Pasteurização do leite da própria mãe não reduz
a incidência da sepse tardia
Pasteurization of Mother’s Own Milk for Preterm Infants Does Not Reduce
the Incidence of Late-Onset Sepsis
Veerle Cossey; Chris Vanhole; An Eerdekens; Maissa Rayyan;Steffen Fieuws; Annette
Schuermans
Neonatology 2013;103:169-175
Apresentação: Daniel Pinheiro Lima; Guilherme Ferreira Almeida; Paulo
Ferraresi, Guilherme Prata
Coordenação: Paulo R. Margotto
www.paulomargotto.com.br
Brasília, 23 de fevereiro de 2013
Ddos Guilherme Prata, Paulo Ferraresi, Guilherme Ferreira
Almeida; Daniel Pinheiro Lima
ESCS!
 Assim que as taxas de sobrevivência dos pré-termo aumenta,
mais atenção se focaliza na qualidade da sobrevivência através de
um ótimo manuseio nutricional;
 O leite humano  padrão ouro; diminui o risco de sepse
tardia que ocorre em 16-36% nos recém-nascidos (RN) de muito
baixo peso (<1500g ao NASCER)
 Sepse tardia  16-36% dos RNMBP;
 Poucos estudos acerca da relação: alimentação x sepse tardia.
 Leite humano  microbiota e imunidade;
 No entanto o leite materno não é estéril  veículo para
microorganismos patogênicos (derivados da mãe ou do
ambiente durante a coleta, estocagem e manuseio do leite)
 Os microrganismosa relacionados à infecção pelo leite
materno incluem: Staphylococcus aureus, Streptococcus do
Grupo B, Eschericia coli, Serratia spp, Pseudomonas spp,
Salmonela spp, HIV e citomegalovirus
 Para neutralizar qualquer contaminação  pasteurização;
 No entanto, a pasteurização afeta negativamente a qualidade
nutricional e imunológica.
 Investigar se a pasteurização do leite da própria mãe
para os recém-nascidos de muito baixo peso influência
na incidência e severidade da infecção durante a per e
permanência na UTI Neonatal
Hipótese: infecções relacionadas aos benefícios do
leite humano são diminuídas pelo processo de
pasteurização.
 Pacientes selecionados:
 Todos os pacientes admitidos na UTIN do Hospital da
Universidade de Leuven (Bélgica) nascidos em até
24h:
Idade gestacional (IG) inferior a 32 semanas
 Peso < 1500g

 Excluídos pacientes que morreram em 24h
Crianças foram distribuídas aleatoriamente usando
envelopes numerados sequencialmente e selados, para
receber leite próprio da mãe cru ou pasteurizado
Duração do estudo do nascimento a 8 semanas ou
alta da UTI
Distribuição dos pacientes
 Procedimentos do estudo:
 Os bebês receberam leite da própria mãe
pasteurizado, em frascos selados aquecidos a 62,5 ° C
durante 30 min com um pasteurizador TES Sterifeed
S75.
 Ou receberam leite cru fresco ou congelado da própria
mãe
 Leite cru “contaminado” → temporariamente
suspenso e substituído por leite artificial
 Se após orientações maternas ainda persistiu, o leite
foi pasteurizado
 Medidas de resultado
 Critério de avaliação primária foi a incidência de
sepse tardia (com mais de 48 hs de vida)
comprovada, com:
Crescimento de agente ou Staphylococcus coagulase
negativo em cultura de sangue juntamente com
aparecimento súbito de dois ou mais sinais clínicos
predefinidos e (somente para o Staphylococcus coagulase
negativo) um parâmetro laboratorial de infecção sistêmica
 O sistema de detecção microbiana BacT/ALERT
(bioMérieux, Marcy l'Etoile, França) foi utilizado

 Os desfechos secundários foram:
 a incidência de sepse clínica avaliada como um
episódio de tratamento antimicrobiano por pelo
menos 5 dias na presença de sinais clínicos;
 sítio de infecção que não seja a corrente sanguínea,
 taxa de utilização de antibióticos;
 ECN (enterocolite necrosante) estágios II e III de
acordo com a modificação critérios de Bell;
 leucomalácia periventricular ou hemorragia
intraventricular, excluindo hemorragia grau I;
 necessidade de suporte respiratório,
 doença pulmonar crônica definida como a
necessidade de suplementação de oxigênio com 36
semanas de idade corrigida;
 retinopatia da prematuridade,
 tempo de permanência em UTI e
 mortalidade na UTIN.
Foram comparados os dois grupos de estudo com
relação a variáveis nutricionais como a idade em
alimentação enteral e ganho de peso.
