Aula 8 RESPONSABILIDADE CIVIL Culpa e nexo causal Prof. Dr. Alexandre Guerra 2 CULPA CC. Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. CC. Art. 927 - Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. 1. Descumprimento de um dever objetivo de cautela (desnecessário o animus laedendi) 2. Culpa lato sensu (dolo) 3. Juízo de reprovação de conteúdo varíavel 4. “Homo medius” 5. “Bonus pater familiae” 6. Dolo: violação intencional de um dever jurídico 3 Culpa em sentido estrito (aquliana) 1. IMPRUDÊNCIA: precipitação no agir ou agir sem cautela 2. NEGLIGÊNCIA: inobservância de normas de agir com atenção e cautela 3. IMPERÍCIA: falta de habilidade ou capacitação para prática do ato 4. NÃO HÁ RC SEM CULPA, SALVO NOS CASOS DE RC OBJETIVA 5. Graus de culpa 6. CULPA GRAVE: não prever o que todos preveem. Omissão de cuidados elementares (embriaguez ao volante) 7. Equipara-se ao dolo 8. CULPA LEVE: a falta poderia ser evitada com atenção normal. Descuido evitável pelo bom pai de família 9. CULPA LEVÍSSIMA: somente evitável com atenção extraordinária e com extrema cautela 4 1. Culpa, mesmo levíssima, obriga a indenizar (“in lege Aquilia et levissima culpa venit”) CC. Art. 944 - A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização. 2. Inadimplemento do contrato presume-se culposo 3. Culpa “in eligendo”: má escolha do representante 4. Culpa “in vigilando”: ausência de fiscalização sobre pessoa ou coisa sob sua guarda 5. Culpa “in custodiendo”: falta de cuidados na guarda da coisa (inclusive animais). 6. Culpa “in comittendo”: Culpa no agir 7. Culpa “in omittendo”: Omissão juridicamente relevante diante do dever jurídico de agir. 5 1. CULPA PRESUMIDA (presunções relativas) 2. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA: Não há relação de causalidade entre o comportamento do ofensor e o dano suportado pela vítima. Desaparece dever de indenizar. 3. Culpa CONCORRENTE da vítima: Não há compensação de culpas. Valoração judicial da responsabilidade de cada um. CC. Art. 945 - Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano. 4. No CDC, culpa concorrente não afasta a RC integral do fornecedor. 5. Na teoria do risco (RCO), não é necessária a prova de culpa por parte da vítima, pois o agente responde apenas com a prova do nexo causal entre a conduta e o dano. 6 CULPA NO CÍVEL e CULPA NO CRIME 1. Unidade da jurisdição como função soberana do Estado. 2. Mesmo fato pode gerar consequências civis e criminais. 3. CC. Art. 935 - A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. 4. Verdade real vs. Verdade formal 5. CP. Efeitos genéricos e específicos. Art. 91 - São efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; (...). 6. Sentença absolutória no crime pode ter influência do cível a depender do fundamento da absolvição. 7 CPC. Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: (...) II - a sentença penal condenatória transitada em julgado; CPP. Art. 387 - O juiz, ao proferir sentença condenatória: (...) III - aplicará as penas de acordo com essas conclusões; IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; (Inciso com redação dada pela Lei nº 11.719, de 20.06.2008 - DOU 23.06.2008). Necessidade de indenização postulada na inicial? (2 correntes). “Actio civillis ex delicto”: ação cível ajuizada à satisfação do dano reconhecido na jurisdição criminal. 8 “ACTIO CIVILLIS EX DELICTO” 1. Necessidade de liquidação de sentença 2. Apuração do “quantum debeatur” 3. Competência do juízo cível de onde ocorreu o ilícito 4. Ajuizamento pela vítima, representante legal ou herdeiros (CPP, art. 63). 5. Ajuizamento pelo MP (CPP, art. 68) 6. CPP. Art. 67 - Não impedirão igualmente a propositura da ação civil: I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação; II - a decisão que julgar extinta a punibilidade; III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime. CPC. Art. 265 - Suspende-se o processo: (...). IV - quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa, ou da declaração da existência ou inexistência da relação jurídica, que constitua o objeto principal de outro processo pendente; 9 NEXO CAUSAL 1. 2. 3. Relação de causalidade entre o ilícito e o dano É Imprescindível ao dever de indenizar Sem o comportamento do ofensor, o dano não teria ocorrido. 4. Teoria da equivalência das condições (ou da “conditio sine qua non”): toda circunstância que concorre para o dano é considerada sua causa Cria situações injustas e rol muito amplo de responsáveis Teoria da causalidade adequada: causa é somente a condição apta, por si só, a produzir o dano. TEORIA DOS DANOS DIRETOS E MEDIATOS (concilia as duas acima; cada agente responde pelos danos diretos de imediatamente decorrentes de sua conduta). CC. Art. 403 - Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual. 5. 6. 7. 8. 10 EXCLUDENTES DE RC Hipóteses de não incidência do dever de indenizar (GUERRA, Alexandre. In: Responsabilidade civil do Estado: desafios contemporâneos: São Paulo: Quartier latin, 2010). 1. Estado de necessidade 2. Legítima defesa 3. Estrito cumprimento do dever legal 4. Exercício regular de direito 5. 6. 7. 8. 9. Culpa exclusiva da vítima Culpa exclusiva de terceiro Caso fortuito Força maior Cláusula de não indenizar 11 CC. Art. 188 - Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. (1) Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo. Bem pertencente a terceira pessoa inocente? 12 CP. LEGÍTIMA DEFESA. Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. CP. ESTADO DE NECESSIDADE. Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. Parágrafo primeiro - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. Parágrafo segundo - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. 