POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES Solange Mary Moreira Santos103 Introdução O propósito deste trabalho é discutir iniciativas de uma política pública no contexto do neoliberalismo, à luz das diretrizes veiculadas pelos documentos oficiais de diferentes associações voltadas para aspectos específicos, em relação à formação e à profissionalização do magistério. Essas iniciativas partem, dentre outros, do suposto de que para a melhoria do ensino é essencial que o Estado assuma o papel de controle de qualidade dos resultados que vêm sendo produzidos pela escola, a partir de padrões estabelecidos, expressos em conteúdos a serem ensinados em âmbito nacional. Procuro explorar significados dessas práticas, que adquirem coerência e significados dentro dos objetivos da atual política educacional brasileira. É importante salientar que, no contexto do projeto neoliberal, a concepção de formação se insere na temática da formação do educador em uma política educacional global. Nessa direção, as propostas políticas de formação vêm delineando os princípios gerais e questões particulares relativas a essa formação, assumindo que a melhoria da qualidade do ensino, no que diz respeito ao profissional da educação, passa por uma articulação entre formação básica, condições de trabalho e formação continuada. Nessa perspectiva, pretendo, nessa pesquisa, coletar dados sobre essas políticas de formação conhecidas e vivenciadas pelo professor no seu cotidiano escolar, na busca de novas bases para um repensar da escola pública e do trabalho de seus agentes. Campo teórico Ao longo de décadas, a crise educacional brasileira tem-se manifestado em duas dimensões. A primeira refere-se ao estado a que, pouco a pouco, foi reduzido o sistema educacional, evidenciado sobretudo nos altos índices e preocupantes características de exclusão social a saber: elevados percentuais de repetência e evasão escolar; mais de 22 milhões de pessoas, dentre as 112,8 milhões com mais de 10 anos, que não sabem ler, nem escrever; um dos mais baixos percentuais latino-americanos de matrícula no ensino médio ( cerca de 25% da população na faixa de 15-17 anos ); padrões aviltantes de remuneração e condições de trabalho dos profissionais que atuam na área de educação.104 A segunda referese à contradição historicamente verificável entre a retórica e a ação governamental no que diz respeito às políticas públicas. Essa crise vem sendo agravada pelo conjunto de políticas públicas adotadas pelo governo brasileiro; tais políticas obedecem à matriz, na forma de prescrições e determinações advindas do FMI e do Banco Mundial. A importância desse Banco hoje deve-se, não apenas ao volume de empréstimos e à abrangência nas áreas de atuação, mas, também, ao caráter 103 Universidade Estadual de Feira de Santana e Doutoranda da PUC/SP. 104 Dados extraídos do Plano Nacional de Educação: Proposta da Sociedade Brasileira. II CONED, Belo Horizonte, 1997 e do Censo do IBGE, de 1996. 138 estratégico que vem desempenhando no processo de reestruturação neoliberal dos países em desenvolvimento, por meio das políticas de ajustes. TORRES (1995) chama a atenção para as políticas postuladas por esses organismos, muitos deles verdadeiras instituições financeiras que, orientadas pela lógica neoliberal, propõem ajustes estruturais, com o objetivo de facilitar o domínio do mercado internacional, nas economias latino- americanas, como México, Argentina, Peru, Bolívia, Chile e Brasil, que são atingidas por essa onda seguindo à risca toda a política de ajuste do FMI, do BM, do Consenso Washington, que intensificam suas exigências no cumprimento do novo modelo. Nesse sentido, a visão dos países alinhados com a política neoliberal de progresso, de democracia e de qualidade de vida é cenário e justificativa para alcance dos objetivos propostos, não só da política brasileira, mas, sobretudo, da política dos países capitalistas dos centros mais avançados para as nações periféricas do mundo, na tentativa de garantir mercados internacionais. Embora o governo em suas ações tenha um discurso a favor da maioria, no plano da política neoliberal, alguns resultados desse modelo político evidenciam-se na prática como a privatização dos bens da nação, que reduz o tamanho do Estado, na crença de que, exercendo responsabilidades mínimas, o Estado se torne mais forte e mais eficiente. Ainda nesse plano, há uma tendência de deixar os problemas sociais em mãos privadas, enquanto ajuste que o governo arquiteta para empreender mudanças na organização do trabalho, configurando um novo perfil do trabalhador para um mercado mais competitivo, excludente e diversificado. Isso implica em altos custos sociais para os diversos segmentos da população, haja vista que as estatísticas oficiais vêm demonstrando os elevados índices de concentração de renda e estágios