TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ APELANTE: ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DE MATO GROSSO - ANOREG/MT CAMARA MUNICIPAL DE JURUENA APELADA: Número do Protocolo: 119587/2009 Data de Julgamento: 23-03-2010 EMENTA RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA - LEI MUNICIPAL QUE INSTITUI A COBRANÇA DE ISS SOBRE SERVIÇOS DE REGISTRO PÚBLICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS - IMPOSSIBILIDADE - IMUNIDADE RECÍPROCA - ARTIGO 150, VI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - SENTENÇA MODIFICADA RECURSO PROVIDO. Os serviços de registros públicos, cartorários e notariais são públicos, não afastando esta característica o fato de serem prestados em caráter privado por particulares, por se tratarem de serviços delegados, sendo tributados privativamente pelo Estado e Distrito Federal, e não o Município. Assim, há vedação constitucional prevista no art. 150, VI, da Constituição Federal, visto que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não podem instituir imposto sobre o patrimônio, renda ou serviços uns dos outros. Fl. 1 de 8 TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ APELANTE: ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DE MATO GROSSO - ANOREG/MT CAMARA MUNICIPAL DE JURUENA APELADA: RELATÓRIO EXMO. SR. DES. EVANDRO STÁBILE Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto pela ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE MATO GROSSO contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Juína que nos autos do Mandado de Segurança nº 30/2004 contra a CÂMARA MUNICIPAL DE JURUENA denegou a ordem, reconhecendo a legalidade de tributação pela municipalidade dos serviços de registro público, cartorários e notariais, quanto ao recolhimento do ISSQN. Sustenta que: há ilegalidade e inconstitucionalidade na cobrança de ISSQN dos serviços notariais e registrais; tais serviços possuem natureza jurídica de serviços públicos; o instituto da delegação de que trata o artigo 236 da Constituição Federal não se encontra revista no rol das atividades descritas no §3º do artigo 1º da Lei Complementar nº116/03; os serviços notariais e registrais possuem natureza tributária de taxa remuneratória de serviço público e, portanto sujeitam-se a regime jurídicoconstitucional específico. Requer o provimento do recurso. Apesar de devidamente intimado, o apelado não apresentou contrarrazões, conforme certidão de fls. 216. A Douta Procuradoria-Geral de Justiça às fls. 225/231 opina pelo provimento do recurso. É o relatório. P A R E C E R (ORAL) O SR. DR. LUIZ EDUARDO MARTINS JACOB Ratifico integralmente o parecer escrito. Fl. 2 de 8 TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ VOTO EXMO. SR. DES. EVANDRO STÁBILE (RELATOR) Egrégia Câmara: O apelante busca a reforma da sentença que concedeu a segurança vindicada, reconhecendo a legalidade de tributação pela municipalidade dos serviços de registro público, cartorários e notariais. Primeiramente, os serviços notariais e de registro, são privativos do Estado e do Distrito Federal, e não do Município. Portanto, o recurso de apelação merece provimento, pois os serviços notariais e de registro são de natureza pública, embora exercidos por particular, mediante delegação do Poder Público. A Lei Complementar Municipal nº 568/2003 sancionada pela Câmara Municipal de Juruena, ao estabelecer a cobrança do ISS sobre os serviços de registros público, cartorários e notariais, afronta o princípio da imunidade recíproca no artigo 150, VI, da Constituição Federal. “Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;” Os serviços de notários, registradores e cartorários são atividades típicas do Estado, têm natureza jurídica de serviços públicos através de pagamento de taxas, tendo que ingressar na carreira por intermédio de Concurso Público, sujeitando-se a fiscalização da Administração Pública. Conforme artigo 236, parágrafo 3º da Constituição Federal: “Art. 236 - Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público § 3º - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia Fl. 3 de 8 TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.” Assim, a Lei Complementar Municipal nº 568/2003 ao estabelecer como fato gerador do ISS os serviços de registros públicos e notariais violou o principio constitucional de imunidade recíproca estabelecido na Constituição Federal. Nesse sentido: “DIREITO TRIBUTÁRIO E FISCAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ISS. SERVIÇOS DE REGISTRO PÚBLICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS. É cabível a utilização do mandado de segurança para declaração de inexigibilidade do ISS sobre os serviços notariais e registrais, pois há direito líquido e certo dos impetrantes em sustar os efeitos da lei, já que a referida norma possui efeito concreto capaz de lesar direito individual. Os titulares dos Ofícios são ocupantes de cargos públicos, exercendo sua função de forma delegada e com remuneração através de emolumentos. Impossibilidade de tributação pelo Município dos serviços públicos prestados pelo Estado, tendo em vista o princípio da imunidade recíproca constante no art. 150, VI, da CF. Natureza tributária de taxa dos emolumentos cobrados pelos Notários e Registradores, consoante iterativa jurisprudência do STF. Impossibilidade de incidência do ISS sob pena de haver bitributação. Lei Municipal n.