MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Origem: PRT 3ª Região Interessado(s) 1: MPE - MG Interessado(s) 2: Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde de BH - Sindeess Interessado(s) 3: Ministério Público do Trabalho Assunto(s): Liberdade e Organização Sindical 08.01.04. Procurador oficiante: Antonio Carlos Oliveira Pereira “IMPROBIDADE SINDICAL. Os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais são de interesse público tutelável pelo Parquet trabalhista. Necessidade de início da atividade persecutória ministerial com vistas à obtenção de elementos de informação que justifiquem o encerramento das investigações ou atestem a regularidade da conduta da entidade sindical denunciada. Pela não homologação da promoção de arquivamento sub examine”. RELATÓRIO Trata-se de procedimento administrativo instaurado com gênese em denúncia inicialmente recebida pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais e posteriormente encaminhada ao Parquet laboral, 1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 noticiando a ocorrência de inúmeras irregularidades no âmbito do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde de BH – Sindeess, nos seguintes termos: “(...) O Sr. Presidente desta entidade acima citado, Roberto Antônio Veronica já ocupa o cargo a vários anos, foi demitido do Hospital Belo Horizonte em seu Primeiro mandato e não faz parte da categoria e através de documentação falsa permanece no cargo até hoje. Ele, Roberto Veronica e juntamente com outros diretores; Jose Maria, Maria Josefina, Marcelo Bento, Arlete Martins e outros usam o dinheiro do sindicato que é o dinheiro dos associados da categoria para beneficio próprio. Exemplo, uso de taxi, carros de titular que é conveniado, telefone, Xerox, doações para partido político (PSTU), superfaturamento em organizações de evento, festa de final de ano, seminário, viagens, diárias de hotéis. O sindicato faz doações em dinheiro para outros sindicatos fez uma doação de 10.000,00 (dez mil reais) para o partido PSTU. Imagine agora o presidente do SINDEESS Roberto Veronica é candidato a vereador. E quem vai custear a campanha dele é o sindicato com o dinheiro da categoria, além do mais o sindicato só não esta pedindo dinheiro emprestado, pois esta usando o dinheiro dos processos dos trabalhadores que os hospitais estão depositando, processos da Santa Casa, Vera Cruz, Evangélico e outros. Liberações para diretores para resolverem assuntos particulares e que é custeado pela entidade sindical. Jornais e adesivos que são feitos para a campanha do PSTU em Minas e faz recibo em nome do sindicato como se fosse para a categoria”. 2 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 O ilustre Órgão ministerial oficiante promoveu o arquivamento do procedimento sob os seguintes fundamentos (fls. 24/25), verbis: “(...) Este Procurador não se opõe ao recebimento de denúncia anônima, tanto que em inúmeros outros casos são processadas denúncias dessa modalidade. Isto ocorre com maior frequência quando a denúncia é formulada por empregados. Em tais casos é natural a preservação da identidade do denunciante, pois há risco da perda do emprego. Entretanto, no caso em tela, não parece que a denúncia é formulada por empregado do Sindicato denunciado, mas sim por membro que integra a categoria profissional e está insatisfeito com a atuação do Sindicato. Pelo teor dos fatos denunciados e a natureza da denuncia não se justifica que p denunciante pleitear o sigilo de sua identificação por razões as mais variadas possíveis, o que pode ser assegurado amplamente pelo MPT. Todavia, não há como adotar tal posição quando o denunciante que se encontra no anonimato desde o início da apresentação da denúncia no âmbito da Ouvidoria do Ministério Público Estadual. Alem disso, a denúncia formulada está destituída de indícios e elementos de prova, estando apenas sustentada em fatos articulados de forma genérica, com a imputação de inúmeros delitos a diversas pessoas. É preciso cautela em apreciar a infinidade de denúncias que chegam diariamente ao MP para apuração de condutas irregulares. O MP não possui estrutura para apurar denúncia de origem duvidosa, formulada através do anonimato, que muitas vezes decorre de ressentimentos oriundos de disputas pessoais e políticas. 