Integração das instituições de Educação Infantil Infantilbalho BOLETIM 08 MAIO/JUNHO 2005 SUMÁRIO PROPOSTA PEDAGÓGICA INTEGRAÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL ASO SISTEMAS DE ENSINO ................................................. 03 Rita de Cássia Freitas Coelho PGM 1 CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL – ACERTANDO NOSSOS ENTENDIMENTOS ......................... 07 Integração das creches e pré-escolas ao respectivo sistema de ensino Mônica Correia Baptista Rita de Cássia Freitas Coelho PGM 2 REGULAMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL ......................................................................................... 12 Regulamentação da Educação Infantil no sistema municipal de ensino de Belo Horizonte Lívia Maria Fraga Vieira Mônica Correia Baptista Rita de Cássia Freitas Coelho PGM 3 A PROPOSTA PEDAGÓGICA .......................................................................................................................... 22 Projeto Político-Pedagógico para a Educação Infantil Maria Carmem Silveira Barbosa PGM 4 A FORMAÇÃO DO PROFESSOR QUE ATUA NA EDUCAÇÃO INFANTIL .................................................. 28 A formação do professor e a integração da educação infantil ao sistema educacional Ângela Rabelo Barreto PGM 5 A INTEGRAÇÃO AO SISTEMA COMO UM PROCESSO NEGOCIADO DE CONSTRUÇÃO DA QUALIDADE A autorização de funcionamento da instituição de atendimento da educação infantil – uma expressão da integração ........................................................................................................................................................ 32 Inez Maria de Melo Dolabela INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 2 PROPOSTA PEDAGÓGICA Integração da Educação Infantil aos sistemas de ensino Rita de Cássia Freitas Coelho 1 Conceituação e justificativa O atendimento em creches e pré-escolas sempre se caracterizou, na prática, como uma proposta educativa para as crianças de 0 a 6 anos. Mas, no Brasil, é a partir da Constituição Federal de 1988 que esse atendimento passa a ser reconhecido como direito das crianças à educação e dever do Estado. Na verdade, a Constituição incorporou algo que estava presente na sociedade. Em decorrência deste reconhecimento constitucional, esse Direito e essas competências referentes a ele foram posteriormente reafirmadas em duas importantes legislações: o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). A LDB definiu a Educação Infantil como primeira etapa da educação básica, integrando a estrutura e o funcionamento da educação escolar brasileira. Estabeleceu seus objetivos, caracterizou a exigência de formação profissional, classificou os tipos de instituições e fixou um prazo para integração das instituições ao respectivo sistema, findo em 20 de dezembro de 1999. A integração das creches e pré-escolas aos sistemas de ensino tem gerado muitas dúvidas e ambigüidades. Por outro lado, seu caráter legal e o prazo estabelecido para que a integração ocorresse não deixam dúvidas de que creches e pré-escolas estão integradas ao sistema educacional. São partes constituintes deste sistema e competência das Secretarias de Educação e dos Conselhos de Educação. Nesta perspectiva, os cinco programas da série Integração das instituições de Educação Infantil focalizam e debatem as estratégias privilegiadas para garantir a integração. Para que a integração das instituições de Educação Infantil seja efetiva, é necessário que algumas condições estejam asseguradas. Por outro lado, estas condições são estratégias privilegiadas da integração e são elas que concretamente garantem o direito à educação. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 3 Destacam-se: - A regulamentação da Educação Infantil; - A proposta pedagógica da instituição de atendimento; - A formação do professor que atua na Educação Infantil. O princípio norteador da série é que a integração é um fato, uma realidade, não se trata de uma opção do sistema ou instituição. Por outro lado, é preciso enfrentar as fragilidades reais existentes no quadro da Educação Infantil dentro do sistema educacional. Enfrentar essas questões não significa negar a origem histórica das creches ou as diversas entidades institucionais mas, ao contrário, a partir dessas características avançar na construção da dimensão educacional. Nesta série de cinco programas, vamos abordar a questão da integração da Educação Infantil aos sistemas de ensino, enfocando estes aspectos e evidenciando a articulação que existe entre eles. Temas que serão debatidos nos programas da série Integração das instituições de Educação Infantil, que será apresentada no programa Salto para o Futuro/TV Escola, de 30 de maio a 3 de junho de 2005: PGM 1 – Concepção de Educação Infantil – acertando nossos entendimentos No primeiro programa da série, serão debatidos: a) Conceituação de Educação Infantil; b) Direito da criança ao atendimento em creches e pré-escolas; c) Direito dos pais trabalhadores urbanos e rurais à assistência gratuita aos filhos de até seis anos de idade em creches e pré-escolas; c) Dever do Estado com a oferta; d) Opção da família em matricular; e) Caracterização de creches e préescolas; f) Trajetória histórica e relação com a assistência; f) Integrar não é passar; g) Dimensão intersetorial do atendimento à criança. PGM 2 - Regulamentação da Educação Infantil No segundo programa, serão enfocadas as temáticas: a) Concepção de sistema educacional; b) As opções de integração aos respectivos sistemas; c) Papel do órgão executivo e do órgão normativo; INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 4 d) Aspectos fundamentais da regulamentação: conceituação; espaço físico; proposta pedagógica; formação do professor; razão professor-criança; criação e autorização de funcionamento das instituições; f) A regulamentação como instrumento de formulação de política. PGM 3 - A proposta pedagógica A proposta pedagógica, o projeto político-pedagógico, o currículo e plano de trabalho – conceituação serão enfocados no terceiro programa. Estarão em discussão: a) O caráter coletivo da proposta pedagógica e o processo contínuo de construção; b) A proposta pedagógica como instrumento de garantia do atendimento educacional; c) As diretrizes curriculares nacionais; d) Diferentes referências para a construção da proposta. PGM 4 – A formação do professor que atua na Educação Infantil No quarto programa, estarão em discussão: a) O professor de Educação Infantil – uma identidade em construção; b) Quadro de profissionais da Educação Infantil – esclarecimentos quanto ao auxiliar; c) Habilitação profissional e formação para atuar com crianças de 0 a 6 anos; d) Formação inicial, continuada e em serviço; e) O currículo da formação de professor. PGM 5 – A integração ao sistema como um processo negociado de construção da qualidade No quinto e último programa, pretende-se evidenciar como, na prática de um município, o processo de autorização de funcionamento das instituições de Educação Infantil articula a regulamentação, a proposta pedagógica, a formação e outras exigências com as precariedades da realidade, avançando na construção do direito e da qualidade. Referências bibliográficas BAPTISTA, Mônica Correia, COELHO, Rita de Cássia Freitas e VIEIRA, Lívia Maria Fraga. Regulamentação da Educação Infantil. In: MOVIMENTO INTERFÓRUNS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DO BRASIL. Educação infantil: construindo o presente. Campo Grande, MA: Ed. UFMS, 2002. p. 123-138. BELO HORIZONTE. Conselho Municipal de Educação. Resolução 001/2000. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 5 BRASIL, Lei n. 9.394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 1996. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Integração das instituições de educação infantil aos sistemas de ensino: um estudo de caso de cinco municípios que assumiram desafios e realizaram conquistas. MEC/SEF, 2002. 94p. CAMPOS, M.M. e Rosemberg, F. Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças. Brasília: MEC, 1995. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Lei n. 8.069, Brasília, 1990. Nota 1 Assessora da Secretaria Municipal de Educação e membro do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte. Consultora desta série. