Tradução Literária 2011/2012 PARTIDA Língua /linguagem Texto Cultura CHEGADA TRADUÇÃO MEDIAÇÃO INTERACÇÃO Língua / linguagem Texto Cultura factores envolvidos (extra-textuais) universo do texto de partida, cultura e entidade autoral: distância de tempo e espaço, canonicidade/marginalidade do texto e/ou autor iniciador da tradução (editor / tradutor / instituição): função intencionada para o texto traduzido no sitema literário de chegada; massa crítica interveniente na definição de normas preliminares (escolha de textos para traduzir e a partir de que língua) e na norma inicial (adequação /aceitabilidade) público-alvo: expectativas - poética e ideologia na recepção do texto traduzido o tradutor: motivações, posição e estatuto dentro do sistema literário (e. g., tradutor /autor ou tradutor dentro da academia posições relativas das culturas, literaturas e línguas de partida e de chegada (e. g. literatura forte ou fraca, noção de periferia e centro) • Tradução Literária ou Tradução de Textos Literários? O que é a literatura - propriedade da literariedade: expressão verbal em que o meio (a linguagem) é privilegiada sobre a mensagem transmissão com base na escrita canonicidade e prestígio - validação pela comunidade interpretativa função estético-afectiva em detrimento do meramente comunicativo, informativo ou instrutivo não se aplica valor de verdade no mundo real (carácter fictício) ênfase na plurivocidade e ambiguidade linguística recurso a heteroglossia e “estilos minoritários” (sub-padrão, arcaísmos, etc.) relevo do siginificante, atingindo uma dimensão icónica ou emotivo-musical categorias de análise literária: enquadramento, forma (género, estrutura visível, narrador, registo, metáfora, intertextualidade), intriga, desejo Factores intra-textuais Registo: e.g. pode traduzir-se “I think” por “acho” num registo informal a imitar oralidade, mas não, por exemplo, numa carta a Sua Alteza Variação linguística: e. g. devem manter-se palavras yiddish num texto de autor dos EUA, mas fornecer-se nota de rodapé (goy - gentio, não judeu) Pragmática - relações culturais: e. g. medidas: pound sack (saca de meio quilo); expressões idiomáticas: “what’s that supposed to mean?”;questões de metalinguagem (“his Oxford accent was not quite right”). Atender também ao problema da tradução de antropónimos, topónimos e títulos. Intertextualidade: determinação do género “servants” no texto “Circe” de E. Welty, ou implicações sobre masculino genérico atribuído à palavra em “Circe’s Palace” de Hawthorne. Convenções gráficas e de pontuação: sinalização do discurso directo; valor do travessão em português e inglês, podendo (ou não) ser substituído por reticências Segmentação textual - parágrafos; subversões ou constituições de unidades de sentido na distribuição de versos Semântica - no texto literário há que fazer o levantamento de campos semânticos relevantes, para descobrir padrões que importa respeitar; há também que ter uma noção do repertório disponível na língua e literatura de partia (e. g. “his eyes filled with tears” - “os olhos marejaram-se-lhe de lágrimas”; a semântica influi também na consideração de unidades de tradução. Léxico: há que aprender a desconfiar.... desde “phrasal verbs” a “false friends”. E. g., “assume” Fonologia / Prosódia; é das partes mais difíceis de replicar no texto traduzido, mas o tradutor deve ter consciência da sua existência e do modo da sua ocorrência, para se perimitir fazer uma “compensação mais atrás ou adiante... Morfo-sintaxe Morfo-sintaxe: YOU: a determinação de uma forma de tratamento tem implicações pragmáticas que variam de língua para língua. Não havendo, em inglês, distinção entre um pronome de 2ª pessoa singular formal e outro informal, na tradução portuguesa é preciso determinar o grau de familiaridade entre personagens (caso de diálogo) ou entre narrador e destinatário, sendo que este raramente coincidem com um autor e um leitor empíricos específicos embora isso também possa suceder. Realizações possíveis de um “you” em português: Tu, você, vós, 3ª pessoa velada, vocês; e ainda “uma pessoa,” “um indivíduo”, ou “nós” (com valor impessoal) WE / YOU / THEY / ONE: ONE, YOU, WE - SUJEITO IMPESSOAL : Em inglês existem três realizações mais comuns para designar pessoas que podem aplicar-se a “qualquer um de nós”: you, we, one. Destas, o mais problemático é o “you”, visto que em português raramente se usa um “tu” como pessoa genérica, a não ser que o texto pretenda uma implicação mais profunda ou familiar do destinatário. Caso contrário, o mais comum é optarse por “nós”. Também se pode optar por “uma pessoa”, “um sujeito”... Estas últimas soluções são igualmente possíveis para a tradução de “one”, embora neste caso, neutral por natureza, o mais consentâneo seja normalmente traduzir pelo impessoal “se” VALOR DO “MODAL”: todos os modais e verbos auxiliares merecem especialmente cuidado na tradução. “Would” e “Could”, em particular, são muitas vezes dispoensáveis de tradução quando o verbo principal se pode traduzir pelo pretérito imperfeito: “I could see them as two miniatures” - “Via-os (mentalmente) / Imaginava-os como duas miniaturas”; “She would lie in for days on end” - “Deitava-se na cama dias a fio” (pode também transmitir um hábito - “Costumava deitar-se na cama dias a fio”). “Wouldn´t” geralmente tem valor de recusa. IMPERATIVO. A estrutura do imperativo é usada para instruções em inglês, nomeadamente em receitas. "Lay two pig's cheeks in a dish". Em português, pode também usar-se o imperativo ("Deite duas línguas de porco numa travessa"), o infinitivo ("Deitar duas línguas") ou o impessoal da 3ª pessoa plural ("Deitam-se duas línguas") OMISSÃO PRONOMINAL: visto que o Português não exige sempre sujeito explícito, deve omitir-se o pronome pessoal quando não significativo na frase. O mesmo se aplica ao pronome possessivo. FRASES INTERROGATIVAS: a inversão entre sujeito e auxiliar que ocorre necessariamente no inglês, mas não no português, limita por vezes opções de tradução; a verdade, porém, é que não temos, por exemplo de traduzir "será que" sempre que nos aparece um "will" ou um "does" (ex. Millor Fernandes, "When an old translator dies does his sould go straight to heaven?" / Quando morre um tradutor sua alma vai direita pró céu?) ORDEM DOS ADJECTIVOS: por norma, os adjectivos em Português surgem depois do adjectivo. No entanto, a anteposição também é possível e pode servir uma estratégia estranhante. PASSIVA: O Inglês recorre mais à construção passiva, sobretudo com sujeitos inanimados, do que o Português. Geralmente, não devemos manter sempre as construções passivas do texto de partida, uma vez que elas saturam o texto de verbos auxiliares, que em Português causam estranhez quando em grande quantidade e tornam a leitura demasiado pesada. Alternativas: sujeito impessoal o pronome apassivante “se” (The stone was thrown: Atirou-se a pedra”) ou sujeito impessoal da 3ª pessoa do plural (“Atiraram a pedra”). PRETÉRITO-MAIS-QUE PERFEITO é mais raro, quer na sua forma sintética ("fora para casa", "esperarara..."), quer na sua forma analítica ("tinha ido para casa" / "tinha esperado"). Por vezes, seja para evitar a estranheza da sua repetida utilização, seja para diminuir o uso do auxiliar "ter" (necessário para a forma analítica, mas tornando as frases em português demasiado pesadas), podemos substituí-lo, uma vez estabelecida a anterioridade, pelo pretérito perfeito ou pelo imperfeito, consoante o contexto e a duração da acção relatada. (“That day had been the last. I had worked for several years as a plumber, until I decided to devote myself to writing” - Aquele dia tinha sido o último. Trabalhei vários anos...”; “I had practised for hours. I had been playing for several hours until she came along.” - “Tinha praticado durante horas. Já estava a jogar há várias horas quando ela apareceu:” PRETÉRITO IMPERFEITO OU PERFEITO? - uma vez que a distinção entre estes dois tempos não existe em Inglês, há que decidir através de outros elementos textuais quando empregar um tempo ou outro. “I dont’l like her. She was mean to me” (Não gosto dela, foi má para mim”) / “I didn’t like her, she was mean to me everyday at school” ( Não gostava dela. Ela era má para mim.) Fidelidade e Coerência*, Tradução e Manipulação *fala-se em coerência de opções de tradução, mas também