UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DE SUL FELIPE DE SOUZA RODRIGUES POSSIBILIDADE DE EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO: ANALISANDO AS NOVIDADES DA LEI N° 12.016/2009 Ijuí (RS) 2012 FELIPE DE SOUZA RODRIGUES POSSIBILIDADE DE EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO: ANALISANDO AS NOVIDADES DA LEI N° 12.016/2009 Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia. UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DEJ – Departamento de Estudos Jurídicos. Orientadora: MSc. Eloisa Nair de Andrade Argerich Ijuí (RS) 2012 AGRADECIMENTOS Agradeço a toda minha família, principalmente aos meus pais que sempre me apoiaram em todas as minhas decisões, me guiando pelo melhor caminho, responsáveis por momentos marcantes em minha vida por sua dedicação, pelo amor que me faz mais forte, fazendo entender que somos capazes de ir mais além. Esta vitória também é de vocês. RESUMO O presente estudo monográfico faz uma análise dos direitos e garantias fundamentais no ordenamento jurídico brasileiro, abordando os remédios constitucionais, as diferenças entre direitos e garantias constitucionais. Apresenta, ainda, o instituto do mandado de segurança, que recentemente sofreu modificações introduzidas pela Lei 12.016/2009, realizando uma análise detalhada sobre as alterações introduzidas mediante o contexto jurídico brasileiro. Palavras-chave: Direito e Garantias Constitucionais. Características dos Direitos Fundamentais. Mandado de Segurança. Mandado de Segurança Coletivo e Individual. ABSTRACT This monographic study is an analysis of the fundamental rights and guarantees in the Brazilian legal system, addressing the constitutional remedies, the differences between constitutional rights and guarantees. It also presents the institute's injunction, that has recently amended by Law 12.016/2009, performing a detailed analysis on the changes introduced by the Brazilian legal context. Keywords: Law and Constitutional Guarantees. Characteristics of Fundamental Rights. Writ of Mandamus. Injunction Collective and Individual. . SUMÁRIO INTRODUÇÃO.........................................................................................................................8 1. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS............................................................10 1.1 Conceito e Evolução dos direitos fundamentais ............................................................11 1.1.1 Direitos de Primeira Geração.........................................................................................14 1.1.2 Direitos de Segunda Geração.........................................................................................15 1.1.3 Direitos de Terceira Geração..........................................................................................17 1.2 Características dos Direitos Fundamentais....................................................................21 1.3 Diferenciação entre Direitos e Garantias Fundamentais..............................................22 2 EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO...............................................................................................................................25 2.1 Remédios Constitucionais na CF/88................................................................................25 2.1.1 Mandado de Segurança - art.5º LXIX ...........................................................................27 2.1.2 Analise da Lei 12.016/2009. Novidades e recuos...........................................................34 2.1.3 Posicionamento Jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em face da nova lei do Mandado de Segurança...........................................................................40 CONCLUSÃO.........................................................................................................................44 REFERÊNCIAS......................................................................................................................46 ANEXO A - ACÓRDÃO. Mandado de Segurança. Aprovação Dentro do Número de Vagas do Edital........................................................................................................................49 ANEXO B - ACÓRDÃO. Mandado de segurança. Reprovação no exame psicológico....53 ANEXO 3 ACÓRDÃO. Mandado de Segurança. Negativa de Registro a Atos de Nomeação.................................................................................................................................58 8 INTRODUÇÃO Nesta pesquisa monográfica pretende-se abordar as novidades do Mandado de Segurança em face da Lei 12.016/2009 e a possibilidade de efetivação dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico. Importante referir que para a realização deste estudo serão abordados aspectos referentes aos direitos e garantias fundamentais, haja vista que são estes que podem ser violados. Pode-se afirmar que os direitos fundamentais são normas declaratórias e as garantias fundamentais são normas assecuratórias, sendo assim necessário se faz aborda-los. A partir do momento que a Constituição Federal de 1988 reconhece e consagra os direitos e garantais fundamentais, assume um papel preponderante a discussão acerca da sua evolução, ou seja, as denominadas gerações de direitos, visto que estão intimamente ligadas às transformações da sociedade e do Estado e para este estudo é fundamental a sua compreensão. Desta forma no primeiro capitulo se faz uma análise do surgimento dos direitos e garantias fundamentais, bem como sua origem e conceituação. Ainda, neste capitulo, abordase a divisão clássica dos direitos e garantias fundamentais em três gerações, de acordo com o momento histórico mundial que foram reconhecidos. Apresenta-se a divisão dos direitos como sendo direitos de primeira, de segunda e de terceira gerações. Embora alguns doutrinadores, entre eles Paulo Bonavides, informem que estamos vivenciando momentos nos quais outros direitos se fazem presentes, e compreendem 9 os direitos do homem no âmbito internacional, direito ao desenvolvimento, direito ao meio ambiente sadio, direito à paz, direito à descolonização, enfim os chamados direitos de quarta geração, a abordagem restringir-se-á as gerações mencionadas acima. É importante analisar as características dos direitos fundamentais, e precisam ser apontadas, pois a partir daí compreender-se o instituto do Mandado de Segurança e o significado de direito líquido e certo. Diante dessas características, tem-se a exata dimensão dos direitos fundamentais, os quais são ou devem ser universais, tendo aplicação imediata no âmbito jurídico, fazendo com que o Estado garanta a todos as condições mínimas, porém, indispensáveis para subsistência, enquanto cidadãos de direitos e deveres, baseando–se no princípio da igualdade, e da dignidade da pessoa humana. Na segunda parte deste trabalho verifica-se a efetivação dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico por meio de estudo dos remédios constitucionais, mecanismos de proteção, incluindo-se o Mandado de Segurança art. 5.º LXIX da CF/88. Para melhor compreensão do Mandado de Segurança analisa-se a Lei 12.016/09 e as novidades introduzidas. E, por ultimo analisa-se o posicionamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, relativamente aos pedidos em face da nova lei. Salienta-se que esta pesquisa foi do tipo exploratório, com abordagem hipotéticodedutiva e utilizado documentos virtuais, livros, jurisprudências para sustentação jurídica. 10 1 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS: CONCEITO E DIFERENÇAS Antes de adentrar na diferenciação entre direitos e garantias fundamentais é necessário discutir, primeiramente, o conceito de direito fundamental. Vejamos então o que Cury (2005, p. 1) tem a nos dizer sobre o assunto. Numa visão lata, não há diferença entre as versões direitos do homem, direitos humanos e direitos fundamentais. Porem, em sentido estrito, tais expressões são empregadas da seguinte forma: Direitos do homem – expressão mais utilizada na doutrina jusnaturalista contratualista dos séculos XVII a XIX (Locke, Hobbes e Kant). Diz respeito ao direito natural e aos direitos de liberdade decorrentes; Direitos humanos – expressão utilizada em relação aos direitos e liberdade previstos em tratados internacionais. É um termo internacional dos direitos fundamentais. Direitos fundamentais – em sentido estrito, podem ser conceituados como o conjunto de normas que cuidam dos direitos e liberdade garantidos institucionalmente pelo direito positivo de determinado Estado; devem sua denominação ao caráter básico e fundamentador de toda ordem jurídica, com limitação espacial ou temporal. Segundo Canotilho (1997, pp. 375-377), os direitos fundamentais devem ser observados sob dupla perspectiva: objetiva – cabe ao estado garantir o exercícios desses direitos – e subjetiva – as pessoas têm o direito de exigir do Estado uma prestação (positiva ou negativa). Necessário se faz distingui-los, haja vista que ao se falar em direitos fundamentais se está dizendo que são situações privilegiadas nas quais as pessoas objetivam o trinômio, liberdade igualdade e fraternidade, enquanto garantias fundamentais são instrumentos para assegurar tais condições favoráveis. Neste sentido pode-se afirmar que os direitos fundamentais são normas declaratórias e as garantias fundamentais são normas assecuratórias. Para corroborar tal afirmação utilizamos os ensinamentos de Lenza (2010, p. 741): Assim, os direitos são bem e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto as garantias são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aplaudidos direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violado. Por fim, diferenciar os direitos fundamentais dos remédios constitucionais. Estes últimos são espécies do gênero garantia. Isso porque, uma vez consagrado o direito, a sua garantia nem sempre estará nas regras definidas constitucionalmente como remédios constitucionais (ex.: habeas corpus, habeas data etc.). Em determinadas situações a garantia poderá estar na própria norma que assegura o direito. Direitos e garantias na realidade são normas que possibilitam ao cidadão a concretização material de seus direitos subjetivos, individuais ou coletivos . 11 A norma inscrita no art. 5º, inciso LIV da Constituição Federal de 1988, mostra-nos essas distinções: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;a referida proposição nos trás ao mesmo tempo direito e garantia, quais sejam a liberdade e o devido processo legal; A referida proposição demonstra ao mesmo tempo direito e garantia, quais sejam a liberdade e o devido processo legal. O devido processo legal assegurando a liberdade em relação à prisão arbitrária, não é o único instrumento, podendo ser citado o inciso LVIII do art. 5.ª “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A ação de habeas corpus presta-se exclusivamente a proteger a liberdade de ir e vir, a liberdade ambulatorial, e se esta não for lesada ou está na iminência de o ser, o seu uso é absolutamente descabido, portanto é uma garantia. A partir do momento que a Constituição Federal de 1988 reconhece e consagra os direitos e garantias fundamentais, assume um papel preponderante a discussão acerca da sua evolução, ou seja, as denominadas gerações de direitos, visto que estão intimamente ligadas às transformações da sociedade e do Estado. 1.1 Conceito e Evolução dos direitos fundamentais Importante analisar de onde surgiram os direitos e garantias fundamentais. As teses sobre a origem são de várias vertentes, alguns defendendo em mudanças aprofundadas em diversas legislações, outros da conjugação de pensamentos filosóficos e de ideias do cristianismo, outros do direito natural, porém, dúvida não existe. Tem como marco histórico formal, o constitucionalismo no séc. XVIII, que buscando a limitação do poder acabou por almejar o pleno desenvolvimento da personalidade humana, de outro lado como classificá-los visto que todas as Cartas, desde a primeira Constituição Francesa de 1791, acabaram por 12 destinar títulos ou capítulo com cada finalidade, o mesmo ocorrendo com as brasileiras desde a época imperial (ZIMMERNANN, 2004). Sustenta-se o acima exposto com as palavras de Zimmermann (2004, p. 259). Durante os séculos XVI e XVII surgiu na Europa um visão mais humanista da política, redundante da nova concepção jusnatural dos direitos do homem. Como meta básica, postulou-se a constitucionalização de um projeto delimitador da autoridade governamental, que garantisse ao indivíduo determinados direitos perante o poder potencialmente opressor do Estado. Assim sendo, os direitos fundamentais passaram a ficar consubstanciados em documentos constitucionais, para que então fossem reconhecidos pela sociedade e aceitos como reveladores dos direitos inerentes à própria natureza humana. Estas cartas, solenes e universalistas, postulavam a proteção humana como a finalidade essencial de toda a sociedade política, buscando assegurar a igualdade de direitos e reconhecer a necessidade de liberdade individual, bem como o direito de resistência, às formas variadas de opressão social. Desde então, as declarações dos direitos representam a parte mais nobre da Constituição, orientando o Estado para a garantia de certos princípios fundamentais, que assim estariam revelados como atributos naturais da pessoa humana, imutáveis e estabelecidos por Deus para que todos nós fossemos livres e iguais em direitos. O primeiro destes direitos seria o direito à vida, pressuposto evidente para o usufruto dos demais. Observa-se que a doutrina costuma dividir os direitos e garantias fundamentais em três gerações, de acordo com o momento histórico mundial que foram reconhecidos, sendo assim importante estudá-los. Dividem-se em direitos de primeira, de segunda e de terceira gerações, Embora alguns doutrinadores, entre eles Paulo Bonavides, informem que estamos vivenciando momentos nos quais outros direitos se fazem presentes, e compreendem os direitos do homem no âmbito internacional, direito ao desenvolvimento, direito ao meio ambiente sadio, direito à paz, direito à descolonização, enfim os chamados direitos de quarta geração, a abordagem restringir-se-á as gerações mencionadas acima. Portanto, a evolução histórica dos direitos fundamentais nos oferece elementos suficientes para a compreensão das relações existentes entre as suas dimensões e o Estado Constitucional. Cumpre assinalar que vale a pena esclarecer a utilização dos vocábulos geração ou dimensão, pois só assim ter-se-á a exata compreensão de sua evolução. 