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 6 PROGRAMA 1 CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL – ACERTANDO NOSSOS ENTENDIMENTOS Integração das creches e pré-escolas ao respectivo sistema de ensino Mônica Correia Baptista 1 Rita de Cássia Freitas Coelho 2 Conforme determina o artigo 89 das Disposições Transitórias da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n. 9.394/96, em 22 de dezembro de 1999, encerrou-se o prazo para que as creches e pré-escolas existentes e as que viessem a ser criadas se integrassem ao respectivo sistema de ensino3. Esse e outros dispositivos legais pretenderam concretizar o que a Constituição Federal, quase uma década antes, preconizara: conceber creches e pré-escolas como atendimentos educacionais. Ao longo desses quase dez anos, desde a homologação da LDB, observa-se um movimento, quer por parte dos órgãos dos poderes públicos, quer das instituições educativas, de integrar, aos sistemas de ensino, instituições que historicamente se constituíram sob a figura do amparo e da assistência. É, pois, na tentativa de contribuir com as reflexões acerca desse movimento que este texto pretende discutir o conceito de integração e, a partir dele, destacar algumas implicações e desafios que se colocam para todos aqueles que, de alguma forma, estão implicados na luta por consolidar a Educação Infantil como uma etapa da educação básica. Que significa “integrar-se aos respectivos sistemas de ensino?” O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa4 identifica alguns significados para o verbete “integrar”, dentre os quais destacamos três deles: “1. incluir(se) um elemento num conjunto, formando um todo coerente; incorporar(se), integralizar(se). 2. adaptar (alguém ou a si mesmo) a um grupo, uma coletividade; fazer sentir-se como um membro antigo ou natural dessa coletividade. 3. unir-se, formando um todo harmonioso; completar-se, complementar-se”. Todas as definições acima nos remetem à idéia de movimento. Incluir-se ou incluir algo num todo exige ações, atitudes, definições tanto no âmbito do conjunto no qual se quer incluir, quanto daquilo INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 7 que se pretende incluir. Assim sendo, também no caso das creches e pré-escolas, esse movimento de integração é dinâmico e multilateral. Dinâmico já que exige mudanças estruturais tanto em aspectos administrativos e materiais, como também e, sobretudo, naqueles relacionados às concepções teóricas e filosóficas que as fundamentam. E multilateral, uma vez que tais mudanças pressupõem medidas a serem implementadas pelas instituições educativas – creches e pré-escola – e pelos órgãos normativos e executivos do Poder Público e suas respectivas instâncias. A integração, assim compreendida, se assemelha mais a um processo estruturante do que a uma estrutura preexistente, na qual alguns “elementos” seriam “admitidos” e outros não. Implicações e desafios da integração No caso da Educação Infantil, integrar (se) ou possibilitar a integração significa atuar ou fazer com que atuem sob a coordenação da Educação. Para tanto, uma ação fundamental é estabelecer os parâmetros, valores e objetivos próprios da área educacional a serem tomados como referência. Essas definições, expressas na regulamentação da Educação Infantil, devem levar em conta as características da rede existente que, muitas vezes, apresenta precariedades e dificuldades resultantes do histórico afastamento do Estado nessa área. Desta forma, devem ser previstos os ganhos processuais e graduais na qualidade do atendimento já existente, ainda que, para isso, seja necessário abrir mão de determinados interesses e exigências mais imediatos. Agindo assim, reduzem-se as chances de, por um lado, a regulamentação se tornar uma espécie de cabo-de-guerra ou, por outro lado, um ato burocrático sem efeitos sobre a realidade. A regulamentação da Educação Infantil deve, pois, ser compreendida como uma oportunidade de negociação, de elaboração de um pacto em defesa do direito da criança. Dessa negociação devem resultar soluções, ações concretas e o compromisso efetivo de uma ação integrada entre as diferentes partes do sistema, com vistas a ofertar um atendimento educativo de qualidade. Vista a partir desta perspectiva, a regulamentação pode tornar-se um poderoso instrumento de intervenção na realidade. Contudo, ele não é o único, nem tampouco é suficiente. À normatização, função dos órgãos normativos dos sistemas de ensino, deve corresponder a indispensável reestruturação, definição de diretrizes e implementação de medidas, no âmbito do órgão executivo, com vistas ao fortalecimento do sistema de supervisão, acompanhamento e fiscalização dos estabelecimentos de ensino. Para desempenhar essas funções, o órgão executivo deve se preparar, tanto do ponto de vista de sua estrutura física e administrativa, quanto conceitual, e deve garantir INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 8 uma adequada formação dos seus profissionais para que possam atuar em consonância com as definições e preceitos estabelecidos. A qualificação de professores e outros profissionais para o trabalho nas instituições de Educação Infantil se constitui, igualmente, numa estratégia e condição privilegiada para a integração. Melhorar a qualidade do atendimento requer a construção de uma identidade profissional e o desenvolvimento de uma competência que levem em conta as especificidades dessa etapa da vida humana. Compete às agências de formação, tanto em nível médio quanto superior, reconhecer esta necessidade e providenciar a adequação e melhoria dos cursos, bem como ampliar a sua oferta. Evidentemente, cabe aos governos municipais, estaduais e federal propor e negociar a oferta desses cursos e assegurar aos profissionais as condições necessárias para sua realização. Além da formação inicial, é preciso pensar na formação continuada e em serviço de todos os profissionais. Nesse aspecto, mais uma vez, as parcerias entre agências de formação e sistemas de ensino se tornam fundamentais não apenas para a oferta de cursos de aprimoramento, qualificação e especialização na área, como também para auxiliar na elaboração de uma política de formação continuada através da qual se possam definir os tempos e as atividades a serem desenvolvidas, dentro da carga horária dos profissionais, conforme preconiza a LDB5. A proposta pedagógica6, entendida não apenas como a elaboração coletiva de um documento que descreve os ideais, compromissos, concepções, valores, intenções e objetivos dos profissionais, como também o processo através do qual se concretizam esses preceitos, ganha especial destaque no contexto da integração. Assim compreendida, a proposta pedagógica é um importante instrumento para assegurar que o objetivo de garantir uma educação de qualidade se concretize como ação e não simplesmente como discurso. Outro elemento imprescindível para a efetiva integração das instituições de Educação Infantil ao sistema de ensino é a articulação entre as diferentes áreas responsáveis pela educação e o cuidado da criança pequena. É preciso formular e implementar políticas capazes de articular as secretarias e órgãos ligados à Saúde, Assistência, Justiça, Trabalho, Cultura, concretizando um regime de colaboração entre os órgãos do mesmo município e entre os diferentes entes federados: municípios, estados e Governo Federal. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 9 Ainda na perspectiva da integração, os municípios enfrentam o desafio de assegurá-la efetivamente nos dois ciclos que constituem a Educação Infantil: 0 a 3 anos e 4 a 6 anos. A distinção entre as faixas etárias não pode resultar numa discriminação ou numa desigualdade que acabe por justificar a existência de padrões de qualidade distintos ou a expansão da oferta de apenas um dos dois segmentos. A integração exige ainda a manutenção de um sistema de dados estatísticos completo e atualizado em relação à demanda, ao número de instituições existentes e às condições de funcionamento das mesmas. Ainda que reconheçamos o avanço, nos últimos anos, na coleta e divulgação de dados referentes à Educação Infantil, sobretudo após a sua inclusão no Censo Escolar realizado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP –, muitas creches e pré-escolas ainda não estão inseridas nesse banco de dados. Além disso, são escassas as informações sobre as famílias que não utilizam os serviços de creches e pré-escola, tais como: número, perfil, principais motivos que fazem com que seus filhos não freqüentem esses serviços. Considerações finais Neste texto, apresentamos alguns dos eixos que consideramos essenciais para a efetiva integração da Educação Infantil aos sistemas de ensino. Para finalizar, caberia ressaltar uma vez mais que as definições legais e o movimento delas decorrente abriram novas e profícuas perspectivas para a educação da criança pequena. Entretanto, talvez a conquista mais significativa seja o reconhecimento de que o direito de toda criança de zero a seis anos à educação não é uma questão restrita ao âmbito de cada família e em especial das mulheres, mas é, isso sim, parte integrante da luta de todos os cidadãos por um tempo mais plenamente humano. Referências bibliográficas BAPTISTA, Mônica Correia, COELHO, Rita de Cássia Freitas e VIEIRA, Lívia Maria Fraga. Regulamentação da Educação Infantil. In: MOVIMENTO INTERFÓRUNS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DO BRASIL. Educação infantil: construindo o presente. Campo Grande, MA: Ed. UFMS, 2002. p. 123-138. BELO HORIZONTE. Conselho Municipal de Educação. Resolução 001/2000. BRASIL, Lei n. 9.394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 1996. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 10 BRASIL. Constituição Federal de 1988. CURY, Carlos Roberto Jamil. A Educação Infantil como direito. In: MEC. SEF. Subsídios para credenciamento e funcionamento de instituições de educação infantil. Brasília: maio, 1998. Volume II. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauri de Salles; FRANCO, Francisco M. de M. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Integração das instituições de educação infantil aos sistemas de ensino: um estudo de caso de cinco municípios que assumiram desafios e realizaram conquistas. MEC/SEF, 2002. 94p. Notas 1- Professora do Departamento de Administração Escolar da Faculdade de Educação da UFMG. 2- Assessora da Secretaria Municipal de Educação e membro do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte. 3- Conforme o texto legal: Art. 89: “As creches e pré-escolas existentes ou que venham a ser criadas deverão, no prazo de três anos, a contar da publicação desta Lei, integrar-se ao respectivo sistema de ensino”. 4- Houaiss, 2001, p.1.630. 5- A LDB, no seu art. 67, descreve as condições para que a valorização dos profissionais da educação se efetive. Dentre essas condições, o inciso V determina a garantia de um período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho. 6- A exigência de as instituições de ensino elaborarem suas propostas pedagógicas contando com a participação dos docentes consta dos artigos 12 e 13 da LDB e foi regulamentada pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil de 1999. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 11 PROGRAMA 2 REGULAMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL Regulamentação da Educação Infantil no sistema municipal de ensino de Belo Horizonte Lívia Maria Fraga Vieira 1 Mônica Correia Baptista 2 Rita de Cássia Freitas Coelho 3 “A educação infantil norteia-se pelos princípios de igualdade, liberdade, ideais de solidariedade, tendo por finalidade o desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físico, afetivo, cognitivo, social, contribuindo para o exercício da cidadania e pautando-se: no respeito à dignidade e aos direitos das crianças em suas diferenças individuais, sociais, econômicas, culturais, étnicas, religiosas, sem discriminação; numa concepção que faz do brincar a forma privilegiada de expressão, de pensamento e de interação da criança; na garantia do acesso aos bens sócio-culturais e artísticos disponíveis.” Resolução CME-BH nº 01/2000, artigo 4º. 1. Nos dias atuais, a Educação Infantil (EI), agora fazendo parte da organização da educação nacional, é a etapa do ensino que mais sofreu mudanças no plano da legislação, apelando para a necessidade de regulamentações. Mudanças substanciais ocorreram no plano legal, expressando novas exigências sociais por direitos. Destacam-se, para efeito desta discussão, os seguintes aspectos da Constituição Federal, bem como do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: a) Educação Infantil é direito da criança de 0 a 6 anos, oferecida em creches e pré-escolas; é direito de trabalhadores – homens e mulheres, urbanos e rurais; é dever do Estado, sendo atribuição prioritária do Município, sob o regime federativo de colaboração. b) Educação Infantil é a primeira etapa da educação básica, regida pelos princípios e objetivos, bem como integrada à organização da educação nacional. Tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (LDB, art. 21, 22 e 29). c) Creches e pré-escolas, públicas e privadas, sendo instituições educacionais, integram sistemas de INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 12 ensino – municipal e estadual, desde dezembro de 1999 (LDB, art. 89). Devem ser autorizadas pelos respectivos sistemas, o que pressupõe a necessidade de órgãos normativos de âmbito estadual ou municipal. Ora, cabe aos sistemas de ensino estaduais e municipais “autorizar, credenciar e supervisionar” os estabelecimentos de ensino dos seus respectivos sistemas e, no caso dos sistemas, acresce-se a incumbência de “avaliá-los” (LDB, art. 10 e 11). d) O ensino é livre à iniciativa privada sob as seguintes condições: “cumprimento das normas gerais da educação nacional e do respectivo sistema de ensino; autorização de funcionamento e avaliação pelo Poder Público; capacidade de autofinanciamento (...)” (LDB, art. 7º). e) Os sistemas municipais de ensino agregam estabelecimentos públicos de educação básica estabelecimentos e privados de Educação Infantil. Os municípios podem ainda integrar-se ao sistema estadual ou formar com ele sistema único. Nestes casos, os estabelecimentos de Educação Infantil públicos e privados estarão sob as normas e as incumbências do sistema estadual. Portanto, necessitam de ser regulamentados por ele. Não há dúvidas de que as creches e pré-escolas, públicas e privadas, existentes ou que venham a ser criadas, precisam estar conforme a lei e as normas dos respectivos sistemas de ensino. A Educação Infantil deixa de ser objeto de “oferta livre, sem regulação”, passando a se constituir em concessão, devendo, portanto, estar sujeita à supervisão, fiscalização e avaliação do poder público. 2. Maria M. Campos (1998), ao sistematizar questões sobre o tema, situa as tendências conflitantes do momento atual sobre a necessidade de regulamentar o atendimento educacional. De um lado, os questionamentos sobre o papel regulador do Estado, concomitante à crise do Estado do Bem-Estar Social, num contexto de emergência de teses neoliberais e de políticas de ajuste para países do Terceiro Mundo, que solapam recursos dos setores sociais, procurando enquadrá-los na lógica privada do mercado. De outro, a crescente preocupação com as situações que ofereçam riscos potenciais às crianças e os esforços de amplos setores dos poderes públicos, bem como do movimento social, como, por exemplo, o surgimento e a ação dos Fóruns Estaduais de Educação Infantil e sua articulação nacional, que buscam promover a melhoria da qualidade na educação. A própria legislação educacional e social é indicativa das novas exigências sociais pela inovação e regulamentação na área. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 13 No entrejogo dessas tensões, Campos nos alerta sobre a importância de definir os objetivos que queremos e devemos alcançar com a regulamentação da Educação Infantil e os procedimentos que devemos adotar para a sua aceitação e implementação. Ressalta a importância de se obter e contar com apoio público para as regulações necessárias deste nível de ensino. A autora distingue dois objetivos principais, que não são excludentes, mas podem não ser simultâneos: (a) a autorização de funcionamento, que exige definição e adoção de padrões mínimos e (b) o movimento pela melhoria processual de qualidade, que vai além dos padrões mínimos, inova e amplia objetivos dos serviços de educação e cuidado. Segundo Campos, que apresenta contribuições de outros autores, “A exigência de padrões mínimos visa definir um limite abaixo do qual os serviços são considerados como apresentando riscos inaceitáveis para as crianças. Portanto, acima desse mínimo, cada instituição ou programa pode fixar suas próprias metas e padrões.” (...) “A definição de padrões mínimos implica que serviços operando abaixo desse limite estão infringindo a lei e seus responsáveis podem sofrer sanções legais, inclusive com o fechamento do estabelecimento (...).” (p. 42) Assim, a adoção desses padrões “supõe uma capacidade fiscalizadora e punitiva por parte dos órgãos responsáveis. Sem essa garantia, as exigências correm o risco de produzirem muito pouco ou nenhum impacto sobre a realidade.” (p. 42) A adoção de indicadores de qualidade simples e claros, compreensíveis e divulgados para a maioria das pessoas e que possam ser facilmente aferidos em visitas de fiscalização, é igualmente recomendada. Além disso, é muito importante levar em conta a realidade, as condições e as características sociais e culturais de cada região, município ou estado, pois exigências acima da possibilidade da maioria das instituições podem resultar em efeitos negativos – fechamento das instituições, desestímulo à expansão com aumento de custos – que superem os eventuais benefícios da regulamentação. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 14 Ao lado dos sistemas de concessão de autorização, Campos destaca que os órgãos governamentais, municipais, estaduais, nacionais e inclusive internacionais também podem formular e incentivar a implantação de programas de melhoria processual de qualidade. Nos exemplos internacionais citados, os pontos comuns entre os critérios propostos são o foco no desenvolvimento da criança, a importância do papel do adulto/educador – sua formação, qualificação e profissionalização, bem como a ênfase no papel da família e da comunidade. Além disso, estes sistemas de promoção de qualidade combinam avaliação externa, com o auto-estudo e a auto-avaliação dos estabelecimentos, por meio de metodologias e materiais diversos. 