 Análise estatística
 Dados originais retrospectivos indicaram que a
incidência de sepse tardia foi de 40% entre os
nascidos prematuros que receberam leite artificial
 Para detectar, com um pode de 80%, uma diminuição
absoluta de 15% em sepse tardia, 152 lactentes por
grupo foram necessários com base em um teste de
χ²(com α de 5%).
 Teste exato de Fisher foi utilizado para comparar a
proporção de infecções entre os dois grupos, relatando
a taxa de eventos bruto.
 Análise estatística
 Um modelo de regressão de Cox, com covariáveis
dependentes do tempo foi utilizado para verificar a
relação entre a alimentação entérica ou LM e o risco
de sepse tardia.
 Valores de p considerados significativos se < 0,05.
 As análises foram realizadas utilizando o software
SAS, versão 9.2 do SAS System for Windows (2002,
SAS Institute Inc.). CIs exata foram obtidos com
StatXact-9.
 303 recém-nascidos de muito baixo peso
 24 RN do grupo do leite no estado natural tiveram
seu leite pasteurizado tardiamente;
 Sem diferenças significativas em relação a IG, peso e
Apgar (tabela 1)
Tabela 1.Características básicas da população estudada
Grupo do leite cru
Grupo pasteurizado


61 episódios de sepse em 53 pacientes (tabela 2)
Poucos pacientes que receberam leite materno cru apresentaram
sepse confirmada em relação aos pacientes que receberam leite
materno pasteurizado 22 de 51 versos 31/152 (RR:0,71; IC:0,43-1,17)

A idade do início da sepse tardia foi semelhante entre os dois
grupos, com 72%  ocorrendo entre 7 e 21 dias de vida;
A sepse clínica ocorreu mais no grupo que recebeu leite
pasteurizado 9RR:0,76;ic A 95%:0,48-1,22)
Sem diferença entre os grupos quanto à ocorrência de infecção em
outros sítios ou para o uso de antibióticos



ECN grave  7,3%, sendo casos cirúrgicos relacionados aos que
receberam leite pasteurizados.
Tabela 2-Desfechos clínicos por grupo de nutrição com o leite materno
Grupo do leite cru
Grupo pasteurizado
 51
foram devido a Staphylococcus coagulase
negativa, 9 a S. aureus e 01 a Klebsiella oxytoca;
 Staphylococcus epidermidis foi o principal agente
patogênico;
 De 473 amostras de leite no estado natural, 98,3%
apresentaram
crescimento
bacteriano,
principalmente por Staphylococcus coagulase
negativa isolados (em 81% das amostras com
crescimento).
 Não houve diferenças significativas no uso de antibiótico, na
duração do suporte respiratório, de hemorragia
intraventricular ou leucomalácia periventricular, ou
retinopatia cirúrgica;
 Poucos pacientes no grupo do leite cru apresentou doença
pulmonar crônica (16 versos 24%-p=0,13)
 A duração média de internação  <8 dias para os que
receberam leite materno cru (p=0,36)
 Não houve diferença em relação a nutrição e ao crescimento
 A tabela 3 mostra os resultados relacionados a nutrição
e crescimento
 Entre os RN que alcançaram a dieta enteral plena, o
que usaram leite materno cru da própria mãe o fizeram
na idade mediana de 17 dias (13-25) e no grupo do leite
pasteurizado (19 dias-14-25) (p=0,17)
 Não foram observadas diferenças no crescimento entre
os dois grupo ( houve recuperação do peso ao nascer
aos 11 dias e a média de ganho de peso foi de
20±11g/k/peso/dia
Tabela 3. Resultados nutricionais por grupo de alimentação com leite humano
Grupo do leite cru
Grupo do leite cru
Grupo pasteurizado
Grupo pasteurizado
 Foi observada uma relação significativa dose-
resposta entre a quantidade (por/kg) ajustada de
alimentação fornecida e o risco de sepse comprovada
(tabela 4)
A mesma observação foi feita para o leite humano:
RN recebendo maiores quantidades de leite humano
tiveram menor risco de sepse
Para cada aumento de 10 ml por kg de leite
materno por dia, o risco de sepse diminuiu por
12%.
Tabela 4.Risco provável de sepse tardia de acôrdo com as várias quantificações do leite humano
Todos os pacientes
Grupo do leite cru
Grupo pasteurizado
Grupo do leite cru
Grupo pasteurizado
Hazard ratios e intervalos de confianças são obtidos do modelo de Regressão
de Cox com a quantificação do leite humano ingerido
Como uma covariável tempo-dependente
Os efeitos são expressos por 10mm/kg/dia
Como interpretar HAZARD RATIO?