13 CASO FORTUITO: CC. Art. 393 - O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. 2. Elementos constitutivos do caso fortuito: Interno (objetivo) inevitabilidade ou impossibilidade de impedir ou resistir ao acontecimento Externo (subjetivo): a ausência de culpa.” (v. FONSECA, Arnoldo Medeiros da. Caso fortuito e teoria da imprevisão. Rio de Janeiro: Forense, 1958). Força maior (evento da natureza – duas correntes). 14 CASO FORTUITO INTERNO 1. Exigências da proteção consumerista 2. Caso fortuito interno: é aquele que se insere na linha de desdobramento natural da atividade desenvolvida pelo agente. 3. Não elimina o nexo causal. 4. Diz respeito ao risco ligado à atividade do sujeito responsável. 5. É compreendido dentro (interno) da própria atividade desenvolvida pelo agente. 6. Sua ocorrência não será capaz de eliminar o nexo de causalidade (ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências, Saraiva, 1949, p. 290ss.) 15 STJ CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. Acidente ocorrido com aluno durante excursão organizada pelo colégio. Existência de defeito. Fato do serviço. Responsabilidade objetiva. Ausência de excludentes de responsabilidade. (...). Na relação de consumo, existindo caso fortuito interno, ocorrido no momento da realização do serviço, como na hipótese em apreço, permanece a responsabilidade do fornecedor, pois, tendo o fato relação com os próprios riscos da atividade, não ocorre o rompimento do nexo causal. (...). (REsp 762.075/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, j. 16/06/2009, DJe 29/06/2009)” 16 “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. Recurso especial. Roubo de talonário de cheques durante transporte. Empresa terceirizada. Uso indevido dos cheques por terceiros posteriormente. Inscrição do correntista nos registros de proteção ao crédito. Responsabilidade do banco. Teoria do risco profissional. Excludentes da responsabilidade do fornecedor de serviços. art. 14, § 3º, do CDC. Ônus da prova. Segundo a doutrina e a jurisprudência do STJ, o fato de terceiro só atua como excludente da responsabilidade quando tal fato for inevitável e imprevisível. O roubo do talonário de cheques durante o transporte por empresa contratada pelo banco não constituiu causa excludente da sua responsabilidade, pois se trata de caso fortuito interno. Se o banco envia talões de cheques para seus clientes, por intermédio de empresa terceirizada, deve assumir todos os riscos com tal atividade. O ônus da prova das excludentes da responsabilidade do fornecedor de serviços, previstas no art. 14, § 3º, do CDC, é do fornecedor, por força do art. 12, § 3º, também do CDC. Recurso especial provido. (REsp 685.662/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, j. 10/11/2005, DJ 05/12/2005 p. 323)” 17 • “Os Tribunais brasileiros têm, reiteradamente, acolhido o conceito de fortuito interno como nãoexcludente de causalidade. E têm mesmo aplicado a noção a situações cuja internalidade à atividade é duvidosa. O Tribunal de Justiça do Rio de janeiro, por exemplo, já considerou como fortuito interno da atividade bancária o assalto com roubo de bens materiais mantidos em cofre alugado, condenando a instituição financeira a ressarcir o cliente. A mesma corte entendeu haver fortuito interno na situação de empresa de financiamento que promove abertura de crédito em nome de outrem com utilização de documentação falsa, condenando ao dever de indenizar a empresa que, com base em tal documentação, inscreve o nome do suposto devedor no Serviço de Proteção ao Crédito. Decisões como esta demonstram, à parte outras tantas conclusões merecedoras de análise, que a invocação do fortuito interno não se baseia tanto em uma qualificação cientificamente rígida, porque tormentosa, de um acontecimento como externo ou interno à certa atividade. Nem mesmo a previsibilidade ou resistibilidade têm desempenhado nesta análise um papel tão decisivo. O juízo acerca da incidência ou não da figura do fortuito interno parece, antes, vinculado à do risco e de sua imputação a certo sujeito que desenvolve uma atividade potencialmente lesiva. Daí ser o fortuito interno noção recorrente em relações regidas pela responsabilidade objetiva, mas elemento tecnicamente estranho à seara da responsabilidade subjetiva, onde a simples imprevisibilidade é considerada suficiente para desconfigurar o ilícito. E não é apenas o caso fortuito que vem sofrendo relativização em seu papel de interrupção do nexo causal. Também a culpa exclusiva da vítima e o fato de terceiro têm sido, com este escopo, aferidos de forma restritiva, mantendo-se em muitos casos o nexo de causalidade originariamente formado entre a conduta do responsável e o dano. De um lado, a comum exigência de exclusividade da culpa da vítima consagrada inclusive em lei especial (CDC, arts. 12, § 3º, III, e 14, § 3º, II) afasta, a princípio, a relevância jurídica da concorrência da vítima para o evento, ainda que em grau elevado, o que impede a interrupção da causalidade em uma gama significativa de situações. De outro lado, não é raro que certos comportamentos por parte da vítima ou do terceiro, ainda que incompatíveis com os standards específicos de diligência sejam considerados inclusos no risco do responsável ou imputáveis à sua esfera por alguma outra razão, a exemplo do que ocorre com o fortuito interno.” (SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil. Da erosão dos filtros da reparação à diluição dos riscos. Rio de Janeiro: Renovar, p. 67-69).