Colóquio: Educação Infantil: Expectativas, Desafios e Possibilidades Silvia H. V. Cruz (FACED-UFC) Gosto de matemática, mas sou muito pequeno para fazer muita tarefa, eu gosto de desenhar. (André, 5 anos) Não pode faltar brinquedo, nem pista, nem carrinho, nem boneca, nem boneco. Eu não gosto de boneca escabelada. (criança ouvida na Consulta sobre Qualidade na Educação Infantil) A expansão da oferta de vagas e a melhoria da qualidade das experiências educacionais das crianças em creches e pré-escolas demandam tanto ações de natureza pedagógica como medidas políticas e econômicas. CONCEITOS FUNDAMENTAIS A criança é sujeito histórico, social e de direitos que se desenvolve nas interações que estabelece nos contextos culturais e grupos nos quais se insere. A Educação Infantil tem uma identidade específica, que inclui os seguintes aspectos: tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança; educação e o cuidado são indissociáveis; a ação educativa deve promover as aprendizagens e o desenvolvimento das crianças considerando a integralidade e indivisibilidade das suas diversas dimensões; as várias linguagens da criança precisam ser estimuladas; a atividade lúdica deve ser valorizada e incentivada. ACESSO A legislação brasileira afirma o direito da criança à Educação Infantil (artigo 208 da Constituição, artigo 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente). A meta do PNE de 2001, em relação à ampliação da matrícula na Educação Infantil era que, até 2011, a educação se estendesse a 50% das crianças de 0 a 3 anos e a 80% das crianças de 4 e 5 anos Porém, direito à educação ainda está distante para uma grande porcentagem das nossas crianças pequenas: a meta está sendo alcançada em relação às crianças de 4 a 5 anos, mas as crianças de 0 a 3 anos continuam predominantemente excluídas do direito à educação. A exclusão acontece de modo diferenciado nas várias regiões do país, sendo a região Norte onde ela é mais intensa. A exclusão é mais acentuada na área rural do que na área urbana. A exclusão torna-se maior na medida em que diminui o poder aquisitivo das famílias. Esta associação entre pobreza (e, portanto, raça/etnia) e acesso à educação é especialmente forte na creche. BAIXA OFERTA DE CRECHES As crianças de 0 a 3 anos são submetidas às piores condições de vida: têm a maior taxa de desnutrição, maior taxa de mortalidade, piores condições de salubridade etc., sendo, portanto, a mais vulnerável. Desde que nascem (e não a partir dos 4 anos) as crianças estão em intenso processo de aprendizagem e desenvolvimento. Portanto, a baixa oferta de vagas para a creche expressa a persistência da visão da Educação Infantil como preparação para o ensino fundamental e a desconsideração do seu papel no desenvolvimento integral da criança. QUALIDADE O oferecimento de creches e pré-escolas de qualidade poderia representar um instrumento importante para a diminuição das enormes desigualdades presentes na nossa sociedade. No entanto, sabe-se que são as camadas marginalizadas da população que freqüentam instituições onde há mais problemas relativos ao currículo, à infra-estrutura, ao material pedagógico, ao número de crianças por professor etc. Assim, tais espaços alimentam e reforçam as desigualdades socioeconômicas, étnico-raciais e regionais. Persistem práticas pedagógicas inadequadas que desrespeitam os interesses, as habilidades, as curiosidades, os desejos dos bebês e crianças pequenas. Como resultado, muitas delas se sentem frustradas e insatisfeitas com sua experiência educativa. Para mudar esse quadro, é importante de que os Parâmetros nacionais de qualidade na Educação Infantil (MEC, 2006) e as novas Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil (Resolução CNE/CEB 05/2009) sejam amplamente divulgadas, debatidas e apropriadas pelos profissionais que atuam nessa área. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil alertam que “cumprir função sociopolítica e pedagógica requer oferecer as melhores condições e recursos construídos histórica e culturalmente para que as crianças usufruam de seus direitos civis, humanos e sociais”. Esse é um grande e urgente desafio a ser enfrentado. Os conselhos de educação e os movimentos sociais devem assumir papel fundamental no monitoramento das efetivas condições e recursos oferecidos, muitas vezes tensionando os governos (ex: movimento “FUNDEB pra valer”). FORMAÇÃO DOS PROFESSORES É imprescindível consolidar e avançar nas conquistas relativas à formação e valorização dos professores da Educação Infantil. Se quisermos melhorar a qualidade da educação oferecida às crianças pequenas temos que, necessariamente, nos comprometer com a qualidade da formação dos seus professores. O nível de escolaridade dos professores tem melhorado, mas ainda continua havendo a contratação de pessoas que sequer possuem a titulação mínima exigida legalmente (12.000 profissionais cursam o PROINFANTIL). Além da titulação, é preciso considerar a efetiva formação que os cursos oferecem. As recentes Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia representaram um real avanço. As reformulações curriculares decorrentes desta Resolução precisam ser sistematicamente acompanhadas e avaliadas pelos órgãos competentes para que essa formação realmente incorpore temas e dimensões que, necessariamente, integram o trabalho educativo com crianças menores. FINANCIAMENTO O aporte de mais verbas é imprescindível para viabilizar a melhoria da qualidade na Educação Infantil. Uma meta importante é que seja praticado Custo Aluno-Qualidade – CAQ previsto pela legislação e estimada por estudos recentes. Tomando esse conceito como referência, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação avalia que anualmente é necessário investir mais 29 bilhões em educação. A falta de recursos financeiros é um dos motivos alegados pelos municípios para o baixo investimento na Educação Infantil. A obrigatoriedade de matrícula das crianças de 4 e 5 anos na pré-escola, entre outros problemas, representa um risco de que a creche seja deixada em último plano. Muitos municípios já colocam o fechamento de creches como a única saída para atender a demanda por pré-escolas. O aumento de verbas é fundamental para financiar a oferta pública de Educação Infantil e diminuir ao máximo os convênios. Para dar conta das necessidades de financiamento da educação pública, a estimativa é que é preciso atingir, até 2014, no mínimo, 10% do PIB. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação defende essa meta. A ampliação para 7% do PIB já constava no Plano Nacional de Educação de 2001, mas foi vetada pela presidência da república. Esta Conferência pode corrigir esse erro histórico. INFORMAÇÕES Informações abrangentes, precisas e atualizadas são imprescindíveis para as atividades de planejamento, acompanhamento e avaliação da área. Há necessidade de que Os dados colhidos pelo o IBGE acerca dos indicadores sociais sobre crianças e adolescentes abranjam a faixa de 0 a 3 anos. O censo escolar - inclua todas as instituições de Educação Infantil - seja precedido de orientações para o seu correto preenchimento. CONCLUINDO As fragilidades, equívocos e insuficiências presentes na Educação Infantil apontam que são muitas as prioridades a serem enfrentadas. Mas as conquistas já obtidas evidenciam as transformações que a sensibilidade, o conhecimento, a mobilização e o comprometimento de muitos podem provocar. ESTA CONFERÊNCIA É UMA OPORTUNIDADE ÍMPAR PARA GARANTIR E AVANÇAR NESSAS CONQUISTAS.