muitos diferenciados, no campo da economia, da industrialização, da agricultura e dos serviços, além das graves deficiências nas áreas da saúde, habitação, saneamento e educação que são alguns exemplos da falência do modelo de desenvolvimento concentrador adotado pelo atual governo, caracterizando-se como uma nova face de modernização conservadora e excludente. Segundo FREIRE (1996, 144) o discurso ideológico da globalização procura disfarçar que ela vem robustecendo a riqueza de uns poucos e verticalizando a pobreza e a miséria de milhões. O sistema capitalista alcança no neoliberalismo globalizante o máximo de eficácia de sua malvadez intrínseca. Assim, as atuais reformas implementadas pelo governo federal, orientadas de acordo com seus compromissos internacionais, trazem um conjunto de definições políticas para tentar acompanhar na “nova ordem mundial”105 as estatísticas sociais. Dentre as políticas sociais, destaco a atual política educacional que, de acordo com SILVA ( 1994 ) a educação tem um papel estratégico no projeto neoliberal: Se quisermos compreender as estratégias que o projeto neoliberal no Brasil tem reservadas para a educação, é importante compreender que esse processo é parte de um processo internacional mais amplo. Numa era de globalização e de internacionalização, esses projetos nacionais não podem ser compreendidos fora de sua dinâmica internacional. 105 Utilizo o termo “nova ordem mundial” para designar o cenário sócio-político e econômico contemporâneo que está intimamente relacionado às grandes mudanças que estão desencadeando no mundo ao longo das últimas décadas e que ganharam corpo principalmente nos anos 90. Um conjunto de situações políticas e até mesmo um “novo olhar” sobre o mundo. 139 Para a ANFOPE106 ( 1998 ), a atual política educacional orienta-se por princípios mais gerais da proposta neoliberal do atual governo federal, dentre as quais apresentamos os seguintes: Adoção de um novo conceito de público, desvinculado de estatal e gratuito, com transferência da responsabilidade para a sociedade civil, através de parcerias com empresários e “comunidade”, para financiamento e gestão da educação; Adoção de medidas de combate à repetência, no ensino fundamental, com programas questionáveis como os de “aceleração de aprendizagem” ou “aprendizagem automática”; Programas de difusão da leitura, através de avaliação e da tradicional distribuição de livros didáticos, baseados nos Parâmetros Curriculares Nacionais; Controle de qualidade das escolas e universidades, através da avaliação – SAEB e “provão”, sempre na ideologia empresarial do controle da qualidade pelo controle do produto; Reformas dos conteúdos curriculares com a adoção dos Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs visando à avaliação dos resultados, e não do processo educativo; Mudanças nas formas de gestão e financiamento da educação, através de mecanismos de descentralização controlada pelo poder público em nível federal, estadual e municipal; Ênfase na formação de professores com a popularização de cursos rápidos para docentes, as Licenciaturas Breves, que trazem de volta o grave perigo do aligeiramento da formação docente em cursos de caráter pós-secundário ou pós-médio. Mesmo com essas medidas, tenho observado que, após sete anos do governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso, a crise da educação atinge níveis intoleráveis. A política de desobrigação do Estado com a educação pública, gratuita e de qualidade cada vez mais vem excluindo muitos brasileiros do processo social e político, do mundo da cultura e da esfera da educação, sem direito à leitura e à escrita, aos conhecimentos fundamentais para inserção na sociedade moderna, aprofundando assim, as desigualdades sociais. Tentando minimizar essa situação, a sociedade, através de entidades associativas, vem discutindo e se organizando para intervir nessa situação, provendo um amplo debate das pesquisas e experiências educacionais, bem como construindo propostas concretas em oposição às que os governos vêm implantando ou tentando implantar. Tais propostas se apresentam como alternativa ao modelo vigente e se constituem em um projeto políticopedagógico para a educação brasileira. FREIRE (1995, 59) assim se refere ao contexto em que se situa hoje a prática dos educadores: A prática político-pedagógica dos educadores progressistas ocorre numa sociedade desafiada pela globalização da economia, pela fome, pela pobreza, pela tradicionalidade, pela modernidade e até pós-modernidade, pelo autoritarismo, pela democracia, pela violência, pela impunidade, pelo cinismo, pela apatia, pela desesperança, mas também pela esperança. 106 Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação conforme Documentos de 1992, 1994, 1996. Ao longo desses anos o movimento tem denunciado estas políticas e vê, hoje, muitas de suas previsões, infelizmente, serem confirmadas. 