Numa fase seguinte surge Souza Lima, insigne mestre a quem reverenciamos por ter sido o iniciador, em 1818, do ensino público da Medicina Legal no Brasil, desenvolvendo a pesquisa laboratorial, então reduzida à Toxicologia, e por ter feito, sem ser advogado, uma tentativa de interpretação e comentários médico-legais em relação às leis nacionais. A verdadeira nacionalização da nossa Medicina Legal se deve à criação, por Raymundo Nina Rodrigues, de uma autêntica Escola brasileira da especialidade na Bahia, constituída, entre outros, por Alcântara Machado, Júlio Afrânio Peixoto, Leonídio Ribeiro, Oscar Freire e Estácio Luiz valente de Lima, que originalmente “orientou a diferenciação da disciplina, dos seus métodos e da sua doutrina para as particularidades do meio judiciário, das condições físicas, biológicas e psicológicas do ambiente” (Geraldo Vasconcelos). E desde então sucederam-se sadiamente nas capitais brasileiras as escolas de Medicina Legal, interessando aos juristas, advogados, delegados de polícia, médicos, psicólogos e psiquiatras o conhecimento dessa disciplina, tal o grau de entrosamento que ela guarda com todos os ramos do saber. Importância nas faculdades de Direito Ainda, segundo Delton Croce: Sendo a Medicina Legal a única disciplina nas Faculdades de Direito que se relaciona com a Biologia, seu estudo se reveste de fundamental importância, pois ninguém ignora que os conhecimentos biológicos, médicos e paramédicos ampliam aos acadêmicos de direito a consciência universalista do homem e da gênese de suas ações. Como exemplo, o estudo das socioneuropatias, permitindo ao estudante conhecer os intricados emaranhados da mente humana, abre-lhe maiores perspectivas de percepção sobre seu semelhante e sobre si mesmo, já que o conceito de normalidade é sobremaneira vago: normal é o que funciona harmoniosamente e silenciosamente em sociedade. É o “conhece-te a ti mesmo” socrático, ao qual acrescentamos: por ti mesmo! A Medicina Legal é, portanto, verdadeiro elo de ligação entre o pensamento jurídico e a Biologia, ciência e arte cooperadora na elaboração e na aplicação das leis. Aos juristas, autoridades policiais e advogados importa à Medicina Legal orientar com minudência, concisão e clareza sobre a realidade de um fato de natureza específica e caráter permanente que interessa à Justiça, e como pedir, o que pedir e o modo de interpretar os laudos periciais, para evitar que suceda o ocorrido com delegado da Capital, que, segundo relatou o insigne professor Hélio Gomes, sabedor por informação pericial de que havia espermatozóides na macha da camisa de um suicida, solicitou ao Instituto Médico-Legal determinasse ser o gameta encontrado de homem ou de mulher! “O delegado”, ironiza o mestre, “por não conhecer Medicina Legal, não soube interpretar a resposta simples e clara que lhe fora enviada”. Pelo mesmo mestre, foi ouvido e o mesmo ficou perplexo com a confusão estabelecida por um representante do Ministério Público, data vênia, pouco versado em Medicina Legal, sobre coito vulvar e coito interfemora, expressões para ele não similares. E mais recentemente, nova confusão sobre a fase obstétrica puerperal e o conceito médico-legal de “influência do estado puerperal”, a que alude a lei, no infanticídio. A maioria dos médicos também prescinde, infelizmente, de conhecimentos de Jurisprudência Médica. É por isso que sentenciava Hélio Gomes: “Levando-se em conta o desconhecimento da legislação pelos médicos, esta lhes deverá ser ensinada, de maneira clara e resumida, o suficiente para a perfeita compreensão dos dispositivos legais referentes ao assunto da perícia”. A Medicina Legal estuda a vida, em sua essência, e a morte. É ciência social vivaz e realista, embasada na Verdade e na Justiça, que desnuda o indivíduo desde enquanto ovo e, depois, até o âmago do ser e seduz e apaixona, irremediavelmente, desde o início, os seus profissionais. Genival Veloso França afirma: Além do conhecimento da Medicina e do Direito, exige-se o concurso de outras ciências afins para se firmar com mais precisão o resultado desejado, esclarecer corretamente o raciocínio e exercer com facilidade a dialética. O perito médico-legal, algumas vezes, é transformado em verdadeiro juiz de fato, cuja palavra é decisiva ou ponderável em decisões judiciais. A Medicina legal não se preocupa apenas com o indivíduo enquanto vivo. Alcança-o ainda quando ovo