Servidor Público Texto 02 Regime de Sobreaviso REGIME DE SOBREAVISO O poder de reorganizar os próprios serviços é inerente ao de administrar, e somente a Administração sabe como, quando e de que forma deve fazê-lo. Assim, mediante a análise da conveniência e oportunidade é que o Prefeito poderá dispor sobre a organização de seu quadro de servidores. Ensina o prof. Hely Lopes Meirelles1 que “a competência para organizar o serviço público é da entidade estatal a que pertence o respectivo serviço”, complementando: “Só o Município poderá estabelecer o regime de trabalho e de pagamento de seus servidores, tendo em vista as peculiaridades locais e as possibilidades de seu orçamento.” Nesse aspecto, importa frisar que a definição da jornada de trabalho dos servidores deve observar o princípio da continuidade do serviço público, isto é, a jornada de trabalho dos servidores deve atender à necessidade pública. De acordo com a necessidade, o órgão público determinará o horário de trabalho que melhor satisfaça aos anseios da coletividade usuária e da própria Administração. Para tanto, poderá fazer uso de institutos que venham a corroborar com tal organização, dentre os quais o ‘sobreaviso’2. O regime de sobreaviso teve origem com a Consolidação das Leis do Trabalho – MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 35 ª ed. atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 430-432. 1 2 AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR. MUNICÍPIO DE SÃO LUIZ GONZAGA. É der ser mantida o ato administrativo emanado pelo Poder Público Municipal que garante o serviço de saúde ininterrupto na especialidade de ginecologia e obstetrícia em regime de plantão de sobreaviso, junto ao Hospital de São Luiz Gonzaga, medida que vem a garantir o direito à saúde das munícipes que necessitarem deste atendimento emergencial. AGRAVO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70018710236, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 14/06/2007) Junho/2010 CLT (Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943), que ao dispor sobre o trabalho dos ferroviários, colocou: Art. 244. (...) § 2º. Considera-se de “sobreaviso” o empregado efetivo, que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. Cada escala de “sobreaviso” será, no máximo, de 24 (vinte e quatro) horas. As horas de “sobreaviso”, para todos os efeitos, serão contadas à razão de 1/3 (um terço) do salário normal. Com este instituto consagrado na legislação trabalhista, diversas legislações foram criadas tratando desse regime para as demais categorias profissionais. Pelo regramento da CLT, o sobreaviso se caracteriza pela permanência do empregado em sua própria casa, aguardando o chamado para o serviço. Contudo, parece exagerado, nos tempos atuais, na era da comunicação portátil, exigir que o trabalhador permaneça em casa, visto que o objetivo desta condição é possibilitar sua localização e pronto atendimento tão logo requisitado, o que hoje é perfeitamente possível com o uso da tecnologia3. Verdade é que o fato de o trabalhador não permanecer em casa não descaracteriza o status de sobreaviso. Mesmo que não delimitado o local em que o trabalhador deverá permanecer, o simples fato de estar de sobreaviso, o que pressupõe que deverá estar em local que possibilite o pronto atendimento ao chamado para o serviço, se houver, já tolhe 3 Tanto que a Lei nº 7.183, de 1984, que regula o regime de sobreaviso dos aeronautas, não exige que o empregado fique em casa, mas tão somente estabelece um limite máximo para que chegue ao local do serviço: Art. 25. Sobreaviso é o período de tempo não excedente a 12 (doze) horas, em que o aeronauta permanece em local de sua escolha, à disposição do empregador, devendo apresentar-se no aeroporto ou outro local determinado até 90 (noventa) minutos após receber comunicação para o início da nova tarefa. 1 Servidor Público Texto 02 Regime de Sobreaviso sua liberdade de locomoção. Justamente por isso é que se prevê um acréscimo à sua remuneração. A instituição do regime de sobreaviso na esfera da Administração Pública, para os detentores de cargos públicos que são regidos pelo regime de trabalho estatutário, é perfeitamente possível, ainda mais em determinadas áreas, como a saúde, em que há atendimento em horários incompatíveis com uma pré-fixação. O sobreaviso, em síntese, consiste no cerceamento do repouso ou da liberdade do servidor que fica à disposição da Administração, além da carga horária semanal de trabalho do seu cargo efetivo, aguardando seu chamamento para o serviço; portanto, é tempo de serviço remunerável, sem o que estaríamos diante de uma prorrogação de jornada sem remuneração. Para sua efetiva instituição, então, necessária a existência de lei regulamentadora, de origem do Chefe do Poder Executivo, agente competente para deflagrar o processo legislativo que dispõe sobre a remuneração dos seus servidores, bem como sobre a estrutura organizacional de seu Poder, de acordo com critérios de conveniência e oportunidade. A lei específica que instituir o sistema de sobreaviso deve estabelecer um regime de escala, pelo qual o servidor é remunerado com um valor geralmente equivalente a 1/3 (um terço) ou 1/4 (um quarto) da sua hora normal. Durante o período de sobreaviso, o servidor deve permanecer em local próximo, à espera de um chamado da Administração. Ainda, deverá estar determinado que quando da efetiva convocação do servidor para o trabalho, ser-lhe-á devida a remuneração correspondente a horário extraordinário, com acréscimo de no mínimo cinquenta por cento, nos termos da legislação local, vez que extrapola sua jornada normal, bem como a limitação para sua vinculação a este sistema. Junho/2010 Assim, uma vez instituído o sobreaviso, deverá a Administração estabelecer a escala de turnos para cada servidor, especificando quem se