A concessão de benefícios relativos ao ICMS e a sua repercussão no montante partilhado com os Municípios. Alexandre Teixeira Jorge Pós-graduando em Direito Tributário e Contabilidade Tributária pelo IBMEC/RJ. Advogado no Rio de Janeiro. 1. Introdução Oriunda de um processo conduzido pelas elites da época, que veio a culminar na proclamação da República em 1889 e na posterior promulgação da Constituição de 1891, a federação brasileira nasce sob fortes tendências centrífugas e autonomistas1, as quais ainda se fazem presentes hodiernamente e servem para retratar a fragilidade de nossos laços federativos. Essas individualidades regionais, desde o início, fomentaram o surgimento de conflitos internos no seio da federação, na medida em que, a pretexto de garantir autonomia, desenvolver a economia interna e reduzir as desigualdades inter-regionais, os entes subnacionais, não raras vezes, atuavam em defesa de interesses próprios e em detrimento dos anseios da Nação. 2 Seguindo uma histórica tendência pendular de centralização e descentralização verificada nas Cartas Políticas promulgadas desde a independência do País, a Constituição Federal de 1988 utilizou-se da distribuição de competências tributárias e da repartição do produto dessa arrecadação na tentativa de viabilizar a autonomia dos entes federativos em seus mais diversos aspectos (político, administrativo e financeiro), tendo em vista que somente com a presença de todas essas variantes é que se terá um legítimo Estado federativo. Contudo, em que pesem os esforços do constituinte, o que se verifica atualmente é um quadro em que quase todos os Estados e Municípios reclamam da insuficiência de recursos próprios para o cumprimento de seus deveres constitucionais, o que tem levado a uma crescente dependência dos entes subnacionais em relação à União, bem como dos Municípios (especialmente os de pequeno porte) frente aos Estados, fatores esses que têm provocado um verdadeiro colapso das finanças públicas estaduais3 e municipais. Demais disso, a criação descontrolada de Municípios, desde o advento da Carta Magna de 1988, tornou essa questão ainda mais tormentosa, uma vez que tais Municipalidades, muitas vezes, são desprovidas de um sistema eficaz de arrecadação dos tributos de sua competência, dependendo quase que exclusivamente das transferências do Fundo de Participação dos 1 DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Discriminação de rendas tributárias. São Paulo: José Bushatsky, 1972, pp. 4849. 2 Trata-se, portanto, de um marco histórico do nosso federalismo – a segregação – e que infelizmente ainda tem pautado o comportamento dos entes federados. Cf. UCHÔA FILHO, Sérgio Papini de Mendonça. “Transferência de recursos e participação na arrecadação tributária”. In: CONTI, José Mauricio; SCAFF, Fernando Facury; BRAGA, Carlos Eduardo Faraco (org.). Federalismo fiscal: questões contemporâneas. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, pp. 220-221. 3 Tal cenário poderia estar ainda pior, levando-se em consideração que a União renegociou três vezes a dívida pública dos Estados, através das Leis nº 7.976/89, nº 8.727/93 e nº 9.496/97, respectivamente. 1 Municípios (FPM) e da participação no produto da arrecadação do imposto sobre circulação de mercadorias e prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS), dando origem ao fenômeno chamado por alguns de “parasitismo municipal” 4. Com isso, tem-se uma autonomização político-administrativa desgarrada de uma autonomia financeira, o que inviabiliza o correto funcionamento da máquina pública, deixando as populações locais à míngua. Paralelamente, como fruto dessa dependência e da falta de estrutura, tornam-se crescentes as pressões sobre a União e os Estados-membros em torno do incremento das transferências verticais obrigatórias em favor dos Municípios5. Ocorre que a situação financeira dos Estados tampouco se revela alentadora6. Sucessivas gestões fiscais irresponsáveis com progressivo endividamento público7, reformas promovidas pelo constituinte derivado que implicaram perdas na arrecadação8, contingenciamento dos repasses de verbas do Fundo de Participação dos Estados (FPE) para fins de pagamento de créditos da União9, abandono dos programas de fomento ao 4 GADELHA, Gustavo de Paiva. Isenção tributária: crise de paradigma do federalismo fiscal cooperativo. Curitiba: Juruá, 2010, p. 79-81. Endossando essa crítica, vide: BERTI, Flávio Azambuja. Federalismo fiscal e defesa de direitos do contribuinte: efetividade ou retórica?. Campinas: Bookseller, 2005, pp. 122-126. 5 Como exemplo dessa crescente pressão, podemos mencionar a recém-promulgada EC nº 84/14, que aumentou em um ponto percentual a entrega de recursos pela União ao Fundo de Participação aos Municípios (FPM). 6 Os Estados vêm sofrendo, ao longo das duas últimas décadas, um crescente processo de atrofiamento da sua capacidade de intervenção, o que tem esvaziado o seu poder e contribuído para a intensificação de conflitos no âmbito federativo. Segundo Fernando Rezende, a origem do esvaziamento do papel dos Estados reside na própria Carta Magna de 1988. Com a ampliação do âmbito de incidência do agora ICMS, os Estados voltaram suas atenções para aquelas mercadorias e serviços que anteriormente sofriam tributação de impostos únicos federais (telecomunicação, transporte interestadual e intermunicipal, combustíveis lubrificantes, energia elétrica e minerais), criando uma dependência dessas atividades e concentrando a arrecadação tributária. Essa preferência impositiva acabou abrindo espaço para o avanço da tributação do PIS e da COFINS (que não têm sua receita partilhada) sobre mercadorias e serviços, e para a ampliação da lista de serviços tributados pelo ISS, reduzindo o campo tributário dos Estados. Somado a isso, houve ainda um esvaziamento dos fundos constitucionais e regionais, bem como uma expansão das transferências federais direcionadas ao financiamento de políticas específicas (principalmente as de caráter social), as quais têm sido destinadas, em sua maioria, aos Municípios. (SILVA, Fernando Antonio Rezende. A reforma tributária e a federação. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009, pp. 152-153.). 7 A socialização da gestão fiscal irresponsável veio a ser atenuada com o advento da Lei nº 9.496/97 e da Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal) através de um abrangente ajuste fiscal e patrimonial conjugado com o cumprimento de metas ou compromissos (art. 2º da Lei nº 9.496/97), bem como por meio do controle das despesas com pessoal e com Seguridade Social (arts. 15 a 24 da LRF), e da instituição de limites às contratações de operações de crédito (arts. 32 a 40 da LRF). 8 Cite-se, a título de exemplo, o aumento (de 20% para 25%) do repasse das receitas de ICMS aos Municípios com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a extinção do adicional do imposto de renda com o advento da EC nº 03/93. Para José Roberto R. Afonso, tais perdas arrecadatórias tiveram por fator determinante a ausência de coalização entre os Estados em torno de uma agenda pública nacional eficiente. (AFONSO, José Roberto R. “ICMS: diagnóstico e perspectivas.” In: REZENDE, Fernando (org.). O federalismo brasileiro em seu labirinto: crise e necessidade de reformas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2013. p. 204; 224.). Em contrapartida, é preciso também reconhecer que os Estados saíram vitoriosos em batalhas travadas contra os contribuintes mediante lobby legislativo no Congresso Nacional. Por meio do processo de correção legislativa da jurisprudência, os Estados aprovaram emendas constitucionais que reformavam entendimentos assentados pelo STF em favor dos contribuintes, no tocante a determinados temas, possibilitando, assim, um incremento nas suas arrecadações tributárias (embora esse crescimento não tenha sido capaz de recompor as perdas). Como exemplos, podemos citar a Emenda Passos Porto (EC nº 23/83) – que vedou o creditamento do ICM nos casos de operação isenta e não tributada, assim como possibilitou a incidência do imposto nas importações de bens destinados a consumo ou ativo fixo – além da EC nº 33/01 – que passou a prever a incidência do ICMS nas importações de bens realizadas por pessoa física. Sobre o assunto, ver: OLIVEIRA, Gustavo da Gama Vital de. Direito tributário e diálogo constitucional. Niterói, RJ: Impetus, 2013, pp. 149-150; 184-191. 9 Embora seja uma prerrogativa conferida à União pelo art. 160, parágrafo único, inciso I, da CF/88, no plano operacional, a retenção de cotas do FPE traz inegável prejuízo à implementação de políticas públicas reclamadas pela sociedade, ao reduzir o poder econômico do ente público e, consequentemente, comprometer a eficiência alocativa 2 desenvolvimento regional coordenados pelo governo central, aumento considerável da concentração de rendas na figura da União mediante a criação de tributos não partilhados, entre outros, são apenas alguns dos empecilhos que se põem diante dos entes estaduais. Neste cenário, o ICMS adquiriu importância singular, funcionando, a um só tempo, como instrumento garantidor de certo grau de autonomia aos entes subnacionais, além de válvula de escape para o incremento das arrecadações tributárias estaduais, mediante uma política desenvolvimentista pautada pela concessão unilateral de estímulos fiscais sob as mais variadas formas: isenção, redução de alíquota, redução de base de cálculo, diferimento, restituição do ICMS pago, anistia, crédito presumido, entre outros. Sem embargo, ainda que instituídas após prévio consenso entre os Estados, tais benesses acabam por repercutir direta ou indiretamente no quantum de ICMS a ser repassado às Municipalidades (artigo 158, IV, da CF/88), ensejando intensos debates em torno dos requisitos e dos limites à concessão de incentivos relacionados ao imposto. 