REVENDO PROTOCOLOS RETROSPECTIVOS: ENUNCIATIV A UMA PROPOSTA Maria do Carmo MARTINS FONTES (LAEL PUC-SP) ABSI'RACl': Este estudo procura rediscutir a funfdo dos protocolos retrospectivos, como instrumento de investigllfdo das inadequafiJes de certas /alhas recorrentes em produfdo escrita. Esta reavaliafiio de funfiJes e /eita com base na teoria da enunciafQo, analisando discussiJes coletivas dos alunos como momentos para rejlexlio das/ontes de "erros" em lingua inglesa. KEY WORDS: Retros~o; utterance; production; english. A partir de uma critica das visoes cognitivistas de analise de protocolos, procurase reavaliar tanto 0 seu objetivo quanto sua forma. 0 primeiro passa a ser visto Dio mais como urn mecanismo de se resgatar a forma de pensar dos sujeitos de pesquisa, mas como urn meio de se identificar as fontes constitutivas do processamento da lingua estrangeira. Quanto a revisao formal, esta analise mostra que as ideias de ise~o e Dio-interfer!ncia por parte do pesquisador podem ser reformuladas a partir de uma situaeio mais pr6xima de entrevistas, oode 0 papel do entrevistador passa a ser 0 de auxiliar na reestrutur~o e supervisor das inade~s ("erros"). Esta reavali~lio de funcOes dos protocolos retrospectivos e feita com base na teeria da enunc~lio, analisando as falas dos alunos como indicadoras das origens de certas falhas recorrentes em producio escrita. o corpus constitui-se de dois protocolos feitos com alunos intermediarios de uma escola de idiomas, sobre seus textos. A sua anilise mostra que e possivel tentar-se estabelecer padroes interativos professor-aluno e aluno-aluno que auxiliem no desenvolvimento des processos de escrita a partir de visoes compartilhadas sobre a estrutur~lio da lingua inglesa. As analises de protocolos retrospectivos em lfngua estrangeira tem sua origem na virada da d6:ada de 1980 com os trabalhos de Cohen (1984) e Hosenfeld (1979). Seguindo uma corrente dentro da psicologia cognitiva (Eriesson,I978), nestas pesquisas inieiais ainda se buscava a origem do processamento em lfngua estrangeira e as tecnicas empregadas eram, sem duvida, as que procuravam eonferir a retros~o urn.carater de instrumento eientifico de analise. Neste anseio de buscar 0 rigor metodo16gico, muitos parametros de coleta foram delineados, entre eles 0 de coletar os depoimentos a~ 48 horas ap6s a produclo do texto e buscar Dio interferir no momento da coleta, exeeto no sentido de garantir sua continuidade. Os trabalhos desenvolvidos com esta tecniea de pesquisa foram aprimorando a ideia central a que tais re~s se propunham: 0 resgate do processo de pensamento. A partir destas analises muitas contribui~s na area de lingua inglesa foram feitas, a~ porque acreditava-se que, ao se fixar 0 momento de producAo de urn. informante, garantia-se a explicita~o das estra~gias ou dos instrumentos cognitivos que eram utilizados. Uma analise mais aprofundada dos protocolos retrospectivos levou a· que··se percebesse sua riqueza e, ao mesmo tempo, seus pontos obscuros. Cada informante, ate mesmo em funclo do privilegio dado Asdiferencas individuais, revelava uma gama variada de estrategias de producAoque dava margem a que se continuasse ad infinitum uma tentativa de eategorizaclo, dIferenciando-se as que seriam estrategias de produeio daquelas de aprendizagem. A mudanca de foco do produto para 0 processo de producAo que earacterizou este movimento nas teorias sobre ensino-aprendizagem em segunda lingua, pot urn. lado, garantiu que os protocolos verbais adquirissem 0 status de metodo conflavel de coleta de dados. Por outro lade, os dados af revelados permitiam que se questionasse, exatamente, a sua uniformidade e a analise proposta como senda a Uniea possivel. A maior dificuldade que os depoimentos apresentavam - e ainda apresentam- e, justamente, a sua amplitude em tome do que se pode identificar nos dados. Quando os sujeitos de pesquisa conseguiam explicitar a sua forma de pensar, ao se defrontarem com urn problema, Dio havia apenas uma, mas varias possibilidades de encaixar urn. tipo de estrategia. Independemente das possiveis interpre~oes que se possa ter, 0 que se deve relevar nesta liMa de investig~o e 0 fate de que ela prioriza 0 momento de produ~ao de urn.determinado sujeito sob determinadas condi~s de prod~o. A releitura desta metodologia, sob uma perspectiva enunciativa, busea rastrear os elementos que condicionam a producAo, 0 "como se falalescreve" determinado por quem enuncia, para quem e a partir de onde se produz urn.dado enuneiado. Segundo Bakhtin (1929), cada enunciado s6 ocorre uma Unica vez, e e, portanto, Unicoe irreprodutfvel. A retomada de palavras que 0 constituem sempre sera feita sob novas condicocs de esp~-tempo e enunciador(es). Desta forma novas signfi~s constituem-se, atraves da interacao verbal com um Outro, aqui entendido como interlocutor responsivo ainda que nao fisicamente presentel. Tomando-se esta perspectiva tem-se que a cada interacao· verbal ocorre uma tentativa de estabelecer-se significados para determinadas palavras e enunciacOes, onde os interlocutores