Consultem:
Estatística computacional: Uso do SPSS - o essencial
Autor(es): Paulo R. Margotto
 Medida de associação equivalente ao Risco
Relativo/Odds Ratio, utilizada em estudos de análise
de dados de sobrevivência/aparecimento de eventos. O
método de Kaplan-Meier consiste em dividir o tempo
de seguimento em intervalos, cujos limites
correspondem ao tempo de seguimento em que houve
eventos. Nestes tipo de estudos, a análise de regressão
multivariada é a Regressão de Cox que gera a medida
de associação hazard ratio (interpretação semelhante
ao risco relativo e odds ratio)
 Neste ensaio, os autores avaliaram os efeitos da
pasteurização do leite da própria mãe comparado com
o leite cru da própria mãe nos eventos relacionados à
infecção nos recém-nascidos de muito baixo peso
A taxa de sepse tardia foi menor para os RN que
receberam leite materno cru em comparação aos RN
que receberam leite materno pasteurizado (RR:
0,71;IC a 95%:0,43-1,17) (sem significância estatística).
Devido a baixa incidência de sepse tardia nos grupos
estudados, o estudo não teve suficiente poder para
detectar diferença clinicamente relevante para este
resultado primário
Por isto, a nutrição enteral com o leite pasteurizado aumentou
o risco de sepse tardia em 41%:
Entenda por quê:
OBSERVAÇÃO: Marta David Rocha
Moura e Paulo R. Margotto
Por que o aumento do risco de sepse tardia de 41%
com o leite humano pasteurizado?
 Esse 41% se refere o aumento de casos de sepse tardia
no leite pasteurizado. Assim, a incidência de sepse no
grupo de leite cru foi 22/151 ou 15% e no pasteurizado
31/152 ou 20% . A diferença de 9 casos entre os grupos
representa um aumento de 41% dos casos e assim é
calculado:
 22 100
 31
x
 X = 31 x 100 / 22 = 40,9 ou arredondando 41%
Outros achados favorecem o uso do leite humano cru versos leite
humano pasteurizado
-menor tempo de permanência na UTI Neonatal (por 8 dias)
-ausências de enterocolite necrosante cirúrgica
-tendência a menos doença pulmonar crônica
Este é o primeiro estudo que compara desfechos com o uso do leite
humano cru versos leite humano pasteurizado
Outros estudos compararam leite humano com fórmula no risco de
infecção
(Schanler et al, 2005:243 prematuros extremos alimentados leite
humano pasteurizado de doadora ou fórmula, ambos substitutos para o
leite humano)
-falha no efeito protetor do leite de doadoras na incidência
combinada de sepse tardia e/ou enterocolite necrosante em relação à
fórmula
-em contraste, o leite humano da própria mãe cru foi protetor
para sepse tardia
Ambos os leites apresentam uma dose-resposta efetiva; a maior
quantidade de nutrição enteral correspondeu a menor incidência de
infecção
Elevadas taxas de sepse tardia associadas com uso de leite
humano pasteurizado pode ser explicada por alguns
motivos:
 O processo de pasteurização afeta negativamente a qualidade do
leite pela destruição parcial de imunocomponentes e perda
parcial da atividade bactericida
 A colonização precoce do intestino pode ser afetada se bactérias
não patogênicas maternas e componentes bifidogênicos são
destruídos pelo calor, levando a uma microbiota intestinal mais
virulenta, com aumento de risco de infecção sistêmica pela
translocação bacteriana
 Não houve diferenças entre o ganho de peso e intolerância
alimentar entre os dois grupos (em ambos os grupos foi usado
fortificante do leite humano)
Outros estudos (Schanler et al-referência 9;Andersson et alreferência 12) relataram menor ganho de peso com o uso de leite
humano pasteurizado
Limitações:
-Não foi possível um completo cegamento dos grupos
-Amostra pequena para avaliar comorbidades com menor
incidência, como enterocolite necrosante e retinopatia da
prematuridade
 Fornecer leite da própria mãe
pasteurizado ao
recém-nascido de muito baixo peso durante a sua
internação na UTI Neonatal é uma intervenção que
não melhora os resultados relacionados à infecção.
Com base nos resultados do presente estudo,
PARECE
APROPRIADO
NÃO
INCLUIR
A
PASTEURIZAÇÃO quando se aplicar estratégias para a
redução de morbidades relacionadas a infecções a curto
prazo
 Atenção para coleta, armazenagem e rotulagem dos
procedimentos deve ser enfatizada para garantir a
segurança e qualidade do leite coletado.
MENSAGEM
LEITE DA PRÓPRIA MÃE CRU
PARA O SEU PRÉ-TERMO NA
UTI NEONATAL
(um trabalho diuturno
de toda a Equipe!)