2. A discriminação de rendas tributárias e a questão da autonomia financeira Embora não seja um conceito estático, a federação pressupõe a existência, em um mesmo território, de duas ou mais esferas de governo autônomas – porém, coordenadas entre si –, às quais são atribuídas faixas de competência pelo constituinte, sem hierarquia. Essa descentralização político-administrativa propiciada pela multiplicidade de ordens de poderes e pela repartição constitucional de competências, além de delinear o âmbito de atuação de cada unidade e objetivar a coexistência harmônica entre os diversos níveis de governo, implica criação de entidades autônomas, às quais sejam outorgadas competências próprias e passíveis de serem exercitadas sem a interferência do ente central. Para cumprir tal desiderato, contudo, é preciso que o ente disponha de recursos em patamar satisfatório ao custeio de suas despesas públicas, razão pela qual a doutrina tem apontado a autonomia financeira como pressuposto das autonomias política e administrativa. 10 A autonomia do ente federado, portanto, norteia-se sob três variantes (política, administrativa e financeira), de sorte que somente com a presença de todas elas é que se terá um legítimo Estado federativo. A autonomia política pressupõe que os entes tenham competência para legislar e participar na tomada de decisões a nível nacional, a delimitação de competências para fornecer bens e serviços públicos, e a existência de órgãos próprios. Já a autonomia administrativa exige que o ente federado tenha capacidade de se auto-organizar, no tocante à sua estruturação interna, com vistas à consecução dos misteres que lhe foram destinados. Por dos Estados. A título ilustrativo, vide o julgamento do pedido de liminar na Ação Cautelar nº 3.637/DF, proposta pelo Estado de Rondônia para suspender a retenção do repasse da cota do FPE. (STF, AC 3.637 MC, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 25.6.2014). 10 Por todos: CORREIA NETO, Celso de Barros. “Repartição de receitas tributárias e transferências intergovernamentais”. In: CONTI, José Mauricio; SCAFF, Fernando Facury; BRAGA, Carlos Eduardo Faraco (org.). Federalismo fiscal: questões contemporâneas. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, pp. 200-202. 3 último, a autonomia financeira é a nuança que viabiliza materialmente a federação, porquanto impede que as autonomias política e administrativa se reduzam ao mero plano formal. No entanto, para se conceber a autonomia financeira em sua devida amplitude, é necessário dividir o seu estudo em duas vertentes: (i) a da independência na obtenção de recursos; e (ii) a da suficiência dos recursos percebidos, medida através da compatibilidade entre as receitas e os encargos atribuídos a cada ente11. A independência na obtenção de recursos reclama a existência de fontes de arrecadação próprias que não se sujeitem à interferência dos demais entes federados. Contudo, isso não significa que essas receitas devam provir necessariamente do exercício da competência tributária, mas sim que elas possibilitem ao ente subnacional manter-se por si mesmo12. Disso resulta que o critério da independência guarda íntima relação com a titularidade da receita (e não com a competência tributária), cabendo, portanto, para fins de aferição da autonomia financeira, perquirir quem detém originariamente o poder de disposição sobre aquela renda. Fixadas essas premissas, verifica-se que os entes subnacionais são titulares, em caráter primitivo, tanto das receitas decorrentes do exercício de suas respectivas competências tributárias, quanto daquelas atinentes à participação no produto da arrecadação. No primeiro caso, o ente federativo institui o tributo dentro dos limites traçados pela Constituição, efetua a sua arrecadação e se apropria do seu resultado, sendo, pois, o titular dessas receitas. Na segunda hipótese, apesar de não ser a pessoa competente para instituir o gravame fiscal, o ente periférico faz jus à parcela do produto da sua arrecadação, detendo, de igual modo, poder de disposição sobre as quantias referentes à sua fração ideal. Neste ponto, inclusive, impõe-se uma crítica ao conceito de “receita transferida” usualmente encampado pela doutrina. Isso porque, a rigor, as chamadas transferências constitucionais obrigatórias encerram uma impropriedade terminológica, uma vez que não há aqui uma efetiva transferência de receitas (mudança de titularidade), mas tão somente a entrega de recursos que pertencem ao ente receptor. Aliás, não é por outra razão que os arts. 157 a 159, da CF/88 empregam os verbos “pertencer” e “entregar”. O ente arrecadador não ostenta qualquer poder de disposição sobre tais recursos públicos13, cabendo-lhe apenas repassá-los aos seus verdadeiros titulares, quais sejam: os entes receptores (Estados e Municípios). Desse modo, a nosso ver, laboram em erro os que excluem as receitas oriundas da participação no produto da arrecadação do rol de recursos primários dos entes subnacionais, considerando-as, por conseguinte, como inaptas ao resguardo da autonomia financeira destas 11 CONTI, José Maurício. “Federalismo fiscal e a repartição das receitas tributárias”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; NASCIMENTO, Carlos Valder do; MARTINS, Rogério Gandra da Silva (coord.). Tratado de direito tributário. Volume I. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 188-189. 12 CORREIA NETO, Celso de Barros. “Repartição de receitas tributárias e transferências intergovernamentais”. In: CONTI, José Mauricio; SCAFF, Fernando Facury; BRAGA, Carlos Eduardo Faraco (org.). Federalismo fiscal: questões contemporâneas. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, p. 201. 13 Para o ente arrecadador, esse numerário não acarreta qualquer incremento patrimonial, nem tampouco pode interferir no equilíbrio orçamentário e na autorização de despesas. Trata-se, em verdade, de mero ingresso contábil. 4 unidades. Na verdade, o montante arrecadado submete-se, ab initio, a uma dupla titularidade, a qual é exercida tanto pela pessoa competente como pelo ente receptor (v.g. 75% do produto da arrecadação do ICMS pertence ao Estado, enquanto que a parcela de 25% pertence de pleno direito aos Municípios que integram o seu território). Essa dupla titularidade, vale dizer, é fruto justamente do rateio do produto da arrecadação, o qual assegura ao ente receptor o direito à percepção daquela porcentagem de receitas que lhe fora atribuído pela Lei Maior, ao mesmo tempo que limita o poder de disposição do ente competente sobre a integralidade do tributo arrecadado. A partir do estabelecimento das respectivas quotas-partes, impede-se que a parcela do produto da arrecadação destinada ao ente periférico sofra qualquer tipo de interferência, posto que se trata de um recurso a ele pertencente por força de expressa disposição constitucional, e não em função de uma liberalidade do ente competente. Por isso, cabe a este último tão somente a entrega do numerário correspondente ao percentual fixado pelo constituinte14, de modo que se tem aqui uma fonte independente de receitas, e, portanto, hábil a garantir a autonomia financeira. 15-16 Na prática, porém, não basta que o ente subnacional obtenha essas rendas sem intermediações. É preciso que elas, juntamente com aqueloutras auferidas no exercício de suas respectivas competências tributárias, sejam compatíveis com os encargos que lhe foram designados pela Constituição, motivo pelo qual a análise da autonomia financeira também deve debruçar-se sobre o prisma da suficiência de recursos. Como visto, nem todas as receitas que compõem a discriminação de rendas pelo produto oferecem um parâmetro seguro para aferição da autonomia financeira do ente federativo, eis que nem todas as rendas percebidas a tal título classificam-se como recursos próprios. Exemplo disso são as receitas advindas das chamadas transferências voluntárias, as quais, embora sejam passíveis (ao menos em tese) de assegurar a cobertura dos gastos públicos em um determinado período, não são obtidas de modo independente, sujeitando-se à interferência de outra esfera de poder (a do ente transferidor), nem tampouco são auferidas em 14 A esse respeito, cumpre destacar que o STF possui jurisprudência pacífica no sentido de que o ente competente sequer pode descontar da parcela a ser entregue os gastos incorridos com a arrecadação do tributo (Cf. RE 75.042, Rel. Min. Thompson Flores, Tribunal Pleno, julgado em 7.12.1972). Tais precedentes vieram a culminar na edição da Súmula nº 578/STF, a qual, à luz da ordem constitucional pretérita, dispõe que “Não podem os Estados, a título de ressarcimento de despesas, reduzir a parcela de 20% do produto da arrecadação do imposto de circulação de mercadorias, atribuída aos Municípios pelo art. 23, § 8º, da Constituição Federal.” 