3. Se a regulamentação visa, além de evitar riscos e garantir segurança, também atuar na conquista progressiva de qualidade e na efetiva implementação de direitos, quais são os itens do atendimento passíveis e necessários de regulamentar? Na resposta à tal questão, é importante considerar a diversidade das experiências e as desigualdades regionais, entre o urbano e o rural, entre a periferia, as favelas e o centro, entre o público e o privado e, no privado, a diversidade de iniciativas. Sendo assim, é desejável indicar o estabelecimento de critérios e de normas básicas de funcionamento das instituições de Educação Infantil, sem as quais as crianças podem estar submetidas a situações de riscos diversos, em prejuízo de suas necessidades e direitos. O que é passível de regulamentação? - Com relação à formação dos profissionais: de acordo com a legislação nacional que define a formação mínima de nível médio, modalidade Normal, para o exercício da docência na Educação Infantil, nas instituições públicas e privadas, as Diretrizes Operacionais da Educação Infantil (CNE, 2000) estabelecem o prazo de até 2007 para que todos os professores atuando na Educação Infantil obtenham, no mínimo, a formação em nível médio. - Os espaços físicos: onde se consideram itens como salubridade (ventilação, luminosidade, higiene – Ter água tratada, saneamento, instalações sanitárias, p. ex.); segurança; conforto para atividades que exigem concentração, descanso ou movimentação. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 15 - A razão docente/criança, de acordo com LDB – art. 25, considerando-se a capacidade de atendimento, as idades e a proposta pedagógica. - A proposta pedagógica e o regimento interno, com o estabelecimento de diretrizes para elaboração de acordo com a Resolução CNE/CEB nº 01/1999 e com as normas do respectivo sistema. - A gestão dos estabelecimentos, em que se deve explicitar os instrumentos e mecanismos de participação dos professores, dos pais e da comunidade, bem como as atribuições e competências do órgão normativo e do órgão executivo, no cumprimento das normas. - As sanções, em decorrência do descumprimento de prazos e de padrões estabelecidos. Cada sistema deve estabelecer: quais sanções, quem as garante, como são garantidas, preservando-se os direitos e necessidades de crianças e famílias. - As disposições transitórias: necessidade de prazos, de planos de metas, de validade delimitada da autorização, se levarmos em conta o momento vivido, que é de ajustes de concepções, de exigências, de condições de atendimento, também de acordo com as Diretrizes Operacionais do CNE. - A oferta de educação especial, na perspectiva da inclusão na Educação Infantil regular. 4. Quem elabora e como é elaborada a regulamentação? A EI é regulamentada pelos Conselhos Municipais de Educação nos municípios que constituíram seus próprios sistemas de ensino. Como a maioria dos municípios ainda não constituiu sistema próprio, é destacável o papel regulamentador dos Conselhos Estaduais de Educação e o papel supervisor das Secretarias Estaduais. De acordo com CURY (2000): “Os Conselhos de Educação são órgãos colegiados de funções normativas e consultivas em tudo que se refere à legislação educacional e sua aplicação. Eles também possuem a função de interpretar INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 16 a legislação educacional e assessorar os órgãos executivos dos respectivos governos. De modo geral, os Conselhos normatizam as leis educacionais por meio de Resoluções, precedidas de Pareceres. As Resoluções são o modo pelo qual as deliberações dos Conselhos ganham força de lei, já que são o instrumento apto da interpretação normativa própria destes órgãos.” (p.60) As diversidades na sua origem, composição, organização e funcionamento configuram desafios e diferenciados patamares para o estabelecimento, com base numa gestão democrática, das normas de autorização e funcionamento – as Resoluções. Em muitas situações, de acordo com relatos ocorridos nos Encontros Anuais da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME), a inexperiência dos conselhos municipais para normatizar, pela sua juventude e, em alguns casos, pela composição paritária que privilegia o movimento social e menos o especialista da educação, leva à necessidade de alargar tempos de deliberação/aprovação, como também de ampliar arenas de discussão e interlocução, visando qualificar os conselheiros (e as instituições ou segmentos que representam) para deliberar sobre questão que se configura como novidade para a maioria. Em Belo Horizonte, a Educação Infantil foi regulamentada pela Resolução CME-BH nº 01, de 11 de novembro de 2000, após longo período de discussão e amadurecimento no âmbito do Conselho Municipal de Educação6. Este Conselho, criado em 1998, é composto por pessoas que pela primeira vez eram conselheiras – pais, alunos, professores, além de gestores públicos, particulares e vinculados a instituições comunitárias. Foram 18 meses de elaboração pela Câmara de Educação Infantil e votação em Plenário. Este trabalho buscou contribuições de pelo menos quatro fontes: um diagnóstico das condições da oferta de Educação Infantil no município de Belo Horizonte, considerando-se os principais estrangulamentos e as possibilidades de superação, ou seja, a realidade do atendimento; o estado do conhecimento sobre a educação da criança de 0 a 6 anos; a legislação existente – a educacional e as correlatas, de âmbito nacional, estadual e municipal; e as posições e contribuições dos atores envolvidos através de discussões em Plenário e no interior da Câmara de Educação Infantil, de audiências públicas e debates promovidos pelo CME. A Resolução está dividida em três grandes capítulos. O primeiro é dividido em seis seções, trazendo INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 17 a definição – “do direito à educação e do dever de educar”, as disposições gerais; os princípios e fins; as diretrizes para elaboração de proposta pedagógica e regimento escolar, para os espaços físicos, instalações e equipamentos; dos profissionais, enfatizando a formação mínima necessária. O capítulo II trata da autorização de funcionamento, credenciamento e supervisão, definindo o papel da SMED, do CME, dos estabelecimentos de Educação Infantil, bem como os procedimentos julgados necessários. As disposições transitórias são objeto do capítulo III. Partindo do entendimento de que a efetivação da regulamentação exige a autorização e que o ato de autorização e funcionamento é o que simboliza a integração das instituições ao Sistema, o CME-BH incorporou a autorização no corpo da regulamentação, colocando, como desafio, conceber a relação do Conselho com o Executivo. O CME/BH considerou que ele avalia, define e dá posição que permite o funcionamento da instituição, mas quem executa todo o processo de autorização é o Executivo. Nesta perspectiva, já durante todo o processo de discussão e elaboração, a regulamentação cumpriu a função indutora de constituição de instância técnica e administrativa no âmbito da SMED, necessária ao trabalho de autorização, supervisão e fiscalização. O que vem possibilitando, ao órgão executivo, a construção de amplo conhecimento sobre as condições da oferta pública e privada de Educação Infantil no município e o constante aprimoramento de sua equipe e de seus instrumentos de trabalho. 5. O desafio de integrar creches e pré-escolas ao sistema educacional não pode de fato ser reduzido ao processo de normatização ou regulamentação. O papel que a regulamentação desempenha é dependente das concepções que informam o processo de sua construção e da forma como é conduzida, e depois implementada. Um objetivo primordial sinalizou o trabalho do CME-BH: assegurar às crianças o direito a uma Educação Infantil de qualidade. Tendo esse horizonte, é possível sistematizar alguns pontos que envolvem a regulamentação, que mesmo não sendo solução de todos os problemas da Educação Infantil, expressa exigência social por critérios, tornados públicos, e aprovados em instâncias legítimas e sustentados em processos democráticos, para o funcionamento de instituições infantis de cuidado e educação. Assim, o estabelecimento desses critérios e a sua implementação levam o debate social e ajudam a mostrar as graves distorções existentes no atendimento (situações limite) e nas políticas, levando à mobilização pela qualidade7. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 18 É, portanto, instrumento de luta. É possibilidade de responsabilização do Poder Público. É instrumento de qualificação da concepção de infância e das instituições de cuidado e educação. Exige e obriga melhor conhecimento da realidade. Exige profissionalismo nos serviços diretos (nas instituições infantis) e nos serviços de supervisão e de planejamento (no Poder Público). Exige estruturas públicas, no âmbito dos órgãos executivos, de supervisão, acompanhamento, fiscalização e avaliação. Evidencia o papel do Judiciário – Ministério Público, Juizado da Infância e da Adolescência, a importância da ação interconselhos (incluindo os Conselhos Tutelares) e da articulação com órgãos de fiscalização afins – por exemplo, órgãos de vigilância sanitária, do Ministério do Trabalho etc. Nesse sentido, possibilita a ampliação de parcerias e do leque de atores sociais, divulgando os novos conceitos da Educação Infantil, como direito à educação – acesso e qualidade para todas as crianças, em estabelecimentos públicos e privados. A regulamentação pode levar à explicitação de demandas e necessidades dos diferentes atores: sindicatos, associações, governo, setor privado, famílias, crianças. Propiciando o debate sobre as demandas e necessidades destes atores, que nem sempre são compatíveis entre si. E, quem sabe, contribuir para a construção social da criança como ator social, ativo e competente, na sua dignidade e identidade próprias. Podendo usufruir as instituições de Educação Infantil como “espaços de crianças”, e não somente como “serviços para crianças” (cf. MOSS, 2001). Referências Bibliográficas BELO HORIZONTE. Conselho Municipal de Educação. Resolução CME n. 01/2000 de 11 de novembro de 2000. Fixa normas para a Educação Infantil no Sistema Municipal de Ensino de Belo Horizonte. BRASIL. Constituição da República Federativa Brasileira. 