0000292-57.2004.4.03.6100 Autos com (Conclusão) ao Juiz em 21/08/2015 p/ Despacho/Decisão *** Sentença/Despacho/Decisão/Ato Ordinátorio 22ª VARA FEDERAL CÍVEL DE SÃO PAULO PROCESSO Nº 0000292-57.2004.403.6100 DECISÃO Às fls. 2889/2996 a União Federal apresentou impugnação com fundamento nos artigos 475-L, 1º e 741, ambos do CPC, requerendo a suspensão do pagamento dos precatórios e RPVs, mantendo-se os respectivos valores à disposição do juízo até decisão definitiva nos autos da ação rescisória n.º 0025017-96.2014.403.6100, em razão do acórdão proferido no RE N.º 638.115/CE, com repercussão geral reconhecida.O Sindicato autor manifestou-se às fls. 3060/3092 alegando, basicamente, que o parágrafo primeiro do artigo 741 do CPC não pode ter a abrangência que a União lhe pretende atribuir, considerando que a proteção à coisa julgada encontra fundamento na própria Constituição Federal. Acrescenta que o regime da repercussão geral não tem a eficácia erga omnes pretendida pela União, restringindo-se seus efeitos diretos à lide sub-judice.É o relatório. Decido.A sentença proferida às fls. 393/406 julgou procedente o pedido, condenando a União: (1) atualizar as parcelas de "quintos" incorporados pelos substituídos do autor até a data de 04.09.2001; (2) incluir nas remunerações dos substituídos do autor as VPNIs relativas a quintos incorporados e (3) pagar as diferenças resultantes da procedência do pedido, nos termos da fundamentação, fazendo incluir os reflexos sobre férias e 13º salários, podendo fazê-lo por meio de folha de pagamento suplementar. A correção monetária efetuada nos termos da Resolução 561 CJF e juros de mora de 6% ao ano.Em sede de recurso, foi negado provimento às apelações do sindicato autor e da União e dado parcial provimento à Remessa Oficial para explicitar os critério da correção monetária, fls. 708/718.Admitido o Recurso Especial, fls. 869/872, a ele foi negado provimento, fls. 908/913, transitando em julgado o acórdão em 02.03.2011, conforme certidão de fl. 919.A União sustenta que o parágrafo único do CPC atribui aos embargos à execução eficácia rescisória de sentenças inconstitucionais, abrangendo tanto as sentenças fundadas em norma inconstitucional, quanto as sentenças que aplicam norma declarada inconstitucional em precedente do STF, seja em controle difuso, seja em controle concentrado.Muito embora o parágrafo único do art. 741 faça referência à inexequibilidade da título judicial cuja aplicação ou interpretação seja incompatível com a Constituição, não pode simplesmente retirar a eficácia de uma sentença transitada em julgado.Referido dispositivo deve ser interpretado sob a ótica da proteção à coisa julgada e da segurança jurídica assegurados na própria Constituição Federal. Nesse aspecto destaco:"Título judicial é sentença transitada em julgado, acobertada pela autoridade da coisa julgada. Esse título judicial goza de proteção constitucional que emana diretamente do estado democrático de direito (CF 1º caput), além de possuir dimensão de garantia constitucional fundamental (CF 5º XXXVI). Decisão posterior, ainda que do STF, não poderá atingir a coisa julgada que já havia sido formada e dado origem àquele título executivo judicial. A decisão do STF que declara inconstitucional lei ou situações que estejam se desenvolvendo com fundamento nessa lei. Essa retroatividade tem como limite a coisa julgada. (Canotilho, Dir. const., p.1001). Não se pode alcançar, portanto, as relações jurídicas firmes, sobre as quais pesa a auctoritas rei iudicatae, manifestação do estado democrático de direito (do ponto de vista político-social-coletivo) e garantia constitucional fundamental (do ponto de vista individual, coletivo ou difuso). A esse respeito, ressalvando a coisa julgada dos efeitos retroativos da decisão de inconstitucionalidade, embora nem precisasse fazê-lo, é expressa a CF portuguesa (art. 282, n.3, 1ª parte). Caso se admita a retroação prevista na norma ora comentada como possível, isso caracterizaria ofensa direta a dois dispositivos constitucionais: CF 1º caput (estado democrático de direito, do qual a coisa julgada é manifestação e 5º XXXVI ( garantia individual ou coletiva da intangibilidade da coisa julgada). A norma, instituída pela MedProv 2180-35 10 é, portanto, materialmente inconstitucional. V. coments. CPC 467" (Código de processo civil comentado : e legislação extravagante : atualizado até 7 de junho de 2003 / Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery. - 7 ed. rev. e ampl. - São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2003).Desta forma, tendo a decisão exequenda transitado em julgado em data anterior ao reconhecimento da alegada inconstitucionalidade, não pode ser por ela atingida, sob pena de ofensa à garantia constitucional representada pela coisa julgada.No