e pode vasculhá-lo muitos anos depois na escuridão da sepultura. É muito mais uma ciência social do que propriamente um capítulo da Medicina, devido à sua preocupação no estudo das mais diversas formas da convivência humana e do bem comum. Investiga os conceitos mais gerais e comuns a todas as disciplinas médicas e expõe comparativamente, para além do âmbito local, as diferentes conceituações da Medicina. Isto quer dizer que, ao mesmo tempo que a Medicina Legal procura estruturar uma conceituação das atividades médicas, aplicáveis a cada sociedade – levando-se em conta os diversos fatores que influenciam na ordem jurídica e social - , ela transpõe essas fronteiras, procurando criar normas gerais de conduta, numa conceituação universalística do homem. O Direito moderno não pode deixar de aceitar a contribuição cada vez mais íntima da ciência, e o operador jurídico não deve desprezar o conhecimento dos técnicos, pois só assim é possível a aproximação da verdade que se quer apurar, não é nenhum exagero afirmar que é inconcebível uma boa justiça sem a contribuição da medicina Legal, cristalizando-se a idéia de que a Justiça não se limita ao conhecimento da lei, da doutrina e da jurisprudência. A Medicina Legal requer conhecimentos especiais e trata de assuntos exclusivamente seus, como, por exemplo, o infanticídio, a asfixia mecânica e a identificação médico-legal. Exige de quem a exerce conhecimentos jurídicos que só podem ser assimilados com a atividade pericial ante os tribunais no trato das questões médicas de interesse da lei. É mero engano também acreditar que a Medicina Legal seja apenas aplicada aos casos particulares dos conhecimentos gerais que constituem os diversos capítulos da Medicina. É necessário saber distinguir o certo do duvidoso, explicar clara e precisamente os fatos para uma conclusão acertada, não omitindo detalhes que, para o médico geral, não tem nenhuma valor, mas que, na Medicina Legal, assumem importância muitas vezes transcendente. Para o juiz, é indispensável o seu estudo, as fim de que possa apreciar melhor a verdade num critério exato, analisando os informes periciais e adquirindo uma consciência dos fatos que constituem o problema jurídico. Talvez seja essa a mais fundamental missão da perícia médico-legal: orientar e iluminar a consciência do magistrado. Muitas vezes, a liberdade, a honra e a vida de um indivíduo estão subordinadas ao esclarecimento de um fato médico-legal que se oferece sob os mais diversos aspectos. Se o juiz não possui uma cultura médico-legal razoável, poderá apreciar esses efeitos erroneamente, conduzindo a um erro judicial, um dos mais graves problemas da administração da justiça, transformando a sentença numa tragédia. Argumenta-se que a falta de conhecimentos médico-legais do juiz nos fatos de implicação médica será suprida pelo perito. Mas nem sempre os informes periciais correspondem à verdade dos fatos ou procedem de pessoas incapacitadas, traduzindo, portanto, graves contradições ou pontos de vista menos aceitáveis. Exige, desse modo, do aplicador da Lei, o conhecimento da Medicina Legal para emitir sempre pareceres concisos e racionais. Assim, mais do que nunca, necessitará a autoridade judiciária de elementos de convicção quando apreciar a prova. Determina o art. 59 do Código Penal vigente não apenas que o juiz examine o criminoso, mas, ainda, as condições que motivaram sua ação anti-social e os mecanismos utilizados na sua execução. Em suma, não só a análise da gravidade do crime praticado, nos motivos, nas circunstâncias e na intensidade, a existência, a qualidade e a quantidade do dano, os meios empregados, o modo de execução e, até se possível, a idéia bem aproximada da complexa e aflitiva coreografia do autor e da vítima. Esse é o grande desafio aos novos magistrados: além do conhecimento humanístico e jurídico, uma sensibilidade cúmplice na apresentação quantitativa e qualitativa da prova. Diga-se mais: não deve o juiz ficar sozinho no cumprimento e nas exigências dessa nova ordem. O advogado, na sua atividade liberal, também necessita muito destes conhecimentos no curso das soluções dos casos de interesse dos seus representados. Deve, no melhor sentido, ser um crítico da prova, no sentido de não aceitar a “absolutização” ou a “divinização” de certos resultados, apenas pelo fato de constituírem avanços recentes da ciência ou da tecnologia. O promotor