ASSOCIAÇÃO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO.
CURSO DE FÉRIAS DE DIREITO CIVIL. NOVAS TESES.
A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE.
Flávio Tartuce
Doutor em Direito Civil e graduado pela Faculdade de Direito da USP.
Mestre em Direito Civil Comparado pela PUC/SP.
Professor do programa de mestrado e doutorado da FADISP.
Coordenador dos cursos de pós-graduação lato sensu em Direito Civil, Direito Contratual e
Direito de Família e das Sucessões da Escola Paulista de Direito.
Professor da ESA/OAB/SP e em Escolas da Magistratura.
Advogado e Consultor Jurídico.
Autor de Obras pela Editora Método.
Site: www.flaviotartuce.adv.br.
Blog: www.professorflaviotartuce.blogspot.com.
A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
ÂMBITO DE APLICAÇÃO.
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA.
CC/2002.
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano
a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei,
ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor
do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de
outrem”.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
A RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA TEM DUAS ORIGENS.
1.
A LEI. Exemplos: CDC e Lei 6.938/1981.
2. A ATIVIDADE DE RISCO (Cláusula geral de responsabilidade objetiva).
As principais aplicações vêm ocorrendo no âmbito do acidente de
trabalho. (Ver: Tribunal Superior do Trabalho, Recurso de Revista n.
1132/2007-030-04-00.3, data de julgamento: 20/05/2009, Rel. Min.
Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, 3ª Turma, data de divulgação:
DEJT 12/06/2009; Recurso de Revista n. 2135/2005-032-02-00.6,
data de julgamento: 29/04/2009, Rel. Min. Rosa Maria Weber
Candiota da Rosa, 3ª Turma, data de divulgação: DEJT 22/05/2009).
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
Como analisar esse risco do parágrafo único do art. 927 do Código
Civil?
Enunciado 448, da V Jornada de Direito Civil (2011). “A regra do
art. 927, parágrafo único, segunda parte, do CC aplica-se
sempre que a atividade normalmente desenvolvida, mesmo
sem defeito e não essencialmente perigosa, induza, por sua
natureza, risco especial e diferenciado aos direitos de outrem.
São critérios de avaliação desse risco, entre outros, a
estatística, a prova técnica e as máximas de experiência”.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
E o risco da vítima? Também deve ser levado em conta?
Sim, para excluir totalmente a responsabilidade civil (risco
exclusivo da vítima) ou para diminuir o valor da
indenização (risco concorrente da vítima).
Essa é a essência da tese do risco concorrente, assim
resumida: “a responsabilidade civil objetiva deve ser
atribuída e fixada de acordo com os riscos assumidos
pelas partes, seja em uma situação contratual ou
extracontratual”.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
Fundamentos legais.
“Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a
gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir,
eqüitativamente, a indenização.
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o
evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se
em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a
do autor do dano”.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
Jornadas de Direito Civil.
Enunciado n. 46 da I Jornada de Direito Civil (2002). “Art. 944.
A possibilidade de redução do montante da indenização
em face do grau de culpa do agente, estabelecida no
parágrafo único do art. 944 do novo Código Civil, deve ser
interpretada restritivamente, por representar uma
exceção ao princípio da reparação integral do dano, não
se aplicando às hipóteses de responsabilidade objetiva.”
O Enunciado n. 380, da IV Jornada de Direito Civil, de 2006,
retirou a parte destacada.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
Jornadas de Direito Civil.
V Jornada de Direito Civil (2011).
Enunciado n. 459. “Art. 945. A conduta da vítima pode
ser fator atenuante do nexo de causalidade na
responsabilidade civil objetiva”.
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Fundamentos legais. CC/2002.
“Art. 738. A pessoa transportada deve sujeitar-se às normas
estabelecidas pelo transportador, constantes no bilhete ou
afixadas à vista dos usuários, abstendo-se de quaisquer atos
que causem incômodo ou prejuízo aos passageiros,
danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a execução
normal do serviço.
Parágrafo único. Se o prejuízo sofrido pela pessoa transportada for
atribuível à transgressão de normas e instruções
regulamentares, o juiz reduzirá eqüitativamente a
indenização, na medida em que a vítima houver concorrido
para a ocorrência do dano”.
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Fundamentos legais. CDC.
“Art. 12. § 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou
importador só não será responsabilizado quando
provar:
I - que não colocou o produto no mercado;
II - que, embora haja colocado o produto no mercado,
o defeito inexiste;
III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro”.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
Fundamentos legais. CDC.
“Art. 14. § 3° O fornecedor de serviços só não será
responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro”.
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Julgado. “O caso do escorregador”.
“CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Responsabilidade do
fornecedor. Culpa concorrente da vítima. Hotel. Piscina. Agência de
viagens. Responsabilidade do hotel, que não sinaliza
convenientemente a profundidade da piscina, de acesso livre aos
hóspedes. Art. 14 do CDC. - A culpa concorrente da vítima permite
a redução da condenação imposta ao fornecedor . Art. 12, § 2º, III,
do CDC. - A agência de viagens responde pelo dano pessoal que
decorreu do mau serviço do hotel contratado por ela para a
hospedagem durante o pacote de turismo. Recursos conhecidos e
providos em parte” (STJ, REsp 287849/SP, Rel. Ministro RUY
ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 17/04/2001, DJ
13/08/2001, p. 165)
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
Julgado. “Pingente de trem”.
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL E RESPONSABILIDADE CIVIL. (...). MUTILAÇÃO DE
MEMBROS POR ATROPELAMENTO EM VIA FÉRREA QUANDO MENOR
TENTAVA VIAJAR COMO ‘PINGENTE’. TRANSEUNTE QUE, POR
NEGLIGÊNCIA DA CONCESSIONÁRIA DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO,
QUE NÃO CERCOU A LINHA DE TREM, TINHA ACESSO À LINHA FÉRREA.
CULPA CONCORRENTE. A jurisprudência do STJ reconhece, em regra, a
concorrência de culpa entre a vítima de atropelamento em via férrea e
a concessionária de transporte ferroviário, sobretudo quando há
constatação de que, em área em que ocorre adensamento
populacional, a empresa não adota as necessárias providências para
impedir o acesso de transeuntes à linha férrea” (STJ, REsp 882.036/BA,
Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
17/11/2011, DJe 01/02/2012)
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
Julgado. “Surfista de trem”.
“Responsabilidade civil. Acidente ferroviário. Queda de trem. ‘Surfista
ferroviário’. Culpa exclusiva da vítima. I - A pessoa que se arrisca em
cima de uma composição ferroviária, praticando o denominado ‘surf
ferroviário’, assume as conseqüências de seus atos, não se podendo
exigir da companhia ferroviária efetiva fiscalização, o que seria até
impraticável. II – Concluindo o acórdão tratar o caso de ‘surfista
ferroviário’, não há como rever tal situação na via especial, pois
demandaria o revolvimento de matéria fático-probatória, vedado
nesta instância superior (Súmula 7/STJ). III – Recurso especial não
conhecido” (STJ, REsp 160.051/RJ, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA
RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/12/2002, DJ 17/02/2003,
p. 268).
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
“RECURSO ESPECIAL. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESCRIÇÃO.
NÃO CONFIGURAÇÃO. FUGA DE PACIENTE MENOR DE
ESTABELECIMENTO HOSPITALAR. AGRAVAMENTO DA DOENÇA.
MORTE SUBSEQUENTE. NEXO DE CAUSALIDADE. CONCORRÊNCIA
DE CULPAS. RECONHECIMENTO. REDUÇÃO DA CONDENAÇÃO.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...). As circunstâncias
invocadas pelas instâncias ordinárias levaram a que concluíssem
que a causa direta e determinante do falecimento do menor fora
a omissão do hospital em impedir a evasão do paciente menor,
enquanto se encontrava sob sua guarda para tratamento de
doença que poderia levar à morte....
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
“Contudo, não se pode perder de vista sobretudo a atitude negligente dos
pais após a fuga do menor, contribuindo como causa direta e também
determinante para o trágico evento danoso. Está-se, assim, diante da
concorrência de causas, atualmente prevista expressamente no art. 945
do Código Civil de 2002, mas, há muito, levada em conta pela doutrina e
jurisprudência pátrias. A culpa concorrente é fator determinante para a
redução do valor da indenização, mediante a análise do grau de culpa
de cada um dos litigantes, e, sobretudo, das colaborações individuais
para confirmação do resultado danoso, considerando a relevância da
conduta de cada qual. O evento danoso resulta da conduta culposa das
partes nele envolvidas, devendo a indenização medir-se conforme a
extensão do dano e o grau de cooperação de cada uma das partes à sua
eclosão. Recurso especial parcialmente provido” (STJ, REsp 1307032/PR,
Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 18/06/2013,
DJe 01/08/2013)
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
“RECURSOS ESPECIAIS. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CONCORRENTE.
1) AÇÃO DE INDENIZAÇÃO MOVIDA POR CORRENTISTA CONTRA O
BANCO. PAGAMENTO DE CHEQUES EMITIDOS MEDIANTE ASSINATURA
APENAS DE GERENTE, QUANDO EXIGIDA A ASSINATURA DESTE E DE
MAIS UM DIRETOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO BANCO. 2)
RESPONSABILIDADE CONCORRENTE RECONHECIDA. INDENIZAÇÃO À
METADE. 3) CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DA DATA DE CADA
CHEQUE INDEVIDAMENTE PAGO. 4) JUROS DE MORA CONTADOS A
PARTIR DA CITAÇÃO E NÃO DE CADA PAGAMENTO DE CHEQUE.