15 No mesmo sentido: CORREIA NETO, Celso de Barros. “Repartição de receitas tributárias e transferências intergovernamentais”. In: CONTI, José Mauricio; SCAFF, Fernando Facury; BRAGA, Carlos Eduardo Faraco (org.). Federalismo fiscal: questões contemporâneas. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, pp. 210-214. 16 De fato, não se ignora que as receitas oriundas do exercício da competência tributária conferem maior grau de autonomia financeira ao ente federado, uma vez que independem de qualquer providência por parte de outro poder (fiscalização, cobrança e arrecadação). Porém, tal constatação não denota qualquer incompatibilidade entre os conceitos de autonomia financeira e de discriminação de rendas pelo produto, visto que as receitas resultantes da participação no produto da arrecadação constituem recursos próprios do ente receptor, quedando-se imunes a qualquer intervenção por parte do ente arrecadador. A diferença está apenas na necessidade de providências administrativas e/ou legislativas por parte do ente competente, o que acarreta menor previsibilidade e segurança orçamentária. 5 caráter contínuo e obrigatório, razão pela qual não servem para a salvaguarda da autonomia financeira do ente federado. A suficiência de recursos não se subsome à mera ideia de equivalência entre a quantidade de numerário disponível e as atribuições a serem desempenhadas por cada entidade. Ela requer também independência e previsibilidade na percepção desses recursos, sem o que o ente subnacional não terá como elaborar de maneira segura o seu orçamento e, consequentemente, prover com eficácia os serviços públicos que lhe cabem.17 Dito isso, depreende-se que o critério da suficiência, enquanto corolário da independência na obtenção de recursos, também toma como referência as receitas de titularidade originária, porquanto o recebimento dos recursos advindos do exercício da competência tributária e da participação no produto da arrecadação não se sujeita à interferência de outro ente, bem como ocorre de forma regular. 3. Competência tributária e a repartição de receitas Preocupada em assegurar a autonomia financeira dos entes federados e coibir abusos do Estado na instituição e exigência de tributos, a Carta Republicana de 1988 foi extremamente analítica, optando, de um lado, por conferir a cada entidade um campo próprio para instituir seus tributos18 e, de outro, por estabelecer um feixe de princípios e vedações aos quais essa tributação se sujeitaria. Dessa conjugação resultou a chamada competência tributária, definida por Paulo de Barros Carvalho como “uma das parcelas entre as prerrogativas legiferantes das quais são portadoras as pessoas políticas, consubstanciada na faculdade de legislar para a produção de normas jurídicas sobre tributos”. 19 Ao atribuir faixas específicas para que cada pessoa política instituísse seus tributos, a Constituição delimitou tanto o poder legiferante do ente competente – que deve atuar dentro dos parâmetros das competências que lhe foram outorgadas pela Lei Maior e em obediência às diretrizes por ela prescritas – quanto o dos demais entes federados – aos quais é vedado exigir tributo sobre o mesmo fenômeno. Aqui, aliás, reside o ponto nodal entre a competência tributária e a competência para legislar sobre Direito Tributário, vez que, malgrado ambas constituam espécies de competência legislativa, esta é concorrente (art. 24, I c/c art. 30, II e III, 17 Há vozes na doutrina que restringem a autonomia financeira apenas ao critério da suficiência de recursos, de forma que todas as receitas percebidas pelo ente federativo (inclusive as decorrentes de transferências intergovernamentais facultativas) seriam aptas ao resguardo de sua autonomia. Contudo, essa não nos parece a posição mais acertada, visto que a percepção dessas receitas, além de incerta, fica ao inteiro talante do ente transferidor, o qual, inclusive, pode condicionar esse repasse. Por todos, vide: GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. São Paulo: Noeses, 2009, pp. 207-211. 18 Embora o art. 145 da CF/88 tenha atribuído competência comum a todos os entes da federação para a instituição de taxas e contribuições de melhoria, vale observar que a competência para criar tais exações (tributos vinculados a uma atuação estatal) se resolve a partir da competência anexa, de sorte que quem tem a atribuição para o desempenho da atividade estatal terá, igualmente, a competência tributária. Com isso, impede-se a cumulação de incidências sobre uma única hipótese tributária. Sobre o tema, ver: SCHOUERI. Luís Eduardo. Direito tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, pp. 249-252. 19 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5ª ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 240. 6 da CF/88) e versa sobre a edição de normas gerais; ao passo que aquela, via de regra, ostenta a característica de ser exercida em caráter exclusivo e trata da instituição de tributos. Como consequência dessa discriminação rigorosa das competências tributárias, a pessoa política titular dessa prerrogativa detém a competência legislativa plena para instituir, modificar e extinguir seus tributos, não podendo delegar ou transferir a outro ente a atribuição de legislar sobre os elementos formadores da obrigação tributária20 (arts. 6º e 7º, do CTN21), nem tampouco renunciar a essa faculdade, a qual subsiste mesmo diante da inércia do seu titular (art. 8º, do CTN22-23). Ademais, cumpre destacar que o fato de o tributo ter a sua receita partilhada em nada interfere na competência legislativa plena, a qual continua a pertencer integralmente à pessoa política titular da competência tributária, consoante aduz o parágrafo único do art. 6º do CTN. A respeito do tema, Misabel Abreu Machado Derzi assevera: “Tratamento diferente recebe a questão da participação das pessoas políticas no produto da arrecadação de tributos de alheia competência, direta ou indiretamente. Trata-se de um processo de repartição de produto, e não de um condomínio legislativo ou impositivo. Os assuntos são diversos. Pode-se concluir, de pronto, que o direito de participar do produto da arrecadação de dado tributo não atribui ao partícipe nenhuma parcela de competência legislativa ou impositiva sobre o mesmo tributo. A política legislativa pertence integralmente à pessoa competente. Neste ponto, o partícipe é passivo.” 24 Dessa feita, a instituição, modificação e extinção do tributo independe da autorização de outro ente federado, ainda que este faça jus à parcela do produto da arrecadação. Afinal, como bem salienta Paulo de Barros Carvalho, não é porque a receita de certo tributo venha a ser partilhada que a exação deixa de pertencer à competência de quem a recebeu originariamente, posto que, do contrário, estaríamos a violar o princípio da indelegabilidade das competências tributárias. 25 20 BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 65. 21 “Art. 6º A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta Lei. Parágrafo único. Os tributos cuja receita seja distribuída, no todo ou em parte, a outras pessoas jurídicas de direito público pertencerá à competência legislativa daquela a que tenham sido atribuídos. Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra [...].” 22 “Art. 8º O não-exercício da competência tributária não a defere a pessoa jurídica de direito público diversa daquela a que a Constituição a tenha atribuído.” 23 Embora o art. 8º do CTN pareça supérfluo, tendo em vista que o art. 6º já estatui a indelegabilidade das competências tributárias, o dispositivo em questão veio a pôr fim a uma discussão que perdurou durante o regime da Constituição de 1946. Na época, ante a inércia da União em legislar acerca do imposto único sobre minerais, alguns Estados-membros passaram a exigir o IVC sobre as transações envolvendo minérios, aos argumentos de que (i) o art. 15, III da CF/46 (que atribuía à União a competência para instituir o referido imposto único) não era autoaplicável e (ii) o art. 68 do Código de Minas de 1940 apenas estabelecia um limite à tributação sobre minérios. Instado a se manifestar, o STF encampou a tese dos Estados e, após reiterados precedentes, editou a Súmula nº 118/STF, pondo em xeque a rigidez do próprio texto constitucional. Face a esse malfadado episódio, mostrou-se conveniente deixar expresso o óbvio, razão pela qual o legislador teve o cuidado de reiterar o princípio da indelegabilidade das competências no art. 8º do CTN. A respeito desta celeuma, vide: BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 75. 24 BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 64. 25 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 25ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 230. 7 Neste contexto, cabe ao titular da competência tributária a prerrogativa de legislar acerca dos critérios da regra-matriz de incidência, enquanto que aos entes partícipes do produto da arrecadação de tributos de competência alheia assegura-se o recebimento de sua parcela. O assunto, contudo, ganha contornos peculiares em se tratando da concessão de benefícios em matéria de ICMS, conforme veremos a seguir. 