13 Neste sentido, Cury (2005, p. 11) destaca: Verifica-se que este último, dimensão, substitui, segundo Paulo Bonavides (2001, p. 525), como vantagem lógica e qualitativa, o termo geração, caso este último venha a induzir apenas a sucessão cronológica e, portanto, suposta caducidade dos direitos das gerações antecedentes, o que não é verdade. Ao contrário, os direitos de primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos de desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e a fraternidade, permanecem eficazes, são infra-estruturas, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia. Cabe ressaltar que se utilizará a classificação tridimensional utilizada por T.H.Marshal (1967), a mais aceita pela maioria dos doutrinadores clássicos que procuram conciliar o surgimento de determinados direitos fundamentais, juntamente com as três principais correntes do pensamento jurídico, quais sejam, o positivismo normativo, o positivismo sociológico e o jusnaturalismo (GALINDO, 2006). Por menor que seja a diferença em relação aos períodos históricos do surgimento dos direitos e consequentemente na construção das gerações, importante referir que estas fazem parte das necessidades e evolução histórica da humanidade, e certamente isso possibilitará uma maior compreensão do segundo capítulo desta pesquisa. Neste Sentido, Bedin (2002, p. 42) enfatiza: A classificação proposta por T.H. Marshall (1967) é, sem sombra de dúvida, a mais aceita e valorizada pelos estudiosos na área. No entanto, temos que reconhecer, neste momento, que ela possui uma grande lacuna: não abrange (e não poderia abranger, pois foi proposta em 1950) um fenômeno novo que é a questão dos direitos no âmbito internacional. Por isto, para efeito deste trabalho, propomos a seguinte classificação: a) direitos civis ou direitos de primeira geração; b) direitos políticos ou direitos de segunda geração; c) direitos econômicos e sociais ou direitos de terceira geração; d) direitos de solidariedade ou direitos de quarta geração. Dito isto, pode-se passar a análise das gerações de direitos. Estão divididas em direitos de primeira, segunda e terceira gerações, como já referido acima. 1.1.1 Direitos de primeira geração 14 Para identificar os direitos de primeira geração, verifica-se que foram os primeiros a serem adotados na Carta Magna inglesa no sec. XII e também na já citada Constituição Francesa de 1791 (BEDIN, 2002). Como a revolução francesa foi puramente burguesa, demonstrando a insatisfação dos comerciantes e industriais contras os desmandos da coroa e da nobreza que teimava em manter privilégios a apenas poucos, que não respeitava a liberdade e a propriedade das pessoas, valores que lhes eram supremos. Desta forma surgiu situação comum nas monarquias absolutistas, onde o arbítrio real não tinha limites, eis que todo poder do rei era sem causa legal ou agia arbitrariamente e sem indenização, claro que isso tudo sem nada a pagar e sem o devido processo legal. Assim o que buscavam o revolucionários não era a ação estatal e sim a omissão, o que caracterizou os primeiros direitos fundamentais reconhecidos, chamados de direitos de primeira geração, ou de liberdades públicas. Ou seja, são oponíveis ao Estado. Neste sentido, Bobbio, citado por Bedin (2002, p. 43) informa que: A primeira geração de direitos surgiu com as Declarações de Direitos de 1776 (Declaração de Virginia) e de 1789 (Declaração da França) e pode ser denominada de direitos civis ou liberdade civis clássicas. Esta geração de direitos abrange os chamados direitos negativos, ou seja, os direitos estabelecidos contra o Estado. Daí, portanto, a afirmação de Norberto Bobbio de que entre eles estão “todos aqueles direitos que tendem a limitar o poder do Estado e a reserva para o individuo, ou para os grupos particulares, uma esfera de liberdade em relação ao Estado.” Constata-se que os direitos individuais de primeira geração possuem como característica comum, a proteção do indivíduo contra o arbítrio ou abuso de poder por parte do Estado, mostrando a diferença existente entre as relações privadas e públicas Neste aspecto sustenta Bedin, (2002, p. 43) que : Assim, estes direitos estabelecem um marco divisório entre a esfera pública (Estado) e a esfera privada (sociedade civil). Esta distinção entre a esfera publica e a esfera privada – é bom ressaltar – é uma das características fundamentais da sociedade moderna, e é a partir que se estrutura o pensamento liberal e o pensamento democrático. 15 Esses direitos “entram na categoria do status negativus e fazem também ressaltar, na ordem dos valores políticos, a nítida separação entre a sociedade e Estado” São assim considerados porque passam a ser direitos individuais do homem em relação ao Estado e fazem parte deles os direitos civis e políticos, essencialmente egoísticos, visto que individuais, indivisíveis, como a propriedade e a liberdade (CURY, 2005, p. 12). Pode-se, ainda mencionar que, conforme Zimmermann (2004, p. 263, grifo do autor): Os direitos de primeira geração são os direitos individuais, que devem ser remontados às primeiras Constituições escritas, que apenas continham limitações ao poder de legislar. Correspondem, conforme observação do filósofo Alberto Oliva, à concepção liberdade de negatividade do Estado, que não aceita qualquer prescrições legais (positivas) que limitem abusivamente o exercício de liberdade individual, nem a hipertrofia as funções e poderes do Estado, que reduz o campo de atuação potencial abarcável pelo livre empreendimento individual. Versam estes sobre questões relativas à individualidade do homem que como já enfatizado e se opõem ao Estado. Convém lembrar que, esses direitos foram os primeiros a serem reconhecidos e consagrados nas Constituições advindas com o liberalismo e permitem aos cidadãos o exercício das liberdades fundamentais e a sua proteção mediante as garantias estabelecidas. (GALINDO, 2006) podendo-se citar como parte integrante os direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à propriedade, entre outros. 1.1.2 Direitos de segunda geração No início do século passado, 1901 a 2000, vivemos fase nova, uma reação ao Estado liberal, com aquilo que vem a ser chamado de Estado Social, que colocava o poder público como responsável pela busca de felicidade das pessoas. Sem dúvida, uma mudança radical de pensar as ciências e a política, fato que gerou a declaração de direitos fundamentais assecuratórias, exigindo a atuação estatal. É de se ver o direito a previdência e a educação pública e a proteção do trabalhador acidentado, o que exigem à atuação do Estado, e neste sentido está à caracterização como a de segunda geração, quer organizando serviços quer organizando a economia garantidos do futuro aposentado ou pensionista. (CURY, 2005). 16 Sobre isso Cury (2005, p. 12, grifo do autor) ressalta que foi: A partir do século XIX, do momento em que o sufrágio, passou a ser universal e aos políticos passaram a perceber que precisavam do voto do trabalhador, começaram a aparecer as concessões sociais, fazendo surgir os direitos fundamentais de segunda dimensões, os direitos sociais. “Enquanto os direitos de liberdade procuram libertar o homem da atuação do Estado, os direitos sociais procuram libertar o homem do jugo do próprio homem” (TAVARES, 2001). Os direitos sociais, estando, pois, associados ao direito de igualdade, exigem do Estado não um postura de obtenção, mas uma postura positiva. Começam aqui a nascer as pretensões aos direitos matérias a serem atendidos pelo Estado, como educação, saúde, etc. O Estado tem que agir positivamente. Os direitos fundamenteis de segunda dimensão fizeram aparecer, além do Estado de Direito, o Estado Social de Direito, o bem-estar social (walfare state), já alcançado em muitas nações, como a Suécia e a Alemanha. Dominaram o século XX, do mesmo modo como os direitos da primeira dimensão dominaram o século XIX. São os direitos sociais, culturais e econômicos, bem como os direitos coletivos ou de coletividades, introduzidos no constitucionalismo das distintas formas de Estado social, depois que germinaram por obra da ideologia e da reflexão antiliberal do século XX. Nasceram abraçados ao principio da igualdade, do qual não se podem separar, pois fazê-lo equivaleria a desmembrá-los da razão de ser que os ampara e estimula. Os direitos de segunda geração apenas acrescentaram os de primeira geração razão pela qual dos direitos individuais continuaram a constar acompanhados pelos de segunda geração, sofrendo uma pequena evolução, de modo que a propriedade privada ainda é protegida, sendo subordinados a sua função social, surgindo também outros direitos. Na segunda geração de direitos exige-se uma atuação do Estado, uma contraprestação estatal. Pode-se citar que a obrigatoriedade dos serviços de saúde pública é universal, por isso, a norma inserida no art. 196 da Constituição Federal de 1988 é elucidativa para o entendimento do tema, quando estabelece que. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. O que significa dizer que essa problemática faz com que os direitos fundamentais de segunda geração tenham uma força normativa por demais duvidosa, pois não existe uma ação estatal voltada ao atendimento das necessidades básicas do cidadão nesta área. Para Galindo (2006 p. 64-65) os direitos de segunda geração apresentam 17 [...] uma força normativa duvidosa, pois as constituições passaram a estabelecê-los como normas programáticas, isto é, aquele tipo de norma sem eficácia imediata, representando antes um compromisso do Estado com a possível realização de programas socioeconômicos, sem no entanto, tomar providências imediatas pata tal. Certamente que essa geração de direito só foi positivada na atual Constituição, e na maioria das vezes, o Estado não respeita os direitos dos cidadãos e pouco faz para sanar as deficiências na área social. Mas sabe-se que a CF/88 proclama no art. 5.º, parágrafo primeiro que os direitos fundamentais têm aplicação imediata e isso possibilita ao cidadão recorrer dos Tribunais para ter seus direitos atendidos. Foi no final do século passado, na década de 70, que se passou a falar em direitos de terceira geração, marcados pelas constantes transformações da sociedade. 1.1.3 Direitos de terceira geração A característica marcante desta terceira geração de direitos está ligada a ideia de universalidade dos direitos fundamentais e envolvem os direitos de solidariedade ou fraternidade. São direitos de terceira geração, os difusos, os genéricos, ligados a solidariedade. E o que são direitos difusos? São direitos indivisíveis e com titulares indetermináveis, tratados como, por exemplo, como o disposto art. 225, da CF/88. Assim está expresso: Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Ora, o direito ao meio ambiente saudável, não é do Estado, muito menos de um ente especial, e nem sendo passível de apropriação, sendo que não há titulares determinados, somos todos nós sem a possibilidade de identificação, portando indivisível e inapropriável. Esses direitos na visão de Lenza (2008, p. 588), são: 18 [...] marcados pela alteração da sociedade, por profundas mudanças na comunidade internacional (sociedade de massa, crescente desenvolvimento tecnológico e científico, as relações econômico-sociais se alteram profundamente. Novos problemas e preocupações mundiais surgem, tais como a necessária noção de preservacionismo ambiental e as dificuldades para proteção dos consumidores [...] Pode-se citar então o direito ao progresso, previsto no art. 3.° da CF/88 pertencendo a todos e não sendo passível de apropriação individual. Neste sentido Bedin (2002, p. 73), afirma que houve um “[...] deslocamento dos direitos diante do Estado” e independente de sua classificação o que se verifica é que não há destinatário certo e individualizado, mas se tem o interesse de alguns indivíduos, ou o interesse de um determinado Estado ou Nação. O que se quer com esses direitos é proteger a humanidade. Mantendo a mesma linha de raciocínio, Bedin (2002, p. 73) discorre sobre a terceira geração de direitos observando que essa nasceu no século XX, mais acentuadamente na segunda década, tendo sido influenciada pela Constituição de Weimar de 1923 (Alemanha) e a Constituição Mexicana de 1917 (México). Sobre isso esclarece que: Esta terceira geração de direitos compreende os chamados direitos de créditos, ou seja, direitos que tornam o Estado devedor dos indivíduos, particularmente dos individuas trabalhadores e dos indivíduos marginalizados, no que se refere à obrigação de realizar ações concretas, visando a garantir-lhes um mínimo de igualdade e de bem-estar social. Estes direitos, portanto, não são direitos estabelecidos “contra o Estado” ou direitos de “particular no estado”, mas sim direitos e garantidos “através ou por meio do Estado”. Assim, não se trata de um novo deslocamento da noção de liberdade, por exemplo, como vimos, de não-impedimento para a autonomia, mas sim da revitalização do principio da igualdade. Por isto, podemos dizer com muita tranqüilidade que esta nova geração de direitos representa não uma herança do liberalismo ou do pensamento democrático, como no caso das duas primeiras gerações de direitos, mas sim “um legado do socialismo” (LAFER, 1988, p. 127). Em continuidade ao tema direitos fundamentais não se pode deixar de mencionar o que Dallari (2004, p. 12) escreve, pois se encaixa de forma muito adequada ao que se está abordando. A expressão direitos humanos é uma forma abreviada de mencionar os direitos fundamentais da pessoa humana. Esses direitos são considerados fundamentais porque sem eles a pessoa humana não consegue existir ou não é capaz de se 19 desenvolver e de participar plenamente da vida. Todos os seres humanos devem ter asseguradas, desde o nascimento, as condições mínimas necessárias para se tornar úteis a humanidade, como também devem ter a possibilidade de receber os benefícios que a vida em sociedade pode proporcionar. Esse conjunto de condições e de possibilidade associa as características naturais dos seres humanos, a capacidade natural de cada pessoa e os meios de que a pessoa pode valer-se como resultado da organização social. É a esse conjunto que se dá o nome de direitos humanos. Para entendermos melhor o que significa direitos humano, basta dizer o que tais direitos correspondem à necessidade essencial da pessoa humana. Trata-se daquela necessidade que são iguais para todos os seres humanos, e que devem ser atendidas para que a pessoa possa viver com dignidade que deve ser assegurada a todas as pessoas. Assim, por exemplo, a vida é um direito humano fundamental, porque sem ela a pessoa não existe. Então a preservação da vida é uma necessidade de todas as pessoas humanas. Mas, observando como são e como vivem os seres humanos, vamos percebendo a existência de outras necessidades que são também fundamentais, como a alimentação, a saúde, e tantas outras coisas. Neste contexto significa dizer que os direitos fundamentais têm sua fundamentabilidade material centrada na dignidade da pessoa humana, que sem ela não se vive, sobrevive ou convive na sociedade. Pode-se inferir que os direitos de solidariedade, ou seja, de terceira geração não são exaustivos, podendo surgir novos direitos com o passar dos anos e evolução dos homens. A seguir, passa-se à análise de como os direitos e garantias fundamentais foram positivados na Carta brasileira e como estão catalogados. A nossa Constituição contem títulos denominados de direitos e garantias fundamentais, é o Titulo II, iniciando-se no art. 5° que aglutina os seguintes capítulos: 1° Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos 2° Dos Direitos Sociais 3° Da Nacionalidade 4° Dos Direitos Políticos 5° Dos Partidos Políticos Todos os seus dispositivos contêm ou direitos ou garantias fundamentais, porém existem outros espalhados pelo texto constitucional e em outros documentos. O § 2.