bojo do Recurso Extraordinário RE 638115/CE foi proferido seguinte acórdão:Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a presidência do ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas: preliminarmente, apreciando do Tema 395 da repercussão geral, por maioria, conhecer do recurso, vencidos Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello; em seguida, dar-lhe provimento, vencidos Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello; por maioria, modular os efeitos da decisão, nos termos do voto do Relator.Vencido Marco Aurélio que não lhe modulava e impedido Roberto Barroso.Brasília, 19 de março de 2015.A decisão invocada, ainda não transitada em julgado considerando que há embargos de declaração opostos pendentes de apreciação, reconheceu a inconstitucionalidade da incorporação dos quintos, sob o enfoque do princípio da legalidade. Confirase:"(. . .)Ocorre, porém, que o caso apresentado nos presentes autos é deveras peculiar. O tema referente à incorporação de quintos, por suscitar a interpretação da legislação aplicável a essa matéria (leis 8.112/90, 8.911/94, 9.624/98 e MP 2.22545/2001), costuma ser tratado como deíndole estritamente infraconstitucional. Assim, ele tem sido enfrentadopelos tribunais e também pelo Superior Tribunal de Justiça. No entanto, essa forma de abordar a matéria representa apenas um dos enfoques possíveis quanto à questão da legalidade. Nada impede que a questão debatida em todas as instâncias inferiores, inclusive no âmbito do STJ, seja abordada desde outra perspectiva no Supremo Tribunal Federal, mesmo porque a causa de pedir do recurso extraordinário é aberta (RE 298.695, rel. min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 6-8-2003, Plenário, DJ de 24-10-2003). A mesma questão debatida, devidamente prequestionada, pode ser apreciada desde outro enfoque pelo Supremo Tribunal Federal, o qual poderá enfrentar o tema desde o enfoque constitucional, inegavelmente presente nesta matéria. Nessa hipótese, é cabível o recurso extraordinário, tendo em vista que, apreciada a questão novamente pelo STJ, apenas resta a via do recurso extraordinário para que o STF possa analisá-la sob outra perspectiva, a constitucional. E, no caso, a matéria, apreciada de forma adequada, é visivelmente constitucional.Destarte, não há, aqui, mera questão de ilegalidade, por ofensa ao direito ordinário, mas típica questão constitucional consistente na afronta ao postulado fundamental da legalidade.(. . .)".A parte dispositiva do Voto do Relator assim consignou:"(. . .)Ante o exposto, dou provimento ao recurso extraordinário, fixando a tese de que ofende o princípio da legalidade a decisão que concede a incorporação de quintos pelo exercício de função comissionada no período entre 8.4.1998 até 4.9.2001, ante a carência de fundamento legal.Além disso, em razão da segurança jurídica, modulam-se os efeitos da presente decisão para obstar a repetição de indébito em relação os servidores que receberam de boa-fé os quintos pagos até a data do presente julgamento, cessada a ultra-atividade das incorporações em qualquer hipótese.(. . .)"O regime representativo de controvérsia, ao qual submetido o RE 638115/CE, encontra previsão nos artigos 543-A e 543-B do CPC e não se confunde com o rito próprio das ações declaratórias de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade.Nos termos do artigo 543-B do CPC, reconhecida a repercussão nos moldes do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte. Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se. Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada.Observe-se, contudo, que julgado o mérito do recurso extraordinário representativo de controvérsia, a apreciação pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, limita-se aos recursos cujo andamento tenha sido sobrestado, ou seja, no bojo dos quais não tenha havido decisão definitiva.Em outras palavras, a decisão proferida no recurso extraordinário representativo de controvérsia, e, por consequência, a modulação de seus efeitos, servirá de parâmetro para o posterior julgamento de processos de idêntico objeto, não atingindo situações já consolidadas pela coisa julgada.Desta forma, pretendendo a União desconstituir o julgado, a única via adequada é a rescisória. No caso dos autos, a União propôs ação rescisória, autuada sob o n.º 2012.03.00.025017-0, que se encontra pendente de julgamento perante a Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Assim, eventual pedido de suspensão de pagamento dos precatórios expedidos nestes autos ser formulado no bojo da própria rescisória em respeito à coisa julgada aqui consolidada. Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente impugnação, devendo o feito ter regular prosseguimento.São Paulo, JOSÉ HENRIQUE PRESCENDO Juiz Federal