1 UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA FACULDADE DE DIREITO DIREITO DAS CIDADES PROF. JOSEMAR ARAÚJO – [email protected] FOLHA DE APOIO 02 quanto das funções sociais da propriedade urbana. São coisas diversas. Enquanto nas funções sociais da cidade devem ser desenvolvidos os setores que resultam das demandas primárias e secundárias da coletividade, a função social da propriedade urbana reflete a adequação da propriedade à ordem urbanística estabelecida no plano diretor. Breve História do Estatuto da Cidade Objetivos da Política Urbana Brasileira Antes da Constituição de 1988, várias leis sobre matéria urbanística foram editadas, embora sempre tratando isoladamente de temas específicos relacionados aos problemas das cidades. É o caso, por exemplo, da Lei no 6.766, de 19.12.79 (Lei Lehmann), que disciplina o uso e o parcelamento do solo urbano. Ainda sob a égide da Constituição anterior, o Executivo apresentou o Projeto de Lei no 775/83, que pretendeu definir o sentido de “função social da propriedade”, constante de mandamento constitucional. Referido projeto foi retirado pelo Executivo e em seu lugar foi apresentado substitutivo, o Projeto de Lei Nº 2.191/89, do Deputado Raul Ferraz – primeiro projeto sobre a matéria apresentado sob a égide da Carta vigente. Posteriormente, foi apresentado no Senado o Projeto de Lei no 5.788/90, de autoria do então Senador Pompeu de Souza, e este, depois de longo percurso, no qual foram introduzidas várias alterações, acabou por converter-se na Lei no 10.257. É, portanto, o referido diploma legal – autodenominado de Estatuto da Cidade em seu art. 1o, parágrafo único e única lei, aliás, a qualificar-se a si própria como “estatuto” – que atualmente estabelece as diretrizes gerais no que toca à política urbana. Carvalho filho afirma que são dois os objetivos da política urbana: 1o) o desenvolvimento das funções sociais da cidade; 2o) o desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana. E acrescenta que a Lei Nº 10.257/01 guarda consonância com os parâmetros da modernidade em termos urbanísticos, todos esquecidos pelo ordenamento jurídico até agora vigente. “O Estatuto da Cidade representa, sem dúvida, um passo marcante em matéria urbanística, que estivera pouco lembrada e tratada no Brasil desde as décadas de 60 e 70 do século XX, Competência Legislativa A competência para legislar sobre Direito Urbanístico e para produzir atos administrativos é dividida entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. A legislação sobre o assunto se difunde por numerosas normas constitucionais e legais, complementadas por outros tantos atos administrativos infralegais. Ao atentarmos para a demarcação decorrente do sistema de partilha de competências adotado na vigente Constituição, encontramos normas urbanísticas na esfera, privativa ou concorrente, de todas as entidades federativas. Política Urbana. Carvalho Filho define política urbana como o conjunto de estratégias e ações do Poder Público, isoladamente ou em cooperação com o setor privado, necessárias à constituição, preservação, melhoria e restauração da ordem urbanística em prol do bem-estar das comunidades. Assinala que as estratégias se compõem de planos, projetos e programas especiais ligados à ordem urbanística. As ações indicam a efetiva atuação concreta do Poder Público. Este, por sua vez, pode atuar sozinho, investido em seu ius imperii, como ocorre frequentemente, mas nada impede e, ao revés, tudo aconselha a que os propósitos urbanísticos tenham a participação das coletividades, inclusive porque são elas também titulares de interesses ligados ao fenômeno urbanístico. O Estatuto da Cidade, aliás, faz expressa referência a tal possibilidade. Competência da União 1a) instituição de diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos (art. 21, XX); 2a) fixação de princípios e diretrizes para o sistema nacional de viação (art. 21, XXI); 3a) elaboração e execução de planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social (art. 21, IX); 4a) legislar sobre normas gerais de Direito Urbanístico (art. 24, I c/c § 1o); 5a) edição de normas com as diretrizes gerais para a política de desenvolvimento urbano (art. 182, caput); 6a) edição de lei reguladora da atuação municipal para adequação do solo urbano ao plano diretor (art. 182, § 4o). Competências do Estado Ordem Urbanística Quanto à ordem urbanística, constitui ela o alvo de todas as estratégias integrantes da política urbana, de modo que todos os esforços públicos e privados devem objetivar a sua formação, onde ainda não estiver implantada; a sua preservação, onde já estiver formada; a sua melhoria, quando maiores puderem ser os elementos de satisfação dos interesses gerais; e sua restauração, quando tiver sido rompida por evento nocivo ao interesse público. Permeando-se os diversos dispositivos contidos no Estatuto, verifica-se que seu objetivo mais amplo foi o de fixar as principais diretrizes do que especialistas têm denominado de meio ambiente artificial, para distinguilo do meio ambiente natural – este oriundo diretamente da natureza sem a participação da atividade do homem. Carvalho Filho ressalta ainda que está contido no conceito o bem-estar das comunidades, visto que toda a política urbana tem como direção, afinal, o atendimento ao interesse público. Direito de