140 É dentro desse quadro de referências que vou procurar identificar as políticas públicas de formação de professor e as medidas veiculadas através dos documentos oficiais, as crenças e as propostas de ação concernentes a tais interesses e, em conseqüência, como essas políticas vêm acompanhando a prática dos professores. A investigação A questão da formação tem sido um grande desafio para as políticas educacionais, nos últimos anos, tendo sido, inclusive, objeto específico de inúmeras experiências e projetos desenvolvidos, tanto por universidades como por órgãos governamentais e até nãogovernamentais. No entanto, independente dessas discussões, a crise de identidade do magistério persiste e até mesmo se agrava diante das transformações econômicas, sócio-políticas e culturais do mundo atual e, em particular, do nosso país que exige cada vez mais do professor um compromisso renovado, lúcido e crítico. No intuito de atender a esse compromisso, o Estado vem dizendo que tem envidado esforços no sentido de criar e de desenvolver políticas públicas para a resolução de tal questão. Atenta para essa particularidade, tenho clareza de que o processo de formação que vem se desenvolvendo pelas instituições não se esgota no modelo de formação escolarizada mais tradicional, isto é, na mera aquisição de saberes teóricos isolados. Vale ressaltar que há aspectos do cotidiano escolar que escapam a qualquer política educacional, pois aprimoramento e transformação dependem inteiramente de quem faz Educação nas salas de aula; várias pesquisas já demonstraram que as políticas de formação passam, às vezes, longe do ambiente escolar, não chegando mesmo ao conhecimento de alguns professores. A partir destas constatações, a minha intenção nesse estudo, será identificar as políticas públicas de formação vivenciadas por 20 professores que já lecionam nas primeiras séries do ensino fundamental, nas redes públicas estadual e municipal e que estão fazendo o curso de Licenciatura do Ensino Fundamental, na UEFS. Sendo assim, pretendi conhecer o que pensam esses professores sobre as políticas públicas de formação desenvolvidas pelo Estado da Bahia. Também, julguei necessário que a entrevista assegurasse-me permear pelos seguintes temas: • conhecimento das políticas públicas de formação de professores; • implementação das políticas públicas de formação; • impactos ou resultados das políticas públicas implantadas e implementadas nas escolas. Esses temas, que serviram como referências para a estruturação do roteiro das entrevistas, foram distribuídos por blocos de perguntas, sempre com o olhar voltado para a macro e micro estruturas, mas sem perder de vista os detalhes da mediação desses dois extremos. A Fala dos Professores. De posse dos dados da pesquisa, parti para uma releitura mais cuidadosa e sistemática de todo o material acumulado durante a investigação. Essa tarefa objetivou organizar os dados, a partir da seleção dos focos de pesquisa, e decidir como empreender a análise de grupos de dados para elucidação do problema proposto. 141 Enquanto realizava a organização sistemática dos dados, momento considerado como o mais importante, percebi que existe uma distância entre aquilo que as políticas públicas definidas por órgãos estatais fazem, em termos de educação, e o que os professores, que são os verdadeiros atores deste processo, vêem e pensam destas políticas. TORRES (1996) assevera que os Estados têm encaminhado suas reformas educacionais com soluções privatistas, seletivas e excludentes com viés economicista. Sendo, dessa forma, professores, administradores, alunos e pais de alunos alijados dos processos decisórios, como se nada tivessem a ver com a educação, com o ensino, com a aprendizagem, enfim, com a formação do cidadão, e como se não sofressem os impactos da educação e de todas as suas implicações. Outra percepção é que os professores se vêem em determinados momentos históricos com novas abordagens na sua formação, dimensionando formas diferentes de agir, instauradas organicamente num conhecimento formal e legal, fruto das políticas públicas em educação. Pode-se observar, pelos depoimentos dos professores, que durante todo o período em que eles estão no magistério, já conheceram ou já ouviram falar de diversas políticas de formação, tipo CEFAM107, FUNDEF108, Proleigo109, PCNs, e mais recentemente seus professores na Universidade falaram dos Institutos Superiores de Educação. A respeito dos Institutos, os professores falaram: “os nossos professores explicaram, mas não entendemos bem como vão funcionar estes Institutos, se já temos a Universidade”. Uma outra professora observou que,”pelas explicações, ficou claro que os Institutos vão tirar a função da Universidade, pois lá também formará o professor em nível superior”. Alguns