° do art. 5.° da CF/88 ressalta que: Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: 20 § 2.º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (VADE MECUM, 2011, p. 13, grifo nosso). Essa importância é vital, eis que o art. 60, § 4.° acentua que os direitos e garantias individuais são cláusulas pétreas. Portanto integrantes do rol das normas constitucionais que não podem ser objetos de emenda constitucional, seja para suprimir ou até mesmo reduzir. Neste ponto é indispensável mencionar como exemplo o art. 150, inciso III, alínea “b” da CF/88, já tendo o Supremo Tribunal Federal declarado como sendo fundamental, portanto, cláusula pétrea. Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: III - cobrar tributos: b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; (VADE MECUM, 2011, p. 55) Ainda cabe especial cuidado com art. 5.°, § 3.° acrescentado pela emenda constitucional n.° 45 de 2004, portanto, inexistente na redação original da Constituição, vejamos. Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: § 3.º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (VADE MECUM, 2011, p. 13) Cria a possibilidade da existência de direito e garantias constitucionais fora da Carta. Abriu-se a possibilidade de termos direitos e garantias fundamentais até mesmo fora do texto, porém com a mesma força dos lá expressamente inseridos, quando se refere a direitos humanos. 1.2 Características dos direitos fundamentais 21 É importante analisar as características dos direitos fundamentais, e precisam ser apontadas, pois a partir daí compreender-se-á o instituto do Mandado de Segurança e o significado de direito líquido e certo. Segundo Lenza (2011, p. 864, grifo do autor) são características dos direitos e garantias fundamentais: Historicidade: possuem caráter histórico, nascendo com o Cristianismo, passando pelas diversas resoluções e chegando aos dias atuais; Universalidade: destinam-se, de modo indiscriminado, a todos os seres humanos. Como aponta Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “... a idéia de se estabelecer por escrito um rol de direitos em favor de indivíduos, de direitos que seriam superiores ao próprio poder que o concedeu ou reconheceu, não é nova. Os forais as cartas de franquia continham enumeração de direitos com esse caráter, já na Idade Media...”; Limitabilidade: os direitos fundamentais não são absolutos (relatividade), havendo, muitas vezes, no caso concreto, confronto, conflito de interesses. A solução ou vem discriminada na própria Constituição (ex.: direito de propriedade versus desapropriação), ou caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual direito deverá prevalecer, levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando-a com a sua mínima restrição; Concorrência: podem ser exercidos cumulativamente, quando, por exemplo, o jornalista transmite uma notícia (direito de informação) e, juntamente, emite uma opinião (direitos de opinião); Irrenunciabilidade: o que pode ocorrer é o seu não exercício, mas nunca a sua renunciabilidade. Diante dessas características, tem-se a exata dimensão dos direitos fundamentais, os quais são ou devem ser universais, tendo aplicação imediata no âmbito jurídico, fazendo com que o Estado garanta a todos as condições mínimas, porém, indispensáveis para subsistência, enquanto cidadãos de direitos e deveres, baseando–se no princípio da igualdade, e da dignidade da pessoa humana. Ainda, outras características podem ser citadas. Jose Afonso da Silva (2010, p. 185, grifo do autor) aponta as seguintes características: Inalienabilidade: como são conferidos a todos são indisponíveis; não se pode aliená-los por não terem conteúdo econômico-patrimonial; Imprescritibilidade: “[...] prescrição é um instituto jurídico que somente atinge, coarctando, a exigibilidade dos direitos de caráter patrimonial, não a exigibilidade dos direitos personalíssimos, ainda que não individuais, como é o caso. Se são sempre exercíveis e exercidos, não há intercorrência temporal de não exercício que fundamente a perda da exigibilidade pela prescrição.” 22 Anote-se que o reconhecimento jurídico dos direitos fundamentais, ou seja, dos bens e vantagens prescritos na norma constitucional são muito importantes para a concretização dos fins do Estado, e diante das características mencionadas, constata-se que os direitos devem ser universais e garantidos a todos indistintamente. 1.3 Diferenciação entre direitos e garantias fundamentais Partindo-se das características dos direitos fundamentais aborda-se na seqüência a diferença existente entre direitos e garantias fundamentais, necessário para a compreensão do objeto desta pesquisa, qual seja: o mandado de segurança. Com relação aos direitos e garantias Lenza (2011, p. 863, grifo do autor) tem ressaltado que: Um dos primeiros estudiosos a enfrentar esse tormentoso tema foi o sempre lembrado Rui Barbosa, que, analisando a Constituição de 1891, distinguiu “as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos, estas as garantias; ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia com a declaração do direito”. Assim, os direitos são bens e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto as garantias são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violados. Por fim, diferenciar as garantias fundamentais dos remédios constitucionais. Estes últimos são espécies do gênero garantia. Isso porque, uma vez consagrado o direitos, a sua garantia nem sempre estará nas regras definidas constitucionalmente como remédios constitucionais (ex.: habeas corpus, habeas data etc.) em determinadas situações a garantia poderá estar na própria norma que assegura o direito. Considerando o exposto, denota-se que ao se falar em direito, se está afirmando que são normas que declaram bens, vantagens, prerrogativas ao cidadão e, as garantias são normas que asseguram o cumprimento daqueles. No mesmo sentido, Schäfer (2001, p. 44) conceitua a diferenciação de direitos e garantias fundamentais, vantagens, prerrogativas ao cidadão, e as garantias são normas que asseguram o cumprimento daqueles: 23 Clássica e bem atual é a “contraposição dos direitos fundamentais, pela sua estrutura, pela sua natureza e pela sua função, em direitos propriamente ditos ou direitos a liberdade, por outro lado, e garantias, por outro lado. Os direitos representam só por si certos bens, as garantias destinam-se a assegurar a fruição dessas bens; os direitos são principais, as garantias acessórias e, muitas delas, adjectivas ( ainda que possam ser objecto de um regime constitucional substantivo); os direitos permitem a realização das pessoas e inserem-se directa e imediatamente, por isso, nas perspectivas esferas jurídicas, as garantias só nelas se projectam pelo nexo que possuem como os direitos; na acepção jurisdicional inicial,os direitos declaram-se, as garantias estabelem-se.” Ou seja, o Texto Constitucional, pretendendo manter sua força normativa, estabelece institutos jurídicos cujos objetivos centram-se na proteção de seu núcleo essencial, meios através dos quais é possível tornar eficazes concretamente os direitos declarados em seu corpo, ou, ainda, proteção contra ataques a manutenção dos preceitos constitucionais. A esses instrumentos jurídicos é que se reserva a expressão “garantias dos direitos fundamentais” de um lado as declarações dos direitos; de outro lado, a estes ligados indissociavelmente, os mecanismos de sua proteção. Desta forma podemos afirmar que o direito é uma norma de conteúdo declaratório, é o dispositivo que diz o que você tem, qual é a vantagem que você tem, já a garantia é uma norma de conteúdo assecuratório, portanto assegura um direito que alguém possui. Pode-se, ainda referir que não existe uma divisão muito clara entre direitos e garantais, até porque muitos direitos fundamentais são também garantias e induzem o leitor à dúvida. Não é incomum, se verificar em um mesmo dispositivo constitucional ou legal, a fixação da garantia como declaração do direito. Jose Afonso da Silva, (2003, p. 185-186) ressalta que “Constituição, de fato, não consigna regra que a parte as duas categorias, nem se quer adota terminologia precisa a respeito das garantias [...]” Isso por si só nos mostra o quanto a tarefa de esclarecer o que é direito ou o que é garantia é difícil, pois há o reconhecimento dos direitos, garantindo-os, exemplificando-se de acordo com o art. 5.º, inciso V, que assegura o direito de resposta. O que se quer dizer é que na maioria das vezes, por não se ter clareza quanto a extensão da norma, se é norma declaratória e assecuratória ao mesmo tempo, é que para a concretização dos direitos fundamentais efetivação. se necessita de medidas judiciais para a sua 24 No próximo capítulo aborda-se o tema central desta pesquisa: a possibilidade de efetivação dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico: analisando as novidades da Lei 12.016/09. Mecanismo jurídico-constitucional colocado à disposição do cidadão para a efetivação e proteção dos direitos fundamentais lesados ou ameaçados. 25 2 EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO A Constituição Federal de 1988 garante ao cidadão brasileiro a efetivação dos direito fundamentais quando estabelece no art. 5.º §1.º, que as normas constitucionais têm aplicabilidade imediata, o que significa dizer que os direitos fundamentais são aplicáveis, apesar de alguns necessitarem da intervenção do legislador e do Poder Judiciário para sua consecução. Por outro lado também a CF/88 traz em seu bojo uma série de garantias constitucionais, sendo algumas chamadas de garantias instrumentais, nas quais inserem-se os denominados remédios constitucionais. Importante referir que nesta pesquisa será abordado apenas o MS, haja vista que os demais serão apenas mencionados. 2.1 Remédios constitucionais na CF/88 É de conhecimento de todos que a Constituição brasileira é a lei mais importante do país, e nela encontram-se vários direitos e garantias fundamentais, sendo que direito é uma norma de conteúdo declaratório, é o dispositivo que declara algo que se relaciona com o direito à vida, direito à propriedade e também ao direito de locomoção, já as garantias são normas de conteúdo assecuratório, asseguradora de algo ou alguma coisa que se foi privado ou ameaçado de perda. São vários os remédios constitucionais considerados garantias que a Constituição, em forma de meios ou instrumentos processuais, coloca à disposição dos cidadãos para a defesa e amparo dos direitos subjetivos. Sabe-se que muitas são “as garantias fundamentais específicas que instrumentalizam os direitos fundamentais e fazem prevalecer às próprias garantias fundamentais gerais” (BULOS, 2009, p. 228), podendo ser citada aquelas que proíbem abusos de poder e todas as formas de violação aos direitos que asseguram. É sabido que por meio destas garantias fundamentais gerais, como por exemplo, a legalidade, a liberdade, o devido processo legal, entre outras, “os titulares dos direitos encontram a forma, o procedimento, a técnica, o meio 26 de exigir a proteção de suas prerrogativas.” (BULOS, 2009, p. 229). Encontram-se entre estas garantias específicas, os remédios constitucionais, ou seja, o habeas corpus, o habeas data, o mandado de injunção, ação popular e o mandado de segurança. Pertinente salientar que quando se fala em remédios constitucionais, certamente que se está querendo falar da proteção dos direitos fundamentais contra ao arbítrio do Estado e de suas autoridades públicas, por isso necessário apontar o que Nishiyama (2004, p. 16) diz sobre isso. Sob a égide do Estado democrático de direito, assim denominado no art. 1° da Constituição Federativa brasileira, temos que o governo do povo e a limitação do poder estão individualmente combinados (Moraes, 1997, p. 20). Os direitos fundamentais surgiram para a limitação e o controle dos atos arbitrários do poder estatal. Mas para que isso fosse possível, os remédios constitucionais passaram a ter importância como instrumento à disposição dos indivíduos para a sua proteção. Com efeito, a própria CF/88 para a proteção do cidadão contra o arbítrio do Estado criou mecanismos para a sua defesa. São mecanismos de proteção dos direitos fundamentais que se denominam de remédios constitucionais. Estes nada mais são do que: Remédio constitucional são os meios (ações judiciais ou direito de petição) postos à disposição dos indivíduos e cidadãos para provocar a intervenção das autoridades competentes, visando sanar ilegalidades ou abuso de poder. Ou Remédio constitucional são as garantias constitucionais, os instrumentos, postos a disposição das partes no próprio texto constitucional. (WIKIPÉDIA, 2011) Pode-se então afirmar que são garantias constitucionais, isto é, medidas utilizadas para tornar efetivo o exercício dos direitos constitucionais segundo Nishiyama (2004, p. 18). No caso brasileiro, a Constituição Federal de 1988 determinou os seguintes remédios constitucionais para a proteção dos direitos fundamentais: a) habeas corpus (art. 5, LXVIII); b) mandado de segurança (art. 5°, LXIX); c) mandado de segurança coletivo (art. 5° LXX); d) mandado de injunção (art.5°, LXXI); habeas data (art. 5°, LXXII); e f) ação popular (art. 5°, LXXIII). Ainda sobre o assunto, importante as lições de Sylvio Motta e William Douglas, (2004, p. 70). Os remédios constitucionais representam os instrumentos definidos para garantir os direitos (eis porque alguns utilizam a nomenclatura garantias constitucionais). São 27 os meios para o cidadão defender seus direitos. Quando asseguram a provocação da tutela jurisdicional, podem ser chamados de ações constitucionais. O termo remédio tem o significado de recurso, solução, socorro, “aquilo que combate o mal, a dor, ou uma doença”. Como se verifica, os remédios constitucionais nada mais são do que mecanismos protetivos postos à disposição para a tutela das liberdades públicas, inserindo-se nestas os direito fundamentais. Cabe referir que neste trabalho não serão abordados todos os remédios constitucionais que possibilitam a defesa e amparo dos direitos subjetivos, embora, todos tenham a sua devida importância, mas sim, será analisado o mandado de segurança, art. 5.º, inciso LXIX e as novidades e recuos introduzidas pela Lei 12.016/09. 2.1.1 Mandado de Segurança – Art.5.° LXIX O mandado de segurança é um remédio constitucional, também conhecido como garantia constitucional, mecanismo para proteger direitos previstos na Constituição. O mandado de segurança individual é aquele que protege um indivíduo ou um grupo de indivíduos sem vinculação a determinadas vinculações específicas de uma coletividade e está previsto no art. 5.