em coerência textual, aquilo que permite elaborar sobre o universo discursivo e interpretá-lo consoante padrões (diferente de coesão, a associação dos elementos constitutivos de frases, formando uma textura) Tradução em aceitabilidade Tradução em adequação (respeito de estruturas textuais e (respeito de estruturas textuais e cultura de chegada) cultura de partida) Estratégias de domesticação Estratégias de estranhamento (mudança de unidade, mudança de (sintaxe do TP, obediência a estrutura oracional, mudança de grau estruturas temáticas, intromissões de abstracção, simplificação, filtragem modelares, empréstimos e estrangeirismos, explicitação em notas cultural....) de rodapé) Visibilidade do tradutor e tansparência da tradução (ilusão de) Invisibilidade do tradutor e fluência do texto traduzido Tendências Deformantes (Berman) • Racionalização • Recondução de sintaxe e pontuação à ideia de ordem do discurso natural na LC Ex.Ulisses e os seus homens embebedaram-se na primeira escala e os homens amotinaram-se, diziam alguns. Não! diziam outros: comeram uma planta mágica.. • • Clarificação • Explicitação e definição de sentidos potencialmente ambíguos Ex. Cuja vida é tão extensa como a água (Life as long as the water) • Alongamento • Resultante de estratégias de fluência e aceitabilidade. Ex. “a carne saudosa da sua mulher que partiu há muito.” • Enobrecimento • Parte do pressuposto de que o discurso literário tem de ser belo, consequentemente eleva o tom Ex. “outros cantavam que eles haviam ingerido uma planta que os fizera perder as suas memórias” • • • Empobrecimento qualitativo • Termo ou expressão escolhidos na LC não têm a mesma riqueza icónica do TP Ex. “explorar” (sponging off) • Empobrecimento quantitativo • Menos significantes do que no TP Ex. “a luta foi por não pagarem a conta... foi só uma luta como de costume” (the fight was over non-payment of the bill... It was just a brawl of the usual kind) • • • • • • • • • • • • • • Homogeneização “penteadela ao texto” - unificação daquilo que é heterogéneo (ver ocorrências de “said some” / “no, said others”) Destruição de padrões rítmicos Ex. “para o meu amor - e encantadores - braços de esposa”; “loving - and lovely - wifely arms” Destruição de redes significantes subjacentes Ex. “à procura de imagens” (shopping for images) Destruição de sistematismos (descurar tipo de frases e construções utilizadas) Ex. “And it is an astonishing”... “ And that hurts”... “And it is the authentic” Destruição das locuções e colocações Resultante da tendência para normalizar o vernáculo e para transformar idiossincrasias em expressões aceites Ex. desmorone / “fall apart”; junto às frutas no supermercado de néon (“neon fruit supermarket”) Destruição das sobreposições de línguas Processo hermenêutico em tradução (G. Steiner) confiança - em que o texto faz sentido, agir “como se” agressão / confronto - tradutor invade o texto e colide com ele acomodação / homecoming - texto acomoda-se à casa que o alberga restituição / retribuição: a tradução garante a “sobrevida” do texto identificar e sistematizar problemas de tradução do inglês para português, Objectivos decorrentes do funcionamento contrastivo das duas línguas aplicar processos linguístico-literários de análise de texto (retórica, closereading, polissemia e referência, análise do discurso) na determinação de estratégias tradutórias. apresentar opções de tradução satisfatórias, considerando as possibilidades da estrutura da língua de chegada relativamente à ênfase, registo, tom e estilo do uso da língua de partida, bem como as intencionalidades passíveis de fundamentação no (con)texto de partida em confronto com a pragmática da recepção do texto de chegada. problematizar, na dinâmica entre teoria e prática, noções de fidelidade e coerência em tradução. manejar os principais conceitos do estado actual dos estudos de tradução aplicados aos textos literários ler, apreciar e produzir discursos sobre tradução (textos de interpretação e teoria, estudos descritivos, recensões, etc.) produzir traduções reflectidas e comentadas de textos literários, com incidência sobre a narrativa ficcional breve e alguma poesia.