professores, por já terem vivenciado essas políticas, reconhecem de alguma forma que “sua prática sofreu alteração ou para melhor ou para pior e, ou ainda em termos de pessoa, essas experiências possibilitaram somente ampliar o seu nível de conhecimento”. Os professores entrevistados ainda reconhecem que “tais políticas são determinadas por pessoas que, na maioria, não conhecem sala de aula ou só conheceram na condição de aluno e, diga-se, não de aluno da classe trabalhadora” “... as políticas são determinadas pelos governantes que nunca ficam sabendo o que o pobre tem sofrido”. Talvez a falta de intimidade com os problemas reais da escola, relativos aos menos favorecidos, seja uma das razões para que as soluções de gabinete apresentadas, não se apliquem à realidade, senão desconhecida, pelo menos mal compreendida, mal analisada, mal avaliada pelos mentores das mudanças propostas. De forma unânime, quando questionamos os professores entrevistados sobre de quem é a competência de elaboração de uma política de formação, eles relataram que: “a proposta inicial deveria partir da instituição formadora, em seguida ela seria encaminhada ao Ministério da Educação onde seria compatibilizada com outras propostas. Dessa forma, teríamos uma proposta que representava a cara da escola e dos professores”. Os professores acreditam que os obstáculos existem, porque essas propostas são sempre elaboradas por tecnocratas da educação que estão distantes da sala de aula e julgam estar promovendo a transformação, ainda que seja pela imposição vertical das suas propostas Nesse sentido, percebo pelas declarações e pelas atitudes dos professores, um forte estado de descrença, pois eles demonstram estar cansados, alegando uma certa impotência ao 107 Centros Específicos de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério. Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental. 109 Refere-se ao programa que tem como finalidade formar professores, sem a devida habilitação específica, para ministrar aulas no Ensino Fundamental, séries iniciais. 108 142 confrontar o poder do governo. Alegam também, a todo momento, que muitas vezes os pacotes chegam até as escolas, mas nunca são consultados sobre qualquer decisão no âmbito escolar. Na verdade, com tais ações, o que pode acontecer são cristalizações de práticas repetitivas, acríticas e reprodutoras; é passar um atestado de alienação a professores e a alunos; atestado que se concretiza na ausência e na negação da liberdade e da autonomia em conhecer o mundo para além das fronteiras escolares e em percebê-lo para além das conveniências. Com relação aos programas de formação de que os professores vêm participando, todos responderam que, de uma forma ou de outra, estão participando de alguma experiência de formação continuada, o que vem confirmar os seguintes depoimentos: “ultimamente estou fazendo curso de Formação de Professores Iniciais do Ensino Fundamental e também participando do curso de Informática Educacional promovido pela Secretária de EducaçãoSEC”; “... além do curso de Licenciatura para as séries iniciais do Ensino Fundamental estou participando do projeto Transformando a Educação no Ensino Fundamental-TRANSE, promovido pela Universidade Estadual de Feira de Santana-UEFS”; “... no momento estou fazendo o curso de Formação de Professores e participando do treinamento de Formação para Portadores de Necessidades Especiais, promovido pela SEC”. No entanto, quando perguntei aos professores se eles estão aplicando essas aprendizagens na escola, obtive as mais variadas respostas: 12 (doze) professores responderam que vêm aplicando no seu trabalho aquilo que estão aprendendo nos cursos que estão participando; entretanto, apesar de reconhecerem que esses programas têm ajudado o conhecimento deles, disseram que acham muito difícil fazer a transferência para a sala de aula. Já 6 (seis) professores responderam que aplicam em parte aquilo que estão vendo, nas experiências de formação continuada, porque também, acham muito difícil fazer transferência das aprendizagens para a sala de aula. Com relação às mudanças na prática em sala de aula, 12 (doze) professores revelaram que suas ações docentes haviam se transformado e eles atribuíram tal alteração ao Curso de Licenciatura, que estão fazendo na Universidade, conforme depoimentos a seguir: “O curso de Formação de Professores vem contribuindo para melhorar a minha prática pedagógica porque aumentou o meu conhecimento, e ajudou também a melhorar o relacionamento entre educador e educando;”. “ ... o curso vem ajudando o professor a repensar mudanças no ato educativa;” “... as discussões e os estudos realizados no curso têm levado a analisar os fatores que embasam a minha prática, consequentemente passei a rever a minha postura como educador;” “ ... o curso tem me ajudado a trabalhar, a