1988. _______. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. _______. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. _______. Conselho Nacional de Educação. Parecer CEB nº 04/2000. Diretrizes Operacionais da Educação Infantil. Brasília, 2000. _______. Ministério da Educação. SEF/DPE/COEDI. Subsídios para credenciamento e funcionamento de instituições de educação infantil. Brasília, 1998. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 19 _______. Ministério da Educação. SEF/DPE/COEDI. Referenciais Curriculares para a Educação Infantil. Brasília, 1999. _______. Congresso Nacional. Plano Nacional de Educação. Brasília, 2001. CAMPOS, Maria M. A regulamentação da educação infantil. In: BRASIL. MEC. SEF/DPE/COEDI. Subsídios para credenciamento e funcionamento de instituições de educação infantil. V. II. Brasília, 1998. CAMPOS, M. M. & ROSEMBERG, F. Critérios para o atendimento em creches que respeitem os direitos fundamentais das crianças. Brasília: MEC, 1995. CURY, Carlos R. J. Legislação educacional brasileira. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. MOSS, Peter. Beyond early childhood education and care. Stockolm, june, 2001. (trabalho apresentado em Congresso, promovido pela OECD) TELLES, Vera da Silva. Política e espaço público na constituição do “mundo comum”: notas sobre o pensamento de Hannah Arendt. In: TELLES, V. S. Direitos sociais: afinal de que se trata? Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999. THIESSEN, Maria L. A posição dos Conselhos Estaduais de Educação sobre a educação infantil. Brasília: MEC/SEF/DPE/COEDI, 1994. Notas 1 Professora da FAE/UFMG – Presidente do CME/BH (período dezembro/98 a maio/01). 2 Professora da FAE/UFMG – Presidente do CME/BH (período maio/01 a maio/02). 3 SMED/BH e Presidente da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME) . 4 No Brasil, é remarcável a publicação, pelo Ministério da Educação, de documento encomendado que apresenta “Critérios de qualidade para creches que respeitem os direitos fundamentais das crianças” (1995). Inspirado em exemplos internacionais e baseado nas situações brasileiras, este documento pode ser fonte para subsidiar a elaboração de material de avaliação de qualidade para creches e pré-escolas, contribuindo para definição de metas de melhoria. O mesmo se pode considerar com relação aos “Referenciais Curriculares para a Educação Infantil” (1999), elaborados pelo Ministério da Educação, que podem nortear a melhoria de qualidade do trabalho pedagógico nas instituições infantis, dos livros e materiais didáticos produzidos e dos sistemas de supervisão e formação de professores. Lembramos ainda a recente publicação pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, do documento “Subsídios para o Projeto Político-Pedagógico da Educação Infantil” (julho/2001), que é resultado de trabalho conjunto, envolvendo diferentes parcerias. 5 No artigo citado, Campos considera que “embora não esteja claro, do ponto de vista das exigências legais, qual a responsabilidade dos Conselhos de Educação sobre o atendimento de crianças em residências, as chamadas creches domiciliares, ainda assim é preciso considerar que essa modalidade de acolhimento constitui uma realidade no Brasil, sendo muitas vezes apoiada por programas oficiais na área do bem-estar social” (p. 48). Fica evidente a necessidade de esclarecer a expressão constante da lei, que define que a educação infantil será oferecida em creches ou instituições equivalentes. Os termos “instituições equivalentes” carecem de maiores debates, podendo resultar em Resoluções específicas, as quais podem incluir INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 20 “creches domiciliares”. Campos reconhece que “esse tipo de atendimento coloca dificuldades especiais para a exigência de autorização e de fiscalização”, exigindo acréscimos significativos de pessoal para a fiscalização. 6 O CME-BH foi criado pela mesma lei que instituiu o sistema municipal de ensino de Belo Horizonte. Iniciou suas atividades em dezembro de 1998, quando por um período inicial de 4 a 5 meses elaborou e aprovou seu regimento interno. 7 A regulamentação contribui, sem dúvida, para combater o que poderíamos chamar de cultura do “antes isso do que nada”, já que pode acarretar a redução do número de crianças atendidas numa determinada instituição, o fechamento ou a suspensão de serviços, demonstrando com isso que o direito das crianças estava sendo, na prática, denegado. Ao mesmo tempo, torna visível a necessidade do investimento na melhoria e na ampliação do atendimento. Em outras palavras, a regulamentação explicita a demanda que, via de regra, é abafada, dentre outros motivos, pelo atendimento de baixa qualidade que prescinde de quaisquer critérios e em especial daqueles que podem assegurar o direito à educação. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 21 PROGRAMA 3 A PROPOSTA PEDAGÓGICA Projeto Político-Pedagógico para a Educação Infantil Maria Carmem Silveira Barbosa 1 Por que projeto político-pedagógico? Muitas vezes, temos um certo receio da palavra política, porém, ao pensarmos a educação que pretendemos oferecer para as crianças que irão viver em nosso país nos próximos anos, podemos constatar que a escrita de um projeto educacional, além de pedagógico, é também uma decisão profundamente política. “A educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças o bastante para não expulsá-las de nosso mundo e abandoná-las a seus próprios recursos, e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós, preparando-as em vez disso com antecedência para a tarefa de renovar um mundo comum.” Hannah Arendt Nós, os seres humanos, somos seres sociais, isto é, não sobrevivemos sem a existência de outros seres que nos cuidem, eduquem e auxiliem a crescer. A política surge a partir da constatação de que os seres humanos são dependentes entre si, que se relacionam e, por serem diversos, precisam formular possibilidades de convivência. A política é a capacidade de conviver com o pensamento plural, ser capaz de pensar no lugar e na posição do outro. Nossa condição humana nos faz diferentes em termos de etnias, credos, idades, gênero, porém compartilhamos o mesmo mundo, e a política é a capacidade de construção do diálogo com os outros com os quais devemos chegar a um acordo. “O campo da política é o do diálogo no plural que surge no espaço da palavra e da ação – o mundo público – cuja existência permite o aparecimento da liberdade.” Hannah Arendt Construir um Projeto Político-Pedagógico de uma escola é poder exercitar a política, pois ela é um produto da ação/diálogo dos seres humanos no espaço coletivo. Discutir, elaborar, argumentar, confrontar, decidir são ações que exercitam a criatividade e a tolerância de todos e que colocam as INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 22 idéias e a vida em movimento, criando e gestando um novo contexto. A construção de um Projeto Político-Pedagógico pode fazer avançar e instalar um novo modo de viver a experiência educativa da instituição. Quem constrói esta proposta político-pedagógica? Se considerarmos que a escola é um espaço público1, acreditamos que a construção do seu projeto educativo deve emergir da discussão entre todos aqueles que estão envolvidos em sua composição: administradores, docentes, funcionários, pais, avós, crianças e a comunidade em geral2 todos precisam ser ouvidos na elaboração do projeto político-pedagógico da escola. As portas da escola precisam estar abertas para criar um campo de discussão dos diferentes pontos de vista, das diversidades de concepções, procurando, através não da coerção, mas sim da argumentação, chegar a consensos sobre o que é o mais adequado e importante para a educação das suas crianças. A nossa Lei de Diretrizes e Bases (LDB n. 9.394/96) define, em seu artigo 12, que os estabelecimentos de ensino, ao elaborarem uma Proposta Pedagógica, precisam respeitar as leis e normas comuns do país e, também, estar de acordo com aquelas do seu sistema de ensino. Isto é, a proposta não pode ferir as leis maiores como a Constituição Federal, a Declaração dos Direitos das Crianças (ONU), o Estatuto da Criança e do Adolescente, a LDB e as normas dos Sistemas Estaduais ou Municipais. Como se constrói um Projeto Político-Pedagógico (PPP)? Um PPP pode ser construído de diferentes modos e cada instituição deve ter a liberdade para criar um documento que represente realmente o pensamento