encontra em regime de sobreaviso. Portanto, o sobreaviso é pago em razão de ser o servidor designado pela autoridade competente para estar à disposição e possui percentual próprio definido para este pagamento, não havendo que se falar em horas de sobreaviso como sendo horas extraordinárias ou suplementares, pois um instituto não se confunde com o outro. O sobreaviso remunera tão somente a disponibilidade, enquanto que as horas extras serão devidas pelo efetivo exercício da atividade laboral. Esta parcela adicional submete-se ao mesmo requisito exigido às outras parcelas contraprestativas para fins de sua integração salarial, com o subsequente efeito expansionista circular: habitualidade. Assim, recebido com regularidade, integra, no período de sua percepção, o salário para todos os efeitos legais; desse modo, irá refletir no cálculo de décimo terceiro salário, férias com 1/3, aviso prévio, além da contribuição previdenciária. Não se pode desconsiderar que, como o acréscimo à remuneração decorrente do sistema de sobreaviso trata-se, em última análise, de despesa com pessoal, para efetiva instituição mediante lei específica devem ser observados alguns requisitos constitucionais e legais: a) O disposto Constituição no art. 169 da sendo Federal4, 4 Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar. § 1º. A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: 2 Servidor Público Texto 02 Regime de Sobreaviso necessária autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias e previsão no orçamento anual, com dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; b) O disposto no art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal5, devendo o Projeto de Lei estar acompanhado do demonstrativo de estimativa de impacto orçamentário-financeiro e da indicação das medidas adotadas para compensação de seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes; c) Os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal, especificamente a alínea “b”, Inciso III, do art. 206 e inciso II, parágrafo I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. 5 Art. 17 Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios. § 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do artigo 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio. § 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do artigo 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa. ... § 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias. ... 6 Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais: (...) III - na esfera municipal: (...) b) 54% (cinquenta e quatro por cento) para o Executivo. Junho/2010 único, do art. 227, que disciplinam a respeito dos percentuais de gastos com pessoal a serem observados pelo Poder Executivo municipal. Quanto à participação do servidor no sistema de sobreaviso, esta se dá por convocação da autoridade competente, e não por adesão. Considerando que do fato de o servidor estar em regime de sobreaviso poderá resultar na efetiva prestação de serviços extraordinários, deve esta situação se dar por determinação expressa da autoridade competente. E tal pode-se dar mediante a publicação de escala de turnos de sobreaviso para cada servidor. Quanto ao controle, este será imprescindível quando da efetiva convocação do servidor para o trabalho. Importante frisar, ainda, que o regime de sobreaviso é de aplicação restrita ao servidor público cujo cargo seja afeto ao serviço ao qual está sendo aplicado referido sistema, uma vez que sua instituição pode-se dar de forma limitada a determinado serviço. 7 Art. 22. A verificação do cumprimento dos limites estabelecidos nos arts. 19 e 20 será realizada ao final de cada quadrimestre. Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95% (noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que houver incorrido no excesso: I - concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37 da Constituição; 3 Servidor Público Texto 02 Regime de Sobreaviso Junho/2010 Parágrafo único. O valor do sobreaviso não será computado para efeitos de quaisquer vantagens que o servidor perceba ou venha a perceber. Art. 4º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. MINUTA DE PROJETO DE LEI Nº ..., DE ... DE ............... DE 20... Institui o sistema de sobreaviso no serviço público municipal Art. 1º Institui o sistema de sobreaviso no serviço público municipal, para atender os serviços 8 emergenciais na área da saúde. Art. 2º Considera-se de sobreaviso o servidor que, cumprida sua jornada normal, permanecer à disposição, fora do local de trabalho, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. § 1º As horas de sobreaviso, não efetivamente trabalhadas serão contadas com o 9 acréscimo de ..... da remuneração da hora normal. § 2º As horas de sobreaviso efetivamente trabalhadas serão pagas com o acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre a remuneração normal. § 3º Os servidores sujeitos ao regime de sobreaviso serão convocados previamente, através de ato da Administração. § 4º Cada período de sobreaviso não poderá exceder de 24 (vinte e quatro) horas, em 10 cada 72 (setenta e duas) horas. Art. 3º O valor percebido pelo servidor em decorrência do regime de sobreaviso não integrará seu vencimento, remuneração ou salário, nem se incorporará a estes para quaisquer efeitos. 8 Poderá ser delimitado de forma mais restrita, como, por exemplo, “... serviços emergenciais de remoção de pacientes, para atendimento em horários em que o atendimento ambulatorial no posto de saúde local não estiver disponível.” 9 Geralmente o valor é equivalente a 1/3 (um terço) ou 1/4 (um quatro) da sua hora normal, ficando a critério da Administração. 10 O período máximo de sobreaviso deverá ser determinado pela Administração (outra sugestão: “...não poderá exceder de 12 horas, em cada 36 horas.”) 4