® BuscaLegis.ccj.ufsc.br Política Salarial – Para Funções Idênticas, Mesma Remuneração. Equiparação Salarial Heloiza Beth Alves Macedo* Sumário: Introdução; 1. Idêntica Função; 2. Trabalho de Igual Valor; 3. Mesmo Empregador; 4. Mesma localidade; 5. Simultaneidade na prestação de serviços; 6. Excludentes da equiparação salarial; Conclusão. Introdução Em primeiro lugar, antes de qualquer digressão acerca do que venha a ser equiparação salarial, insta abordarmos a importância do tema “salário”. Antes da revolução industrial do século XVIII, com a conseqüente mecanização dos meios de produção, o trabalho humano era eminentemente manual, ou seja, artesanal. Com as mãos os homens produziam tudo de que necessitavam. Havia a figura do artesão, ou seja, aquele que detinha não apenas os instrumentos para a produção de todos os bens dos quais necessitava, mas que também detinha o conhecimento de seu ofício. Este ofício era transmitido aos aprendizes que, mais tarde, se tornariam mestres. Citando-se um exemplo desta realidade, vamos imaginar um sapateiro. Antes da revolução industrial o mestre sapateiro detinha os instrumentos de que necessitava para produzir os sapatos, ou seja, pregos, matéria-prima (couro), martelo, fôrmas, e demais instrumentos. Além disso, o mestre sapateiro detinha o conhecimento de como confeccionar um sapato. Como o trabalho era manual, o custo do trabalho certamente era mais elevado, porque para a produção de um único sapato eram necessários vários dias. Ocorre que, com o advento da Revolução Industrial no século XVIII houve uma verdadeira revolução nos meios de produção. Muitas máquinas foram inventadas para ajudar o homem na confecção de vários bens e na prestação de vários serviços. Ocorre que nem todos podiam comprar os equipamentos sofisticados para a feitura dos bens, mas apenas uma classe mais abastada, chamada de burguesia. Com a criação de máquinas, aquele sapato que levava dias para ficar pronto, agora podia ser feito em horas. Alguns burgueses começaram a comprar estas máquinas e colocá-las em determinados lugares, contratando pessoas para que pudessem operá-las. Com o surgimento das fábricas, o artesão foi sendo esquecido e perdendo mercado de trabalho, posto que, agora, os produtos eram feitos em muito menos tempo e a um custo muito mais baixo. Era a famosa “produção em série”. Diante deste novo quadro social que surgia, o artesão foi obrigado a vender sua força de trabalho e seu conhecimento ao capitalista, detentor dos meios de produção, meios estes entendidos como as máquinas e equipamentos. Assim surge o salário, ou seja, a contraprestação paga àquele que vendia sua força de trabalho para o capitalista (dono da empresa) que detinha os meios e instrumentos de produção. O salário existe porque, de um lado, temos o detentor dos meios de produção, que não tem o conhecimento necessário para a produção do bem, ou que, mesmo tendo referido conhecimento não pode, sozinho, operar todos os instrumentos e meios de produção e, de outro, o empregado que, não detém os meios de produção, mas que precisa vender sua força de trabalho ao capitalista. Assim, surgiu este quadro de simbiose capitalista (na realidade muito mais de parasitismo capitalista), no qual, de um lado, uma das partes necessita de mão-de-obra para a produção de bens, e de outro, uma parte que precisa trabalhar para poder sobreviver e adquirir outros bens de que necessita à sua subsistência. E assim surgiu a divisão social do trabalho. E como decorrência desta divisão social do trabalho, houve a especialização dos trabalhadores em diversas funções dentro dos mais variados setores da indústria. Ocorre que, no início, mais especificamente quando da Revolução Industrial, os trabalhadores eram explorados, com jornadas de trabalho extenuantes e extremamente longas. Referidas jornadas de trabalho variavam de 14 (catorze) a 16 (dezesseis) horas diárias. Além disso, utilizava-se a mão-de-obra de mulheres e crianças, que eram exploradas, uma vez que recebiam salários muito inferiores aos dos homens, cumprindo as mesmas longas jornadas de trabalho. Cientes destas situações, os trabalhadores começaram a se organizar e a reivindicar melhores condições de trabalho, como jornadas mais curtas, repouso semanal, salários mais justos consentâneas com as exigências de casa profissão. Atualmente, uma das conquistas dos trabalhadores é a figura da equiparação salarial, ou seja, para funções idênticas, mesma remuneração. Isto significa que, empregados que desempenham a mesma