da escola. Neste texto, levantamos alguns aspectos que consideramos essenciais para serem discutidos na proposta final do texto. Geralmente, os documentos pedagógicos apresentam uma INTRODUÇÃO, na qual são apresentados os objetivos do documento, sua estrutura, quem elaborou, por quanto tempo será prevista a sua ação, como será acompanhada e avaliada, etc. Podemos ter, como segundo item, a CONTEXTUALIZAÇÃO, na qual se faz uma apresentação das características gerais da comunidade, das famílias residentes, do bairro, na qual se analisa a situação INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 23 de empregabilidade, o nível de escolarização dos adultos e jovens e as aspirações educativas da comunidade. Temos muitos modos de realizar este trabalho: trazendo pessoas da comunidade para informar, organizando pesquisas em que visitamos as famílias e procuramos conhecer um pouco mais da comunidade, entrevistando lideranças, lendo os dados estatísticos do perfil do bairro, etc. Conhecemos, assim, as características de identidade da comunidade escolar. Estes dados brutos, levantados empiricamente, precisam ser interpretados e é também neste momento que a presença de todos é importante para que não façamos análises estereotipadas da comunidade e de seus valores. Muitas vezes, neste momento de análise, podemos contar com técnicos que nos auxiliem a interpretar e compreender a realidade que emerge dos dados e dois campos disciplinares podem nos ser úteis neste momento: a sociologia e a antropologia. Além das características da comunidade, também é preciso mostrar as características de identidade da instituição: quem somos, onde estamos em nosso processo, qual a nossa história, o que valorizamos... Agora talvez venha uma das partes mais importantes do PPP, que são os PRINCÍPIOS EDUCACIONAIS. Os princípios não precisam ser muitos, nem extensos, o importante é que sejam pontos de vista compartilhados por todos e que possam vir a ser operacionalizados no dia-a-dia da educação. Creio que, inicialmente, é fundamental ter uma perspectiva mais abrangente sobre a sociedade e sobre o papel da educação e da escola nesta sociedade, retirando daí os seus princípios gerais. Numa sociedade que defende a democracia, é importante que valores como a igualdade, a participação, a solidariedade e a felicidade sempre sejam lembrados. É preciso também afirmar a especificidade do nosso trabalho educativo, que será realizado com crianças muito pequenas (de 4 meses até 6 anos). Assim, ter claro uma concepção de infância, dos seus direitos, de suas identidades pessoais, de suas potencialidades humanas, lembrando que estas concepções precisam permear todos os integrantes da instituição. Refletir sobre os valores que acreditamos serem fundamentais para as crianças também nos leva a pensar as práticas pedagógicas para a construção social destes sujeitos. Se o que pretendemos é formar seres sensíveis, criativos, brincalhões, não podemos construir uma proposta em que as crianças precisem ficar muito tempo em atividades dirigidas, disciplinares, em salas cheias de mesas e cadeiras. Isto é, nossas concepções promovem um tipo de organização do ambiente de trabalho e de interação entre as crianças que, conseqüentemente, terá efeitos na construção dos sujeitos. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 24 Como as instituições de Educação Infantil têm os seus objetivos visivelmente centrados no cuidar e educar3, é preciso constituir muita clareza conceitual sobre estes dois aspectos para não torná-los extremamente simples, pois ambos são conceitos complexos que, além de serem discutidos a partir do sentido comum para educadores, pais, crianças podem também ser alimentados pela filosofia, antropologia, pedagogia, psicologia. As visões sobre o cuidar e educar e a sua inter-relação irão colaborar na elaboração das perspectivas do projeto político-pedagógico e darão elementos de identidade para a escola. Também as relações educativas entre as crianças como grupo social, as relações entre as educadoras e as crianças e entre os adultos entre si são temas de importante discussão. Os princípios educacionais podem agora, depois de pesquisados, discutidos e sintetizados, serem transformados em OBJETIVOS GERAIS da instituição. Quanto aos objetivos gerais, é importante que eles sejam claros, sintéticos e reconhecidos por todos, sendo operacionalizáveis na ação educativa concreta dos educadores. Agora é preciso situar melhor a instituição descrevendo a ORGANIZAÇÃO DO CENTRO OU ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL. Nesta descrição, é preciso estar presente tanto a organização pedagógica como a administrativa nos aspectos físicos, recursos materiais, equipamentos e material pedagógico, os recursos humanos, seu papel, formação, etc. Finalmente, a Proposta Político-Pedagógica deve informar como será a ORGANIZAÇÃO DA AÇÃO EDUCATIVA, isto é, como ela estabelecerá a relação escola-família (desde a adaptação até a constante comunicação do acompanhamento da criança), a organização do trabalho pedagógico do professor, como será realizado o planejamento: a organização das rotinas, da programação5 (quais os conhecimentos e saberes que serão privilegiados), quais os instrumentos de intervenção pedagógica privilegiados (observar, agir, registrar, refletir, propor), como será o registro e o acompanhamento das aprendizagens, a organização dos grupos de crianças (vertical ou horizontal), organização do espaço (do ambiente físico e humano), do tempo e dos diferentes tipos de brinquedos e materiais, quais as propostas para as atividades de alimentação, descanso, higiene, as propostas de relacionamento com a comunidade, e outras definições. É preciso que na própria Proposta Político-Pedagógica das instituições, seja explicitado como ela será implementada e também como serão realizados seu acompanhamento e sua avaliação. Isto é, é INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 25 preciso formular uma proposta de acompanhamento da execução desta proposta, verificando como a mesma se desdobra na prática. Uma Proposta Político-Pedagógica é um documento de compromisso com as crianças brasileiras e com a sua educação, assim a instituição, como espaço público, deve constantemente estar abrindo o diálogo e a reflexão coletiva sobre o seu PPP, na tentativa de não sedimentar apenas a experiência vivida, mas confrontá-la com a prática, com os seus efeitos, com seus ganhos e perdas e, assim, poder estar em constante reflexão e em permanente reconstrução. E o regimento interno? O regimento interno é um documento escrito na seqüência da elaboração do Projeto PolíticoPedagógico. Ele é um documento com características diferenciadas, muito mais normativas que o PPP. O regimento é o documento básico que contém as determinações legais e as linhas norteadoras da organização formal da escola e devendo explicitar como será executada a aplicação do PPP. O Regimento Interno de um centro ou escola de Educação Infantil vai tentar especificar direitos e deveres das crianças e adultos (os professores, administração e funcionários), também vai dispor acerca do calendário escolar, dos dias letivos, da forma de organização dos grupos, da classificação dos alunos, da progressão escolar, da freqüência, do modelo de gestão, da administração das finanças e pessoal, da supervisão do trabalho docente, da formação em serviço dos educadores, da integração escola-comunidade, das funções dos diferentes setores, etc. Alguns Sistemas de Ensino estão solicitando que as escolas ou centros de Educação Infantil elaborem Planos de Estudos, isto é, que descrevam quais seriam as noções6 que deveriam ser adquiridas no decorrer de certo tempo de presença na instituição freqüentando por determinado grupo. Referências bibliográficas ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo, Perspectiva, 2003. ARENDT, Hannah. O que é política. Rio de Janeiro, Editora Bertrand Brasil, 1999. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 26 Notas: 1 Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 2 A escola é um espaço público seja ela gerenciada pela iniciativa privada, filantrópica ou estatal. 2 Muitos segmentos da sociedade podem participar da discussão como integrantes dos Conselhos Tutelares, Conselhos Municipais de Educação, Juízes da Vara da Infância, Pessoal de Saúde Pública, Associação de Pais ou Moradores de Bairro e outros. 3 São compreendidos, no ato de educar, as concepções de conhecimento-saber, ensino e aprendizagem, desenvolvimento, contexto de experiência, etc. 4 Em certas situações, ter uma relação de objetivos ampla dilui a importância do foco educacional, que precisa estar constantemente sendo retomado. 5 Atualmente, muitos pesquisadores trabalham um conceito de currículo ampliado, em que toda a PPP da escola estaria contemplada. Creio que esta expansão do currículo acabou deixando de lado a reflexão mais profunda sobre quais as experiências que a escola poderá oferecer (explícita ou implicitamente) a todos aqueles que dela são usuários. 