À escuta de fragmentos sobre o sol José Henrique Padovani Departamento de Música/CCTA – UFPB Resumo: A partir do ensaio À l'écoute, de Jean-Luc Nancy, o texto aborda elementos sensíveis à escuta e elementos apreensíveis pelo entendimento que se inter-relacionam e ressoam em "fragmentos sobre o sol" (2012), peça para flauta, soprano e violoncelo. Baseada em fragmentos líricos e filosóficos de Heráclito, Anaxímenes, Anacreonte, Xenófanes e Safo que falam sobre o sol, a peça vale-se da fragmentação de sonoridades, gestos, imagens poéticas e pensamentos e em sua reiteração/reverberação, o que apresenta consequências tanto na conformação de estruturas sonoras locais como na constituição formal da peça. Abstract: Departing from the essay À l'écoute, by Jean-Luc Nancy, the text approaches elements sensitive to the listening and elements apprehensible by the understanding which interrelate and resonate in "fragmentos sobre o sol" (2012), piece for flute, soprano and violoncello. Based on lyrical and philosophical fragments by Heraclitus, Anaximenes, Anacreon, Xenophanes and Sappho that deal with the sun, the piece employs the fragmentation of sonorities, gestures, poetic images and thoughts and the reiteration/reverberation of these same fragments, which has consequences both in the conformation of local sound structures and in the formal constitution of the piece. 1. Escuta e pensamento a partir de À l'écoute, de Jean-Luc Nancy Jean-Luc Nancy começa seu ensaio À l'écoute com uma pergunta que poderíamos traduzir concisamente da seguinte maneira: é, a filosofia, capaz de escutar?1 A partir de vários jogos de palavras e das particularidades, no idioma francês, das acepções de "entendre" e "écouter" – já extensivamente exploradas por Pierre Schaeffer no Traité des objets musicaux –, Nancy coloca uma série de perguntas para investigar o porquê da filosofia, de modo geral, procurar geralmente ensurdecer o sentido da audição para dar primazia à compreensão e ao entendimento amparando-se no isomorfismo entre o conceitual e o visual.2 1 No contexto original: "Supondo que ainda faça sentido colocar questões sobre limites ou sobre os limites da filosofia (supondo, portanto, que um ritmo fundamental de ilimitação e limitação não constitui o andamento permanente da própria filosofia, com uma cadência variável, talvez acelerado hoje em dia), indagaríamos: a escuta, é ela um afazer que ao qual a filosofia seja apta? Ou ainda – insistamos um pouco, apesar de tudo, sob o risco de exagerar – a filosofia, não acabou ela por antecipada e forçosamente superpor e substituir à escuta qualquer coisa que seria antes da ordem do entendimento?" (Nancy 2002, 13) 2 Embora com uma abordagem filosófica diferente daquela utilizada por Nancy, Henri Bergson (2003) já discutia esse paralelo entre a entendimento/representação e o espaço extensivo – percebido sobretudo pelo sentido da visão – no Essai sur les données immédiates de la conscience, de 1888. Uma apresentação mais longa do tema, a partir dos conceitos caros à abordagem bergsoniana (como 1 Seu ponto é: uma filosofia à escuta deveria operar menos por uma substituição da escuta pelo entendimento e – mesmo ao considerar a escuta e a percepção – nem mesmo deveria postular um sujeito frente a um estímulo ou fenômeno, mas simplesmente estar aberta e em vigília em relação "a si". Esse estado de vigília ou de tensão – a que podemos relacionar à propriocepção e à capacidade de sentir as próprias sensações – não é assim limitado a um sujeito supostamente dado e suas impressões subjetivas, mas à própria faculdade de permitir que algo "ressoe" por uma via que não se dá pela entendimento intencional e racional. Estar à escuta é portanto entrar na tensão e na guarda em relação a si: não, deve-se sublinhar, em relação a "mim" (sujeito supostamente dado) e não também ao "si" do outro (o falante, o músico, aquele também supostamente dotado de sua subjetividade), mas em relação a si, se eu posso dizer, de maneira que ele forme um "si" ou um "a si" em geral e se algo assim alcance algum dia o termo de sua formação. É passar, consequentemente, do registro da presença a si, tendo entendido que o "si" não é precisamente nada de disponível (de substancial e de subsistente) àquilo que possa estar "presente", mas justamente a ressonância de um retorno. (Nancy 2002, 30-31) Para Nancy, tal superação de uma presença – isto é, a presença de um fenômeno frente a um sujeito – e o estabelecimento de uma zona de ressonância apontam para uma superação (ou um recuo) da abordagem fenomenológica3. Segundo Nancy, quando a fenomenologia procura pensar o som ou os fenômenos, ela recorre sempre à subjetividade e ao estímulo, a um sujeito demasiadamente intencional e a uma negação do silêncio – ou da ausência de fenômenos em geral. Para Nancy, no entanto, o silêncio não é negativo, não é uma privação do som e dos estímulos, mas antes uma "disposição à ressonância", condição essencial para o surgimento de um sujeito à escuta: Trata-se portanto de retornar do sujeito fenomenológico, ponto de vista intencional, ao sujeito ressonante, um espaçamento intensivo de um reverberar que não chega em nenhum retorno a si sem imediatamente relançar-se em eco como um chamado a si mesmo. Se o sujeito da visão é duração, representação e intuição), é apresentado no segundo capítulo da minha dissertação de mestrado (Velloso 2009, 35-67). 3 Especialmente, deve-se dizer, da abordagem fenomenológica husserliana. 2 sempre já dado, colocado em si a partir de seu ponto de vista, o sujeito da escuta está sempre por vir, espaçado, transverso e clamado por si próprio, soado por si próprio, se é que posso me permitir todos esses jogos de palavras, mesmo triviais, que sugerem a língua francesa (...). O sujeito da escuta ou o sujeito à escuta (mas também aquele que é "sujeito à escuta" no sentido em que se pode estar "sujeito a" um problema, a uma afecção e a uma crise) não é um sujeito fenomenológico, isto é não é um sujeito filosófico e, em definitivo, não pode ser sujeito algum salvo ser o local de ressonância de sua tensão e de seu ressoar infinitos, a amplitude do desenrolar sonoro e a espessura de seu desdobramento simultâneo – pelo qual se modula uma voz na qual vibra o que há de singular em um choro, um chamado ou um canto (uma "voz": deve-se entender como aquilo que soa de uma garganta humana sem ser linguagem, aquilo que sai da goela de um animal ou de um instrumento, mesmo o vento nos galhos: o farfalhar ao qual nos tendemos ou emprestamos a orelha). (Nancy 2002, 45) Cabe prioritariamente à filosofia e às ciências humanas em geral considerar o fôlego que pode ter a intuição original proposta por Nancy, fortemente amparada em imagens poéticas que procuram especular um pensamento que é menos produto de um sujeito intencional que a ressonância ou a resposta a impulso de um "meio reverberante". Tal avaliação, no entanto, será de consequência direta para a sonologia, as musicologias e as especulações teóricas e criativas da composição e da música eletroacústica, que a partir de ideias tomadas na fenomenologia (em especial, a escuta reduzida derivada da époche) procurou explicar determinadas particularidades da música acusmática e justificar determinadas posições criativas. No entanto, o interesse aqui não é revisar tais posições e construir uma crítica a posições poéticas e teóricas particulares, mas utilizar a pergunta colocada por Nancy como uma espécie de pretexto reflexivo, especialmente invertendo-a em uma forma mais interessante à criação musical: é, a música (ou "a criação musical"), capaz de pensar filosoficamente? Ou, em outros temos, ainda inversos mas mais próximos da colocação original de Nancy: o pensamento filosófico, é ele um afazer ao qual a criação musical está apta? Obviamente, a resposta a essa questão seria demasiadamente artificial se fosse construída também em termos meramente inversos. A intenção aqui não é, portanto, postular as possibilidades e as eventuais características positivas de uma música 3 pensada, ensurdecida ao sentido da escuta ou especialmente focada no que há de inteligível, dialético, lógico ou compreensível na forma e no construção motívicotemática do classicismo ou na parametrização da música serial, por exemplo. O interesse reside, antes, em discorrer sobre a relação entre alguns elementos apreensíveis pela escuta e compreensíveis pelo entendimento que podem ser identificados em uma peça específica, fragmentos sobre o sol (2012), para flauta, soprano e violoncelo. Trata-se de esboçar um ponto de contato entre um pensamento analítico/criativo sobre essa peça e um conjunto de imagens filosóficas bastante particulares, investigando como certos elementos verbais/conceituais/inteligíveis utilizados como base para a composição acabaram por ressoar no plano sonoro. 