função, devem receber o mesmo salário, em respeito ao princípio constitucional da igualdade. A Constituição Federal em seu art. 7º, XXX, proíbe a desigualdade salarial, defendendo o princípio de que para todo trabalho igual pressupõe salário igual, como podemos observar com a simples leitura do dispositivo abaixo transcrito: “Art. 7º ... XXX - proibição de diferença de salários, de excercicio de função e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”. No intuito de garantir a isonomia salarial, o art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê o instituto da “Equiparação Salarial”, que disciplina a igualdade de salário para empregados que desempenham a mesma função. Entretanto, para falar do assunto, devemos analisar alguns requisitos, dentre eles a figura do “paradigma” que é indispensável. O “paradigma” é aquele empregado que serve de modelo em caso de pleitear judicialmente a igualdade de salário, ou melhor, é o empregado que exerce a mesma função do equiparando e que, no entanto, recebe salário superior a este, portanto, servirá de “espelho” ao pleitear-se a devida equiparação de salário. A falta de indicação do paradigma na reclamação trabalhista impossibilita o julgador de analisar o caso, assim como a indicação de mais de um modelo dificulta o exame da pretensão, por essa razão deverá o reclamante indicar somente um paradigma. Além da figura do “paradigma”, existem outros requisitos cumulativos que são de suma importância ao analisar o instituto da equiparação salarial, conforme preceitua o art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, senão vejamos: “Art. 461. Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.” Assim, passemos à análise de cada um dos pressupostos para a isonomia: 1. Idêntica Função Quando se fala em identidade de função é bom se ter em mente que não importa o cargo exercido pelo paradigma e pelo equiparando, ou seja, o nome dado ao cargo ou mesmo à anotação feita na CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social) do obreiro, pouco tem relevância para a definição de equiparação. O que deve se levar em conta é a tarefa desempenhada por ambos, ou seja, o que efetivamente tem importância é a realidade dos fatos, portanto, função é a atividade que o obreiro desempenha. 2. Trabalho de Igual Valor Conforme dispõe o § 1º do art. 461 da CLT, trabalho de igual valor “será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço não for superior a dois anos”. Portanto, como conceituado acima entendemos que igual produtividade corresponde a produção, ou melhor, a quantidade, enquanto que perfeição técnica, quer dizer a mesma qualidade, ou seja, o equiparando deverá produzir na mesma quantidade e com a mesma qualidade que seu paradigma. Pode acontecer do equiparando não conseguir produzir com a mesma quantidade ou qualidade produzida pelo seu paradigma, deve-se nesse caso observar 2 (duas) hipóteses: a primeira é se a culpa é única e exclusiva do reclamante, por desinteresse deste; e a segunda hipótese se a culpa não é do empregador por não oferecer condições ao reclamante de produção igual a do seu paradigma, para isso, será de suma importância uma análise detalhada do local de trabalho, examinando o equipamento utilizado pelo equiparando e o equipamento utilizado pelo paradigma, caso exista uma determinada máquina para a produção do produto. É certo que, em uma indústria onde se fabrica solas para calçados, por exemplo, a máquina utilizada para a confecção desse produto são as injetoras, verifica-se que o equiparando produz uma quantidade pequena de solas em um determinado espaço de tempo, enquanto que o paradigma no mesmo tempo gasto pelo equiparando produz uma quantidade bem maior de solas, necessário nesse caso saber se a tecnologia de ambos os equipamentos é a mesma. Pois, pode ocorrer de em uma mesma empresa os equipamentos de produção ter tecnologia mais avançada do que outros, o que permite uma produção bem maior e com melhor perfeição técnica em um curto espaço de tempo. Importante ressaltar, que a diferença de tempo de serviço entre paradigma e equiparando não pode ser superior a dois anos. Conta-se esse tempo na função e não no emprego, conforme entendimento Sumulado pelo TST e STF (Súmula nº.6, II do TST) e (Súmula nº. 202 STF). 