saD sujeitos social e historicamente constituidos. Logo, as tentativas de se resgatar a origem do significados de determinadas enunciacOes, implica no resgate das condicOes de sua producao. Os protocolos retrospectivos, podem enta~ funcionar como momentos de interacao onde os significados estio sendo efetivamente constituidos desde que algumas de suas caracteristicas fundantes sejam revistas. Para que eles assumissem esse carater, algumas adaptacOes deveriam ser feitas. Pimeiro,a ideia de estabelecer um limite de tempo de coleta (are 48 boras ap6s a producao) incorre em uma certa crenca de que a mem6ria est! condicionada apenas ao tempo cronol6gico. Ora, e evidente que um distanciamento espaco-temporal2 tem implicacaes quanto ao tipo de rememoracao requerida, mas ela nao e determinante do tipo de informacao recuperada a partir de textos produzidos por seus pr6prios autores. Ao contrario, este distanciamento auxilia a reflexao critica por parte dos sujeitos que, na quase totalidade dos casos coletados, constatam suas falhas ja na primeira leitura. segundo ponto criticavel das tecnicas de coleta e 0 que se refere a naointerferencia por parte do pesquisador durante 0 processo retrospectivo. As pesquisas recentes mostram a utilidade de se interagir ao longo das atividades nao s6 porque elas demonstram ser extremamente produtivas do ponto de vista da aprendizagem de estruturas- 0 retomar elementos formais ja introduzidos em aulas anteriores -, mas tambem no que tange a aquisicao de estrategias de producio, atraves da troea de informacOes entre os diversos participantes sob os meios utilizados para a producao. Na verdade estes "momentos de troca" , ou entrevistas coletivas tem urn papel importante inclusive para 0 professor que pode avaliar 0 porque de cerros significados se estabelecerem. A proposta de releitura proeura contemplar estes pontos de tal modo que eles passem a constituir uma nova forma de se privilegiar estes e eleva-Ios condicao de momento de producao. o a Neste primeiro recorte temos um grupo de alunos que recebem suas redacOes sem nenhum tipo de correcao. A opcao da pesquisadora em nao indicar os erros foi feita a partir da avaliacao de que todos os trabalbos apresentavam 0 mesmo tipo de falba. Ou seja, I Segundo Bakhtin. 0 discurso interno e tambem dial6gico em sua constitui~o. 2 A distAncia e tambem espacial III medida emq ue os sujeitos de nossa pesquisa produzem seus textos em casa. Mesmo quando a prod~o se cia em sala de aula, as reflexOes pedidas ocorrem na aula seguinte. 596 Legenda: Ma: professora AL: todos os alunos ao mesmo tempo Newgen4 Tueffhu 15:20 1-/95 Produto: texto rmal sobre rued to e would AmiIise: FL, + comparativos e intensificadores MI, LC, MC, MK Ma: Entio como e qui e que se forma 0 comparativo de adjetivos curtos? AL: Com 'er' no final. Ma: Pois e. Entio 0 que aconteee com 'calm'? FL: Nlio fica 'more calm '? Ma: Fica? MK.: 'Calmer' Ma: Isso. Todo mundo checa, agora. ( ) Ma: Porque qui a gente usa 0 'used to'? FL: Pra fala do passado. Ma: Mas que passado? MI: Do fazia, andava. Ma: 80m, entio e uma coisa que nlio aconteee mais, provavelmente... Sera que eu posso usar no presente, pm alguma coisa presente? LL: Ate pode. Ma: Mas af perde a fun~o de estar descrevendo se~ e habitos passados. ( ) Ma: Checa os verbos. Tempo, pessoa. FL: Eu sempre tive curiosidade, pssora. Porque qui fala, As vezes, 'If I were' MK.: E porque e 'if'. Senlio e 'I was'. ... ... FeE-Part 1 Tueffhu 16:40 1-'95 Produto: texto argumentativo An8Iise: KA, MD, JL, ZM, MIl, AD Ma: Porque qui todo mundo erra 0 jeito de escreva 'which'. Ninguem pOe 0 'h'. MB: Ue, porque confunde com 'with'. Ma:Ue, mas 0 que qui tem a va preposi~o com pronome relativo? Nem a pronuncia se parece. MB: Mas confunde, teacher. 0 jeito de escrever. Intercb 2- Mon/Wed 14:30 1-'95 Produto: texto descritivo-subjetivo - pianos de viagem An8Iise: RO, MS, ED Ma: n hem legal 0 plano de viagem, s6 que quando e que voce vai faze? RO: Nas pr6ximas ferias. Ma: Bom, enta~ cia uma olbadinha nos verbos. RO: Qual 0 poblema? Ma: Olba aqui 6. Voce pois 'going to' aqui,mas Iii em cima fa 'go to'. Porque? RO: De, porque eu achei que era se eu ganhasse, assim n!o de verdade, porque come~a com 'If you won.. ' . MS: E, mas a gente tinha feito de conta que ia de verdade. RO: Bom, ai e 'going to'. n. A anlilise dos dados revela que as entrevistas servemde base a maioria dos sujeitos como momento de reflexao sobre suas produ~oes. Resgata-se, n!o s6, 0 caminho percorrido para se chegar a um determinado USO, ou escolba de uma dada estrutura, mas tambem as eventuais falhas de compreensao de certos aspectos da lingua inglesa. RESUMO: Este estudo proeura rediseutir a fun~iio dos protoeolos retrospeetivos, eomo instrumento de investig~iio dos inadequa~oes de eertas /alhas reeorrentes em produ~iio eserita. Esta reavali~iio de fun~oes e /eita eom base no teoria da enunci~iio, analisando diseussoes eoletivas dos alunos eomo momentos para reflexiio dos/ontes de "erros" em lfngua inglesa. PALAVRAS-CHAVE: Retrospec~ao; enuncia~ao; produ~o; ingles.