Propriedade O Direito de propriedade não mais representa um direito absoluto e intangível como o foi em épocas pretéritas. A Constituição a menciona no caput do art. 5o e no inciso XXII, neste caso assegurando de modo peremptório: “é garantido o direito de propriedade”. Contudo, ao mesmo tempo em que assegura o direito, a Carta assinala: “a propriedade atenderá a sua função social” (inc. XXIII). Numa interpretação conjugada dos postulados, ter-se-ia como que a afirmação: “é garantido o direito de propriedade desde que atenda a sua função social”. O atendimento da função social, por conseguinte, estampa verdadeira condição para a garantia do direito. De fato, para garantir o bem-estar da população, a política urbana deve ser direcionada tanto ao desenvolvimento das funções sociais da cidade 1a) suplementar a legislação federal e estadual urbanística, quando couber (art. 30, II); 2a) promoção do adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (art. 30, VIII); 3a) estabelecimento da política de desenvolvimento urbano, observadas as regras da lei federal (art. 182, caput); 4a) elaboração do plano diretor, obrigatório para cidades de mais de vinte mil habitantes (art. 182, § 1o); 5a) exigibilidade, em face de proprietários do solo urbano, de adequação de sua propriedade imobiliária ao plano diretor da cidade (art. 182, § 4o); 6a) aplicação das medidas punitivas de parcelamento e edificação compulsórios; IPTU progressivo no tempo; e desapropriação urbanística sancionatória (art. 182, § 4o, I a III). Competências do Distrito Federal Não pode ser dividido em Municípios, conforme vedação contida no art. 32 da CF. A Constituição enuncia que a ele caberão as competências estaduais e municipais cumulativamente, conforme está consignado no art. 32, § 1o. O Estatuto da Cidade estabeleceu, no art. 3o, a competência da União para as atribuições de interesse da política urbana, repetindo em parte o que a Constituição já assinala. É o caso dos incisos I (legislar sobre normas gerais de direito urbanístico); IV (instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos); e V (elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social), correspondentes, respectivamente, aos arts. 24, I, 21, XX, e 21, IX, da Constituição. Além dessas competências, fixou ainda a de legislar sobre normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios no que tange à política urbana, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional (inc. II), sendo essa competência fundada no art. 23, parágrafo único, da CF, que, aliás, prevê lei complementar para a cooperação em geral entre as referidas entidades. 2 título ou ajuizar a Ação cabível. Não se confundem, em matéria ambiental, as figuras da transação e do compromisso. Direitos Transindividuais Urbanísticos Homologação Primeiramente, podemos fazer referência aos direitos difusos. Para muitos, fazem parte dos direitos de terceira geração, juntamente com os direitos coletivos e com os direitos individuais homogêneos. Os direitos difusos não pertencem a ninguém individualmente e pertencem a todos coletivamente. Um típico exemplo é o ar atmosférico. O direito difuso é transindividual, tendo um objeto indivisível e titularidade indeterminada, interligada por circunstâncias de fato. São transindividuais porque ultrapassam a mera esfera individual de direitos e obrigações. São indivisíveis porque não podem ser cindidos, pertencem a todos coletivamente e a ninguém individualmente. São de titulares indeterminados porque não há como determinar seus sujeitos, é o caso do ar poluído, todos são titulares do direito ao ar puro. Todos estão interligados por uma circunstância fática, inexiste uma relação jurídica. Para a validade da homologação do compromisso de ajustamento de conduta às exigências legais, são exigidas: Necessidade da integral reparação do dano, por tratar-se de direito indisponível; Indispensabilidade de total esclarecimento dos fatos, de maneira a ser possível a identificação das obrigações a serem estipuladas; obrigatoriedade da estipulação de cominações para a hipótese de inadimplemento; Anuência do Ministério Público, quando não seja autor. As regras pelas quais tramita em juízo a Ação Civil Pública estão disciplinadas no Código de Processo Civil, com as especificidades da Lei 7347 de 1985. O Estatuto da Cidade e a Ação Civil Pública Direitos Coletivos são os transindividuais de natureza coletiva de que sejam titulares grupo, categorias ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. Diferem-se dos direitos difusos em razão da determinabilidade dos titulares. Ainda que em um primeiro momento não seja possível determinar todos os titulares, estes são identificáveis posteriormente. Nos direitos coletivos, essa indivisibilidade está restrita à categoria, ao grupo ou à classe titular do direito, de forma que a satisfação de um só, implica a satisfação de todos e a lesão de um só, implica a lesão de todos. Por fim, os Direitos Individuais Homogêneos caracterizam-se por se constituírem em direitos individuais cuja origem decorre de uma mesma causa. São homogêneos, portanto, porque têm uma mesma origem, apesar de serem exercidos individualmente. Ação Civil Pública A Ação Civil Pública destina-se à defesa dos interesses coletivos, os difusos e os individuais homogêneos. Destina-se ainda à proteção do Patrimônio