° inciso LXIX. Observa-se, que nesse inciso está explícito que sua utilização deve ocorrer para proteção de direito líquido e certo, aquele direito, o qual não se admite produção de prova testemunhal, mas que admite prova documental. Saliente-se, que o direito líquido e certo está imediatamente posto à proteção do indivíduo, não sendo caso nem de habeas corpus nem de habeas data e não vão proteger nem a liberdade de locomoção nem ter acesso a dados e informações do impetrante, mas que, para a sua configuração, houve abuso cometido por autoridade publica ou alguém investido de tal autoridade. Além do MS individual também existe o MS coletivo, com previsão no art. 5.° inciso LXX, alíneas, “a” e “b”, sendo que este diferencia-se do individual por ser corporativo, proteger grupos de pessoas, sendo que a diferença principal esta na legitimidade ativa, quem poderá propor o MS coletivo, e ao propor poderá ter o amparo dado pelo Poder Judiciário. 28 Para corroborar tais ensinamentos, as lições de Bulos (2009, p. 303), são esclarecedoras, ou seja, um dos instrumentos de tutela das liberdades, ou seja, um dos meios constitucionais postos à disposição do cidadão para defesa de seus direitos é o MS, que pode ser caracterizado como “o instrumento processual constitucional, colocado ao dispor de toda pessoa física ou jurídica para proteger seu direito líquido e certo, contra as investidas praticadas pelas autoridades públicas ou por seus delegados”. Objetivando compreender melhor o instituto do MS, importante saber que este faz parte do rol de direitos e garantias estabelecidos na CF/88, denominados de remédios constitucionais que visam a assegurar a efetivação dos direitos fundamentais dos cidadãos, quando lesados ou ameaçados de lesão e que já faz parte da afirmação dos direitos fundamentais desde a década de 30 (TAVARES, 2002). Assim vejamos Bruno Garcia Redondo, Guilherme Peres de Oliveira e Ronaldo Cramer (2009, p. 26-27). No plano constitucional, o mandado de segurança foi inicialmente previsto na Constituição de 1934. Sua inserção no texto constitucional evidentemente não se deu a mero acaso. Foi, na realidade, fruto da evolução de mecanismos similares e de contexto peculiar. A malfadada experiência com a ação de anulação de atos administrativos, prevista na Lei 221/1894, foi a razão para a busca de solução para a defesa de direitos individuais contra a ação ilegal das autoridades publicas. Sua previsão ocorreu porque com o habeas corpus a “Emenda Constitucional de 1926 restringiu o uso dessa medida às hipóteses de ofensa ao direto de locomoção [...]” (DI PIETRO, 2012, p. 840), visando o MS à proteção dos direitos subjetivos. Assim, considerando que o MS é uma ação de muita importância para a tutela das liberdades, que visa a assegurar o gozo de direitos violados ou em vias de violação, não se pode deixar de mencionar sua origem e evolução na histórica constitucional brasileira. Muitos anos decorreram até a inclusão do MS como uma ordem de garantia, com a finalidade de proteção dos direitos que tivessem sido violados ou ameaçados de violação. Foi a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, editada em 1934, que trouxe conteúdos acentuadamente sociais, introduzindo o MS como um mecanismo de defesa contra 29 os atos ilegais e abusos praticados pelas autoridades públicas. Criação brasileira e chamada de mandamus. A história mostra que a utilização desse mandamus teve avanços, mas também, retrocessos, pois a Carta de 1937, mais conhecida como a “Constituição polaca”, de índole ditatorial, e “embalada na posição universal de descrença da democracia” (BULOS, 2009, p. 33), omitiu o MS em seu texto, impedindo que aqueles que tivessem seus direitos lesados ou ameaçados pudessem fazer uso deste mecanismo de proteção. Vejamos o que diz Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 27). A constituição de 1937, entretanto, limitou severamente o instituto, retirando-o do rol de garantias fundamentais. O mandado de segurança perdeu, assim, seu fundamento constitucional, passando a ser regulamentado exclusivamente pelo direito infraconstitucional, notadamente pelo Código de Processo Civil anterior, aprovado em 1939. Evidencia-se que o MS perdeu sua conotação constitucional e passou a ser regulamentado por uma lei infraconstitucional, enfraquecendo como um direito de defesa. Neste período, até o ano de 1939, houve um pequeno avanço na legislação processual que acolheu o instituto, considerando-o como um processo especial e dando-lhe a devida disciplina. Porém, como informa Tavares, (2002, p. 616). O mandado de segurança foi tolhido em sua amplitude natural, para deixar a salvo do remédio heróico os atos do Presidente da República, Ministros de Estados, Governadores e Interventores, tudo em consonância com o Estado autoritário que se implantou naquele momento histórico. Não restam duvidas que o MS, instrumento de proteção dos direito subjetivos deixava algumas autoridades à salvo, sendo que não poderá ser impetrado MS contra atos por elas praticados. Observa-se, assim, que a trajetória do MS sofreu alguns entraves e somente no texto constitucional de 1946, passa novamente a ser introduzido, tornando-se definitivamente uma garantia constitucional. Vejamos Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 28). 30 Posteriormente, a constituição de 1946 tornou a conceder, ao mandado de segurança, status de garantia constitucional. Mais ainda, aprimorou alguns aspectos do instituto, acolhendo a evolução que a doutrina e a jurisprudência vinham reclamando, tais como a supressão da exigência de que a ilegalidade fosse manifesta. A Constituição de 1946 considerada uma constituição eminentemente social e apresentava em seu texto melhorias relativas ao MS. Aos poucos o MS passa a ser encarado como um mecanismo de tutela de liberdades, em que pese ter sido outorgado em 1967 à nova constituição manteve o MS como garantia de tutela para proteger direito individual líquido e certo, que posteriormente seria modificada por Emenda Constitucional 1/69, retirando a expressão “individual”, voltando a ser como anteriormente na Constituição de 1946. Com efeito, pode-se assegurar que o MS como instrumento garantidor de direito líquido e certo sempre constou nas Constituições brasileiras, em que pese o período autoritário vivido na Constituição de 1937 que continha restrições constitucionais, principalmente com relação à liberdade de locomoção, ato disciplinar de servidor público, e questões tributárias, impedindo que o cidadão da época impetrasse um ação em sua defesa. Na verdade o MS era regulamentado pelo Código de Processo Civil de 1939 que segundo Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 29) ressaltam que: Três anos após, o mandado de segurança passou a ser disciplinado pelo Código de Processo Civil de 1939, destinando-se à “defesa e direito certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional, ou ilegal, de qualquer autoridade, salvo do presidente da República, dos Ministros de Estado, Governadores e Interventores”. Ainda pode-se dizer que o Código de Processo Civil de 1939, no art. 319 § 2.º afirma que mesmo não sendo autoridade pública, mas pessoas exercentes da função delegada pelo poder público, como por exemplo, notariais, leiloeiros, “ainda que não fossem parte da administração seria legitimados passivos para demanda mandamental” (REDODNO; OLIEIRA E CRAMER, 2009, p. 29). 31 Não se pode deixar de mencionar que a Lei 1.533/51 que regulava o MS naquela época revogou as disposições do CPC de 1939 referentes a essa ação mandamental e, assim com sua regulamentação passa a estabelecer regras para a impetração do mandamus. Muitas outras leis introduziram modificações sucessivas no processamento do MS sendo que culmina com a Lei 12.016/09. Por fim, a Constituição de 1988 firmou definitivamente o mandado de segurança como uma garantia constitucional, tanto no âmbito individual como no coletivo. Continuando, pode-se afirmar que a evolução sofrida pelo MS foi gradativa, mas atualmente, o que se verifica, é sua mais completa inserção no mundo jurídico, pelo assentamento constitucional e a nova legislação que lhe dá novos contornos. A CF/88 contempla duas espécies de MS e estabelece no art. 5.º, inciso LXIX que: “cabe mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”. Silva (2010, p. 385), afirma de forma muito clara que o MS visa, como se nota: Amparar direito pessoal líquido e certo. Só o próprio titular desse direito tem legitimidade para impetrar o mandado de segurança individual, que é oponível contra qualquer autoridade pública ou contra agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições públicas, com o objetivo de corrigir ato ou omissão ilegal ou decorrente de abuso de poder. Importante lembrar que o MS é um remédio constitucional, com natureza de ação civil, “posto à disposição de titulares de direito líquido e certo, lesado ou ameaçado de lesão, por ato ou omissão de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuição do Poder Público” (SILVA, 2010, p.387). Desta forma, pode-se dizer que há no sistema constitucional brasileiro, mecanismos capazes de proteger direitos fundamentais e podemos citar então o MS que tutela direito líquido e certo quando lesado ou violado, ou sob a ameaça de lesão. 32 Segundo Fagundes (2007, p. 271), afirma sobre direito líquido e certo: “Para quem terse-á como líquido e certo o direito cujos aspectos de fato se possam provar, documentalmente, fora de toda a dúvida, o direito cujo os pressupostos materiais se possam constatar pelo exame da prova oferecida com o pedido”. Para se compreender o que significa direito líquido e certo, é necessário abordar-se, como já explicitado acima, o significado dos direitos fundamentais, sua caracterização, classificação e principalmente a eficácia e aplicabilidade dos direitos, para somente após abordar especificamente sobre as novidades introduzidas pela Lei 12.016/2009. Segundo Tavares (2002, p.601): Os direitos fundamentais do homem, ao receberem positivação no Direito Constitucional, passam a desfrutar de uma posição de relevo, no que toca ao ordenamento jurídico interno. Mas a mera declaração ou reconhecimento de um direito não é suficiente, não bastando para a plena eficácia, porque se torna necessário tutelar esse direito nas situações em que seja violado. Por outras palavras, o direito constitucional tutela as liberdades públicas principalmente quando estas são lesadas ou ameaçadas de lesão. Com relação ao direito líquido e certo vale ressaltar a manifestação de Lenza (2012, p. 1.046), que assim explica: O direito líquido e certo é aquele que pode ser demonstrado de plano mediante prova pré-constituída, sem a necessidade de dilação probatória. Trata-se de direito manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Configura-se, então que direito líquido e certo é aquele não amparado por habeas corpus ou habeas data. Nesse sentido, Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 35) são firmes ao mencionar que “o direito liquido e certo não é um espécie de direito material, ou um direito material mais “qualificado” que os demais, mas sim uma especial forma de demonstração dos fatos constitutivos do direito material”. 33 Salienta-se ainda que os comentários efetuados por Redondo Oliveira e Cramer (2009, p. 42) são esclarecedores. Vejamos: Para a propositura do mandado de segurança não se exige que o direito do impetrante seja “líquido e certo” no sentido de que deva ser absoluto, incontestável ou incapaz de gerar divergência sobre as questões subjacentes à demanda. Não se trata, em absoluto, de análise do mérito, mas de etapa anterior, referente a admissibilidade do julgamento do mérito da demanda. “Direito líquido e certo” significa apenas a possibilidade de demonstração, em tese, da ilegalidade ou abusividade do ato coator, sem necessidade de dilação probatória, uma vez que esta se revela incompatível com a celeridade do procedimento especial do mandado de segurança. Há entendimento de que o direito líquido e certo é condição principal da ação mandamental, pois caso não exista direito líquido e certo, não haverá ilegalidade ou abuso por parte de autoridade pública, não cabendo MS. Para corroborar tal afirmação cita-se Sergio Ferraz apud Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 36). Considera o direito líquido e certo tanto como “condição da ação” quanto como o próprio “mérito” do mandado de segurança: “É aqui, no Texto Maior, ao mesmo tempo em que só se enseja o writ se de plano verificável a existência dessa condição, também só se concede, afinal, a segurança se o direito líquido e certo, a início tido como plausível, por último se constata efetivamente existente. É dizer: no mandado de segurança o direito líquido e certo é, a um só tempo, condição de ação e seu fim último (na primeira fase, como juiz provisório; na segunda, como objeto da tutela jurisdicional). Assim, a sentença que negue, ou afirme, o direito liquido e certo, realiza o próprio fim da ação; trata-se de uma decisão de mérito, que exaure o campo da indagação, próprio do mandado de segurança. Frise-se: trata-se de condição especialíssima da ação, ao mesmo tempo amalgamada com sua própria finalidade – condição, pois, não afinada (integralmente) aos cânones da lei processual”. É uma das condições para o deferimento do pedido que o direito seja líquido e certo, e que esteja previsto como um direito fundamental. Observa-se que o rol dos Direitos Fundamentais é exemplificativo, em razão do art. 5.°, § 2.º, da CF/88 (VADE MECUM, 2011, p. 23), e por isso ás vezes um direito lesado ou em vista de ser lesado não se encontra no at. 5.°, mas em princípios, ou até em tratados internacionais. O parágrafo 1.º, do art. 5.º, apesar de não haver consenso acerca do alcance desse dispositivo na doutrina, dispõe que as normas definidoras dos direitos e garantias 34 fundamentais possuem aplicabilidade imediata, excluindo o caráter programático. São, portanto, auto-aplicáveis. Art. 5.º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: § 1.º. As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.(VADE MECUM, 2011, p. 13). A partir do exposto, salienta-se o quanto são importantes os denominados remédios constitucionais colocados à disposição do indivíduo ou cidadão para a efetivação de seus direitos, pois esse não pode ficar a mercê dos interesses das autoridades públicas para o seu exercício e concretização. Além do que se houver lesado ou ameaçado de lesão, o Poder Judiciário, se for acionado, poderá dar resposta ao pedido. 