4. A concessão de benefícios relativos ao ICMS 4.1. A competência exonerativa em matéria de ICMS: requisitos para seu exercício e campo de atuação do legislador estadual. Ao outorgar competência tributária aos entes políticos, o constituinte igualmente atribuiu-lhes, entre outras faculdades, a de exonerar os seus contribuintes, seja mutilando parcialmente um ou mais critérios da regra-matriz de incidência26, seja dispensando direta ou indiretamente o sujeito passivo do cumprimento da obrigação tributária. Tomando por base a exclusividade 27 e a facultatividade que, via de regra, são inerentes ao exercício da competência tributária, a doutrina sedimentou entendimento segundo o qual o poder de exonerar corresponderia a uma derivação do poder de tributar, isto é, verso e reverso da mesma medalha28. Tal entendimento, todavia, deve ser assimilado com cautela, haja visto que, quando se tem um sistema de competências tributárias integrado verticalmente e com interrelacionamentos entre as ordens jurídicas de governo, é do conjunto de normas que derivam do contexto constitucional que sobressaem os limites à competência exonerativa. 29 De fato, o poder de exonerar guarda certa simetria com o poder de tributar, até porque a exoneração “se dá nos limites da competência” 30 . Ocorre que a norma exonerativa guarda autonomia em relação à regra-matriz de incidência tributária. Na verdade, é do encontro entre as duas normas jurídicas que sobressai a inibição da incidência da hipótese tributária (nos casos em que o preceito exonerativo atua sobre o antecedente) e da eficácia do fato jurídico tributário (quando o preceito exonerativo suprime a funcionalidade do consequente)31, assim como a dispensa (direta ou indireta) do dever jurídico de adimplemento da obrigação tributária. Desse modo, nada impede que a competência desonerativa encontre limitações diversas daquelas 26 As imunidades, apesar de serem uma espécie exonerativa, possuem sede constitucional, consagrando regras de incompetência tributária que vedam o estabelecimento de regras de incidência sobre determinadas materialidades ou pessoas. Portanto, a competência tributária já nasce limitada pela imunidade, de sorte que sequer surge ao ente tributante a possibilidade de tributar determinada situação. A isenção, por sua vez, assim como outras espécies exonerativas (v.g. reduções de alíquotas e bases de cálculo), é assunto que se compreende dentro da competência tributária do ente subnacional. 27 Embora seja recorrente na doutrina atribuir à competência tributária a característica da privatividade, o mais correto seria dizer que ela é exclusiva. Isso porque a competência privativa admite delegação e competência suplementar, o que não ocorre com a competência tributária, que é atribuída a uma entidade com exclusão das demais. 28 BORGES, José Souto Maior. Isenções Tributárias. 2ª ed. São Paulo: Sugestões Literárias, 1980, p. 2. 29 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. ICM: competência exonerativa: convênios de Estados, imunidades, isenções, reduções e diferimento. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1982, p. 67. 30 SCHOUERI. Luís Eduardo. Direito tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 235 31 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5ª ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 601. 8 aplicáveis à competência tributária. No entanto, face à rigidez do nosso sistema constitucional tributário, tais restrições devem defluir da própria Constituição, seja implícita ou explicitamente. Do contrário, a competência tributária e a competência exonerativa se sujeitarão ao mesmo regime jurídico, sendo esta corolário lógico daquela. Por se tratar de um imposto não-cumulativo cujos efeitos se propagam por todo o território nacional, o ICMS demanda comandos de uniformização, sob pena de se ter no País um sem-número de políticas tributárias diferentes e conflitantes entre si. Sem essa uniformidade de tratamento, questões como a não-cumulatividade do imposto, a sua incidência em operações/prestações interestaduais, as alíquotas e a concessão de incentivos fiscais ficariam ao bel-prazer de cada Estado-membro, o que decerto ocasionaria guerras fiscais permanentes e, consequentemente, comprometeria a própria unidade da federação. Ciente desses riscos, o constituinte previu, no próprio bojo da Constituição Federal, algumas limitações e exclusões atinentes ao exercício da competência tributária por parte do legislador estadual do ICMS, tendo, em outros momentos, reservado tal tarefa às leis complementares, resoluções do Senado Federal e deliberações entre os Estados.32 Entre tais regramentos de uniformização, o constituinte atribuiu à lei complementar a função de prescrever a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais em matéria de ICMS serão concedidos ou revogados (art. 155, §2º, XII, “g”, da CF/88), o que acabou tornar obrigatório o exercício competência tributária do ICMS. Afinal, se a exigência de deliberação entre as unidades federativas figura como condição sine qua non ao exercício da competência exonerativa – que nada mais é do que uma das facetas da competência tributária (“o reverso da medalha”) –, não há como, unilateralmente, deixar de exercer a competência para instituir o ICMS, porquanto a omissão do legislador estadual importaria indiretamente em um benefício fiscal33, o que, como visto, exige diálogo prévio entre os Estados34. Em paralelo, tampouco se pode perder de vista que a inatividade do legislador ordinário estadual inviabilizaria por completo a não-cumulatividade do imposto (art. 155, §2º, incisos I e XII, “f”, da CF/88)35, bem como propiciaria uma divisão do mercado nacional (art. 32 BRANDÃO JUNIOR, Salvador Cândido. Federalismo e ICMS: Estados-Membros em “Guerra Fiscal”. Série Doutrina Tributária v. XIV. São Paulo: Quartier Latin, 2014, pp. 86-87; 111. 33 A omissão do titular da competência tributária em instituir o gravame produz os mesmos efeitos da isenção, sendo ambas hipóteses de não incidência. A diferença está na causa dessa não incidência. Enquanto no primeiro caso há uma ausência de elemento normativo, oriundo da inércia do legislador; no segundo caso, existe a regra-matriz de incidência tributária, a qual, porém, vem a ser alvo de uma norma isentiva que mutila um os mais critérios de sua estrutura. No mesmo sentido: CARVALHO, Paulo de Barros. “Guerra fiscal” e o princípio da não-cumulatividade no ICMS. Disponível em:<www.ibet.com.br>. Acesso em 30.1.2015. 34 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5ª ed. São Paulo: Noeses, 2013, pp. 253254. 35 “Art. 155. (omissis) § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal; [...] XII - cabe à lei complementar: 9 219, da CF/88)36, sendo certo que tais fatores acabam por realçar a obrigatoriedade do exercício da competência tributária do ICMS. Neste contexto, vislumbra-se, de início, uma clara dicotomia entre a competência tributária e a competência exonerativa. O exercício da competência tributária do ICMS é obrigatório, devendo o ente competente instituir o gravame e estabelecer uma disciplina legal que observe os comandos de uniformização contidos na Carta Republicana e nas normas de caráter nacional. Por sua vez, a competência exonerativa é extraordinariamente partilhada entre os Estados-membros37, somente sendo autorizado o seu exercício mediante deliberação conjunta entre todos os entes estaduais. Deliberação essa que, como se sabe, é regulada pela Lei Complementar nº 24/75, a qual prevê a figura dos convênios como instrumentos de exteriorização formal do prévio consenso institucional entre as unidades federadas, no tocante à concessão e revogação de benefícios relativos ao ICMS. A celebração do convênio interestadual vocacionado à outorga de incentivos divide-se em duas etapas, a saber: (i) a aprovação unânime em reunião para a qual tenham sido convocados representantes de todos os Estados (art. 2º, caput e §2º, da LC nº 24/75); e (ii) a sua posterior ratificação, seja através da edição de decreto executivo38-39-40 ou pelo mero silêncio do Governador (art. 4º, da LC nº 24/75), momento no qual a norma convenial torna-se válida. [...] f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias;” 36 SCHOUERI. Luís Eduardo. Direito tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 237. 37 O Estado tem competência para exonerar, porém, essa prerrogativa legiferante, embora autonômica, não é unilateral, mas sim colegiada. Cf. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. ICM: competência exonerativa: convênios de Estados, imunidades, isenções, reduções e diferimento. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1982, p. 64; 67. 38 Com a vênia dos pensam em sentido contrário, a ratificação dos convênios pelo Executivo estadual viola os princípios da legalidade tributária e da separação de poderes. Isso porque a própria Carta Magna, em seu art. 150, §6º, exige o advento de “lei específica” para a concessão de benefícios fiscais, não havendo o estabelecimento de qualquer exceção a essa reserva legal em matéria de ICMS. Pelo contrário. A oração final do aludido dispositivo constitucional (“sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g”) reforça a plena compatibilidade entre a cláusula de reserva de convênio e a de reserva legal. No mesmo sentido: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. “Convênios, ICMS e legalidade estrita em matéria tributária”. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; ELALI, André; PEIXOTO, Marcelo Magalhães (coord.). Incentivos fiscais: questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal. São Paulo: MP Editora, 2007, pp. 347-353; COSTA, Alcides Jorge. “ICMS - natureza jurídica da isenção - natureza jurídica e função do convênio no âmbito do ICMS”. In: ______. Estudos sobre IPI, ICMS e ISS. São Paulo: Dialética, 2009, p. 88; BRANDÃO JUNIOR, Salvador Cândido. Federalismo e ICMS: Estados-Membros em “Guerra Fiscal”. Série Doutrina Tributária v. XIV. São Paulo: Quartier Latin, 2014, p. 202; PYRRHO, Sérgio. Soberania, ICMS e isenções: os convênios e os tratados internacionais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 42-47. Em sentido contrário, vide: TÔRRES, Heleno Taveira. “Isenções no ICMS - limites formais e materiais. Aplicação da LC nº 24/75. Constitucionalidade dos chamados convênios autorizativos”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 72. São Paulo: Dialética, setembro de 2001, pp. 89-90. 39 Parte da doutrina defende que essa ratificação deveria ocorrer por meio de decreto legislativo, dada a similaridade entre os convênios interestaduais e os tratados internacionais, bem como o fato de o referido veículo normativo ser lei em sentido material (cf. CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012, pp. 579584). Essa tese foi rejeitada durante muito tempo pelo STF, que havia sedimentado jurisprudência pela inconstitucionalidade da norma estadual que condiciona a validade dos convênios à aprovação da Assembleia Legislativa estadual (v.g. ADI 165/MG; ADI 676/RJ; ADI 462/BA; ADI 177/RS). Contudo, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 539.130/RS, o Pretório Excelso inovou ao se manifestar no sentido de que o convênio constitui apenas uma autorização à implantação do benefício fiscal, a qual somente se corporifica mediante a edição de um decreto legislativo, em obediência ao princípio da estrita legalidade em matéria tributária (RE 539.130/RS, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 4.12.2009). Essa novel jurisprudência vem sendo reiterada pela Suprema Corte (RE 501.877 AgR/MA, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 5.2.2013; e RE 637.959 AgR/DF, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 19.2.2013). Ademais, inobstante 10 Uma vez preenchidas tais condicionantes, caberá, então, a cada ente estadual implementar ou não em seu território aquele benefício autorizado via convênio41. Feito esse juízo de discricionariedade e havendo a consequente opção por instituí-lo, ganha relevo o estudo da tipologia exonerativa, porquanto o campo de atuação do legislador estadual nessa matéria não é livre e irrestrito. Na esteira da doutrina de Sacha Calmon Navarro Coêlho, as exonerações dividem-se em internas e externas, conforme atuem dentro ou fora da estrutura da norma de tributação, respectivamente. As exonerações internas, por sua vez, podem investir sobre os critérios do antecedente (como é o caso das imunidades42 e isenções) ou do consequente da regra-matriz de incidência (v.g. reduções de base de cálculo e alíquotas), suprimindo parcialmente o seu âmbito de abrangência. Lado outro, as exonerações externas não atuam na estrutura da regra-matriz de incidência, sendo supervenientes ao nascimento da obrigação tributária (p.ex. remissão e devolução do valor pago legitimamente a título de tributo). 43 Sem embargo, ocorrido o fato jurídico tributário e instaurado o vínculo obrigacional, o que se tem é, de um lado, o direito subjetivo de que está investido o sujeito ativo de exigir a prestação pecuniária e, em contraponto, o dever jurídico do sujeito passivo de adimpli-la. Há, portanto, apenas um crédito tributário em favor do Estado, que, enquanto não satisfeito pelo sujeito passivo mediante a entrega de dinheiro, representará uma potencial receita a ser auferida. Acontece que o constituinte, ao determinar a repartição das receitas do ICMS, tomou por base consideremos que a questão de fundo seja de índole eminentemente constitucional, não podemos deixar de registrar que o STJ já se manifestou pela ilegalidade da ratificação de convênio por meio de decreto executivo, por expressa violação ao art. 97, VI, do CTN. Naquela oportunidade, a Corte Especial asseverou que o instrumento hábil para ratificar os convênios interestaduais seria o decreto legislativo (REsp 556.287/RN, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 4.11.2004). 40 Registre-se que chegou a haver uma proposição legislativa com o fito de submeter a ratificação dos convênios ao Poder Legislativo dos Estados. Trata-se do Projeto de Lei Complementar nº 09/91, de autoria do então deputado Geraldo Alckmin Filho, o qual, em sua exposição de motivos, consignava expressamente a incompatibilidade entre a nova ordem constitucional e a LC nº 24/75, uma vez que esta última admitia interpretações segundo as quais os convênios independeriam, para sua eficácia, de aprovação pelas Assembleias Legislativas estaduais. O mencionado projeto de lei complementar veio a ser arquivado ao final daquela legislatura, após obter pareceres contrários da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e da Comissão de Finanças e Tributação. 41 A natureza dos convênios celebrados no âmbito do Conselho Nacional de Política (CONFAZ) ainda é objeto de intensa controvérsia na doutrina e jurisprudência, havendo aqueles que lhe atribuem caráter impositivo e os que lhe conferem feitio meramente autorizativo. O STF, à luz do regime constitucional pretérito, havia firmado posicionamento no sentido de que a LC nº 24/75 não admitia a distinção entre convênios autorizativos e impositivos, de modo que não caberia ao Estado decidir se institui ou revoga determinado benefício, posto que isso consistiria numa ação unilateral (RE 96.545, Rel. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em 1.9.1982). Todavia, com o advento da Carta Republicana de 1988, o Pretório Excelso reviu sua jurisprudência, passando a assentar que o convênio possui natureza autorizativa, não assegurando, por si só, a concessão do benefício fiscal relativo ao ICMS (RE 635.688/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 16.10.2014; e RE 630.705 AgR/MT, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 11.12.2012). No mesmo diapasão, encontra-se a jurisprudência do STJ: RMS 26.328/RO, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 18.9.2008; REsp 709.216/MG, Rel. Min. Franciulli Netto, Segunda Turma, julgado em 22.2.2005; e RMS 13.543/RJ, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 4.11.2003. No caso, com a celebração do convênio, o Estado fica obrigado apenas a tolerar o emprego que outros Estados façam da prerrogativa que foi a todos conferida, qual seja: a de instituir ou revogar determinado incentivo (Cf. PYRRHO, Sérgio. Soberania, ICMS e isenções: os convênios e os tratados internacionais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 39). 42 Vide nota 27. 43 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. “Tipologia exonerativa: imunidades, isenções e outras formas de exonerar os contribuintes às luzes da teoria da norma jurídica.” In: BARRETO, Aires Fernandino (coord.). Direito tributário contemporâneo. Estudos em homenagem a Geraldo Ataliba. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 778-779. 11 as rendas efetivadas, consignando expressamente no art. 158, IV, da CF/88 que a partilha se daria em função do produto da arrecadação do imposto, isto é, do resultado da operação, do conteúdo monetário que adentrou no Erário estadual. Neste ponto, vale lembrar que a relação jurídico-tributária se forma exclusivamente entre o ente competente e o sujeito passivo, havendo para a entidade beneficiada uma mera expectativa de participação naquela receita tributária. No caso, somente com a extinção deste liame obrigacional tributário mediante o pagamento44 – e o consequente após a entrada do numerário no caixa do Estado – é que surge uma nova relação jurídica (de índole financeira), dessa vez entre o ente partícipe (sujeito ativo) e a pessoa política competente (sujeito passivo), tendo por objeto uma percentagem do produto da arrecadação do tributo. Com efeito, não é qualquer redução do montante arrecadado (e, por consequência, do valor a ser repartido) que representará uma violação ao art. 158, IV, da CF/8845. É preciso que essa diminuição se dê, ou seja, após o desaparecimento da relação jurídico-tributária com o correspondente ingresso de recursos para a Fazenda, fato esse que evidencia que, para fins de delimitação do campo de atuação do legislador estadual do ICMS em matéria desonerativa, é igualmente imprescindível aferir o momento da incidência do preceito exonerativo. Fixadas essas premissas, é possível extrair, desde logo, a ilação de que as exonerações internas não afrontam a autonomia municipal nem o pacto federativo, uma vez que sua concessão não interfere na entrega do quantum arrecadado, mas no próprio nascimento da obrigação, ao restringir o campo de validade da norma de tributação mediante a mutilação de seus critérios qualitativos e/ou quantitativos. Contudo, no que tange à concessão de exonerações externas, impõe-se um estudo mais aprofundado da questão. As exonerações externas, como se viu, agem fora da estrutura da regra-matriz de incidência, sendo supervenientes ao nascimento da obrigação tributária. Todavia, tal espécie exonerativa subdivide-se em duas categorias de preceitos: (i) os que incidem no interior da relação jurídico-tributária (antes, portanto, de sua extinção pelo pagamento); e (ii) os que atuam após o desaparecimento do liame obrigacional (quando a receita já foi realizada). Na primeira hipótese, a medida desagravadora pressupõe o nascimento da obrigação tributária para extinguila através da dispensa total ou parcial do seu cumprimento (v.g. remissão), ao passo que na segunda hipótese, a norma exoneradora supõe não apenas o surgimento do vínculo obrigacional como também o seu cumprimento pelo sujeito passivo para, então, lhe anular os efeitos (caso da 44 Aqui também se incluem as hipóteses de conversão de depósito em renda, de pagamento antecipado e homologação do lançamento, e a consignação em pagamento, posto que tais causas extintivas nada mais são do que modalidades de pagamento. (Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5ª ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 549). 