3 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 Não raro essas investigações que nascem de forma duvidosa não chegam a lugar nenhum. E servem apenas para sobrecarregar a precária estrutura de trabalho, causando prejuízos às investigações que tiveram início regular e transparente, nas quais as partes se fazem presentes para ajudar e colaborar na elucidação dos fatos denunciados”. Por distribuição deste feito na CCR/MPT, vieram os autos a esta Relatora (fl. 32). É o relatório. VOTO-FUNDAMENTAÇÃO Concessa venia dos argumentos expedidos pelo d. Colega oficiante neste feito, entende-se não caiba, por ora, a cessação da tarefa persecutória ao encargo do Ministério Público do Trabalho. Em que pese esta C. Câmara de Coordenação e Revisão costumeiramente entender que não cabe ao Ministério Público do Trabalho exercer qualquer tipo de ingerência em gestão de entidade sindical, tendo em vista a autonomia que lhe é conferida pela Carta Magna, consoante art. 8º, inc. I (“a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização 4 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 sindical”), tem-se que a hipótese do presente expediente denota especificidades que reclamam a atenção do Parquet laboral. Da análise da peça de ingresso, depreende-se que as irregularidades noticiadas não se restringem a uma insatisfação pessoal do denunciante com a atual gestão do sindicato representado. Com efeito, há relato de utilização inadequada da verba sindical, seja para realização de atividades particulares de seus dirigentes, seja para financiamento de campanhas de partidos políticos. Ora, muito embora tenha a Constituição Federal conferido aos sindicatos autonomia administrativa e financeira para gerir seu patrimônio e coordenar suas atividades, também é certo que a atuação da entidade deverá ser norteada pelos princípios da legalidade, da probidade e, bem assim, da moralidade administrativa, tudo em prol dos legítimos interesses da categoria que representa. Saliente-se, por oportuno, que o custeio do sistema sindical brasileiro, segundo o ordenamento jurídico pátrio, é realizado com base na captação de inúmeras contribuições, dentre elas, a conhecida “contribuição sindical”, instituída por lei (Art. 580 da Consolidação das 5 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 Leis Trabalhistas1) e de recolhimento obrigatório pelos integrantes da categoria representada. Inegável, portanto, o caráter tributário característico da contribuição sindical, já tendo, inclusive, o Supremo Tribunal Federal se manifestado por diversas vezes nesse sentido, verbis: EMENTA: CONSTITUCIONAL. SINDICATO. CONTRIBUIÇÃO INSTITUÍDA PELA ASSEMBLÉIA GERAL: CARÁTER NÃO TRIBUTÁRIO. NÃO COMPULSORIEDADE. EMPREGADOS NÃO SINDICALIZADOS: IMPOSSIBILIDADE DO DESCONTO. C.F., art. 8º, IV. I. - A contribuição confederativa, instituída pela assembléia geral - C.F., art. 8º, IV - distingue-se da contribuição sindical, instituída por lei, com caráter tributário - C.F., art. 149 - assim compulsória. A primeira é compulsória apenas para os filiados do sindicato. II. - R.E. não conhecido. (RE 198092, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 27/08/1996, DJ 11-10-1996 PP38509 EMENT VOL-01845-04 PP-00843) – Grifos nossos. EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL: NATUREZA JURÍDICA DE TRIBUTO. COMPULSORIEDADE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (RE 496456 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 30/06/2009, DJe-157 DIVULG 20-08-2009 1 CLT Art. 580. A contribuição sindical será recolhida, de uma só vez, anualmente, e consistirá: I – Na importância correspondente à remuneração de um dia de trabalho, para os empregados, qualquer que seja a forma da referida remuneração 6 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 PUBLIC 21-08-2009 EMENT VOL-02370-07 PP01441) – Grifos