6 Podem ser conceitos, experiências, conteúdos de acordo com a abordagem curricular. Esta creche respeita criança Critérios para a unidade creche • • • • • • • • • • • • Nossas crianças têm direito à brincadeira Nossas crianças têm direito à atenção individual Nossas crianças têm direito a um ambiente aconchegante,seguro e estimulante Nossas crianças têm direito ao contato com a natureza Nossas crianças têm direito à higiene e à saúde Nossas crianças têm direito a uma alimentação sadia Nossas crianças têm direito a desenvolver sua curiosidade,imaginação e capacidade de expressão Nossas crianças têm direito ao movimento em espaços amplos Nossas crianças têm direito à proteção, ao afeto e à amizade Nossas crianças têm direito a expressar seus sentimentos Nossas crianças têm direito a uma especial atenção durante seu período de adaptação à creche Nossas crianças têm direito a desenvolver sua identidade cultural, racial e religiosa INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 27 PROGRAMA 4 A FORMAÇÃO DO PROFESSOR QUE ATUA NA EDUCAÇÃO INFANTIL A formação do professor e a integração da educação infantil ao sistema educacional Ângela Rabelo Barreto 1 Na história das creches e pré-escolas em nosso País, especialmente das creches, os adultos que atuavam diretamente com as crianças apresentavam diferentes perfis de escolaridade e formação, sendo, às vezes, voluntários e semivoluntários sem nenhuma formação. Quando o Brasil adotou, nas décadas de 70 e 80, programas de expansão do atendimento às crianças de zero a seis anos, como o Projeto Casulo, da antiga Legião Brasileira de Assistência (LBA), e o Mobral, do Ministério da Educação, foram utilizados recursos da comunidade, inclusive recursos humanos, sem exigência de formação específica. Nos primeiros anos pós-Constituição, quando a creche e a pré-escola já estavam legalmente incluídas no dever do Estado com a educação (artigo 208, da Constituição), parte significativa dos profissionais que atuavam na Educação Infantil, mormente nas creches, não possuía formação específica e nem mesmo grau de escolaridade de nível médio. Muitos nem haviam concluído o Ensino Fundamental. Por esta razão, a formação foi considerada, no início dos anos 90, um dos pilares da política nacional de Educação Infantil (MEC, 1994a). Entendia-se que, para corresponder a uma concepção de Educação Infantil que considera a criança como um sujeito social e histórico e que, em complementação à ação da família, deve promover o desenvolvimento físico, emocional, cognitivo e social da criança e a ampliação de seus conhecimentos e experiências, o adulto que nela atua deve ser reconhecido como um profissional. Este profissional tem a função de educar e cuidar da criança, de forma integrada, devendo-lhe ser assegurados: formação, condições de trabalho, plano de carreira e remuneração. A formação é vista, portanto, como direito, sendo indissociável da profissionalização: as diferentes estratégias de formação devem gerar profissionalização, tanto em termos do avanço na escolaridade, quanto no que diz respeito à progressão na carreira (MEC, 1994b). Ao incluir a Educação Infantil – oferecida em creches e pré-escolas – na educação básica, como sua primeira etapa, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394, de 1996) explicita a INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 28 identidade educacional dessas instituições. Coerente com o reconhecimento desta identidade, a Lei define o perfil do profissional que nela atua: é o professor. Em seu artigo 62, a LDB estabelece que “a formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na Educação Infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal”. A exigência de que o profissional que atua nas creches e pré-escolas seja o professor, com formação em cursos próprios, de igual natureza daqueles que formam o professor das primeiras quatro séries do Ensino Fundamental, constitui, portanto, um aspecto essencial da identidade da Educação Infantil com o campo da educação e da estratégia da efetiva integração das creches e pré-escolas aos sistemas de ensino. Da mesma forma, a LDB, ao tratar dos profissionais de educação, determina que os sistemas de ensino devem promover a valorização desses profissionais, assegurando-lhes, no magistério público: ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos; aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento remunerado para esse fim; piso salarial profissional; progressão funcional baseada na titulação ou habilitação e na avaliação do desempenho; período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho; condições adequadas de trabalho (Art. 67). Ora, essas condições também se aplicam à Educação Infantil. Um outro aspecto da situação dos recursos humanos da Educação Infantil, identificado no início dos anos 90, além da existência de profissionais não habilitados, referia-se à qualidade da formação dos professores de Educação Infantil. Havia consciência de que a formação específica dos professores é uma das variáveis que mais impacto causam sobre a qualidade do atendimento em instituições de Educação Infantil (Scarr & Eisenberg, 1993). Entretanto, o lugar da Educação Infantil nos cursos de formação inicial de professores, seja de nível médio seja de nível superior, mostrava-se ainda tímido em nosso País (Barreto, 1994). As especificidades do desenvolvimento da criança na faixa etária de zero a seis anos e as práticas pedagógicas adequadas a ela, mormente a indissociabilidade das funções de cuidar e educar, nem sempre são devidamente tratadas nos cursos de formação prévia (Barreto, 1994; Campos, 1994; Oliveira-Formosinho, 2002). Em decorrência, tornam-se imprescindíveis grandes investimentos na formação em serviço. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 29 Alguns autores (Katz e Goffin, 1990; Barreto, 2004) têm apontado diferenças da Educação Infantil em relação aos outros níveis de ensino, exigindo um olhar próprio no contexto do setor educacional e de seus valores e tradições. Tais diferenças têm impacto na formação dos profissionais da área. Entre essas diferenças, pode-se mencionar a maior vulnerabilidade física e emocional das crianças pequenas, o que exige do adulto maior vigilância e supervisão mais intensa. O fato de a criança pequena ter menos capacidade verbal para expressar seus sentimentos e necessidades exige que o professor seja capaz de inferi-los e interpretá-los, o que requer desse adulto habilidades interacionais bem desenvolvidas para compreender os significados particulares da experiência de cada criança, considerando o contexto de sua família e cultura, bem como seu nível de desenvolvimento intelectual e cognitivo. Também as relações entre o professor e a família apresentam peculiaridades no caso da Educação Infantil, uma vez que os pais das crianças mais novas geralmente estão mais envolvidos com questões como alimentação, sono, controle de fezes e urina e outros aspectos da saúde e bem-estar da criança, levando-os a manter uma interação informal com o professor sobre essas questões (Katz & Goffin, 1990). Se não forem bem negociadas, essas interações podem levar a ressentimentos, discordâncias e mesmo hostilidade nas relações família-professor. Outro aspecto característico das crianças pequenas é que sua aprendizagem tende a ser indiferenciada por fronteiras de assuntos, tornando inadequada a organização de um currículo estruturado por disciplinas acadêmicas. Isto exige do professor sensibilidade para monitorar o comportamento e o progresso individual e dos pequenos grupos de crianças, e requer uma forte consciência sobre os objetivos da aprendizagem e habilidades múltiplas para capitalizar os interesses das crianças. A legislação educacional posterior à LDB sobre a formação de professores inclui vários pareceres e resoluções do Conselho Nacional de Educação (CNE) e neles as diretrizes e normas para a formação dos professores da Educação Infantil são as mesmas daquelas dos professores das primeiras quatro séries do Ensino Fundamental. Coerente com o princípio da LDB (Art. 61) de que a formação de profissionais da educação deve atender aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase do desenvolvimento do educando, as resoluções do CNE enfatizam que as propostas pedagógicas dos cursos de formação devem contemplar as especificidades de cada etapa e modalidade de ensino. Determinam que as diretrizes curriculares nacionais da educação básica constituem referência fundamental nas propostas pedagógicas e nos currículos dos cursos de formação dos futuros professores. Assim, os cursos que INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 30 formam professores de Educação Infantil devem considerar, em seus programas, as Diretrizes Curriculares Nacionais de Educação Infantil (Resolução CNE/CEB nº1, de 1999). As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) orientam as instituições de Educação Infantil quanto aos princípios, fundamentos e procedimentos na organização, articulação, desenvolvimento e avaliação de suas propostas pedagógicas. Definem que as propostas pedagógicas de Educação Infantil devem respeitar (a) os princípios éticos da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum; (b) os princípios políticos dos