45 SCAFF, Fernando Facury; SILVEIRA, Alexandre Coutinho da. “Competência tributária, transferências obrigatórias e incentivos fiscais”. In: CONTI, José Mauricio; SCAFF, Fernando Facury; BRAGA, Carlos Eduardo Faraco (org.). Federalismo fiscal: questões contemporâneas. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, p. 300. 12 devolução do valor pago legitimamente a título de tributo).46 Disso se infere que, a despeito de ambas as categorias implicarem direta ou indiretamente a redução ou supressão do ônus fiscal, uma parte das exonerações externas possui natureza tributária, operando sobre o prisma da receita, enquanto que a outra parcela ostenta viés financeiro47, atuando sobre a vertente da despesa pública.48 A importância desta diferenciação reside na própria demarcação da competência exonerativa, uma vez que, quando a norma exoneradora incide em fase posterior à extinção do liame tributário com a consequente arrecadação, já se instaurou a relação jurídico-financeira que confere ao ente partícipe o direito de receber um percentual do valor angariado. E em tais circunstâncias, não é dado aos Estados dispor sobre a integralidade do ICMS arrecadado, mas somente sobre os 75% que lhe pertencem, de modo que a exoneração deve ficar adstrita a essa porcentagem, sob pena de agressão ao art. 158, IV, da CF/88. Aqui, inclusive, vale recordar a clássica lição de Aliomar Baleeiro sobre o conceito de receita pública enquanto “entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo.” 49 Ora, a totalidade do ICMS arrecadado não constitui receita pública dos Estados, pois, uma vez instituído o imposto, o produto de sua arrecadação exsurge com dupla titularidade, sendo uma parte destinada ao ente competente e a outra ao ente partícipe. Assim, ao reservar 25% do valor coletado aos Municípios, a Carta Magna estabeleceu um condomínio federativo no plano das receitas do ICMS, razão pela qual os entes estaduais devem se ater à parcela que lhes cabe de pleno direito (75%) ao concederem exonerações relativas ao imposto, visto ser essa a receita da qual são titulares. Do contrário, estar-se-á fazendo “cortesia com chapéu alheio”. 46 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8ª ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010, pp. 658-660. 47 Conquanto, no plano jurídico-formal, a exoneração externa que susta a eficácia do cumprimento da obrigação tributária possua natureza financeira, os seus efeitos equivalem aos da exoneração externa que habita no interior da relação jurídico-tributária, servindo apenas como via indireta para o cumprimento do mesmo desiderato: dispensar total ou parcialmente o sujeito passivo do adimplemento da obrigação tributária. Por isso, a nosso ver, não devemos excluí-la do temário exonerativo. No mesmo sentido: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. “Tipologia exonerativa: imunidades, isenções e outras formas de exonerar os contribuintes às luzes da teoria da norma jurídica.” In: BARRETO, Aires Fernandino (coord.). Direito tributário contemporâneo. Estudos em homenagem a Geraldo Ataliba. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 778. 48 A distinção entre incentivos tributários e financeiros é meramente jurídico-formal, uma vez que ambos produzem os mesmos efeitos financeiros. Atento a essa conversibilidade, Ricardo Lobo Torres assevera: “Os privilégios tributários, que operam na vertente da receita, estão em simetria e podem ser convertidos em privilégios financeiros, a gravar a despesa pública. A diferença entre eles é apenas jurídico-formal. A verdade é que a receita e a despesa são entes de relação, existindo cada qual em função do outro, donde resulta que tanto faz diminuir-se a receita, pela isenção ou dedução, como aumentar-se a despesa, pela restituição ou subvenção, que a mesma consequência financeira será obtida.” (TORRES, Ricardo Lobo. “Responsabilidade fiscal, renúncia de receita e guerra fiscal do ICMS”. In: SCAFF, Fernando Facury; CONTI, José Mauricio (org.). Lei de Responsabilidade Fiscal – 10 anos de vigência – Questões atuais. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, p. 13). 49 BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 16ª ed. rev. e atualizada por Dejalma de Campos. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 126. 13 4.2. A utilização de “pseudoinstitutos exonerativos” como forma camuflada de burla à reserva de convênio. Inteligência do art. 155, §2º, XII, “g”, da CF/88. Afora as exonerações propriamente ditas, existem outras fórmulas que não reduzem ou suprimem a carga tributária do ICMS em caráter definitivo, porém, são largamente utilizados pelos Estados para atrair investimentos para seus rincões, visto que protelam o momento do recolhimento do gravame. Para fins do presente estudo, limitaremos nossa análise aos dois principais instrumentos adotados nesse sentido, a saber: o diferimento e as operações triangulares de crédito. A terminologia “diferimento” pode assumir o caráter de isenção, substituição tributária ou mera postergação da data prevista para pagamento do tributo. Será isenção quando promover a mutilação do critério temporal da regra-matriz de incidência, impedindo que haja, em momento algum da cadeia, a exigência tributária concernente à operação “diferida”, e provocando uma quebra da sistemática débito-crédito e a sua consequente repercussão, do ponto de vista financeiro, no contribuinte da etapa seguinte, que não terá créditos a aproveitar. Por sua vez, o diferimento apresentar-se-á como hipótese de substituição tributária quando houver o adiamento no pagamento do tributo cujo fato gerador já ocorreu e, ao mesmo tempo, a atribuição da responsabilidade pelo seu recolhimento ao sujeito que realiza a etapa subsequente da cadeia. Por fim, o diferimento pode manifestar-se como sinônimo de moratória, representando mera dilação da data de pagamento, sem interferência em quaisquer dos critérios da regra-matriz de incidência. 50-51 Embora possibilite diversas conceituações, as quais variam ao sabor da situação fática, o diferimento não constitui em si uma exoneração tributária, vez que o tributo continua devido, havendo apenas o adiamento da sua coleta. Usualmente, tal medida é utilizada pelo legislador do ICMS para conferir praticidade à fiscalização nos casos em que o Fisco estadual encontra dificuldades de fiscalizar determinados seguimentos de contribuintes, fazendo-o optar por exigir o imposto na operação subsequente (a chamada substituição tributária “para trás”). Todavia, há situações em que o diferimento se traduz na concessão de prazos muito amplos52 ou até mesmo indefinidos53 para o recolhimento do tributo, configurando autêntico benefício fiscal e, portanto, sujeito à reserva de convênio, nos termos do art. 155, §2º, XII, “g” da CF/88 e art. 1º, parágrafo único da LC nº 24/75. 50 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5ª ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 745. Sacha Calmon Navarro Coêlho adota posicionamento semelhante, acrescentando apenas que o diferimento pode ser visto como efeito econômico de algum tipo de exoneração jurídica nos impostos plurifásicos e não-cumulativos, uma vez que posterga a carga tributária para o elo seguinte da cadeia de tributação. Todavia, como reconhecido pelo próprio autor, trata-se de fenômeno econômico, despido de qualquer sentido jurídico autônomo. (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria geral do tributo, da interpretação e da exoneração tributária. 3ª ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 246-247.). 52 ADI 1.179/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, julgado em 13.11.2002. 53 ADI 3.702/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 1.6.2011. 