2. Elementos composicionais de fragmentos sobre o sol Fragmentos sobre o sol baseia-se em alguns fragmentos e trechos de poesias e textos filosóficos pré-socráticos que falam sobre o sol. São textos curtos de autoria de Heráclito, Safo, Xenófanes, Anaxímenes e Anacreonte que foram selecionados a partir de uma temática um tanto quanto arbitrária e ordenados segundo uma justaposição não menos fortuita. Em essência, foram escolhidos devido à natureza ao mesmo tempo poética/lírica quanto filosófica/especulativa com que abordam e especulam sobre o sol, distantes ainda da concepção moderna que temos de uma clara segmentação entre filosofia, ciências e artes. Fragmentos de filósofos pré-socráticos e de poetas gregos da antiguidade revelam ideias que, contrapostas à ciência e ao conhecimento modernos, poderiam ser apressada e presunçosamente taxadas de redundantes, anacrônicas ou rechaçadas como meros devaneios. No entanto, tais textos preservam o frescor de uma imaginação que ousa indagar sobre a ontologia e a essência de todas as coisas existentes de maneira verdadeiramente curiosa e ingênua, combinando poesia, 4 filosofia, cosmologia e especulações científicas em asserções extremamente concisas. Preservados apenas em pedaços desconexos e concebidos em uma realidade e em um tempo alheios à altíssima especialização em que vivemos na contemporaneidade, esses fragmentos revelam apreensões sobre o mundo que se destacam não apenas por sua excentricidade ou idiossincrasia frente ao conhecimento que atualmente se tem sobre uma infinidade de temas e assuntos, mas por sua visão poética, aberta e imaginativa frente a estes mesmos temas que pode ser comparada às indagações que crianças fazem aos pais a respeito das coisas que observam pela primeira vez. Dentre os fragmentos utilizados na peça, encontram-se tanto reflexões ontológicas em torno do cosmo e do devir – como em Heráclito4 –, trechos líricos enaltecendo a beleza e a luminosidade da natureza – como em Safo5 – e especulações cuja conotação original se perde frente ao caráter inusitado e quase surreal de suas asserções – como em Heráclito e Anaxímenes.6 Quanto ao conteúdo exato de cada um dos fragmentos utilizados na peça e uma explanação da sua escolha e justaposição, pouco poderia ser dito sem preencher inadvertidamente lacunas que, pela própria decisão composicional de criar uma peça baseada em fragmentos, seriam antes empobrecidas em termos poéticos do que esclarecidas. Pode-se apenas dizer que alguns destes textos foram ainda mais fragmentados (como os fragmentos de Safo e de Anacreonte), retirando uma conotação específica mais ampla que os textos sugeriam originalmente para acentuar imagens e ideias poéticas mais gerais. 4 Como em: "O sol não é somente novo a cada dia como eternamente continuamente novo". Como em: "Aurora dos róseos braços (...), levando às mais remotas regiões da terra (...)// eu amo o doce esplendor (...)// o amor me concedeu a luz resplandecente e a beleza do sol" 6 Como em: "O sol tem o tamanho de um pé de um homem" (Heráclito) e "O sol é largo como uma folha" (Anaximenes). 5 5 t. ram #) %! !( " f 1 # /C nat. I. , + 2 mp 1 , + 1 #. mp #d mf !! !! !! # !! d p 5 ! #. p :!" !" pp 1 &h 5 sfz &!" mp [p'] ! ;" ! ! 0 # " . p ' &! ! $! " p &! mf !" 1 , & !! ! !! 6! #! %. # .9 pp ST !" #!" mf ! ! !! ( % !! mf &! &!" 9 mf *" #! ! "" ! * mf ! ! #!" #! #! mf 0 #!" f 3 # !! %! %. mp 0 p ' #! mp #d" sfz 4 mf #! 