CAP 23 – IDENTIDADE
NARRATIVA
Signo, referente, linguagem e identidade
 Retomando
a experiência do estádio do espelho,
estudada por Lacan, a criança identifica-se com
sua imagem, despertando o impulso para o
desenvolvimento da individualidade.
 Vamos pensar agora no papel da imagem nesse
processo.
A
criança vê sua imagem refletida no espelho, e
com ela se identifica.
 É um signo artificialmente produzido, uma imagem
técnica na produção de experiências pessoais e de
comportamentos individuais e coletivos.
 Ao se reconhecer na imagem do espelho, a criança
tem uma dupla experiência, pois adquire
consciência do signo como um elemento capaz de
referir uma coisa, um ser e, principalmente, uma
ideia.
O
signo é essa ponte que estabelece uma
relação inseparável com seu referente e com o
ser pensante que lhe dá vida.
 Com a fala, a criança adquire a capacidade de
referir-se a si mesma e ao mundo que a rodeia.
 Ela poderá criar realidades com signos verbais,
sonoros ou gestuais.
 As
palavras acrescentam novos elementos à
experiência simbólica, permitindo que a criança
vivencie sua imagem até mesmo quando estiver
longe do espelho, quando a certeza da própria
existência puder ser sintetizada na palavra ‘eu’.
 Além de permitir a relação do ser humano com o
mundo por meio de ‘pontes’ que o ligam à
realidade, a linguagem torna essas experiências
compartilháveis e, portanto, coletivas.
 Por
isso a linguagem e a comunicação são
a base da cultura e da vida social.
 Os signos sempre ligarão o ser ao mundo,
estabelecendo relações, semelhanças e
analogias, fonte de identidade simbólica.
Narratividade, mitos e histórias
 Para
expressar um movimento ou um
acontecimento, o signo nos conduz ao seu
referente, que pode ser uma coisa ou um ser (o
eu ou o outro).
 Contudo, para elaborar um enunciado ou uma
narrativa, são necessários vários signos
combinados entre si.
As pinturas rupestres das cavernas de
Lascaux, na França, feitas por nossos
ancestrais, remetem a diversos seres e coisas.
 Esses
signos estão articulados, prendem-se uns
aos outros formando um discurso ou uma história.
 Esse discurso que articula diversos signos e tem
começo, meio e fim pode ser chamado de
narrativa.
 As primeiras narrativas foram os mitos.
 As histórias bíblicas também são mitos, e um
exemplo ilustrativo é a passagem que narra Adão
e Eva cometendo o pecado original.
Quando o homem começou a desenvolver o
pensamento científico, os mitos foram deixando de
ser a única explicação válida para a orientação da
vida humana.
 Eles também perderam parte de seu caráter
sagrado.
 Muitos deles se transformaram em contos e lendas.

Histórias individuais e histórias coletivas
Uma das características dos mitos é o relato de
acontecimentos coletivos.
 A narrativa mítica trata do surgimento dos primeiros
ancestrais, da demarcação do território, da transformação
de um membro em xamã e até mesmo de tabus
alimentares, explicando como e por que certos hábitos e
tradições são obedecidos pela coletividade.

A
narratividade que se desenvolve com a cultura
humana é uma grande fonte de identidade tanto
coletiva como individual.
 Assim como as máscaras e os papéis sociais,
mitos e histórias medeiam a relação entre o eu e
o outro, entre o indivíduo e a sociedade.
Memória individual e coletiva
 Uma
das funções do mito é a organização da
memória individual e coletiva, pois relata o início
dos tempos, as origens e os acontecimentos
primordiais, possibilitando que os membros do
grupo relacionem a vida pessoal à história coletiva.
 Existem diferentes formas de memória, entre elas a
memória-hábito e a memória-lembrança.
 Pela
memória-hábito condicionamos as ações e
o corpo, sabemos algo “de cor” ou percorremos
um caminho sem prestar atenção ao trajeto.
 Já a memória-lembrança é aquela suscitada
pelas narrativas, que evocam situações
vivenciadas no passado (ex. álbuns de
fotografias)
O interesse das ciências sociais pela
narratividade
 Segundo
Foucault, as ciências humanas
‘endereçam-se ao homem na medida em que ele
vive, fala e produz’.
 Como um ser simbólico, que é o que interessa aqui,
o homem existe enquanto tal pela sua capacidade
de se relacionar com o mundo por intermédio de
construções mentais e sígnicas que referem,
substituem e representam o mundo que o cerca.
Foucault afirma que o objeto das ciências humanas é o
homem, ‘esse ser que do interior da linguagem se
representa’.
 Os primeiros cientistas sociais que se interessaram e
estudaram as narrativas mitológicas, históricas ou
ficcionais dos diferentes povos foram os antropólogos,
como Claude-Lévi-Strauss.

O
estudo das narrativas históricas, biográficas e
ficcionais data também da primeira metade do
século XX, estimulado pelo grande
desenvolvimento dos meios de comunicação e
da importância crescente que as narrativas
midiáticas passaram a ter na cultura.
 Com
o desenvolvimento da psicologia e da
psicanálise, a importância da linguagem e dos
signos na compreensão do ser humano apontou
para possibilidades mais complexas de análise
pelos cientistas sociais.
 George Mead foi um dos primeiros a explorar as
possibilidades de o imaginário elaborar relações
entre o ego (eu) e o alter (outro) e de permitir que
o ego se coloque na posição de alter.
Identidade midiática
É
importante o estudo das diversas linguagens e
formas de expressão, como também dos meios
tecnológicos com os quais e por meio dos quais a
narratividade se processa.
 O advento da fotografia, ainda no século XIX, trouxe
grande contribuição para esse esforço de
construção das identidades pessoal e coletiva e
para a constituição de uma identidade narrativa.
O
ato de fotografar tornou-se hábito importante do
ritual cotidiano de celebrações e formulação
narrativa.
 Pudemos construir histórias protagonizadas por nós
e compartilhadas por outros.
 Pudemos fixar o nosso olhar sobre o que nos cerca,
construindo imagens sobre o outro e registrando-as.
Entender como a tecnologia cria signos e atua nas
formas de comunicação e nas relações sociais é um
dos desafios dos sociólogos das sociedades
contemporâneas.
 O advento das mídias digitais e da comunicação em
rede revolucionou as relações humanas e as formas
tradicionais de narrativa, modificando,
consequentemente, a formulação de nossa identidade.

Download

CAP 23 - IDENT NARRATIVA