Público, do meio ambiente, dos consumidores e da ordem econômica, com a finalidade de promover a condenação dos responsáveis pela reparação do interesse lesado, preferencialmente com o cumprimento específico da pena. Reconhecendo a existência de interesses transindividuais coletivos e difusos na ordem urbanística, o Estatuto da Cidade procedeu a duas alterações na Lei no 7.347, de 24.7.85, que regula a ação civil pública, instrumento que, como sabido, contempla o instrumento judicial de tutela dos referidos direitos. Primeiramente, o art. 53 do Estatuto alterou o art. 1o da Lei 7.347/85, que elenca os direitos transindividuais específicos sob tutela, passando a constar do inciso III a proteção à ordem urbanística. Assim, é cabível a ação civil pública para a tutela de direitos coletivos e difusos pertinentes à ordem urbanística ao lado de direitos relacionados ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica e à economia popular e aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Depois, foi inserida a ordem urbanística como objeto de tutela preventiva, ao lado dos demais direitos específicos já mencionados, passando então a constar do art. 4o da Lei 7.347/85, que prevê a possibilidade do ajuizamento de ação cautelar visando prevenir a ocorrência de dano aos direitos protegidos. Evidentemente que deverão, em se tratando de tutela preventiva, estar presentes os pressupostos do risco de lesão irreparável em face de demora na solução da lide (periculum in mora) e da plausibilidade do direito invocado (fumus boni iuris). Diretrizes gerais da Política Urbana nacional Inquérito Civil Compete ao Ministério Público, exclusivamente, a instauração do inquérito cível, que é medida preparatória de eventual Ação Civil Pública, com previsão inicial na Lei 7347/85 e elevada ao nível constitucional em 1988 (art. 129 III da Constituição). O inquérito civil tem por objetivo a coleta de informações necessárias para o ajuizamento da Ação Civil Pública. Por meio dele é que se verifica a existência de fato que justifique a aplicação das leis pertinentes, de maneira a formar a convicção do promotor de justiça e evitar a proposição temerária. Tanto quanto o inquérito policial, o inquérito civil é peça dispensável, pois se existirem ou não existirem elementos, o Ministério Público pode ajuizar a Ação ou arquivar o procedimento, respectivamente. Comunicação ao Conselho Superior SE entender por arquivar o procedimento, o promotor deve comunicar sua decisão ao Conselho Superior do Ministério Público (Ver art. 30 da Lei 6.825/93) SE houver concordância do Conselho Superior do Ministério Público, o procedimento será arquivado, se houver discordância, será designado outro promotor de justiça para prosseguir nas investigações, e, eventualmente, ajuizar a ação civil pública. Durante o trâmite do arquivamento, do inquérito civil ou das peças de informação junto ao Conselho Superior do Ministério Público, qualquer pessoa poderá manifestar-se nos autos, juntando documentos a fim de instruir e colaborar com a decisão sobre a promoção do arquivamento. A Lei no 10.257/2001 estabeleceu uma série de postulados com o objetivo de nortear os legisladores e administradores (Ver art. 2º), não somente lhes indicando os fins a que se deve destinar a política urbana, como também evitando a prática de atos que possam contrariar os referidos preceitos. São as diretrizes gerais, relacionadas no art. 2o do Estatuto. Carvalho Filho observa ainda que a despeito de serem as diretrizes gerais comandos dirigidos para o futuro de uma forma geral e terem caráter programático, estão elas contidas em dispositivo legal, no caso o citado art. 2o do Estatuto, de modo que demandam sua integral observância por todos os agentes públicos em qualquer das funções estatais cuja atuação esteja atrelada à observância da referida lei. Para os Municípios em especial, entidades federativas, de grande responsabilidade na execução da política urbana, tais diretrizes são de fundamental importância, pois representam uma verdadeira carta de princípios para os governos municipais. Por isso, a atuação municipal será suplementar em relação ao Estatuto, embora os Municípios também possuam competência própria (art. 30, CF). Conceito Diretrizes gerais da política urbana são o conjunto de situações urbanísticas de fato e de direito a serem alvejadas pelo Poder Público no intuito de constituir, melhorar, restaurar e preservar a ordem urbanística, de modo a assegurar o bem-estar das comunidades em geral. A política urbana se constitui do conjunto de estratégias e ações que visam ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. Assim, as estratégias e ações só podem ser consideradas legítimas se estiverem em consonância com as diretrizes gerais. Compromisso de Ajustamento de Conduta Fontes: O art. 5º Parágrafo 6º da Lei 7347/85 estabelece que os órgãos públicos legitimados podem tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial. Em não havendo o cumprimento do compromisso expresso no termo, o Ministério Público ou qualquer outro legitimado para a propositura da Ação Civil Pública pode executar o CARVALHO FILHO, José dos Santos. Comentários ao Estatuto da Cidade. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2013. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. Rio de Janeiro: Saraiva, 2012.