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Fragmentos sonoros e formais Colocados em sequência, os fragmentos selecionados foram transcritos do grego antigo para sua provável pronúncia a partir de fonemas do alfabeto fonético internacional (IPA). A posteriori – e tendo em vista que é incomum que as pessoas compreendam fluentemente o grego antigo na contemporaneidade –, pode-se justificar a não tradução desses textos e sua transcrição aproximada em fonemas como uma estratégia de criar um espaço de ininteligibilidade ao sentido exato das palavras que, ao favorecer as sonoridades dos fonemas frente aos conceitos e palavras que expressam, situa-se no limiar de modos de escuta mencionados por Nancy: Se escuta aquilo que possui um discurso que se quer compreender, ou se escuta aquilo que pode surgir do silêncio e fornecer um sinal ou um signo, ou ainda se escuta àquilo que chamamos música. No caso dos dois primeiros exemplos pode-se dizer, ao menos para simplificar (se esquecemos das vozes, dos timbres), que a escuta está direcionada ao sentido além do som. No último caso, aquele da música, é ao próprio som que o sentido se oferece à auscultação. Em um caso o som tendencialmente desaparece, em outro, o sentido tendencialmente torna-se som. Mas não há aí senão, precisamente, duas tendências e a escuta se volta a – ou é suscitada por – esse lugar onde o som e o sentido se mesclam e ressoam um no outro ou um pelo outro. (Nancy 2002, 20) Uma língua que fala algo que não nos é compreensível – ou que nos é apenas parcialmente compreensível – nos coloca justamente nesse limiar de escuta mencionado por Nancy. Sensação semelhante, na literatura, ocorre com manuscritos ou textos que não podemos ler por usarem sistemas de escrita desconhecidos e decodificáveis, como ocorre por exemplo com o famoso Codex Voynich, do século XV – escrito numa linguagem e em um alfabeto até hoje não decifrados – ou com o monumental Codex Seraphinianus, espécie de tratado fantástico publicado em 1981 7 pelo artista Luigi Serafini, que alterna figuras de seres imaginários e textos indecifráveis, cuja letras remetem à grafia cursiva do alfabeto latino mas que, justamente por não ser inteligível e decodificável, ganha um valor estésico e plástico que se sobrepõe à hipotética função linguística, esvaziada tanto pelo idioma inacessível quanto pelos signos heteróclitos7. Na peça, o emprego de sonoridades derivadas da pronúncia dos fragmentos em grego antigo amplificadas ou reverberadas por gestos instrumentais na flauta e no violoncelo, com o que se procura criar uma zona de contato entre percepção sensorial e compreensão intelectual. Poeticamente, isso que aqui se chama de zona de contato se refere à intenção de explorar um lugar intermediário entre um plano estésico – relacionado à articulação de sonoridades, ataques, alturas, intervalos, perfis melódicos, ritmos – e um plano verbal/conceitual que atua como a linha condutora do discurso/forma da peça e que, embora não seja imediatamente inteligível, repercute na própria expressão sonora resultante da execução vocal e de suas reverberações nos instrumentos. Tendo em vista este aspecto, os trechos de texto utilizados na peça não estão fragmentados apenas no nível de um plano literário/filosófico ou de um contexto narrativo ou lírico mais amplo no qual estariam inseridos originalmente. Um segundo nível de fragmentação ocorre a partir da transcrição sonora das palavras que, esvaziadas de sentido imediato – novamente, ao menos ao ouvinte comum – tendem a ser escutadas na zona limiar entre uma escuta de sons e uma escuta de sentidos8. 7 Calvino, observa o fato de a grafia de Serafini estabelecer essa zona limiar entre compreensão e plasticidade: "No universo em que Luigi Serafini habita, creio que a palavra tenha precedido as imagens: essa grafia cursiva, munusicosa, ágil e (devemos admitir) claríssima, que sempre nos sentimos prestes a poder ler e que no entanto nos escapa em cada palavra e letra" (Calvino, 2010: 265) 8 Evidentemente, tanto a diferenciação entre modalidades de escuta quanto a intenção de se explorar limiares de escutas não são novos nas teorizações relacionadas à criação musical e à música eletroacústica. Além do já citado trabalho de Scheffer – em que são categorizados tipos de escuta – é de se considerar que o tema do limiar é de grande importância para Gérard Grisey, especialmente no que 8 Desmembradas nos fonemas que resultariam de sua leitura na pronúncia de um grego antigo um tanto quanto hipotético (tendo em vista que tal língua não é mais falada e que possuía variações específicas de pronúncia segundo regiões, épocas e círculos sociais), as palavras tornam-se passíveis de ser exploradas em um nível sonoro, independentemente de uma possível interpretação lírica de seu conteúdo semântico. ! "# &# ! ' + *d0 $ !" mf $ % "# + mf -# *# p mp $ "d ppp ! [s] 2 "# ! ## $ ) ) $ " # " ( # sfz p mf Figura 2 - Trecho entre compassos [43] e [45] de fragmentos sobre o sol (2012). ) 1 "#0 ! #0 ! ! z , ! ! f 3 " "# !