público, como responsável pelo ônus da produção da prova, tem que justificá-la e explicá-la em seus resultados e sua razões. Exige-se dele, hoje, uma contribuição mais efetiva e mais imediata. Para Genival Veloso França: Os médicos também carecem de conhecimentos do Direito Médico, no estudo da Jurisprudência Médica, tão imprescindível à sua vida profissional, e, ainda, de uma consciência pericial nos casos em que haja um interesse da Justiça na apreciação de um fato inerente à vida e á saúde do homem. Levando em conta as sutilezas das questões médico-legais em que o perito é chamado a intervir, dizia Alcântara Machado: “Tão freqüente e difíceis e relevantes são elas, que fizeram surgir a Medicina Legal como ramo distinto dos outros ramos de conhecimentos, e a prática médico-legal como arte distinta da clínica”. Isto não quer dizer que esta Ciência tenha apenas o caráter prático, informativo, pericial. Hoje, a Medicina Legal moderna, além de contribuir nesse sentido, ainda ajusta o pensamento do doutrinador e complementa as razões do legislador nos fatos de interpretação médica e biológica. Simplesmente “relatar em juízo”, qualquer um faz, bastando ter experiência e bom senso. A Medicina Legal também contribui com precisão e eficiência às necessidades gerais do Direito, transcendendo assim ao simples caráter informativo.Onde não há uma verdadeira contribuição da Medicina Legal, fica a Polícia Judiciária à mercê da boa vontade de um outro médico, nos hospitais, maternidades ou clínicas privadas, para a aquisição de um relatório médico-pericial a fim de esclarecer um fato médico de interesse da Lei. Será uma Polícia Judiciária desaparelhada, incapaz de atender a um mínimo necessário para o cumprimento de sua alta e nobre missão: a de ajudar a Justiça quando da apuração dos mais complexos problemas que interessam ao administrador dos tribunais. Cada vez que crescem as necessidades da Justiça, maiores são as possibilidades da ciência médicolegal, pois dia a dia ganha mais impulso e mais perfeição, sendo hoje um instrumento indispensável em toda investigação que exija o esclarecimento de um fato médico. Segundo o professor A. Almeida Júnior: A Medicina Legal, ramo vasto e complexo dos conhecimentos científicos que une a Medicina ao Direito na aplicação e elaboração das leis reguladoras dos atos humanos, é de inconteste importância para o esclarecimento de inúmeros fatos ou negócios jurídicos. Estudando ela as questões elevadas na hierarquia dos valores, apesar de possuir base biopsicológica, transpõe não poucas vezes, o horizonte predominantemente experimental para juntar-se, ainda, à ciência da Moral na comprovação dos direitos e deveres dos cidadãos. Forrageia , também, em outros ramos do saber humano, os elementos indispensáveis para as suas pesquisas, não só no campo da Medicina propriamente dita, senão, ainda, no âmbito das ciências afins – conhecimentos esses extensos, profundos, e que obrigam seus cultores e pacientes e devotados esforços. As características conjeturais das ciências médicas e a mobilidade permanente dos problemas equacionados corroboram para tornar mais difícil ainda o perscrutar-lhe o vasto campo de investigação. Se ousássemos defini-la, diríamos que a Medicina Legal compreende o estudo e a aplicação dos conhecimentos médicos e afins que devem ser utilizados para o esclarecimento dos fatos e negócios jurídicos, bem como para a elaboração das normas jurídicas que regulam a vida social, sem essa finalidade não haveria razão para a sua existência. O aparecimento da medicina Legal, com corpo doutrinário próprio, decorreu das necessidades surgidas para a solução dos casos concretos. A princípio acenos, nuvem diáfana mal percebida nas legislações primitivas e nos ensinamentos dos antigos mestres; no Código de hamurabi; nas Leis de Manu, em que o brâmane médico jurava, após recitar fórmulas védicas, dizer apenas a verdade (cap. VIII); no Egito, com a verificação da espécie de morte, inclusive antes da prática do embalsamento ou quando, nos crimes de violência sexual, o suspeito, atado sobre o leito em uma das salas do templo, assistia às hierodulas nuas, ou apenas com vestes transparentes, dançarem ao seu redor, e seria considerado culpado se o órgão o traísse; na lei hebraica com os sacerdotes peritos (sacrificadores da tribo de Levi) ou com os velhos da cidade a examinarem as vestes nos casos de