partir da realidade do aluno;” “... a partir do curso, começo a rever a concepção de avaliação;” “ ... a prática mudou, foi muito melhor, passei a ver os alunos com outros olhos; passei a ver coisas boas no aluno.” Em contrapartida, 6 (seis) professores afirmaram terem sentido, apenas, uma pequena mudança em suas práticas: “ ... no meu trabalho vejo uma mudança não muito grande;” “ ... sinto que mudei na forma de encarar o aluno, só não consigo ainda preparar minhas aulas com as novidades que estou tendo oportunidades de aprende;” “. ... hoje reflito mais sobre o que estou fazendo, por isto tenho certeza que a minha prática vai mudar;” “ .... tenho preparado aulas mais interessantes de algumas matérias, tipo Português e História, mas das outras disciplinas ainda sinto dificuldades;” “... o curso vem me possibilitando conhecer melhor os textos, mas, na minha prática, eu continuei ainda com várias dúvidas.” Os resultados apontam para a confirmação da premissa de Paulo Freire de que a mudança profissional só ocorre a partir da mudança pessoal e permite afirmar que para formar 143 um profissional crítico, competente, reflexivo, em busca da qualidade do ensino, nada mais certo e lógico do que o professor perceber-se como a peça importante desse processo, reconhecendo sua responsabilidade nesta tarefa de reflexão. A partir dos depoimentos, parece claro que os professores encontraram nas experiências de formação continuada, cada qual a sua maneira, um ponto de apoio que interferiu no seu modo de ver, pensar e/ ou agir. Observa-se também que, no momento, os professores reconheceram o curso de Formação de Professores para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental enquanto política pública que o Estado vem desenvolvendo como a mais significativa para a sua prática docente; daí considerarem que as mudanças na prática estão associadas a esse curso. Considerações finais As reflexões desenvolvidas neste trabalho sobre a formação do professor têm constituído um desafio para as políticas educacionais do governo. Todos os fóruns em âmbito nacional, preocupados com as políticas públicas de formação do profissional da educação, admitem que as novas bases materiais que caracterizam a reestruturação da produção, globalização da economia e a política neoliberal, gestam um projeto político-pedagógico diferente, trazendo demandas específicas aos processos de formação humana. São os profissionais da educação os responsáveis pela leitura e análise crítica desse projeto, deles esperando uma participação competente na organização coletiva pela busca de processos de desenvolvimento, que articulem a educação a esses processos e consolidem as relações sociais democráticas. A partir dessa perspectiva, não é possível em mais uma proposta de governo ser “esquecida” a obrigação dos dirigentes com uma sólida formação inicial e continuada dos formadores de professores do país. Tal esquecimento me faz pensar que a desqualificação dos professores vem sendo um dos mecanismos para mantê-los fracos e disponíveis às manobras e conchavos político-burocráticos ( ARROYO, 1985 ). Outro dado percebido é que a forma de pensar e fazer política no modelo que estamos analisando, passa muito distante das aspirações dos que a vivem, ou seja, há uma dicotomia fortemente presente entre o pensar e fazer. O governo, que é responsável por essas políticas, espera que as mesmas sejam cumpridas no âmbito do sistema escolar, em nível nacional, fazendo um discurso de convencimento para a população que, por não conhecer profundamente o que se passa no interior das escolas e ignorar os instrumentos para explicar qualquer contraposição, acaba aceitando pacificamente o discurso. Nesse contexto, os neoliberais estão tendo um grande êxito em impor seus argumentos como verdades que se derivam da natureza dos fatos. Desarticular a aparentemente inquestionável racionalidade natural do discurso neoliberal constitui apenas um dos desafios que se apresentam pela frente, e se trata de um desafio que depende da possibilidade de construir uma nova hegemonia que dê sustentação material e cultural a uma sociedade plenamente democrática e igualitária. Referências Bibliográficas ANFOPE. Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação. Boletim da ANFOPE. Ano IV, N.º 8, Abril de 98. Por uma política global de formação dos profissionais da educação.1/12/99 144 http://www.lite.fae.unicamp.br/grupos/formac/docanfope/politica.html . ARROYO, M. Quem de-forma o profissional do ensino? In: Revista AEC, Ano 14, N.º 58, out/dez., 1985. CHOSSUDOVSKY, Michel; A Globalização da Pobreza: impactos das reformas do FMI e do Banco Mundial; São Paulo; Moderna; 1999. FREIRE, Paulo. A sombra das mangueiras. São Paulo: Olho D’ água,1995. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 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