# # # mp p mp &# $ k/ $ . % ! ! ' essa 0 fragmentação pode Se imediatamente e na "# $0 "ser #6 & # $ #ouvida $#$# *# &# 3 "# & # ' # " 5na prolongação -# + !k $ -5 mf [fe] p mf mp p p pp mp relação emergente entre sonoridades que ocorrem na voz e nos instrumentos, pode-se ) dizer que+ela! #ressoa na formal * # condução "# # # 5 da peça. Ao basear-se na justaposição casual p mp de textos cujo tema comum é o sol e na fragmentação de 17 fonemas desses textos a C !# # # # # # r , "4 II. ST 4 $0 ! " II. I. % poca press. "# # # # # # # # !%# " "5 # – essa estrutura que, em síntese, é inaudível enquanto som, partir da( escritura, a forma mf p mf p fp mas sempre passível de se ouvida pela memória e formalizada pelo pensamento – ! ! torna-se também fragmentada, encontrando consistência! apenas ! em uma! recorrência 8# 9# "# # !)# " de gestos, intervalos e sonoridades que não são explorados seriais p mp segundo mp mf esquemas ' ) -5 + ) % "# ou espectrais, mas apenas a partir do ressoar – no sentido dado por Nancy à palavra – 17 4. Conclusão , III. IV. ( "# # "# # fp pp # # # # # # p # $ (r) *# "# # # # !# # # # # # # # # # # ) $ w *# "# "# $ (# *# "# 3 # "# # "# 6 !# "# mf pp p mp de certos gestos instrumentais, melódicos e rítmicos.pp + C !# # poca press. $# &# !$" $# $# $# &## "# *# p ## pp f se refere a criar agregados sonoros que são tanto escutados como sobreposição de alturas (acordes) quanto escutados como complexos sonoros (timbres). Essas escutas Grisey (2008: 100-101) denomina, respectivamente, como "escuta analítica" e "escuta sintética". 9 Não se deve esperar como termo de uma reflexão como a que aqui é proposta uma resposta menos vaga e aberta que aquela apontada por Nancy à indagação inicial de seu texto. Se uma filosofia à escuta é ensaiada essencialmente a partir da especulação sobre um "sujeito à escuta" (que é antes um lugar de ressonância e reverberação que um sujeito intencional), uma música que se propõe os afazeres do pensamento é uma música que busca criar um espaço de ressonância entre ideias e fragmentos de ideias ao lado de sons e fragmentos de sons9. É esse espaço de reverberação em que mesmo o próprio texto poético de base não se apresenta a partir de uma intencionalidade discursiva/narrativa que a peça em questão procura estabelecer. Esse espaço visa possibilitar uma relação entre sons, gestos e textos que coloque músicos e ouvintes à escuta de fragmentos que são simultaneamente conceituais e sensíveis, gestuais e abstratos e, em todo caso, unidos ou justapostos apenas a partir de um pretexto poético-filosófico. Referências bibliográficas: Anacreonte. The Odes of Anacreon. Harvard: Taylor and Walton, 1837. Bergson, Henri. Essai sur les données immédiates de la conscience. Quèbec: Les classiques de sciences sociales. 2003. [acesso 20 de junho de 2012]. Disponível em: <http://dx.doi.org/doi:10.1522/cla.beh.ess> Calvino, Italo. "A enciclopédia de um visionário" in: Coleção de Areia. 1ª Edição, versão ePub. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. pp 265-275. Grisey, Gérard. "Structuration des timbres dans la musique instrumentale" in Écrits ou L’invention de la musique spectrale. Paris: MF, 2008: pp. 89-120. Nancy, Jean-Luc. À l'écoute. Paris: Éditions Galilée, 2002. Schaeffer, Pierre. Traité des objets musicaux essai interdisciplines. Paris: Éditions du Seuil, 1977. Velloso, José Henrique Padovani. Representação, intuição e contato na composição com algoritmos. Dissertação de Mestrado. Campinas: Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas. 2009. 9 A essa relação, seria interessante acrescentar ainda aquela dos gestos e dos fragmentos de gestos que permeiam a peça, relação que é necessário deixar para um outro momento devido aos limites desse texto. 10