Para os recém-nascidos pré-termos, a pasteurização do leite da própria mãe,
mostra uma tendência ao aumento de infecção, embora sem
alcançar significação estatística. Práticas deveriam se concentrar na coleta,
estocagem e rotulação, para garantir segurança e qualidade
do leite ordenhado
Consulte artigo integral, Aqui e
Agora!
 Randomized trial of donor human milk versus
preterm formula as substitutes for mothers'
own milk in the feeding of extremely premature
infants.
 Schanler RJ, Lau C, Hurst NM, Smith EO.
 Pediatrics. 2005 Aug;116(2):400-6.
 PMID:
 Free Article
 Related citations
Transmissão do
Citomewgalovirus aos recémnascidos pré-termos pelo leite
materno. Devemos nos
preocupar?
Miron D, Brosilow S, Felszer
D., Halle D, Wachtel D,
Eidelman A, Schlesinger Y
(Israel) e Schanler R (EUA)
CMV acquisition in premature infants fed human milk: reason to worry?
Schanler RJ. J Perinatol. 2005 May;25(5):297-8. Artigo Integral!
 Segundo Schanler, comentando o artigo, o estudo de Miron et al e outros estudos
prévios indicam que a aquisição da infecção pelo CMV pelo leite humano em
RN pré-termos não está associado com aumento significativo na
sintomatologia. No follow-up também não se identificou déficit no
desenvolvimento, assim como déficit auditivo (o estudo de Volmer e cl,
estendeu-se de 2 a 4,5 anos: Postnatally acquired ctomegalovirus infection via
breast milk-effects on hearing and development in preterm infants. Pediatr
Infect Dis 2004; 23:322-7).
 No entanto, segundo Schanler , como neonatologista, devemos nos preocupar a
respeito da aquisição do CMV a partir do leite materno? A “deterioração
clínica” sugerida, mas não comprovada estatisticamente por vários estudos parecem
não ter implicações a longo prazo. Devemos trocar os benefícios do leite
humano (redução da sepse, da enterocolite necrosante em 50%), para zero a
25% de chance de “deterioração clinica”? Os benefícios do leite humano em
prematuro tem sido identificados tanto com o uso do leite humano fresco como
leite humano congelado.
Leite materno e a
regulação intestinal e
pulmonar no recémnascido
Jaques Belik (Canadá).
Realizado por Paulo R.
Margotto
 Nesta Palestra é enfocado o papel da tetrahidrobiopterina (BH4), um cofator
presente no leite humano (e AUSENTE NAS FÓRMULAS) importante para o
funcionamento da enzima sintetase endotelial (e-NOS) do óxido nítrico, na geração
do óxido nítrico (NO). A deficiência do BH4 leva ao não acoplamento da e-NOS e
ao invés de produzir o NO, vai produzir o superóxido que vai gerar o peroxinitrato e
isto leva a diminuição da vasodilatação; o peroxinitrato, leva a remodelação vascular.
A falta de BH4, em estudos animais, leva á produção de hipertensão pulmonar.
 A nível intestinal, o BH4 exerce importante papel protetor para a enterocolite
necrosante. Há um aumento da geração de óxido nítrico no leite humano a partir
do primeiro dia ao 4º dia e há uma similaridade entre o pico de NO e o nível de BH4.
Ao comparar a concentração de BH4 no colostro e com a fórmula, foi observado que
as fórmulas usadas no Canadá não tem nenhum BH4 e o leite materno tem 500
vezes mais. Assim, a possibilidade do leite materno proteger a ECN com base no
BH4 é real, pela facilitação da vasodilatação intestinal. O leite materno, além de
conter BH4, contem arginina que é o substrato para geração do NO. Parece haver
áreas perfusão watershed no intestino que poderia ser de risco para lesão por
isquemia e reperfusão. Portanto, o padrão anatômico da vasculatura intestinal tem
muito a ver com a predisposição do RN a enterocolite necrosante: a vasoconstricção
e isquemia são um elementos importantes neste processo.
 E a pasteurização destruiria o BH4? A literatura não mostra nenhuma evidência
para este fato. Pergunta enviada ao Prof. Belik ([email protected])assim me
respondeu: Eu creio que a pasteurização destrói o BH4, mas seria importante
confirmar isto. Há muito tempo que estou querendo obter dados a respeito aqui em
Toronto, já que todo o nosso leite vindo do Banco de Leite é pasteurizado.
Ddo Guilherme Prata, Dr. Paulo R. Margotto, Ddo. Paulo Ferraresi,
Ddo. Daniel Pinheiro Lima, Ddo. Guilherme Ferreira Almeida;
ESCS!
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