3. Mesmo Empregador Outra exigência para o deferimento da equiparação salarial é de que o equiparando e o paradigma preste serviços ao mesmo empregador. Temos como conceito de empregador a pessoa “que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirigi a prestação pessoal de serviços, conforme redação dada pelo art. 2º da CLT.” Também pode considerar como mesmo empregador todas as empresas que compõe um mesmo grupo econômico, assim conceituado no § 2º do art. 2º da CLT. Entretanto, deve-se ter em mente que o equiparando e o paradigma podem trabalhar na mesma empresa e, no entanto, ter como empregador pessoas distintas. Citamos o exemplo do equiparando trabalhar para empresa de trabalho temporário e o paradigma presta serviços diretamente para a empresa tomadora de serviços, no caso em tela não admite o instituto da equiparação salarial, pois nesse caso o equiparando é subordinado à empresa de trabalho temporário embora preste serviços à empresa tomadora, enquanto que o paradigma é subordinado a empresa tomadora de serviços. O que pode e deve existir é o equiparando receber remuneração equivalente a do empregado contratado diretamente pela empresa tomadora, ou seja, deve ser pago ao empregado temporário o mesmo salário pago por serviço semelhante. 4. Mesma localidade Para ter direito a equiparação salarial é necessário que a prestação dos serviços seja na mesma localidade. Como mesma localidade entende-se a mesma cidade ou mesmo município, essa importância deve-se ao fato de que a realidade socioeconômica das cidades são diferentes, o que justifica a variação salarial. Vamos imaginar a seguinte situação: uma empresa com filiais na Capital de São Paulo e em Campinas, cidade localizada no interior de São Paulo, que tenham empregados desempenhando a mesma função e recebendo salários diferentes, essa hipótese não possibilita a equiparação salarial, pois é evidente que o custo de vida não é o mesmo, daí surge a necessidade de um maior salário para as localidades nas quais o custo de vida é elevado. 5. Simultaneidade na prestação de serviços Outro requisito importante é que haja simultaneidade na prestação de serviços entre equiparando e paradigma. Entretanto, é desnecessário que na época da propositura da reclamação sobre equiparação salarial, o reclamante ainda esteja trabalhando para o mesmo empregador, o que importa, no entanto, é que o pleito esteja se referindo a situação pretérita, decisão esta dada pelo TST, súmula nº. 22 . 6. Excludentes da equiparação salarial Demonstrado os requisitos indispensáveis à propositura da reclamação sobre o instituto da equiparação salarial, vale ressaltar ainda as hipóteses que impedem a equiparação, que é o caso de haver quadro organizado em carreira e empregado readaptado por doença, conforme dispõem os §§ 2º e 4º do art. 461 da CLT, respectivamente. A existência de quadro organizado em carreira deve necessariamente ser homologada pelo Ministério do Trabalho, observando ainda as promoções que “deverão ser feitas alternadamente por merecimento e por antiguidade, dentro de cada categoria profissional”, conforme dispõe o § 3º, do art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, excluindo-se, apenas, dessa exigência o quadro de carreira das entidades de direito público da administração direta, autárquica e fundacional aprovado por ato administrativo da autoridade competente. A segunda causa que impede a equiparação é o empregado escolhido como paradigma encontrar-se readaptado em nova função por motivo de doença declarada pela previdência social. Por fim, o fato do empregado indicado como paradigma ter sido anteriormente beneficiado por ação judicial que ocasionou o desnível salarial é irrelevante, salvo se decorrente de vantagem pessoal ou de tese jurídica superada pela jurisprudência de Corte Superior, entendimento do TST, Súmula 6, VI. Finalmente, quanto ao ônus da prova, o entendimento é do TST, súmula n. 6, item VIII que diz: “É do empregador o ônus da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação salarial”. Cabendo, portanto, ao reclamante provar o exercício da mesma função, enquanto que o empregador deverá provar menor produtividade ou falta de perfeição técnica do equiparando, tempo de serviço superior a dois anos, ou a existência de quadro organizado em carreira no seu estabelecimento. Conclusão Pelo acima exposto, percebe-se que pelo principio constitucional da isonomia, dentro do âmbito do direito do trabalho, atendidos os requisitos contidos no art. 461 da CLT, trabalhadores que se encontram exercendo a mesma função fazem jus a mesma remuneração. *Advogada em Birigui/SP, com pesquisa na área do Direito do Trabalho. Disponível em: < http://www.casajuridica.com.br/?f=conteudo/ver_artigo&cod_artigo=162 >. Acesso em: 02 jul. 2007