direitos e deveres da cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática; (c) os princípios estéticos da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais. As DCNEI enfatizam que tais propostas devem promover práticas de educação e cuidados que possibilitem a integração entre os aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivos/lingüísticos e sociais da criança, reconhecendo-a como um ser íntegro. As propostas devem também buscar a interação entre as diversas áreas de conhecimento e aspectos da vida cidadã, a partir de atividades intencionais, ora estruturadas, ora espontâneas e livres, contribuindo com o provimento de conteúdos básicos para a constituição de conhecimentos e valores. Sendo o professor o principal agente da elaboração e execução das propostas pedagógicas, as quais devem ser fundamentadas nas DCNEI, é fundamental que sua formação se paute nessas diretrizes. Nelas estão explicitadas as especificidades da Educação Infantil. Portanto, se a definição do profissional de Educação Infantil como professor, cuja formação se dá em curso normal ou licenciatura, constitui fator fundamental para a verdadeira integração da Educação Infantil nos sistemas de ensino, não se pode negligenciar que esta formação deve levar em conta as especificidades desta etapa da educação básica. De outra forma, corre-se o risco de não atender à finalidade da Educação Infantil que é “o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade” (LDB, Art. 29). Nota 1 Doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília; pesquisadora nas áreas de infância e de Educação Infantil. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 31 PROGRAMA 5 A INTEGRAÇÃO AO SISTEMA COMO UM PROCESSO NEGOCIADO DE CONSTRUÇÃO DA QUALIDADE A autorização de funcionamento da instituição de atendimento da educação infantil – uma expressão da integração Inez Maria de Melo Dolabela 1 Todas as instituições de Educação Infantil, existentes ou que venham a ser criadas, devem ter o seu funcionamento organizado a partir de critérios comuns estabelecidos pelas normas do respectivo sistema de ensino. Em geral, estas normas compõem uma regulamentação específica para a Educação Infantil, assegurando a responsabilidade do governo e da sociedade com o atendimento de qualidade das crianças de 0 a 6 anos de idade. A partir da Regulamentação, que pode ser estadual ou municipal, as instituições de atendimento, públicas e privadas, comunitárias, filantrópicas, confessionais e particulares precisam ser autorizadas pela Secretaria de Educação para ofertarem a Educação Infantil. A autorização de funcionamento é, portanto, uma expressão do conjunto de critérios; envolve a atuação da Secretaria e suas instâncias, dos Conselhos de Educação e das instituições de Educação Infantil. Ela significa ou simboliza o reconhecimento da identidade educacional do estabelecimento. Concretamente, insere a instituição no cadastro do sistema educacional. Autorização e credenciamento das instituições para oferta da Educação Infantil é ato da competência do(a) Secretário(a) Municipal de Educação, com base em parecer conclusivo do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte - CME/BH. As principais etapas do processo de autorização são da competência da Secretaria Municipal de INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 32 Educação- SMED, por meio de seus órgãos competentes, em especial da Gerência de Funcionamento Escolar/Gerência de Autorização de Funcionamento Escolar- GEFE/GAFESC: • orientação sobre a documentação exigida; • instrução e protocolo do processo; • análise da documentação apresentada: • realização da verificação in loco; • elaboração do laudo técnico; • encaminhamento ao CME/BH; • homologação do parecer conclusivo do CME/BH; • publicação do ato de autorização; • envio à instituição de cópia do ato e do certificado da autorização. O requerimento da autorização de funcionamento da instituição de Educação Infantil será, obrigatoriamente, instruído com os seguintes documentos: • cópia do ato constitutivo da instituição de Educação Infantil; • alvará de funcionamento ou alvará de construção, na hipótese de imóvel inacabado, devendo o documento definitivo, acompanhado do habite-se, ser apresentado até o início das atividades educacionais; • contrato de locação ou escritura do imóvel onde funcionará a instituição requerente; INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 33 • descrição das instalações físicas e sua adequação à modalidade de educação oferecida; • descrição do mobiliário e demais equipamentos necessários ao desenvolvimento do serviço oferecido; • Regimento Escolar. Proposta Pedagógica Este requerimento será endereçado ao Secretário Municipal de Educação, assinado pelo representante legal da entidade mantenedora e protocolado na SMED. Recebido o pedido, a documentação exigida é organizada dentro de um processo. Este processo que é encaminhado à GEFE/GAFESC, que terá o prazo de 60 (sessenta) dias, prorrogável por igual período, para emissão do laudo técnico e encaminhamento do mesmo ao CME/BH. Todos os documentos recebidos são analisados e têm suas informações avaliadas pela equipe técnica da GAFESC. Após análise dos documentos que instruem o processo, é realizada uma visita à instituição para observação e avaliação das condições de funcionamento e atendimento no local. É lavrado o Relatório de Verificação in loco. Esse relatório é circunstanciado, descritivo, contendo observações que a comissão verificadora entender que são necessárias para melhor esclarecimento da situação verificada in loco. Caso a instituição não apresente as condições de atendimento estabelecidas na Resolução CME/BH n. 001/2000, a GAFESC firma um Plano de Metas junto ao representante legal daquela instituição, flexibilizando as condições necessárias e os prazos para adequação ao fim a que se destina, atendendo às normas e especificações técnicas da legislação pertinente. Esse processo demanda acompanhamento e avaliação por parte dos órgãos públicos responsáveis (Regulação Urbana, Vigilância Sanitária, Rede Física e outros) visando à segurança das crianças e à melhoria da qualidade do atendimento. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 34 É um esforço para solucionar as questões, tendo em vista que a regulamentação da Educação Infantil é uma conquista dos pais e de vários setores da sociedade que lutam pelos direitos da criança pequena à educação e aos cuidados no seu cotidiano, na instituição. O processo, devidamente instruído, contendo o relatório de verificação in loco (laudo técnico) lavrado pela equipe da GAFESC, é encaminhado ao gabinete da Secretaria Municipal de Educação que o envia ao CME/BH. Ao CME/BH cabe receber o processo e designar um conselheiro como Relator para analisar e emitir parecer fundamentado sobre cada instituição. É este parecer que vai subsidiar a posição em relação a autorizar o funcionamento da instituição. No CME/BH, para que uma decisão seja tomada, é preciso que todos os conselheiros se posicionem. Assim, o Parecer elaborado para cada pedido de autorização de funcionamento é votado em sessão plenária pública. De acordo com a deliberação da maioria dos conselheiros, é dado o parecer conclusivo do Conselho Municipal de Educação, que retorna o processo à Secretaria Municipal de Educação para homologação do Secretário e publicação no Diário Oficial do Município - DOM. O ato de autorização de funcionamento da instituição terá validade por prazo determinado de até três anos. A renovação da autorização de funcionamento deve ser solicitada no prazo de 180 dias antes do vencimento. O processo de renovação de funcionamento é instruído com base na legislação pertinente e segue as mesmas etapas mencionadas anteriormente e o ato desta renovação terá validade por prazo determinado de até cinco anos. A supervisão, acompanhamento e a avaliação sistemática das instituições de Educação Infantil são de responsabilidade da SMED, a quem cabe assegurar a observância das leis de ensino e das decisões do CME. Cabe aos pais e demais integrantes da comunidade em geral participar desse momento de regularização de funcionamento das instituições de Educação Infantil, acompanhando as discussões, informando-se a respeito, exigindo dos responsáveis a apresentação do ato de autorização de funcionamento e do Certificado expedidos pela SMED e encaminhando a esta as irregularidades observadas em instituições que atendem a crianças de zero a seis anos. Todas as instituições INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 35 autorizadas devem ter o seu nome, número do ato de autorização e o prazo de validade disponibilizados na home page da Prefeitura de Belo Horizonte – PBH. (www.pbh.gov.br ). Assim posto, é preciso afirmar o processo de autorização das instituições de Educação Infantil como um processo negociado de construção da qualidade do atendimento educacional. Referências bibliográficas LDBEN- Lei Federal nº. 9.394/96. Resolução CME/BH 001/2000. Resolução CME/BH 002/2003. Nota 1 Gerente da Gerência de Funcionamento Escolar da SMED/BH. INTEGRAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL. 36