º 2.208/2003 que estabeleceu a cobrança do ISS sobre os serviços de registro públicos, cartorários e notariais. Suspensão da sua eficácia neste tocante. APELAÇÃO DESPROVIDA. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO.” (Apelação e Reexame Necessário Nº 70010772333, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 06-07-2005). “APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. ILEGITIMIDADE DA AUTORIDADE IMPETRADA PARA APRESENTAÇÃO DO RECURSO EM NOME PRÓPRIO. INTERESSE DO ENTE PÚBLICO. APELAÇÃO NÃO CONHECIDA. REEXAME NECESSÁRIO. LEI MUNICIPAL QUE INSTITUI A COBRANÇA DE ISS SOBRE SERVIÇOS DE REGISTRO PÚBLICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS. IMPOSSIBILIDADE. IMUNIDADE. Os serviços Fl. 4 de 8 TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ de registros públicos, cartorários e notariais são públicos, não afastando esta característica o fato de serem prestados em caráter privado por particulares, por se tratarem de serviços delegados. Assim, há vedação constitucional prevista no art. 150, VI,da CF/88, visto que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não podem instituir imposto sobre o patrimônio, renda ou serviços uns dos outros. Precedentes deste Tribunal. Sentença confirmada em reexame necessário.” (Apelação e Reexame Necessário Nº. 70010403806, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 31-08-2005). Analisando os autos, verifica-se direito líquido e certo da apelada, ensejando a concessão da segurança. Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação, determinando a suspensão dos efeitos da Lei Complementar Municipal nº 568/2003 quanto ao recolhimento do ISS, reconhecendo a inconstitucionalidade e ilegalidade da tributação pela municipalidade dos serviços de registro público, cartorários e notariais. É como voto. VOTO EXMA. SRA. DRA. SERLY MARCONDES ALVES (REVISORA) Egrégia Câmara: Acompanho o voto do relator. VOTO EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (VOGAL) Egrégia Câmara: Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. Fl. 5 de 8 TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ EM 16 DE MARÇO DE 2010. ADIADA A CONCLUSÃO DO JULGAMENTO EM FACE DO PEDIDO DE VISTA DO VOGAL. O RELATOR E A REVISORA PROVERAM O RECURSO. V O T O (23-3-2010) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (VOGAL) Egrégia Câmara: A hipótese é de apelação cível de sentença que denegou a segurança, reconhecendo a legalidade da tributação do ISSQN pelo Município de Juruena, visto que os notários e registradores não estão abrigados pela imunidade tributária e, por conseguinte, sujeitos à tributação daquele imposto. O fundamento do voto condutor é no sentido de que os serviços prestados pelos Notários e Registradores são atividades típicas do Estado, sujeitando-se à fiscalização Pública, na forma descrita no art. 236, § 3º. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar improcedente a ADIN n. 3089, proposta pela ANOREG, reconheceu a constitucionalidade da exigência do ISSQN sobre os serviços notariais e registrais, nos termos dispostos na Lei Complementar n. 116/2003, inclusive dos itens 21 e 21.1, da Lista Anexa, permitindo a tributação dos serviços de registros públicos, cartoriais e notariais pelo ISSQN. Nesse sentido o STJ já decidiu: “As pessoas que exercem atividade notarial não são imunes à tributação, porquanto a circunstância de desenvolverem os respectivos serviços com intuito lucrativo invoca a exceção prevista no art. 150, § 3º da Constituição. O Fl. 6 de 8 TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ recebimento de remuneração pela prestação dos serviços confirma, ainda, capacidade contributiva. A imunidade recíproca é uma garantia ou prerrogativa imediata de entidades políticas federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços públicos mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. Não há diferenciação que justifique a tributação dos serviços públicos concedidos e a não-tributação das atividades delegadas” (STJ, REsp 964789/PR, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, 15.10.2009). Desse modo, entendo superada qualquer controvérsia de que os serviços notariais e de registro, embora exercidos por delegação do Poder Público, são executados em regime de caráter privado, os respectivos Oficiais os assumiram por conta e risco econômico próprios, e seus rendimentos ficaram sujeitos à tributação do Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza - ISSQN. Isto posto, com a vênia dos demais membros da Câmara, nego provimento ao Recurso. É como voto. Fl. 7 de 8 TJ Fls ----- TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO Nº 119587/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA DE COTRIGUAÇÚ ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. EVANDRO STÁBILE (Relator), DRA. SERLY MARCONDES ALVES (Revisora) e DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (Vogal), proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA, PROVERAM O RECURSO, VENCIDO O VOGAL. Cuiabá, 23 de março de 2010. ---------------------------------------------------------------------------------------------------DESEMBARGADOR RUBENS DE OLIVEIRA PRESIDENTE DA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL SANTOS FILHO - ---------------------------------------------------------------------------------------------------DESEMBARGADOR EVANDRO STÁBILE - RELATOR ---------------------------------------------------------------------------------------------------PROCURADOR DE JUSTIÇA Fl. 8 de 8 GEACOR