INADIMPLEMENTO CONTRATUAL E NÃO INDENIZAÇÃO POR ATO
ILÍCITO. 5) LUCROS CESSANTES DEVIDOS”....
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
“1.- Há responsabilidade objetiva do banco, que paga cheques
assinados apenas por gerente, quando exigível dupla
assinatura, também assinatura de um Diretor. Aplicação do
art. 24 do CDC.
2.- A Responsabilidade concorrente é admissível, ainda que no
caso de responsabilidade objetiva do fornecedor ou
prestador, quando há responsabilidade subjetiva patente e
irrecusável também do consumidor, não se exigindo, no
caso, a exclusividade da culpa” (STJ, REsp 1349894/SP, Rel.
Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em
04/04/2013, DJe 11/04/2013)
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
TRECHO DO ACÓRDÃO:
“III. RESPONSABILIDADE DA AUTORA PELO FATO CONCORRENTE. Após debate
de longo curso, veio a firmar-se, adequadamente, a orientação de que a
responsabilidade objetiva do fornecedor ou prestador de serviço não
afasta a co-responsabilidade do consumidor pelo fato também por ele
concausado por culpa patente, não se exigindo, no caso, culpa exclusiva.
Por todos, reporte-se ao vibrante debate doutrinário, em que vacilaram
inclusive conclusões das prestigiosas ‘Jornadas de Direito Civil”
(Enunciados ns. 46 e 380), reproduzido por FLÁVIO TARTUCE e DANIEL
AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES (‘Manual de Direito do Consumidor’, São
Paulo, Gen/Método, 2012, p. 188-193), culminando com a conclusão de
que o fato concorrente do consumidor constitui atenuante da
responsabilidade civil de fornecedores e prestadores”.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
TRECHO DO ACÓRDÃO:
“São numerosos os escritos e julgados (a começar do ‘caso do escorregador’, RESP.
287849/SP, 4ª. T., j. 17.4.2001, Rel. Min, RUY ROSADO DE AGUIAR), seguindo-se
outros, alguns dos quais lembrados pelas partes nestes autos (REsp.
712591/RS, 3ª. T., j. 16.11.2006, Rel. Mina. NANCY ANDRIGHI; AgRg no Ag
852683/RJ, 4ª T., j. 15.2.2011, Rel. Min. LUIZ FELIPE SALOMÃO – e outros).
Nesse sentido historiam, por todos, dada a especificidade e qualidade,
inclusive quanto às conclusões provisória e definitiva das ‘Jornadas de Direito
Civil’, FLÁVIO TARTUCE (‘Responsabilidade Civil Objetiva e Risco Concorrente’,
São Paulo, Gen/Método, 2011, passim) e o E. Ministro PAULO DE TARSO
SANSEVERINO, cuja participação honra este julgamento (‘Indenização e
Equidade no Código Civil de 2002’, Curitiba, Juruá, 2009, p, 103-104), e CAITLIN
SAMPAIO MULLHOLLAND, ‘A Responsabilidade Civil por Presunção de
Causalidade’, Rio de Janeiro, GZ, 2009, p. 24)”.
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
PARA FECHAR... O PROBLEMA DO CIGARRO.
“RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. FUMANTE.
EXERCÍCIO DO LIVRE-ARBÍTRIO. RUPTURA DO NEXO DE CAUSALIDADE.
VIOLAÇÃO AO ART. 535 NÃO CONFIGURADA. (...). 2. É incontroverso nos
autos que o Autor começou a fumar nos idos de 1.988, mesmo ano em
que as advertências contra os malefícios provocados pelo fumo
passaram a ser veiculadas nos maços de cigarro. 3. Tal fato, por si só,
afasta as alegações do Recorrido acerca do desconhecimento dos
malefícios causados pelo hábito de fumar, pois, mesmo assim, com as
advertências, explicitamente estampadas nos maços, Miguel Eduardo
optou por adquirir, espontaneamente, o hábito de fumar, valendo-se de
seu livre-arbítrio. 4. Por outro lado, o laudo pericial é explícito ao
afirmar que não pode comprovar a relação entre o tabagismo do Autor
e o surgimento da Tromboangeíte Obliterante”...
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A TEORIA DO RISCO CONCORRENTE
“5. Assim sendo, rompido o nexo de causalidade da obrigação de
indenizar, não há falar-se em direito à percepção de indenização
por danos morais. 6. Recurso Especial parcialmente conhecido e,
nessa extensão, provido”. (STJ, REsp 886.347/RS, Rel. Ministro
HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/AP), QUARTA TURMA, julgado em
25/05/2010, DJe 08/06/2010).
Ver, também: STJ, REsp 1113804/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 27/04/2010, DJe
24/06/2010. Ação proposta por familiares do fumante.
NOSSA POSIÇÃO, A PARTIR DA TEORIA DO RISCO CONCORRENTE.
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