nossos. EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. POSTULADO DA SUBSIDIARIEDADE. INOBSERVÂNCIA. INVIABILIDADE DE REFERIDA AÇÃO CONSTITUCIONAL. DOUTRINA. PRECEDENTES. EXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA JUDICIAL RELEVANTE CARACTERIZADA POR JULGAMENTOS CONFLITANTES DE ÓRGÃOS JUDICIÁRIOS DIVERSOS: PRESSUPOSTO NECESSÁRIO E ESSENCIAL AO VÁLIDO AJUIZAMENTO DA ADPF. AUSÊNCIA, NO CASO, DE QUALQUER ESTADO DE INCERTEZA OU DE INSEGURANÇA NO PLANO JURÍDICO, NOTADAMENTE PORQUE JÁ RECONHECIDA, PELO STF, MEDIANTE INÚMEROS JULGAMENTOS PROFERIDOS EM FACE DA CONSTITUIÇÃO DE 1988, A PLENA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL, QUE SE QUALIFICA COMO MODALIDADE DE TRIBUTO EXPRESSAMENTE PREVISTA NO PRÓPRIO TEXTO DA LEI FUNDAMENTAL. DOUTRINA. PRECEDENTES. ADPF DE QUE NÃO SE CONHECE.(ADPF 126 MC / DF DISTRITO FEDERAL, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, julgado em 01/02/2013, DJe-035 DIVULG 21/02/2013 PUBLIC 22/02/2013). – Grifos nossos. Sendo assim, em atenção aos princípios da supremacia e da indisponibilidade do interesse público, havendo notícia da ocorrência de supostos atos de improbidade praticados por diretoria 7 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 representativa em gestão de respectiva entidade sindical, e tendo em vista o caráter parafiscal da contribuição prevista no art. 8º, IV, da CF/88, e sua integração ao patrimônio da referida entidade (art. 549, “a” da CLT), bem assim, e primordialmente, o fortalecimento da respectiva categoria representada, emerge a legitimidade do Ministério Público do Trabalho para atuação no feito. Nesse diapasão, a Orientação nº05 da Coordenadoria Nacional de Liberdade Sindical (CONALIS): “Os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais são de interesse público tutelável pelo Parquet trabalhista”. Destaque-se, oportunamente, que a referida orientação da CONALIS teve como elemento propulsor decisão proferida por esta E. Câmara de Coordenação e Revisão, nos autos do Processo nº9945/2009, cuja ementa a seguir transcrevo: EMENTA: Os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais, por estarem equiparados ao crime de peculato (art. 552, CLT) e serem possíveis de acarretar a destituição de diretores ou de membro de conselho (alínea (c), artigo 553, CLT), afetando a representatividade disposta no inciso III, artigo 8º, da Constituição da República, assim como por atraírem a aplicação das disposições sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos por atos de improbidade ( Artigo 1º, § 8 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 único, c/c artigo 7º, Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992), são de interesse público tutelável pelo parquet trabalhista. Processo CCR nº9945/2009, Relator voto divergente: Subprocurador-Geral do Trabalho Rogério Rodriguez Fernandez Filho, deliberado em 29/09/2009. Por fim, há de se concluir que a autonomia albergada em sede constitucional e garantida aos sindicatos não tem caráter absoluto e tampouco deve servir como obstáculo à atuação ministerial quando presentes indícios de lesão a direitos transindividuais da coletividade laboral. Diante do exposto, tendo em vista a necessidade de início da atividade persecutória ministerial com vistas à obtenção de elementos de informação que justifiquem o encerramento das investigações ou atestem a regularidade de conduta da entidade sindical, a não homologação da promoção de arquivamento sub examine é medida que se impõe. CONCLUSÃO Pelo exposto, voto no sentido de NÃO HOMOLOGAR o arquivamento proposto pelo Exmo. Procurador do Trabalho, Dr. Antonio Carlos Oliveira Pereira, às fls. 24/25 do 9 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO FEITO PGT/CCR/PP/Nº 2044/2013 presente expediente administrativo. Deixo, no entanto, de aplicar o inciso II, do §4º, do art. 10 da Resolução CSMPT nº69/07, devendo a designação atender às práticas da Regional. Retornem os autos à origem para regular processamento. Brasília, 22 de março de 2013. VERA REGINA DELLA POZZA REIS Subprocuradora-Geral do Trabalho Coordenadora da CCR – Relatora ffpam 10