51 14 A nosso ver, o exagero na fixação da data para pagamento do ICMS dependerá de dois fatores: (i) a forma para execução da dívida tributária (unitária ou parcelada), e (ii) o intervalo de tempo estipulado para adimplemento da obrigação. Em se tratando de prorrogação do prazo para pagamento do crédito tributário em prestação única, deve-se atentar aos lapsos temporais previstos no Convênio ICM nº 38/8854, ao passo que, nas hipóteses de parcelamento55, o prazo a ser observado é de até 60 (sessenta) meses, conforme autoriza o Convênio ICM nº 24/75 – prorrogado indeterminadamente pelo Convênio ICMS nº 151/94. Desse modo, havendo a intenção por parte do legislador estadual de conceder prazos mais favoráveis do que os mencionados, será necessária a autorização prévia em convênio interestadual celebrado especificamente com essa finalidade. Por sua vez, a indefinição do prazo para recolhimento do tributo ocorre quando o legislador não estabelece o período de duração da moratória, nem o número de prestações e os seus respectivos vencimentos, incorrendo em violação ao art. 153, incisos I e III, “b”, do CTN56. No caso, a incerteza ou até mesmo improbabilidade em torno da exigibilidade do tributo apenas denota que o nominado diferimento reveste-se, em verdade, de caráter de benefício fiscal dissimulado, resultando em forma de não pagamento do imposto, e não em simples adiamento no recolhimento do valor devido. Por corolário, impõe-se igualmente a aprovação prévia dos demais Estados-membros para a concessão desse benefício fiscal indireto. A partir das premissas fixadas, e tendo em vista que o diferimento do recolhimento do ICMS não significa a redução do ônus fiscal, mas sim a dilação do prazo de vencimento do tributo, é inegável que a implementação desta moratória afetará o momento de percepção das receitas, não obstante o montante a ser arrecadado pelos Estados (e, por conseguinte, repartido com os Municípios) permaneça incólume. A controvérsia, porém, reside em saber se essa postergação, ainda que não promova uma exoneração tributária, revela-se compatível com a com o sistema de repartição de receitas tributárias preconizado na Constituição. 54 “Cláusula primeira. Os prazos máximos previstos na cláusula terceira do Convênio ICM 24/75, para recolhimento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias - ICM, passam a ser os seguintes: I - para os industriais, em até o décimo dia do segundo mês subsequente àquele em que tenha ocorrido o fato gerador; II - para os comerciantes, em até o vigésimo dia do mês subsequente àquele em que tenha ocorrido o fato gerador.” 55 Neste ponto, insta salientar que o parcelamento é espécie do gênero moratória, uma vez que representa uma das formas de se conceder melhores condições e prazo para execução da dívida tributária. Tal entendimento, a propósito, se harmoniza com a jurisprudência do STJ (REsp 1.012.866/CE, Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, julgado em 25.3.2008; REsp 663.564/DF, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 15.5.2007) e com a melhor doutrina (Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5ª ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 545; COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 726; MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 191192). 56 “Art. 153. A lei que conceda moratória em caráter geral ou autorize sua concessão em caráter individual especificará, sem prejuízo de outros requisitos: I - o prazo de duração do favor; [...] III - sendo caso: [...] b) o número de prestações e seus vencimentos, dentro do prazo a que se refere o inciso I, podendo atribuir a fixação de uns e de outros à autoridade administrativa, para cada caso de concessão em caráter individual;” 15 Materializado sob a forma de mera moratória, o diferimento não investe contra os critérios da regra-matriz de incidência, nem tampouco importa na dispensa do dever jurídico de pagar o tributo. Trata-se, deveras, de um benefício concedido no âmbito da relação jurídicotributária que aumenta o período de tolerância para pagamento da dívida. Neste momento, não há que se falar no direito dos Municípios de receber parte do produto da arrecadação do ICMS, até porque ainda não houve o desaparecimento liame obrigacional tributário com o correspondente ingresso de recursos para a Fazenda estadual, que, como se viu, é pressuposto indeclinável para o surgimento da relação jurídica de natureza financeira que contrapõe o ente partícipe (sujeito ativo) e a pessoa política competente (sujeito passivo), e tem por objeto um percentual do produto da arrecadação do tributo. Com efeito, por configurar um benefício outorgado na dimensão tributária, ou seja, antes da extinção da relação jurídico-tributária pelo pagamento, o diferimento não debilita a autonomia municipal, submetendo-se tão somente à reserva de convênio, sendo certo que a necessidade de norma convenial específica dependerá da forma de execução da dívida tributária e do lapso temporal estabelecido para seu cumprimento voluntário. A seu turno, as operações triangulares de crédito ocorrem a partir da criação de um fundo no qual o Estado fornece para as empresas um financiamento com base no montante de ICMS devido. Em geral, esse financiamento se opera de duas maneiras, a saber: (i) por meio do repasse de parte da arrecadação do imposto para um fundo fiscal, o que viola o art. 167, IV, da CF/8857; ou (ii) mediante crédito na conta gráfica do contribuinte. Na primeira hipótese, o numerário relativo ao ICMS devido ingressa nos cofres públicos para, posteriormente, ser “devolvido” sob a forma de crédito, enquanto que, na segunda hipótese, os valores sequer entram na contabilidade do Estado. De toda sorte, como ponto de convergência das operações triangulares de crédito, e que lhe confere inequívoca roupagem de incentivo fiscal, pode-se mencionar o fato de que a parcela do ICMS financiada tem o seu pagamento diferido, sujeitando-se, ainda, a juros subsidiados e generosos prazos de amortização. O financiamento mediante crédito na conta gráfica do contribuinte em nada diverge do diferimento, consistindo em um mecanismo de postergação do recolhimento do ICMS, em que se aplica sobre o valor financiado uma taxa de juros e correção monetária abaixo do mercado ou nulas. A mais desse fator, é importante ressaltar que tal prática não se confunde com à do crédito presumido, uma vez que nesta última não se tem um “empréstimo” para a quitação do 57 “Art. 167. São vedados: [...] IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo.” 16 débito, mas uma autêntica forma de exoneração tributária que se corporifica através da outorga de um crédito fictício em montante superior ao que o contribuinte faria jus, para fins de compensação com o débito ocasionado pela saída, o que acaba por diminuir o quantum do tributo devido pelo sujeito passivo. De outra parte, as operações de triangulação com a intermediação de fundos fiscais apresentam-se como “diferimentos indiretos”, uma vez que o Estado igualmente se propõe a financiar parte do ICMS (só que por meio de recursos orçamentários). Aqui, o valor devido a título de imposto é recolhido e, em seguida, restituído à empresa na forma de um crédito subsidiado, o que demonstra que o incentivo em questão possui natureza financeira e deve, portanto, restringir-se à porcentagem de receitas pertencente aos Estados, qual seja: 75% do ICMS arrecadado. Por derradeiro, a parcela do produto da arrecadação do ICMS reservada aos Municípios (25%) deve lhes ser creditada tão logo os recursos adentrem no Erário estadual, não podendo os Estados reter ou condicionar a entrega da quota-parte dos entes municipais à amortização da dívida oriunda da devolução aos contribuintes de parte do imposto pago na forma de financiamento (art. 160, caput, da CF/8858). 5. A jurisprudência do STF Por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 572.762/SC, o Pretório Excelso teve a oportunidade de se manifestar, em sede de repercussão geral, acerca da possibilidade de diminuição da parcela do produto da arrecadação do ICMS destinada aos Municípios em razão da concessão de incentivos pelos Estados-membros. Na espécie, discutia-se a constitucionalidade de dispositivo do Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense (PRODEC) que instituía uma operação triangular de crédito, na qual o contribuinte recolhia o ICMS dentro do prazo regulamentar e, posteriormente, recebia 75% do valor do ICMS pago na forma de financiamento, fixando-se um prazo de amortização do empréstimo de 48 a 60 meses. Ocorre que, ao calcular a quantia a ser repassada às Municipalidades, o Estado de Santa Catarina não levava em consideração o montante integralmente pago pelo contribuinte a título de ICMS, escriturando como receita tributária apenas os 25% do imposto devido, isto é, aquilo que se quedava nos cofres públicos após os repasses efetuados às empresas via financiamento. Dessa forma, ao invés de receberem 25% do total da apuração do ICMS arrecadado, os Municípios passaram a receber apenas 6,25% do produto da arrecadação, havendo a retenção de cerca de ¾ das suas respectivas quotas-partes. 58 “Art. 160. É vedada a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos, nesta seção, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, neles compreendidos adicionais e acréscimos relativos a impostos.” 