2.1.2. Análise da Lei 12.016/09. Novidades e recuos A análise da Lei 12.016/09 se faz necessária, haja vista que a legislação existente até então, ou seja, a Lei 1.533/51, foi editada em um período da história constitucional brasileira na qual, as Constituições derivavam ora da concessão dos governantes, seja ele imperador ou, presidente, sendo, quanto à sua origem, outorgada, como as de 1824, 1937 e 1967, seguida esta última pela Emenda Constitucional n.1/69, ora, democráticas, como as Constituições de 1891, 1934, 1946 e a de 1988. A nova lei do mandado de segurança trata tanto do mandado de segurança individual quanto o coletivo, apresentando a primeira novidade estabelecida pela Lei 12.016/09, modificando aspectos legais da Lei 1533/51, adaptando-a a CF/88, vejamos então o que e esta dito em seu art. 1.°. Art. 1.° Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem às funções que exerça. (VADE MECUM, 2011, p. 1779). 35 Nota-se que tanto a pessoa física quanto jurídica pode-se utilizar do mandado de segurança, tanto faz individual ou coletivo. A lei não estipula e não restringe qualquer pessoa física ou jurídica. Conforme lição de Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p.39-40): O art. 1.º da Lei 12.016/09 assegura o cabimento do mandado de segurança “sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa natural ou jurídica sofrer violação ou houver receio de sofrê-la por parte da autoridade”. Contempla, portanto, não apenas a hipótese de lesão, mas também a de sua iminência, em conformidade com o inciso XXXV do art. 5.º da Constituição, que garante o acesso a Justiça sempre que houver lesão ou ameaça a direito. Patente, pois, admissibilidade do mandado de segurança em duas modalidades, preventivo e repressivo, variando conforme a concretização ou não da ilegalidade ou da abusividade. Quando a lesão ao direito do impetrante, por meio da ilegalidade ou abusividade, ainda não se concretizou, mas se encontra na fundada iminência (ameaça) de correr, tem-se o mandado de segurança na modalidade preventiva. Esses são os pressupostos que possibilitam a o cabimento do MS, sendo que para a sua admissibilidade, seja na modalidade preventivo ou repressivo, são necessários a concretização da ilegalidade ou abuso de poder, ou lesão ou ameaça de lesão. Quando a Lei 12.016/09 refere-se ao titular de “direito liquido e certo decorrente de direito, em condições idênticas de terceiro”, na realidade está assegurando que terceiro possa impetrar MS em favor de direito de outrem, “desde que o direito daquele decorra de direito não exercido por este” (VADE MECUM, 2011, p. 1779). Assim, Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 72) continuam expondo que: A primeira observação importante refere-se a legitimidade do terceiro. Trata-se da típica substituição processual, porquanto to dispositivo permite que terceiro defenda, em nome próprio, direito alheio (art. 6.º do CPC). Esta autorização para a tutela jurisdicional direta de direito alheio por parte de terceiro, contudo, não é genérica. Terceiros não possuem legitimidade para defesa, por meio de mandado de segurança, de todo ou qualquer direito alheio. Pelo contrario, para que se configure a hipótese autorizada pelo art. 3.º da Lei 12.016/09, é essencial que o direito do terceiro dependa de direito de outrem. E o interesse de agir daquele somente surge após a inércia deste. 36 Salienta-se que a nova lei quis assegurar o direito subjetivo próprio daquele que sofreu a lesão ou ameaça de lesão, abuso de poder ou violação de direito líquido e certo, determinando o interesse em agir. Atualmente em conformidade com a Lei 12.016/09 há possibilidade da substituição processual. Nesse sentido sustentam os autores supra citados. Sendo aplicável o regime jurídico da substituição processual, tanto o substituto (o terceiro) quanto o substituído (o titular do direito originário) ficam sujeitos à autoridade da coisa julgada material. Por essa razão,pode o substituído intervir no processo movido pelo terceiro, com o objetivo de buscar decisão que lhe seja favorável. Afinal, a sentença produzirá efeitos diretamente em sua esfera jurídica, visto que a ele pertence o direito produzido em juízo. Trata-se, assim, de clássica assistência litisconsorcial (art. 54 do CPC). Por outro lado, caso o titular do direito originário ingresse em juízo, o terceiro poderá pleitear seu ingresso, naquela elação processual, na qualidade de assistente simples (art. 50 do CPC). (REDONDO; OLIVEIRA E CRAMER, 2009, p. 72). Quer-se ainda dizer que a Lei 12.016/09, não inova em relação ao art. 6.º, relacionando-o com a Lei 1.533/51, quando trata da petição inicial e dos requisitos que esta deve conter. Apresenta-se a seguir as inovações introduzidas na primeira parte do art. 6.º da nova lei segundo Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 91): A nova Lei manteve a necessidade, peculiar ao mandando de segurança, de a contrafé ser acompanhada de cópias dos mesmos documentos que foram apresentados juntamente com a petição inicial. A exigência de apresentação das cópias dos documentos é previsão evidentemente protetiva do Poder Público, dado que no procedimento comum do processo de conhecimento a sistemática é diversa, sendo suficiente que o autor forneça cópias apenas da petição inicial para que sirva de contrafé, sem apresentação dos demais documentos que a acompanham – sendo, assim, ônus do réu consultar os autos a fim de melhor formular sua defesa. Segundo os doutrinadores Redondo, Oliveira e Cramer, a Lei 12.016/09 inovou de forma mais eficaz quando diz respeito ao cabimento de agravo de instrumento contra decisão que concede tutela de urgência. É nesse sentido o que estabelece o art. 7.º, §1º ao § 4º: Art. 7.º Ao despachar a inicial, o juiz ordenará: [...] § 1.º Da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar caberá agravo de instrumento, observando o disposto na Lei n. 5.869 de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil. 37 § 2.º Não será concedida medida liminar que tenha por á compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. § 3.º Os efeitos da medida liminar, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença. § 4.º Deferida a medida liminar, o processo terá prioridade para julgamento. (VADE MECUM, 2011, p. 1779-1780). Sustentando tal novidade os autores supracitados enfatizam que: Um dos dispositivos mais felizes da nova Lei é o § 1.º de seu art. 7.º, que, ao prever o cabimento de agravo de instrumento contra a decisão que se manifesta sobre tutela de urgência, supera a polêmica acerca do cabimento ou não de recurso imediato contra esse pronunciamento judicial. Importante observar que a Lei 1.533/1951 não previa, de forma expressa, o cabimento de recurso, o que levou a linha de entendimento a sustentar o não cabimento de agravo de instrumento. Para os defensores dessa corrente, deveria ser impetrado outro mandado de segurança contra decisão que se manifestasse sobre a liminar da primeira demanda. (REDONDO; OLIVEIRA E CRAMER, 2009. P. 106). Trata-se, portanto de uma novidade que vem possibilitar que o juiz em sua discricionariedade, em determinadas situações, decida de acordo com o juízo de conveniência e oportunidade. Convém destacar, ainda que a referida lei apresenta novidades também no § 4.º do art 7.º, quando ressalta prioridade de tramitação do MS após deferimento da liminar. Veja-se que, no entendimento de Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 109) é o exposto que segue: Ao contrário do que possa parecer à primeira vista, não se trata de medida destinada a prestigiar o impetrante que já demonstrou a probabilidade do direito e do perigo na demora do processo para conceder-lhe prioridade de tramitação com o intuito de célere pronunciamento final. Em verdade, o demandante já se encontra devidamente tutelado e permanecera assim enquanto se fizerem presentes os requisitos autorizadores da medida liminar. Trata-se, por conseguinte, de previsão protetiva do Estado, ainda que dissimulado sob “celeridade” que, apenas aparentemente, operaria em favor do impetrante. Enquanto a liminar permanecer vigente, este não sofre nenhum prejuízo pela demora natural do procedimento. É o Estado, ao contrario, que sofre os efeitos deletérios de uma tutela concedida com base em cognição não exauriente. Por essa razão, quanto mais rápido for o julgamento definitivo do pedido, mais célere será a eventual reversão de um provimento contrario ao Estado, minimizando as consequências negativas de sua efetivação provisória. 38 Não obstante se tratar de norma destinada à proteção do Poder Público, não há nenhuma inconstitucionalidade no dispositivo, razão pela qual deve ser observado pelo Poder Judiciário. É provável que esta novidade visa a dar maior celeridade as ações de MS com intuito de evitar prejuízo ou lesividade à queles que sofrem ameaças ou lesões aos seus direitos líquidos e certos. Com referência a regulação procedimental verificada no art. 14, da nova lei que prevê que da sentença denegatória ou concessiva, cabe apelação. Acerca do tema as lições de Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 121) são de suma importância para o entendimento do seu significado. A apelação no mandado de segurança deve ser recebida, em regra, em todos os demais efeitos com exceção do suspensivo que, como se sabe, destina-se a retirar, momentaneamente, a eficácia da decisão, impedindo sua execução [...]. Importante observar que o referido dispositivo refere-se apenas à hipótese de concessão de ordem, permitindo a execução provisória da sentença de procedência do pedido. Exclui-se, assim, a execução provisória da sentença denegatória da segurança, em distinção que não implica quebra de isonomia. Afinal, o procedimento do mandando de segurança busca proteger o individuo do arbítrio estatal, para reequilibrar a relação que perdeu seu equilíbrio. É imperativo, portanto, que se conceda o máximo de efetividade as decisões que reconhecem o equilíbrio do impetrante, razão pela qual somente a apelação interposta contra sentença concessiva de ordem – favorável, assim, ao impetrante – é que se revela destituída de efeito suspensivo, para que se permita a execução provisória. A apelação de sentença denegatória da segurança submete-se a regra geral, permanecendo dotada de efeito suspensivo. Necessário enfatizar que o § 4.º do art. 14 da nova lei considera inaplicável a concessão de MS referente à produção de efeitos patrimoniais, quando, por exemplo, servidores públicos reclamam em juízo pagamento de vencimentos e vantagens pretéritas. Confirma-se assim a Súmula 271 do STF, segundo a qual “ a concessão do mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”. Aponta-se a importância de tal dispositivo no que tange a impossibilidade de os servidores públicos utilizarem MS para obter condenação do Poder Público. Conforme relatam Redondo, Oliveira e Cramer (2009, p. 124). 39 A nova Lei, no § 4.º do art. 14, retirou a possibilidade de os servidores públicos se valerem da via mandamental para obter a condenação do Poder Público ao pagamento de verbas vencidas, bem como revogou, expressamente, a Lei 5.021/1966. O referido § 4.º apenas permite que o servidor público ao pagamento das verbas devidas a partir da propositura do writ. Assim não se pode exigir pagamentos em valores vencidos ou condenatórios contra o Poder Público via MS. Por último, do mesmo modo que o MS individual, MS coletivo, novidade introduzida a partir da CF/88 a nova lei consagra no art. 21 caput da lei 12.016/09 a legitimidade ativa do mesmo. A lei apresenta as mesmas regras que o art.5.º inc. LXX e a grande diferença existente entre o MS individual e o coletivo encontra-se em seu objeto e na legitimação ativa. Sobre este tema sustenta Redondo, Oliveira e Cramer (2009. p. 150-151) que: O mandando de segurança coletivo distingue-se do mandando de segurança individual essencialmente em dois aspectos: legitimidade e coisa julgada. Foram principalmente esses aspectos os regulados pelos artigos 21 e 22 os dois únicos dispositivos da nova Lei que tratam do mandado de segurança coletivo. O caput do art. 21 da Lei 12.016/2009 dispõe sobre a legitimidade ativa para o mandado de segurança coletivo. Segundo essa norma, os partido políticos tem legitimidade para o mandando de segurança coletivo, desde que atuem na defesa dos integrantes de seus quadros ou de alguma das finalidades partidárias. Ainda conforme a regra, a organização sindical, a entidade de classe ou associação (desde que legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, um ano) podem, sem necessidade de autorização especial de seus membros e na forma do estatuto social, impetram o writ coletivo, mas apenas para a defesa dos direitos de seus associados. Outro aspecto a ser observado é relativamente a proteção de direito líquido e certo que se busca com o MS coletivo para preservação ou reparação de interesses transindividuais, sejam os individuais homogêneos ou coletivos. Evidentemente, que segundo os autores acima referidos o MS coletivo tem por objeto: [...] direitos coletivos stricto sensu e direitos individuais homogêneos. Esse dispositivo, no entanto, se interpreta como excludente dos direitos difusos, viola a Constituição, uma vez que o inciso LXX de seu art. 5.º não restringe o cabimento do writ coletivo apenas aos direitos coletivos stricto sensu e individuais homogêneos. Logo, se o texto constitucional não restringe, não cabe ao legislador infraconstitucional fazê-lo, mormente porque o mandado de segurança coletivo está 40 disposto no rol de garantias fundamentais da Constituição, o que toma ainda mais descabida a limitação de sua incidência pela Lei 12.016/2009. Assim, a nosso ver, o mandado de segurança coletivo pode proteger todo e qualquer direito tutelado coletivamente – difusos, coletivos stricto sensu ou individuais homogêneos – devendo o parágrafo único do art. 21 ser interpretado conforme o texto constitucional. (REDONDO; OLIVEIRA E CRAMER, 2009, p. 152). Considerando todos estes aspectos entende-se que a lei 12.016/09 assegura a proteção jurídica dos direitos individuais homogêneos ou coletivos consagrados pela CF88, sustentando que toda vez que houver ameaça ou lesão a direito, sendo leste líquido e certo pode ser impetrado MS. Embora a Lei 12.016/09 apresente em seu contexto novidades, verifica-se que no §2.º do art. 10 ao admitir o litisconsórcio ativo, após determinado procedimento processual é um retrocesso pois viola o princiípio do juiz natural e da livre distribuição. Tudo isto porque a lei admite a formação de litisconsórcio ativo após a distribuição da petição inicial, desde que não recebida pelo magistrado.Na realidade o dispositivo legal, permite que se saiba de antemão qual o juiz da causa, pois ao aguardar a distribuição da petição, já se tem conhecimento prévio qual magistrado processara ou julgara o MS. 2.1.3 Posicionamento Jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em face da nova lei do Mandado de Segurança Aborda-se objetivamente as novidades introduzidas pela Lei 12.016/09 no que se refere aos remédios constitucionais, mais especificamente sobre MS individual e coletivo. Observa-se que o MS criado pelo direito brasileiro é uma ação constitucional que visa à defesa do direto liquido e certo não aparado por habeas corpus ou habeas data, quando a autoridade coatora agir com ilegalidade ou abuso de poder. Em razão das novidades introduzidas pela Lei 12.016/09, a seguir apresenta-se entendimento jurisprudencial em face da nova lei do MS. 41 Salienta-se que o posicionamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul se faz necessário para a compreensão sobre a importância da utilização do MS de forma adequada e observando os requisitos exigidos para o seu cabimento. Nesse sentido, quando os Juizes de primeiro grau processam e julgam um MS e em não sendo deferida medida, ainda resta ao lesado e à autoridade coatora a possibilidade de dirigir-se aos Tribunais Superiores para reformar ou não a decisão. Assim, colaciona-se abaixo alguns acórdãos da justiça gaúcha, conhecida como uma das mais serias do país, que demonstram que essa possibilidade existe e a prestação jurisdicional é realizada, seja a favor do impetrante ou em desfavor do impetrante. Vejamos o primeiro acórdão: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS DO EDITAL. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE LESÃO AO DIREITO. PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. NÃO EXPIRADO. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ART. 535, DO CPC. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. Esse acórdão (anexo 1) diz respeito ao caso de uma determinada candidata que impetrou MS para ter reconhecido o direito à nomeação e investidura do cargo, tendo em vista a aprovação em certame dentro do número de vagas disponíveis. Inconformada com a decisão de segundo grau que reformou parcialmente a sentença em reexame necessário, nos autos do MS impetrado em desfavor do Estado do Rio Grande do Sul, prequestionou a matéria em embargos de declaração, sendo que os embargos foram recebidos mas que, não prosperaram pela ausência das hipóteses do art. 535, do CPC. O que se quer demonstram é que houve lesão a um direito subjetivo da candidata a vaga em um concurso público, e esta sentindo-se lesada, impetrou MS e este foi deferido em seu favor. Assim, pode-se dizer que tanto o Juiz de 1º grau, como o órgão superior, no caso o TJ/RS verificando a presença dos pressupostos do MS fizeram justiça ao caso concreto. Chama a atenção o segundo acórdão (anexo 2), que abaixo se apresenta, pois a ordem foi denegada, por não ser o instrumento hábil para a discussão do mérito. Quer dizer, a Lei 42 12.016/09, estabelece de forma clara quando cabe MS. Ou seja, o direito deve ser líquido e certo que não precisa de comprovação, de dilação probatória e nesse caso não foi concedido por não preencher um dos requisitos do mandamus e não ser caso de MS. Neste sentido, analisemos o julgado a seguir: MANDADO DE SEGURANÇA.SUPERINTENDENTE DOS SERVIÇOS PENITENCIARIOS (SUSEPE).CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE AGENTE PENITENCIÁRIO.REPROVAÇÃO NO EXAME PSICOLÓGICO. IMPUGNAÇÃO DO EXAME.NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. Mandado de segurança impetrado por certamista reprovado no exame psicológico do concurso público promovido pela SUSEPE ao cargo de agente penitenciário.Impugnação - com vista à continuidade no certame - do laudo administrativo.O Mandado de segurança exige a liqüidez e a certeza do direito; vale dizer, os fatos de que emanam o direito devem ser comprovados de plano, sem a necessidade de dilação probatória. Inteligência do art. 5º, LXIX, da CF, e 1º da Lei 12.016/09. A comprovação da aptidão psicológica de candidato reprovado em exame psicológico realizado em concurso público exige, tendo em vista a presunção de legitimidade dos atos administrativos, dilação probatória, a qual possibilitará a realização de perícia judicial. Precedentes jurisprudenciais do STJ. PETIÇÃO INICIAL INDEFERIDA, POR NÃO SER CASO DE MANDADO DE SEGURANÇA (ART. 10 DA LEI 12.016/09). Evidencia-se, portanto que houve indeferimento do pedido da parte impetrante por não ser cabível ao caso esse tipo de ação constitucional, ou seja, não era caso para ser discutido em MS, por não ter um direito líquido e certo. No entendimento de Hely Lopes Meirelles (1997, p. 34/35) “o direito líquido e certo, o qual deve se apresentar manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração, é o que resulta de fato certo, e fato certo é aquele capaz de ser comprovado de plano” Por último, analisa-se um terceiro acórdão (anexo 3) que apresenta um MS preventivo, pois pretendiam os impetrantes a obtenção da suspensão do ato de exoneração que seria publicada por ser um ato ilegal e como estava sub judice, pois pendente um recurso de embargos no TJ/RS. Observa-se que foi concedida liminar satisfatória, acatando os argumentos dos impetrantes e possibilitando-lhes a efetivação da garantia do contraditório e ampla defesa no processo administrativo, estabelecida no art. 5.º, inciso LV, da CF/88. Assim, tem- se que: SERVIDOR PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA. NEGATIVA DE REGISTRO A ATOS DE NOMEAÇÃO. MUNICÍPIO DE ARROIO GRANDE. NOTIFICAÇÃO DOS SERVIDORES ACERCA DA 43 EXONERAÇÃO. IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. PLEITO DE SUSPENSÃO DO ATO ATÉ O JULGAMENTO DE RECURSO NO ÂMBITO DA CORTE DE CONTAS. DEFERIMENTO DE LIMINAR SATISFATIVA. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. EXAURIMENTO DO OBJETO DO MANDAMUS. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE CUSTAS. ISENÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE HOMENAGIADO. MANUTENÇÃO. HONORÁRIOS A ASSISTENTE JURÍDICO MANTIDO. ÔNUS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ATO Nº 19/05-P. Assim, os servidores públicos que foram prejudicados por não terem atendidos seus direitos pela autoridade coatora e estavam para serem exonerados, tiveram a possibilidade de exercer o direito ao contraditório e da ampla defesa. Certamente que muitas outras decisões poderiam ser analisadas, mas esta pesquisa não tem o intuito de esgotar o assunto, apenas apresentar alguns casos ilustrativos para compreensão de um instituto tão importante para a defesa dos direitos fundamentais. 44 CONCLUSÃO Ao término desta pesquisa pode-se afirmar que os objetivos propostos forma alcançados, sendo que se abordou aspectos referentes aos direitos fundamentais, remédios constitucionais, notadamente o Mandado de Segurança, sendo realizada uma análise da Lei 12.016/09, para uma melhor compreensão do instituto que tem caráter acentuadamente constitucional. Para tanto, no primeiro capítulo se analisou que para a efetivação dos direitos fundamentais foi necessário a inserção no texto constitucional de mecanismos capazes de conceder-lhes a devida proteção. E, que neste contexto se inseriu o Mandado de Segurança, juntamente com outros remédios constitucionais, até então, não existentes no ordenamento jurídico, tais como, habeas data, mandado de injunção, sendo que o MS é um dos instrumentos com maior eficácia para que as normas declaratórias, ou seja, os direitos e liberdades públicas possam ser garantidas. Pode-se afirmar que a partir do momento que a Constituição Federal de 1988 reconheceu e consagrou os direitos e garantais fundamentais, foi muito importante para o estudo do MS a discussão acerca da evolução daqueles, ou seja, o reconhecimento das várias gerações de direitos, visto que estão intimamente ligadas às transformações da sociedade e do Estado e foram muito elucidativas para a compreensão dos remédios constitucionais. No segundo capítulo se abordou especificamente sobre o mandado de segurança é se concluiu que este é um remédio constitucional, também conhecido como garantia 45 constitucional, mecanismo para proteger direitos previstos na Constituição. O mandado de segurança individual é aquele que protege um individuo ou um grupo de indivíduos sem vinculação a determinadas vinculações especificas de uma coletividade e está previsto no art. 5° inciso LXIX e LXX. Esse instrumento possibilita a proteção judicial dos direitos individuais e coletivos e posto à disposição dos titulares de direito líquido e certo, lesados ou ameaçados de lesão, por ato ou omissão de agente público ou pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público. Ademais, observou-se que foi fundamental a realização da análise da Lei 12.016/09 haja vista que a legislação existente até então, ou seja, a lei 1.533/51, foi editada em um período da história constitucional brasileira na qual, as Constituições derivavam ora da concessão dos governantes, seja ele imperador ou, presidente, sendo, quanto à sua origem, outorgada, como as de 1824, 1937 e 1967, seguida esta última pela Emenda Constitucional n.1/69, ora, democráticas, como as Constituições de 1891, 1934, 1946 e a de 1988. A primeira novidade estabelecida pela lei 12.016/09, modificando aspectos legais da lei 1533/51, diz respeito à possibilidade de mandado de segurança individual quanto o coletivo, desde que direitos individuais, coletivos ou homogêneos estejam sendo lesados ou em vias de sofrer lesão, e que a autoridade coatora seja autoridade pública ou no exercício de atividade como se autoridade pública fosse, assegurando a proteção jurídica dos direitos individuais homogêneos ou coletivos consagrados pela CF88, sustentando que toda vez q houver ameaça ou lesão a direito, sendo leste liquido e certo pode ser impetrado MS. Importante referir que se chegou a conclusão que MS é cabível quando há lesão a direito liquido e certo, sendo este um dos requisitos imprescindíveis para a sua impetração e condição principal da ação mandamental, pois caso não exista direito liquido e certo, não haverá ilegalidade ou abuso por parte de autoridade publica.E, que a posição dos tribunais superiores é muito clara, pois há deferimento do pedido de liminar quando presentes os requisitos para a sua impetração. 46 Verificou-se, também, que lei 12.016/09 apresenta em seu contexto novidades, mas a que mais chamou a atenção foi relativamente à admissão do litisconsórcio ativo, após determinado procedimento processual e no entendimento dos integrantes do Poder Judiciário é um retrocesso, pois viola o principio do juiz natural e da livre distribuição. Tudo isto porque a lei admite a formação de litisconsórcio ativo após a distribuição da petição inicial, desde que não recebida pelo magistrado. Na realidade o dispositivo legal, permite que se saiba de antemão qual o juiz da causa, pois ao aguardar a distribuição da petição, já se tem conhecimento prévio qual magistrado processará ou julgará o MS. Outro aspecto que se conclui como muito importante e que foi introduzido pela nova lei foi que se considera inaplicável a concessão de MS referente à direitos que produzam efeitos patrimoniais, quando, por exemplo, servidores públicos reclamam em juízo pagamento de vencimentos e vantagens pretéritas, confirmando posição dos tribunais superiores já sumuladas, que entendem que esse tipo de pedido deve ser reclamado administrativamente ou pela via judicial própria. Pode-se dizer que assim, que após o estudo feito, constatou-se que foi muito interessante e proveitoso para a vida acadêmica e para a vida profissional, pois o MS é um instrumento que é muito utilizado nas vias judiciais e pouco se estuda sobre ele. Inclusive, conclui que o suporte do MS é uma situação incontroversa, com a liquidez e certeza, não se admitindo prazo para a produção de provas, perícias, oitiva de testemunhas. Por fim, o Mandado de Segurança tutela tanto os interesses individuais como coletivos, relativamente às liberdades públicas, configurando-se tanto como um direito fundamental que visa à proteção do direito líquido e certo, lesado ou ameaçado, quanto um mecanismo constitucional de defesa desses direitos. 47 REFERÊNCIAS BEDIN, Gilmar Antônio. Os direitos do homem e o neoliberalismo. 3. ed. Ijuí: Unijuí, 2002. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 45. ed. São Paulo: Saraiva, 1988. BULOS, Uadi Lammego Direito Constitucional ao Alcance de Todos. São Paulo: Saraiva, 2009. CURY. Ieda Tatiana. Direito fundamental à saúde: evolução, normativa e efetividade. Rio de Janeiro, 2005. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria Geral do Estado. Saraiva, 2004 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 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A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. SCHÄFER, Jairo Gilberto. Direitos fundamentais: proteção e restrições. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. SEABRA, FAGUNDES, O Controle dos atos administrativos pelo poder judiciário, 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2003 ______. Curso de Direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2010 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. Saraiva, 2002. ZIMMERMANN, Augusto. Curso de direito constitucional: revista, ampliada e atualizada até a emenda n° 42. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris , 2004. 49 ANEXO A - Acórdão. Mandado De Segurança. Aprovação Dentro do Número De Vagas Do Edital. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS DO EDITAL. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE LESÃO AO DIREITO. PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. NÃO EXPIRADO. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ART. 535, DO CPC. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. Não merecem acolhimento os embargos declaratórios que não contemplam qualquer das hipóteses previstas no artigo 535 do CPC, ou que refiram nulidade ou erro material inexistentes. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DESACOLHIDOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO Nº 70048289334 FERNANDA MAGALHAES QUARTA CÂMARA CÍVEL COMARCA DE SAPUCAIA DO SUL DE FREITAS MUNICIPIO DE SAPUCAIA DO SUL EMBARGANTE EMBARGADO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desacolher os embargos de declaração. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA (PRESIDENTE) E DES. EDUARDO UHLEIN. 