Farmacologia dos Contraceptivos Orais Os contraceptivos orais (CO) constituem uma das mais eficientes formas de contracepção reversível, sendo utilizados por cerca de cem milhões de mulheres em todo o mundo (1).Estes também são amplamente utilizados por diminuir a incidência de amenorreia, ciclos irregulares, sangramentos intermenstruais, anemia ferropriva, tensão pré-menstrual, doenças benignas da mama, fibroides uterinos e cistos funcionais dos ovários(2) . A aplicação mais importante dos estrogênios e progestógenos em combinação é a contracepção. Mostram-se muito eficazes e, quando administrados corretamente, o risco de concepção é pequeno. A taxa de gravidez é estimada em cerca de 0,5 a 1,0 por 100 mulheres/ano de risco. As combinações de estrogênios e progestógenos exercem seu efeito contraceptivo em grande parte através da inibição seletiva da função hipofisária, resultando no bloqueio da ovulação. Os agentes combinados também produzem alteração do muco cervical, do endométrio uterino, da motilidade e da secreção das trompas uterinas, diminuindo, assim, a probabilidade de concepção e implantação (3). A taxa de insucesso dos contraceptivos orais combinados, independentemente do uso concomitante com outros fármacos, é de 1%, quando administrados de forma regular e adequada, ou seja, a medicação deve ser ingerida todos os dias, sempre no mesmo horário, preferencialmente à noite (4). Existem três tipos principais de contraceptivos encontrados no mercado: (1) preparações combinadas de estrógeno e progesterona, com alto, médio ou baixo conteúdo de estrógeno; (2) preparações combinadas com doses variadas de esteroides ao longo do ciclo; (3) preparações únicas de progestogênio, conhecidas como minipílulas. A pílula combinada de estrogênio e progesterona é a mais utilizada, em virtude de apresentar uma melhor eficácia (5). A redução na concentração dos estrogênios e progestógenos tem sido objeto de estudo de muitos pesquisadores, pois existe a possibilidade de ocorrer diminuição do efeito contraceptivo quando do uso concomitante com antibióticos (ATB). Os grupos mais implicados na falha dos CO são anticonvulsivantes, barbitúricos e antibióticos (6). A perda da eficácia contraceptiva com a utilização de ATB ocorre por meio de dois mecanismos. Como a flora gastrintestinal normal aumenta o ciclo êntero-hepático (e a biodisponibilidade) dos estrogênios, os agentes antimicrobianos que interferem nesses microrganismos podem reduzir os níveis do CO e consequentemente sua eficácia. Além disso, a coadministração com potentes indutores das enzimas do metabolismo microssomal hepático, como a rifampicina, pode aumentar o catabolismo hepático dos estrogênios ou dos progestógenos, reduzindo sua meia-vida e também sua eficácia (7). A Rifampicina é o fármaco responsável pelo maior número de casos de interação com os anticoncepcionais, seguido da Amoxicilina, Ampicilina, Fluconazol, Metronidazol e Tetraciclina. Esses últimos fazem parte de uma categoria com pouco relato de interação. Um terceiro grupo de fármacos tem sido descrito – Cefalexina, Clindamicina, Clotrimazol, Dapsona, Doxicilina, Eritromicina, Griseofulvina, Isoniazida, Cetoconazol, Minociclina, Trimetropim, Fenoximetilpenicilina –, porém são raros os casos encontrados, e quando ocorrem, são casos isolados (4). No caso da Rifampicina o mecanismo de interação é a indução de enzimas hepáticas, resultando no aumento do metabolismo do CO, pois a Rifampicina é um potente indutor do sistema microssomal P-450, responsável pelo metabolismo de algumas drogas, incluindo-se o CO (8). A trombose venosa é caracterizada como a formação de coágulos (trombos) no sistema venoso superficial ou profundo, que desencadeia a oclusão total ou parcial da veia (9). Segundo MAFFEI a trombose venosa profunda (TVP) é uma entidade clinica grave, caracterizada pela formação de trombos dentro de veias profundas, mais comum em membros inferiores (80 a 95% dos casos)(10). A TVP pode ocorrer em pacientes sem antecedentes ou predisposição, porém, sua incidência é maior quando há presença de alguns fatores como hipercoagulabilidade, diminuição da atividade fibrinolítica e imobilidade, varizes, idade avançada, obesidade, falência cardíaca, uso de hormônios femininos, dentre outros(11). Os CO e outros métodos que liberam hormônio possuem em sua formulação estrógeno e progesterona que afetam a coagulação sanguínea, pois modificam os níveis plasmáticos de vários fatores da coagulação. Os vasos sanguíneos são alvo dos efeitos desses hormônios, uma vez que existem receptores de estrogênio e progesterona em todas as camadas que constituem os vasos sanguíneos, e como consequências apresentam uma maior chance do desenvolvimento da TVP(12,13).No entanto, essas mudanças são muitas vezes modestas e as concentrações dos fatores de coagulação geralmente permanecem dentro dos intervalos de referência (16). Um estudo realizado em 1998 concluiu que as mulheres que utilizam CO de baixa dose (30 μg de etinilestradiol) apresentam um risco de trombose venosa de 3 a 6 vezes superior que as não consumidoras(14). E segundo Bloemenkampet al., este risco é maior nos primeiros 6 meses e no primeiro ano de utilização do CO, sendo 3 vezes superior nos primeiros 6 meses de utilização e 2 vezes no primeiro ano(15). Inicialmente, o estrogênio foi responsabilizado pela trombose causada pelos CO, entretanto alguns progestagénios demonstraram ter efeitos importantes. Um estudo realizado com mulheres que utilizam CO com desogestrel observou um aumento dos níveis de pró-coagulantes (fatores VII, VIII e X) e diminuição dos níveis de anticoagulantes (proteína S e antitrombina) em comparação com as mulheres sem CO(17). Em uma meta-análise de sete estudos, Kemmerenet al. (2001) encontraram um risco de trombose venosa de 1,7 vezes superior para os CO de terceira geração comparado com os CO que contêm levonorgestrel de segunda geração(18). Podemos concluir que o risco de Tromboembolia venosa em mulheres que utilizam CO depende da dose de estrogênio e do tipo de progestagenio utilizado, e, devido a isso, difere substancialmente entre os vários CO disponíveis no mercado(15,17). 1. SocietyScientific Medicine. 1999; 49(9):1139-55 2. Rang HP, Dale MM, Ritter JM, Moore PK. O sistema reprodutor. In: Farmacologia. 5a.ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2004. p.488-508. 3. Chrousos PG, Zoumakis E, Gravanis A. Hormônios gonodais& inibidores. In: Katzung GB. 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