desvirginamento; na Grécia, onde o médico, antes da perícia, prestava o juramento junto ao altar de Eumenes; na opinião de Hipócrates, sobre os nascimentos precoces e tardios; na afirmação de Aristóteles (De historia animalium), fixando em 40dias a época de animação do feto, que foi perfilhada pelos magistrados de Areópago no julgamento dos crimes de aborto. No período romano, antes de Justiniano, a primeira determinação relativa à perícia médico-legal é atribuída a Numa inspirado, segundo consta, pela ninfa Egéria, e exigindo a prática de histerectomia nas gestantes mortas. Nessa época era também obrigatório, antes da condenação, o exame, procedido pelas matronas, nas vestais que violassem o véu da castidade. Em todos os casos de morte violenta, o cadáver deveria ficar exposto publicamente para que qualquer pessoa pudesse opinar a respeito do evento. A Lei das Doze Tábuas estabelecia a avaliação dos danos existentes nas pessoas portadoras de ferimentos. A partir de Constantino (313), o cristianismo começou a influir na lei romano, principalmente no Código teodosiano (438), com as questões médicas relativas ao casamento e, mais tarde, no século VI, depois de Augusto, quando Justiniano concitou os jurisconsultos a que reunissem as legislações esparsas para elaborarem a lei romana. No Código Justiniano encontram-se artigos relacionados ao casamento, à impotência, ao aborto, à interdição, às doenças simuladas, ao parto etc. Na atualidade é matéria obrigatória do currículo normal da maioria das Faculdades de medicina e de Direito, ou, então figura nos cursos universitários de especialização ou nas organizações, conforme as normas legais de cada país. No Brasil, tornou-se eletiva em várias Universidades do Direito e com isto vem sofrendo pressões dos acadêmicos e professores para seu retorno compulsório, e que aos poucos volta à grade curricular no Curso. Metodologia de ensino Genival Veloso França discorre: Mesmo que a Medicina Legal seja uma só, no seu conhecimento e na sua concepção prática, entendemos existirem metodologias de ensinos diversas quanto a sua abordagem nos cursos de medicina ou de Direito. No curso médico, deve-se enfatizar a Medicina Legal Pericial, tendo em vista um projeto de formação de um profissional capaz de atender à Justiça como perito oficial ou nomeado, levando-se em conta as diversas formas de contribuição técnica no dia a dia da administração dos tribunais, ao mesmo tempo, quando vinculado à Deontologia Médica, a análise e a discussão de temas que interessam na formação ética de cada médico. A distribuição programática da matéria nos cursos de Medicina deve ser feita de acordo com a seqüência dos capítulos ou unidades encontrados nos diversos tratados da especialidade, os quais têm uma progressão de assuntos ditada pela evolução do seu aprendizado. No curso jurídico, recomenda-se a ênfase à Medicina Legal Doutrinária, como forma de subsidiar e complementar as diversas formas de direito positivo ou de propiciar meios para se assimilarem as informações técnicas e científicas constantes dos relatórios legispericiais. Não quer dizer que se deixe de ensinar a Medicina Legal Pericial, pois ela é também necessária na prática diuturna dos operadores jurídicos. A seleção do conteúdo programático nos cursos de Direito pode ser distribuída especificamente de acordo com os interesses de cada ramo do direito positivo, em medicina Legal Penal (conceito; importância e contribuição da medicina legal nas questões criminais; peritos e perícias e de natureza penal; identidade e identificação criminal; energias causadoras do dano; lesões corporais sob o ponto de vista jurídico-penal; periclitação da vida e da saúde; distúrbios da preferência sexual; aborto legal e aborto criminoso; sedução, posse sexual mediante fraude, estupro e atentado violento ao pudor; infanticídio, toxicofilias, embriaguez alcoólica; tanatologia médico-legal; imputabilidade penal; limites e modificadores), Medicina Legal Civil (conceito; importância e contribuição da Medicina Legal às questões de direito privado; identidade e identificação civil; peritos e perícias de interesse civil; perícia do nascituro e provas do início da personalidade civil; avaliação do dano corpóreo de natureza jurídico-civil; casamento, separação e divórcio; política demográfica; capacidade civil: limites e modificadores; Psicologia Judiciária Civil; estudo do testemunho