17 Forte nessas razões, o Plenário da Suprema Corte manifestou-se pela inconstitucionalidade do adiamento da entrega da parcela do ICMS pertencente aos Municípios, em virtude da outorga de benefícios fiscais. Eis a ementa do julgado: “CONSTITUCIONAL. ICMS. REPARTIÇÃO DE RENDAS TRIBUTÁRIAS. PRODEC. PROGRAMA DE INCENTIVO FISCAL DE SANTA CATARINA. RETENÇÃO, PELO ESTADO, DE PARTE DA PARCELA PERTENCENTE AOS MUNICÍPIOS. INCONSTITUCIONALIDADE. RE DESPROVIDO. I - A parcela do imposto estadual sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, a que se refere o art. 158, IV, da Carta Magna pertence de pleno direito aos Municípios. II - O repasse da quota constitucionalmente devida aos Municípios não pode sujeitar-se à condição prevista em programa de benefício fiscal de âmbito estadual. III - Limitação que configura indevida interferência do Estado no sistema constitucional de repartição de receitas tributárias. IV - Recurso extraordinário desprovido.” (RE 572.762/SC, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 18.6.2008) Embora o precedente tenha dirimido controvérsia envolvendo um autêntico benefício de natureza financeira, que incidia após o recolhimento do ICMS aos cofres públicos e, com isso, diminuía significativamente o montante repassado às Municipalidades; alguns doutrinadores59 passaram a interpretar o posicionamento do STF no sentido de que o direito dos entes subnacionais ao repasse das parcelas do produto da arrecadação de tributo de competência alheia seria anterior ao valor arrecadado, de modo que, em matéria de ICMS, os Estados só poderiam conceder benefícios sobre 75% do imposto devido, visto ser essa a parte da receita a que têm direito.60 Inconformados com tal interpretação, que privilegia a autonomia financeira em detrimento da competência tributária, os Estados mostraram-se receosos com a proposta de súmula vinculante (PSV) nº 41, pugnando para que na redação do verbete ficasse consignado que a concessão do incentivo relativo ao ICMS não poderia afetar o repasse da parcela do imposto efetivamente arrecadada.61-62 Frente a tal cenário, voltou à tona a discussão acerca do campo de atuação do legislador estadual no tocante à concessão de incentivos relacionados ao ICMS, revigorando-se a dicotomia entre Estados e Municípios em torno do conceito de competência tributária, mais especificamente se ele abrange todos os aspectos referentes à regra-matriz de incidência ou se ele compreende apenas a parcela atinente à sua receita própria, excluindo-se, portanto, as receitas repassadas a outros entes. 59 SCAFF, Fernando Facury; SILVEIRA, Alexandre Coutinho da. “Competência tributária, transferências obrigatórias e incentivos fiscais”. In: CONTI, José Mauricio; SCAFF, Fernando Facury; BRAGA, Carlos Eduardo Faraco (org.). Federalismo fiscal: questões contemporâneas. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, p. 296. 60 Em defesa desse posicionamento, vide: MACHADO, Hugo de Brito; MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. “ICMS. Incentivos fiscais. Reflexos na receita dos Municípios. Inconstitucionalidade”. In: ______. Direito tributário aplicado. Rio de Janeiro: Forense, 2008, pp. 323-333. 61 BEVILACQUA, Lucas. Incentivos fiscais de ICMS e desenvolvimento regional. Série Doutrina Tributária v. IX. São Paulo: Quartier Latin, 2013, p. 199. 62 A referida proposição, que seria convertida na Súmula Vinculante nº 30, restou acolhida pelo Plenário do STF nos seguintes termos: “É inconstitucional lei estadual que, a título de incentivo fiscal, retém parcela do ICMS pertencente aos Municípios”. Entretanto, a publicação do verbete foi suspensa após questão de ordem suscitada pelo Min. Dias Toffoli, uma vez que um dos precedentes em que a súmula vinculante se embasava não tratava da concessão de incentivo relativo ao ICMS, mas sim de dação em pagamento de bens. 18 Sem embargo, a exegese empreendida a favor dos Municípios não se sustenta, uma vez que a afetação do produto da arrecadação não interfere na competência tributária atribuída à determinada pessoa política, cuja titularidade mantém-se inalterada (art. 6º, parágrafo único, do CTN). No caso, a aptidão para legislar em matéria de ICMS pertence exclusivamente aos Estados, não podendo os Municípios intervirem na concessão de incentivos de natureza tributária, mesmo que isso possa impactar no montante da parcela da arrecadação que posteriormente lhes será entregue. A esse respeito, impende assinalar que a jurisprudência sedimentada a partir do julgamento do Recurso Extraordinário nº 572.762/SC possui alcance limitado, haja visto que cuidou de questão específica, qual seja: a retenção da quota-parte do ICMS destinada aos entes municipais. No mencionado leading case, o imposto havia sido efetivamente arrecadado, mas, por conta de um incentivo (de inequívoco caráter financeiro), a parcela do montante concernente às Municipalidades não lhes tinha sido repassada em sua plenitude. Situação totalmente diversa – e, portanto, a carecer de pronunciamento da Suprema Corte – é quando se concede um estímulo de cunho tributário, pois, nesta hipótese, a norma incentivadora decorre do exercício da competência tributária (sob o viés desonerativo) e incide em momento anterior à extinção do liame obrigacional, impedindo que o tributo seja recolhido aos cofres públicos. Trata-se, aqui, de assunto afeto à temática da competência tributária, e não à da repartição de receitas, até porque não existe arrecadação, nem receita. Atento a essa lacuna, o Plenário do STF reconheceu a repercussão geral no Recurso Extraordinário nº 705.423/SE, tendo o Ministro Ricardo Lewandowski assentado em seu voto que o tema em debate no referido recurso é mais abrangente do que o discutido nos autos do Recurso Extraordinário nº 572.762/SC. Confira-se: “A questão constitucional versada neste recurso consiste em definir, sob o prisma constitucional, até que ponto a concessão de benefícios e incentivos fiscais relativos ao Imposto de Renda e ao Imposto Sobre Produtos Industrializados pode impactar nos valores transferidos aos Municípios a título de participação na arrecadação daqueles tributos. O tema em debate apresenta singular relevância por afetar pilares do nosso sistema federativo, a saber, a autonomia financeira dos Municípios e a competência tributária da União. Nessas circunstâncias, a discussão assume tamanha importância do ponto de vista econômico, jurídico e político, a exigir a manifestação desta Corte sob o rito da repercussão geral. Ressalte-se, finalmente, que a questão constitucional posta em julgamento revela matéria mais abrangente do que a discutida no RE 572.762/SC, de minha relatoria.” 63 Conquanto o Recurso Extraordinário nº 705.423/SE envolva controvérsia a respeito dos impactos econômicos dos benefícios atinentes ao Imposto de Renda (IR) e ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre as importâncias repassadas aos Municípios, o seu deslinde influirá diretamente no debate acerca da necessidade de os Estados ressalvarem a parcela do ICMS pertencente às Municipalidades quando da outorga de benefícios de natureza tributária. 63 RE 705.423 RG/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 9.5.2013. 19 Afinal, em ambos os casos, o cerne da controvérsia reside na definição dos limites à concessão de incentivos em tributos de receita partilhada. Destarte, espera-se que, com o julgamento deste recurso paradigma, seja desfeita a confusão entre repartição de competências tributárias e partilha de receitas, pondo-se finalmente uma pá de cal na discussão acerca dos limites da repercussão econômica dos benefícios relativos ao ICMS sobre os valores repassados aos Municípios. 6. Conclusões Diante do exposto, conclui-se que a discriminação constitucional de competências tributárias é só um dos mecanismos para a salvaguarda da autonomia financeira dos entes federados, havendo ainda a previsão de participação no produto da arrecadação de tributos de outras unidades da federação. Ademais, o direito à participação no produto da arrecadação não atribui ao ente beneficiado a aptidão para regular o tributo, de modo que as decisões sobre o nível de incidência do gravame continuam a figurar como prerrogativa exclusiva do ente titular da competência tributária. Por conta disso, impõe-se distinguir os incentivos de natureza tributária daqueles de caráter financeiro, pois o direito ao repasse da parcela do produto da arrecadação apenas surge com a extinção da relação jurídico-tributária e a consequente arrecadação, havendo antes disso uma mera expectativa de participação. Com efeito, ao concederem benefícios financeiros relativos ao ICMS, os Estados devem se limitar ao percentual de receitas que lhes pertence de pleno direito (75%), visto que a Constituição Federal estabeleceu um condomínio federativo no plano das receitas, o qual veda aos entes estaduais efetuar reduções na parcela atribuída às Municipalidades depois de arrecadado o imposto. A mais desse fator, importa ressaltar, ainda, que a quota-parte do ICMS reservada aos Municípios (25%) deve lhes ser creditada assim que os recursos ingressem nos cofres públicos, não podendo os Estados reter ou condicionar a entrega dessa verba. Por fim, registre-se que o entendimento firmado no Recurso Extraordinário nº 572.762/SC tem aplicabilidade restrita, podendo ser invocado tão somente quando se tratar de benefício financeiro que provoque a diminuição nos valores a serem repassados aos Municípios a título de participação no produto da arrecadação do ICMS. No caso, resta saber se a concessão de incentivos de natureza tributária pelos Estados também deve se dar com exclusão da parcela do ICMS pertencente aos Municípios, sendo o reconhecimento da repercussão geral no Recurso Extraordinário nº 705.423/SE uma ótima oportunidade para o STF pacificar essa questão. 20