50 Porto Alegre, 23 de maio de 2012. DES. JOSÉ LUIZ REIS DE AZAMBUJA, Relator. RELATÓRIO DES. JOSÉ LUIZ REIS DE AZAMBUJA (RELATOR) Trata-se de embargos de declaração interpostos por Fernanda de Freitas Magalhães em face do acórdão que reformou parcialmente a sentença em reexame necessário, nos autos do mandado de segurança impetrado em desfavor do Estado do Rio Grande do Sul. Alega, em síntese, haver a necessidade de esclarecimento do julgado, pois houve contradição no acórdão embargado, devido à confirmação, em reexame necessário, do reconhecimento do direito da parte autora à nomeação e investidura do cargo, tendo em vista a aprovação em certame dentro do número de vagas disponíveis, conforme a sentença, reformando a decisão apenas no sentido de afastar o direito da impetrante aos vencimentos e ao tempo de serviço, anteriores a posse no cargo. Assevera que os vencimentos e vantagens concedidos ao servidor público somente seriam devidos com o efetivo exercício do cargo, em decorrência do desempenho das funções pertinentes, prejudicando-se a impetrante em favor da administração pública. Aduz que deveria ser afastado o direito da parte autora em perceber a verba indenizatória e não deveria ser afastado o direito em perceber os vencimentos devidos, posto que desde expirado o edital a impetrante poderia estar exercendo função, a qual foi aprovada e devidamente classificada, não havendo como negar a negligência do ente público em nomeála. Requer o recebimento e o provimento dos presentes embargos de declaração, a fim de prequestionar a matéria expressamente aduzida. É o relatório. VOTOS DES. JOSÉ LUIZ REIS DE AZAMBUJA (RELATOR) 51 Avaliados os pressupostos processuais de admissibilidade do recurso, recebo os embargos declaratórios, mas que, todavia, não têm viabilidade de prosperar. Não há qualquer espécie de omissão, contradição ou obscuridade no respeitável acórdão, porque a decisão está adequadamente fundamentada. Quanto à alegação de contradição no que tange ao reconhecimento do direito da embargante à nomeação e investidura no cargo, tendo em vista o documento de fl. 26 dos autos, evidenciada a aprovação no concurso para o cargo de auxiliar municipal, em décimo nono lugar, para o Município de Sapucaia do Sul, portanto, dentro do número de vagas previstas no Edital de n° 001/2003 (fls. 13/23). Ademais, é suficiente a leitura do acórdão para concluir que o entendimento de conferir direito subjetivo à nomeação de candidato quando aprovado dentro do número de vagas disponíveis no edital, se encontra pacificado no Superior Tribunal de Justiça, nas Câmaras integrantes do 2° Grupo Cível deste Tribunal de Justiça, bem como na doutrina de José dos Santos Carvalho Filho, que por ora, a fim de evitar a tautologia, transcrevo: Se o edital do concurso previu determinado número de vagas, a Administração fica vinculada a seu provimento, em virtude da presumida necessidade para o desempenho das respectivas funções. Assim, deve assegurar-se a todos os aprovados dentro do referido número de vagas direito subjetivo à nomeação. Sendo assim, a falta de nomeação é que deve constituir exceção, cabendo ao órgão público comprovar, de forma fundamentada, a sua omissão. Somente com tal orientação poderá impedir-se o arbítrio da Administração, ao mesmo tempo em que com ela poderá respeitar-se com impessoalidade, a ordem classificatória advinda do concurso público, obstando-se a que os aprovados fiquem à mercê dos caprichos e humores dos dirigentes administrativos.1 Cumpre salientar que expirado o prazo de validade do concurso (fl. 24), é certo o direito da embargante à nomeação, se ainda não nomeada. Na espécie, contudo, no que pertine à indenização decorrente da nomeação e a contagem de tempo de serviço, ressalto que deve ser feita ressalva quanto a esses pontos na sentença, reformando-a em parte, uma vez que os vencimentos e vantagens concedidas ao 1 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 23. ed. rev., ampl. e atualizada até 31.12.2009. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 688. 52 servidor público somente são devidos com o efetivo exercício do cargo, como decorrência do desempenho das funções pertinentes, cujos efeitos patrimoniais devem incidir somente após a posse da embargante. Assim, tendo o acórdão se manifestado expressamente quanto à omissão apontada, a conduta do embargante, tangencia, somente, a intenção de protelar o andamento do feito, o que vai de encontro ao interesse das partes. Quanto ao prequestionamento suscitado, conclui-se que os pedidos formulados foram examinados com base na legislação pertinente, desnecessário exame pontual de cada artigo suscitado no recurso. O prequestionamento não significa vinculação do julgador ao enfrentamento de todas as razões e fundamentos invocados pelas partes, suficiente apenas um para atender a prestação jurisdicional objetivada, uma vez que compete ao julgador a apreciação da questão posta e não, necessariamente, o exame dos artigos de lei referidos pelas partes. O que pretende o recorrente, em suma, é a rediscussão da matéria ventilada no acórdão, o que não se coaduna com as características do recurso de embargos de declaração, que visa – conforme dispõe o art. 535, I e II, do CPC – tão somente suprir omissão, contradição ou obscuridade. Não há, portanto, omissão, obscuridade ou contradição no aresto embargado. Do exposto, desacolho os embargos de declaração. DES. EDUARDO UHLEIN - De acordo com o(a) Relator(a). DES. ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA - Presidente - Embargos de Declaração nº 70048289334, Comarca de Sapucaia do Sul: "À UNANIMIDADE, DESACOLHERAM OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO." Julgador(a) de 1º Grau: ROGERIO DELATORRE 53 ANEXO B - Acórdão. Mandado de segurança. Reprovação no exame psicológico MANDADO DE SEGURANÇA. SUPERINTENDENTE DOS SERVIÇOS PENITENCIARIOS (SUSEPE). CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE AGENTE PENITENCIÁRIO. REPROVAÇÃO NO EXAME PSICOLÓGICO. IMPUGNAÇÃO DO EXAME. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. Mandado de segurança impetrado por certamista reprovado no exame psicológico do concurso público promovido pela SUSEPE ao cargo de agente penitenciário. Impugnação - com vista à continuidade no certame - do laudo administrativo. O Mandado de segurança exige a liqüidez e a certeza do direito; vale dizer, os fatos de que emanam o direito devem ser comprovados de plano, sem a necessidade de dilação probatória. Inteligência do art. 5º, LXIX, da CF, e 1º da Lei 12.016/09. A comprovação da aptidão psicológica de candidato reprovado em exame psicológico realizado em concurso público exige, tendo em vista a presunção de legitimidade dos atos administrativos, dilação probatória, a qual possibilitará a realização de perícia judicial. Precedentes jurisprudenciais do STJ. PETIÇÃO INICIAL INDEFERIDA, POR NÃO SER CASO DE MANDADO DE SEGURANÇA (ART. 10 DA LEI 12.016/09). MANDADO DE SEGURANÇA Nº 70031718752 TERCEIRA CÂMARA CÍVEL COMARCA DE PORTO ALEGRE MARCIO SIQUEIRA DE SILVEIRA IMPETRANTE SUPERINTENDE DOS SERVICOS PENITENCIARIOS DO RS SUSEPE DECISÃO MONOCRÁTICA Vistos. COATOR 54 1. MÁRCIO SIQUEIRA DE SILVEIRA impetrou mandado de segurança contra ato do SUPERINTENDENTE DOS SERVICOS PENITENCIÁRIOS DO RS (SUSEPE). Afirmou ter prestado concurso público para o cargo de agente penitenciário, tendo sido aprovado na primeira e na segunda fase do certame (prova objetiva e exames físicos). Disse, no entanto, ter sido reprovado no exame psicológico. Referiu ter realizado três outras “avaliações psicológicas, com testes e entrevistas que se assemelham aos submetidos no concurso público, onde os resultados confrontam e contradizem o apontado pela profissional subordinada à autoridade coatora”. Sustentou a aplicabilidade do princípio da isonomia e proporcionalidade. No mérito, requereu a realização de nova avaliação pelo impetrado, bem como sua permanência no certame. Disse que o exame psicológico realizado pelo impetrado fora subjetivo, não se sabendo quais os critérios para a avaliação do candidato. Requereu, liminarmente e ao final, a realização de novo exame psicológico e a sua permanência no concurso. É o relatório. 2. Não é caso de mandado de segurança, razão pela qual deve ser, nos termos do art. 10 da Lei 12.016/09 (nova lei do mandado de segurança), indeferida a petição inicial. O mandado de segurança, remédio constitucional destinado a evitar ou a reprimir ilegalidade ou abuso de poder, somente se revela cabível quando o direito subjetivo que o fundamenta se apresentar líqüido e certo; vale dizer, quando os fatos de que emanam o direito forem comprováveis de plano, sem a necessidade de dilação probatória. Esta interpretação decorre da própria estrutura dada pela Constituição ao mandado de segurança (art. 5º, LXIX), explicitada hoje na Lei 12.016/09, cujo artigo 1º manteve a exigência da liqüidez e certeza do direito. Neste sentido, os seguintes precedentes do STJ, um dos quais similar ao presente caso, verbis: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. ILÍCITOS FUNCIONAIS DE NATUREZA GRAVE. 55 EXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DESCONSTITUIÇÃO. NÃO-CABIMENTO. ABRANDAMENTO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. SEGURANÇA DENEGADA. 1. O mandado de segurança não constitui o meio processual adequado para provar um fato. Exige prova pré-constituída como condição essencial à verificação do direito líquido e certo, de modo que a dilação probatória mostra-se incompatível com a natureza dessa ação constitucional. 2. Se o servidor público acusado pretende desconstituir as provas de processo disciplinar, que se apresentam suficientes para a aplicação da sanção, deve se valer dos meios processuais adequados. 3. Atestar serviços não-executados em obra pública, permitindo o proveito indevido de empresa contratada, conforme apurado pela comissão processante, constitui falta funcional de natureza grave, passível da aplicação da pena de demissão. 4. O indeferimento motivado de produção de provas, mormente quando se mostram dispensáveis diante do conjunto probatório, não enseja cerceamento de defesa. Precedentes do STJ. 5. Constatada a prática de grave ilícito funcional, a inexistência de anterior sanção disciplinar aplicada em desfavor do servidor não afasta, por si só, a possibilidade de imposição da pena de demissão. 6. Segurança denegada, ressalvando-se, no entanto, as vias ordinárias. (MS 13.224/DF, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2009, DJe 03/08/2009) ADMINISTRATIVO - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PÚBLICO - CARGO DE ESCRIVÃO DE POLÍCIA - PERÍCIA MÉDICA - DISPENSA IMPOSSIBILIDADE - ILEGALIDADE DA AVALIAÇÃO MÉDICA - AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA INADMISSIBILIDADE, NA VIA ELEITA - AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1 - É inadmissível a dispensa de perícia médica para o exercício do cargo de Escrivão de Polícia. A realização do exame psicotécnico, bem como psicológico, está acobertada não apenas pela legislação (Lei nº 5.117/66 – art. 3º), mas, principalmente, pela racionalidade e essência em face dos requisitos necessários à função da carreira policial. A exigência desta avaliação, desta forma, é necessária e constitucional. Os requisitos do Concurso Público devem estar em conformidade com a natureza e a complexidade do cargo almejado. 56 2 - Outrossim, na via processual constitucional do mandado de segurança, a liquidez e a certeza do direito devem vir demonstradas initio litis. In casu, não há como analisar a ilegalidade da referida avaliação, de modo a justificar o pedido de sua dispensa. Tal exame deve ser feito através de perícia. Para tanto, é necessário dilação probatória, possível somente na via ordinária, a qual fica ressalvada nesta oportunidade. Ausência de liquidez e certeza a amparar a pretensão. 3 - Recurso conhecido, porém, desprovido. (RMS 14.079/RS, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUINTA TURMA, julgado em 09/09/2003, DJ 13/10/2003 p. 382) A comprovação da aptidão psicológica de certamista desclassificado, por esta razão, de concurso público é, ante a presunção de legitimidade dos atos administrativos (v.g, RESP 926.039/PR, REL. MINISTRO LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, JULGADO EM 05/02/2009, DJE 19/02/2009), fato que exige, inequivocamente, dilação probatória, inviável, como dito, em sede de mandado de segurança. A prova unilateralmente produzida pelo impetrante não é suficiente para o reconhecimento da certeza e liqüidez dos fatos que fundamentam o direito que entende possuir. A dúvida, no embate entre o exame realizado pela administração e os trazidos pelo impetrante, permanecerá, não permitindo, dada à impossibilidade da produção probatória, na qual se possibilitaria a realização de perícia judicial, o julgamento do mérito do writ. Incabível, pois, o mandado de segurança. 3. ANTE O EXPOSTO, POR NÃO SER CASO DE MANDADO DE SEGURANÇA, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL COM BASE NO ART. 10 DA LEI 12.016/09. Ressalvada a possibilidade do ajuizamento, pelo impetrante, da ação ordinária própria (art. 19 da Lei 12.016/09). Condenado o impetrante em custas processuais, cuja exigibilidade resta, porém, suspensa em face da AJG que ora concedo, pois o impetrante encontra-se desempregado. Intime-se. 57 Porto Alegre, 18 de agosto de 2009. DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO, Relator. 58 ANEXO C - Acórdão. Mandado de Segurança. Negativa de Registro a Atos de Nomeação. SERVIDOR PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA. NEGATIVA DE REGISTRO A ATOS DE NOMEAÇÃO. MUNICÍPIO DE ARROIO GRANDE. NOTIFICAÇÃO DOS SERVIDORES ACERCA DA EXONERAÇÃO. IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. PLEITO DE SUSPENSÃO DO ATO ATÉ O JULGAMENTO DE RECURSO NO ÂMBITO DA CORTE DE CONTAS. DEFERIMENTO DE LIMINAR SATISFATIVA. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. EXAURIMENTO DO OBJETO DO MANDAMUS. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE CUSTAS. ISENÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE HOMENAGIADO. MANUTENÇÃO. HONORÁRIOS A ASSISTENTE JURÍDICO MANTIDO. ÔNUS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ATO Nº 19/05-P. 1. Conhecimento da apelação: Em que pese o recurso tenha vindo em nome do Prefeito Municipal de Arroio Grande, a petição contém o timbre da Prefeitura Municipal e veio acompanhada de procuração outorgada pelo representante do Poder Executivo a advogado que firma o recurso. 2. A pretensão dos impetrantes em obter a suspensão do ato de exoneração que estava prestes a ser publicado, até que se julgasse recurso de embargos perante a Corte de Contas, foi deferida. Negativa de registro às nomeações que deveria ser acatada pela administração municipal, diante da ilegalidade verificada pela Corte de Contas. Liminar satisfativa que possibilitou aos impetrantes a efetivação da garantia do contraditório e ampla defesa no processo administrativo, insculpida no artigo 5º, LV, da CF-88. Concessão da segurança que era consequencia lógica do deferimento da liminar, haja vista o exaurimento do objeto do mandamus. 3. Em que pese tenha se alterado a situação dos impetrantes com o não-conhecimento dos embargos opostos no âmbito do Tribunal de Contas, tal fato não enseja a denegação da segurança, sob pena de ofensa ao princípio da causalidade e sucumbência. 4. Sucumbência no mandado de segurança que se limita às custas processuais, diante do incabimento de condenação das partes ao pagamento de honorários advocatícios, por força do artigo 25 da Lei nº 12.016/09 e dos verbetes das Súmulas 512 do STF e 102 do STJ. 5. De outra senda, vai mantida a fixação de remuneração em favor do Assistente Jurídico nomeado pelo juízo a quo a ser 59 custeado pelo Tribunal de Justiça, em razão do teor do Ato nº 19/05-P da Presidência desta Corte que assim autoriza quando na comarca na qual tramita o feito não houver atendimento da Defensoria Pública do Estado. APELAÇÃO IMPROVIDA. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO. APELAÇÃO NECESSÁRIO REEXAME TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Nº 70031575863 ARROIO GRANDE JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE ARROIO GRANDE APRESENTANTE MUNICÍPIO DE ARROIO GRANDE APELANTE JOÃO DE DEUS AGUIAR JUNIOR E OUTROS APELADOS ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento à apelação e confirmar a sentença em reexame necessário. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES.ª MATILDE CHABAR MAIA E DES. ROGÉRIO GESTA LEAL. Porto Alegre, 17 de maio de 2012. RELATÓRIO Trata-se de apelação interposta pelo MUNICÍPIO DE ARROIO GRANDE, porquanto inconformado com a sentença de fls. 98-100 que concedeu a segurança impetrada por JOÃO DE DEUS AGUIAR JÚNIOR, LIZIANE PEREIRA LIMA, MARIA DO CARMO GOMES MORAES, FLÁVIO JOEL SILVEIRA LEIVAS, LUCAS DOS SANTOS TAVARES, MARÍLIA FERREIRA SALES, NATÁLIA BENITO LACKMAN, ISLAN FOLHA CAETANO e ITAMARA CALDAS VIEIRA contra ato do 60 PREFEITO MUNICIPAL DE ARROIO GRANDE, no qual visavam liminarmente, à ordem à autoridade impetrada para que se abstivesse de praticar ato de exoneração dos servidores enquanto persistisse o prazo de embargos e enquanto não fosse decidido aquele recurso junto ao Tribunal de Contas do Estado, confirmando-se ao final, a segurança. O dispositivo da sentença restou assim redigido, in verbis: Posto isso, concedo a ordem postulada por João de Deus Aguiar Júnior, Liziane pereira Lima, Maria do Carmo Gomes Moraes, Flávio Joel Silveira Leivas, Lucas dos Santos Tavares, Marília Ferreira Sales, Natália Benito Lackman, Islan Folha Caetano e Itamara Caldas Vieira, em face de ato atribuído a Jorge Luiz Cardozo, Prefeito de Arroio Grande, ao efeito de ordenar à autoridade coatora que se abstenha de exonerar os impetrantes enquanto não for definitiva a decisão do Tribunal de Contas do Estado, tudo de conformidade com os fundamentos acima erigidos. Condeno a autoridade ao pagamento as custas do processo. Honorários advocatícios indevidos, de acordo com a Súmula n. 512 do STF. Sentença sujeita ao reexame necessário, de acordo com o art. 12, parágrafo único, da Lei n. 1.533/51. Assim, decorrido o prazo recursal, com ou sem a interposição do voluntário, remetam-se os autos ao Egrégio TJRS. Arbitro honorários ao assistente judiciário, Pedro Jaime Bittencourt Júnior, em R$ 200,00, nos termos do Ato 19/2005-P, da Presidência do TJRS. Em razões, impugnou a sentença afirmando a vinculação da administração ao princípio da legalidade e a necessidade de cumrpimento dos seus ditames. Referiu que os servidores devem ser exonerados por força da decisão do TCE que concluiu pela existência de vícios nas suas nomeações. Afirmou que os atos viciados podem ser revistos a qualquer tempo e cabe à administração cumprir decisão da Corte de Contas, sob pena de responsabilização, mormente porque os recursos interpostos pelos servidores foram negados. Pediu a reforma da sentença (fls. 103-8). 61 Recebido o recurso no efeito devolutivo (fl. 114), os impetrantes apresentaram contrarrazões às fls. 116-26 pedindo o improvimento da apelação. Após, foram os autos remetidos a esta Corte, indo com vista ao Dr. Roberto Neumann, Procurador de Justiça, que opinou pelo provimento da apelação ou em caso de seu não-conhecimento, impõe-se a reforma da sentença em reexame necessário. Vieram os autos. É o relatório. VOTOS NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO (PRESIDENTE E RELATOR) Encaminho voto pelo improvimento da apelação e pela confirmação da sentença em reexam necessário. Recordo que JOÃO DE DEUS AGUIAR JÚNIOR, LIZIANE PEREIRA LIMA, MARIA DO CARMO GOMES MORAES, FLÁVIO JOEL SILVEIRA LEIVAS, LUCAS DOS SANTOS TAVARES, MARÍLIA FERREIRA SALES, NATÁLIA BENITO LACKMAN, ISLAN FOLHA CAETANO e ITAMARA CALDAS VIEIRA impetraram mandado de segurança preventivo contra ato do PREFEITO MUNICIPAL DE ARROIO GRANDE, no qual visavam liminarmente, à ordem à autoridade impetrada para que se abstivesse de praticar ato de sua exoneração enquanto persistisse o prazo de embargos e enquanto não fosse decidido aquele recurso junto ao Tribunal de Contas do Estado, confirmando-se ao final, a segurança. Deferida a liminar às fls. 71-3, foi concedida a segurança às fls. 98-100. Inconformado, o Município de Arroio Grande interpôs apelação, cujas razões passo ao exame. Inicialmente conheço da apelação, embora conste o Prefeito Municipal como apelante e não o Município de Arroio Grande, verifica-se que o recurso veio com o timbre da Prefeitura Municipal do aludido município e foram outorgados poderes pelo Prefeito Municipal ao procurador que firma o recurso, o que demonstra a legitimidade recursal do ente público. Superada a prefacial, sobrelevo que os impetrantes lançaram mão do presente writ, que é ação documental e célere, cujo pressuposto mínimo é a demonstração do direito líquido e certo a ser tutelado. 62 Com efeito, conforme o magistério de Pontes de Miranda, constante também no Dicionário de Pereira e Souza, “líquido é o que consta ao certo”, caracterizando como direito líquido e certo “aquele que não desperta dúvidas, que está isento de obscuridades, que não precisa ser aclarado com o exame de provas em dilações, que é, de si mesmo, concludente e inconcusso”. (Comentários à CF de 1946, IV, nº 3, p. 369). Por outro lado, consoante o magistério do saudoso Hely Lopes Meirelles, o direito líquido e certo deveria ser comprovado de plano: “Se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver determinada; se o seu exercício depender de situações e fatos não esclarecidos nos autos, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais”.(Mandado de Segurança e Ação Popular, 2ª Edição, p. 15). Modernamente se tem sustentado, com toda a propriedade, diga-se de passagem, que o conceito de direito líquido e certo tem natureza marcadamente processual, valendo transcrever a lição de Celso Agrícola Barbi: “(...) a circunstância de um determinado direito subjetivo realmente existir não lhe dá a caracterização de liquidez e certeza; esta só lhe é atribuída se os fatos em que se fundar puderem ser provados de forma incontestável, certa, no processo” (Do Mandado de Segurança, 3ª Edição, p. 55). Sobrelevo que o tema central está na alegação dos impetrantes de que estavam, na data da impetração do mandado de segurança preventivo, prestes a ser exonerados do serviço público municipal em 31DEZ07 (fl. 44) por força da decisão emanada do Tribunal de Contas que após auditoria no Município de Arroio Grande, negou registro aos seus atos de nomeação ocorridos em 2005, sob o fundamento de afronta aos dispositivos constitucionais, à Lei-Arroio Grande nº 2.232/05 e ao edital do concurso (fls. 45-8). Manifestaram ausência de oportunização à ampla defesa e contraditório e pediram com isso, que a administração municipal não levasse a cabo a decisão do TCE até quse julgasse o recurso de embargos que opuseram naquela Corte. Na hipótese, em que pesem os fundamentos do parecer lançado neste grau de jurisdição apontando a necessidade de reforma da sentença por força do disposto no artigo 462 do CPC, tenho que ela merece ser mantida por seus próprios fundamentos. Isso porque o pedido formulado pelos impetrantes na inicial do mandado de segurança foi limitado à liminar que ordenasse à autoridade coatora se abster da prática do ato de sua exoneração enquanto persistisse o prazo de embargos e enquanto não fosse decidido aquele recurso junto à Corte de Contas do Estado, com a confirmação da segurança ao final (fl. 15). 63 A liminar foi deferida em 28DEZ07 (fls. 71-3) e a autoridade impetrada prestou informações em 09JAN08 apresentando defesa e pedindo a denegação da ordem (fls. 76-7). O Município de Arroio Grande postulou à fl. 78 a revogação da liminar sob o argumento de que o recurso de embargos oposto pelos impetrantes perante a Corte de Contas não havia sido conhecido por intempestivo, consoante a decisão de fl. 79, datada de 07FEV08. Diante disso, o que se verifica é que os impetrantes obtiveram decisão liminar favorável para que não fossem exonerados dos seus cargos até o julgamento dos embargos opostos perante a Corte de Contas, utilizando da garantia do contraditório e ampla defesa assegurada pela regra do artigo 5º, LV, da CF-88, diante da iminência de cumprimento da decisão do TCE anunciada pela administração nos documentos de fls. 48 e 65. Tal situação se efetivou e a concessão da segurança ao final era consequencia lógica, em homenagem ao princípio da sucumbência, inserto no artigo 20 do CPC. Por isso, embora a ocorrência de fato modificativo do direito dos impetrantes, consubstanciado no não-conhecimento dos embargos que opuseram, o que leva à possibilidade de a administração os exonerar do serviço público, tal situação não lhes retirou a garantia da liminar satifsativa que possibilitou a suspensão do ato de exoneração até que se julgasse o recurso administrativo, exaurindo o objeto do mandamus e ensejando, consequentemente, o decaimento da autoridade impetrada. Isso porque a condenação aos ônus sucumbenciais, antes de obedecer ao princípio da sucumbência deve obedecer ao princípio da causalidade. Não fosse a impetração do mandado de segurança pelos apelados e a administração os teria exonerado sem aguardar o julgamento do recurso de embargos na Corte de Contas. Neste contexto, destaco o entendimento emanado do eg. Superior Tribunal de Justiça a respeito da sucumbência em hipóteses similares a dos autos, in verbis: RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 19.342 GO (2004/0176105-8) A decisão colegiada restou assim ementada: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE JULGOU PREJUDICADO O MANDADO DE SEGURANÇA POR PERDA DE OBJETO. DECISÃO UNILATERAL. CABIMENTO. 64 A decisão do relator que extingue o mandamus, por perda do objeto, ante a ausência de interesse processual, é cabível, posto que prevista no inciso II, do artigo 175, do Regimento interno do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás. AGRAVO REGIMENTAL CONHECIDO E IMPROVIDO. (...) DECIDO. A pretensão recursal merece parcial acolhida. Com efeito, o objeto requerido na petição inicial do mandado de segurança é a anulação da demissão do recorrente e conseqüente reintegração do impetrante em seu cargo, com todos os direitos e vantagens dele decorrente. O Relator, ao apreciar o pedido de liminar, nos termos de suas palavras "ante a flagrante ilegalidade do decreto", determinou a suspensão dos efeitos da demissão, tendo sido o impetrante reintegrado aos quadros da Polícia Civil e instaurado o processo disciplinar para apuração dos fatos. De fato, consoante entendeu a Corte de origem, considerando que a pretensão do recorrente, no sentido de reintegrar-se ao cargo de origem, foi alcançada com a afirmação expressa de ilegalidade do ato da Autoridade Coatora pelo Relator, bem como que a eficácia do ato demissionário esvaiu-se, ante o comando satisfativo engendrado na decisão liminar, verifica-se a ausência do binômio necessidade/utilidade inerentes ao interesse processual do impetrante. Com efeito, ressalvado o de natureza preventiva, o mandado de segurança não substitui a ação declaratória. A ação de segurança tem força mandamental (constitutiva negativa), uma vez que objetiva impedir ou fazer cessar ato ilegal ou coator de autoridade pública. Não mais existente o ato ilegal, tendo-se exaurido o objeto da impetração, é desnecessária a declaração da nulidade de ato, quando este não surte mais efeitos, sequer para respaldar pedido de indenização. (...) Por fim, deve ser assinalado que a decisão liminar satisfativa concessiva do Relator, exaurindo integralmente o objeto do presente mandado de segurança, reconheceu o direito pretendido pelo impetrante, refletindo, com isso, a sucumbência do Estado. Segundo o princípio da causalidade: "Responde pelo custo do processo aquele que haja dado causa a ele, seja atribuindo-se razão sem ter (pretensão auto-atribuída), seja obrigando quem tem razão a vir a juízo para obter provimento satisfatório e permitido" (FREDERICO DO VALLE ABREU, "O custo financeiro do processo", in: Revista dos Tribunais; São Paulo: RT, v. 818 dez/2003, p. 65). 65 Por tais fundamentos, nos termos do art. 557, § 1º-A, do CPC, DOU PARCIAL PROVIMENTO, apenas para reconhecer a sucumbência estatal. Custas ex lege; sem condenação em honorários advocatícios (Súmulas 512/STF e 105/STJ). Intimem-se. Brasília-DF, 23 de novembro de 2011. Des. Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ-RS); PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. EXAME NACIONAL DE CURSOS (ENC). INSCRIÇÃO DE ALUNO NÃO-REALIZADA. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR CONCEDIDA. INEP E UNIVERSIDADE. LITISCONSÓRCIO. DESNECESSIDADE. ÔNUS SUCUMBENCIAIS.PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. 1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 2. A Primeira Seção do STJ pacificou a orientação de que a responsabilidade pelo deferimento das inscrições dos participantes do Exame Nacional de Cursos – ECN é do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP, conforme estabelecido no art. 4º, III, da Portaria 963/1997 do MEC. Dessa forma, desnecessária a formação do litisconsórcio passivo entre a Unifenas e o INEP. 3. Hipótese em que o INEP deu causa à impetração do writ, devendo arcar com o ônus sucumbencial, conforme precedentes da Primeira e Segunda Turmas do STJ. 4. Recurso Especial não provido. (REsp 410.388/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, j. em 06AGO09, DJe 27AGO09). Dessa feita, embora seja cediço o incabimento dos honorários advocatícios na via do mandado de segurança, por força do disposto no artigo 25 da Lei nº 12.016/09 e dos verbetes das Súmulas (512 do STF e 105 do STJ), resta a condenação ao pagamento das custas pela movimentação da máquina judiciária, assim como concluiu a sentença. Assim, não merece guarida a apelação do Município de Arroio Grande, e vai confirmada a sentença em reexame necessário, mantendo a condenação da autoridade impetrada somente ao pagamento das custas processuais, haja vista a isenção ao pagamento da verba honorária por força do disposto no artigo 25 da Lei nº 12.016/09 e verbetes das Súmulas 512 do STF e 105 do STJ. Ademais, vai mantida a fixação de honorários 66 advocatícios em favor do Assistente Judiciário a serem custeados pelo Tribunal de Justiça, haja vista os termos dos alvarás de justiça gratuita firmados pelo magistrado da comarca de origem, por força do Ato nº 19/05-P da Presidência desta Corte, que assim autoriza o seu pagamento quando nas comarcas nas quais tramitam o processo não houver atendimento da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul. Diante do exposto, voto pelo improvimento da apelação e pela confirmação da sentença em reexame necessário. DES.ª MATILDE CHABAR MAIA (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. ROGÉRIO GESTA LEAL - De acordo com o(a) Relator(a). DES. NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO - Presidente - Apelação Reexame Necessário nº 70031575863, Comarca de Arroio Grande: "NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO E CONFIRMARAM A SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO. UNÂNIME." Julgador(a) de 1º Grau: NELSON DAGMAR DE OLIVEIRA FERRER