e da confissão; morte real e morte presumida), Medicina Legal Trabalhista (conceito; relação e contribuição às questões trabalhistas; peritos e perícias das doenças do trabalho, das doenças profissionais e acidentes do trabalho; avaliação do dano corpóreo de natureza trabalhista; deficiência e incapacidade; acidente do trabalho; simulação. Dissimulação e metassimulação em Infortunística do Trabalho; Psicologia do Trabalho; Fisiologia do Trabalho; noções do rendimento muscular; poluição ambiental; contaminação, ruídos e irradiações; necropsias de interesse trabalhista) e Medicina Legal Administrativa (conceito; importância e contribuição da Medicina Legal às questões da administração pública; peritos e perícias em servidores públicos; perícia previdenciária; juntas médicas oficiais; avaliação da capacidade laborativa do servidor público; formalidades no exame biométrico; auditorias: tipos, fundamentos e normas; critérios para readaptação de função pública; avaliação do dano corpóreo de natureza administrativa; atividades penosas e periculosidade na função pública; necropsias de interesse administrativo). Situação atual e prospectiva Ainda, comenta França: A Medicina Legal, no Brasil, mesmo ciente da incorporação de novas técnicas, do avanço da ciência e da contribuição multiprofissional, dispõe no campo pericial de um pequeno progresso, mediante a atuação de alguns setores públicos na criação, recuperação e aparelhamento dos laboratórios, nas instituições especializadas, e na reciclagem do pessoal técnico. Acreditase que só com a total incorporação de tais recursos a sociedade resistirá ao resultado perverso de uma violência medonha que cresce e atormenta. Nada mais justo do que investir mais e mais na contribuição técnica e científica, dotando a administração judiciária de elementos probantes de transcendente valor no curso da apreciação processual, porque uma das funções do magistrado, entre tantas, é buscar a verdade dos fatos. No futuro, com certeza, irão ser usados todos esses formidáveis recursos científicos e tecnológicos disponíveis em favor da prova; como, por exemplo, a análise biomolecular, a bioquímica da detecção de drogas e até mesmo a energia nuclear, além dos modernos computadores, cintilógrafos e tomógrafos de ressonância magnética, como contribuição indispensável aos interesses de ordem pública e social. A Medicina Legal no campo experimental no Brasil ainda se mostra incipiente e tímida, mas começa a se desenvolver alguns focos de pesquisa nos centros acadêmicos de pós-graduação. No terreno doutrinário, em que a Medicina Legal contribui de forma mais eloqüente no ajuste dos institutos do direito positivo, tudo ocorrerá a partir das solicitações mais concretas que essas formas de direito venham a fazer e da evolução do próprio pensamento médico-legal; assim, cada vez mais serão enfatizadas as questões ligadas à Engenharia Genética, como as dos animais transgênicos, clones humanos e terapia gênica ou, nos casos mais delicados da reprodução humana, em que se focalizam principalmente algumas indagações sobre a natureza jurídica e o destino dos embriões congelados. No aspecto pedagógico, a Medicina Legal brasileira já viveu dias mais iluminados, quando as cátedras eram regidas pelos grandes mestres, os quais criaram em torno de si eminentes discípulos e respeitáveis escolas. Hoje, com honrosas exceções, diante da desordenada e irresponsável criação de cursos médicos e jurídicos, recrutam-se profissionais sem nenhuma qualificação e intimidade com a matéria. Assim, essas cátedras estão muito a dever à nossa tradição e, certamente, se não houver um trabalho bem articulado na tentativa de recuperar tal prestígio, no futuro teremos a Medicina Legal ensinada num padrão muito distante de suas insupríveis necessidades. O exemplo disso é que muitas das Faculdades de Direito já têm esta disciplina como matéria optativa e, noutras, ainda pior: a disciplina não existe. Vai sendo ocupada por outras disciplinas de existência e utilidade duvidosas. Resta, disso tudo, a dúvida sobre a qualidade desses futuros profissionais que estão sendo formados. No que se refere ao ensino, é preciso valorizar a atividade docente e dotar o aparelho formador de condições para o ensino da Medicina Legal em caráter obrigatório, tanto em Direito como em Medicina, tendo sempre à frente dessas disciplinas profissionais qualificados e compromissados com esse projeto. Fazem-se também necessárias a criação e a ampliação dos cursos de especialização, de mestrado e de doutorado em Medicina Legal, não só como forma de qualificar o pessoal docente, mas também de recrutar outras vocações. O problema da pesquisa e da investigação de interesse médico-legal é ainda mais complexo, no qual devem ser focalizadas as disponibilidades para o setor. O interessante neste aspecto é sensibilizar as Universidades públicas e privadas em relação à contratação de pesquisadores, cuja tarefa seria a de possibilitar a produção científica de qualidade nesta área de concentração. CONCLUSÃO A Medicina legal é freqüentemente usada na prática forense, pois com as perícias realizadas pelos médicos legistas têm um valor probante indiscutível no auxílio do direito processual pela busca da sentença justa, que tenha como fundamento a verdade dos fatos e suas circunstâncias. Assim, a verificação de lesões ou a necropsia; análise do estado mental do acusado ou a cessação da periculosidade, a conveniência de interdição dos toxicômanos ou a desinterdição dos doentes mentais recuperados, a incapacidade de alguém testar ou ser admitido como testemunha, constituem casos comuns. Portanto, a inclusão da disciplina Medicina Legal no curso de Direito é de extrema importância onde os acadêmicos são preparados para um futuro de audiências, sejam elas penais ou civis, onde possam demonstrar o seu aprendizado como advogados, promotores, delegados, juízes e outras atividades jurídicas, nas interpretações de documentos médico-legais, destacando-se os laudos periciais, pareceres e relatórios que terão que ser interpretados no dia-a-dia destes profissionais, resultando na veracidade ou não de um fato ilícito, condenando ou absolvendo agentes acusados ou indiciados. O Poder Judiciário, desde a fase de inquérito, indo para o setor processual e até no julgamento, necessita de provas estas realizar-se-ão com a colaboração dos peritos médicos legistas como auxiliadores da justiça. Bem utilizados tempestivamente anexados aos processos, os documentos médico-legais esclarecem e auxiliam eficazmente a distribuição da Justiça. Não podemos concordar em opção quando falamos da disciplina Medicina Legal no curso de Direito, pois isto é o maior absurdo, é um equívoco. O que será dos acadêmicos de Direito em seu futuro, nas audiências quando se defrontarem com laudos e mais laudos periciais sem saber interpretá-los; sem noções do que sejam lesões corporais e instrumentos causadores das mesmas; como elaborar os quesitos e interpretá-los quando forem delineados pelos médicos legistas; como ir para um Tribunal de Júri sem a mínima condição de defender ou acusar alguém de um delito sem o auxílio da disciplina Medicina Forense que tanto ajuda os elementos que fazem parte do Poder Judiciário que traz a tona às verdades dos fatos. A sua importância já referida por vários mestres na matéria faz-nos pensar o contrário na retirada da disciplina Medicina Legal das Universidades de Direito no nosso País. Pensam Antonio Francisco Bastos e Fortunato Antonio Badan Palhares, médicos legistas da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo: Não se estimula a arte de pensar. O paciente ou cliente é um número e o computador dá o diagnóstico ou a sentença. Esquece-se de que Medicina e Direito não são só ciências, mas são também arte, amor, calor humano, poesia. E quando a morte vence a vida, a ciência e a técnica, devem, o calor humano, o respeito ao próximo e, sobretudo, o amor aquecerem a lousa fria da sala de autópsia ou a penumbra do salão do júri. Se assim o estudante de Medicina e Direito forem doutrinados, com certeza, mesmo na morte, Direito e Medicina serão vida, e é por essa vida que lutamos. Segundo Eduardo Roberto Alcântara Del-Campo: A Medicina Legal é ciência autônoma ou ramo da Medicina (conforme o conceito adotado) que estuda os fenômenos biológicos de interesse judicial, quer na esfera civil, quer na penal ou trabalhista. Seu objeto, portanto, é o corpo humano, vivo ou morto, e suas interações com o ambiente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS MORAES, José Mauro de. Manual de Medicina Legal. Belo Horizonte/MG: Cultura, 1998. FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 7. ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. SANTOS, J. W. 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