Colaboração: Qualidade no Ensino Maria Helena Braga / [email protected] Horácio Almendra Maria Sidalina Gouveia /[email protected] [email protected] www.iqe.org.br Cristina Luiza Garbuio / [email protected] É possível aprender uma língua sem conhecer os termos técnicos com os quais ela é analisada? Maria Helena Braga Supervisora Pedagógica de Programas do IQE – Instituto Qualidade no Ensino É indiscutível que o objetivo da escola é o de criar condições para que o português padrão seja aprendido. Entretanto, vários aspectos podem levar ao seu não aprendizado, sendo um deles a adoção de práticas escolares não signi•cativas. A•nal, aprende-se a falar em interação e não por meio de repetições que não propõem re!exão sobre nossa gramática internalizada — regras que o falante de fato aprendeu e das quais lança mão ao falar ou escrever — para, a partir daí, analisar a língua em fucionamento e compreender as regras que alicerçam seu uso. Infelizmente, por vezes, em sala de aula, deixa-se de considerar a língua como um objeto social variável e, consequentemente, de propor a re!exão sobre os diferentes usos pelos grupos que compõem a sociedade. Um exemplo interessante é o emprego do verbo ter com sentido de existir. Embora não seja uma construção condenada na modalidade oral — utilizada por falantes escolarizados ou não —, quando se trata da escrita, a construção é totalmente rejeitada. Tendo em vista essa situação, as aulas de Língua Portuguesa deveriam levar os alunos à observação de que, por exemplo, enquanto há gramáticos que enfatizam o absurdo que representa o emprego do verbo ter no sentido de existir, há também os que apontam para o seu uso na linguagem coloquial e até validam o emprego por meio de trechos de autores como Carlos Drummond de Andrade, em “Hoje tem festa no brejo"”. A observação do emprego do verbo ter com sentido de existir, em construções realizadas em sala de aula e em veículos de comunicação, levaria os alunos a concluírem que essas construções são comuns e já constituem uma característica do português brasileiro. Além da regra que elimina o emprego do verbo ter e •xa o uso de haver, insiste-se em que o verbo haver, com sentido de existir, deve ser usado na 3ª pessoa do singular, como em “Há muitos alunos na sala”. Essa regra acaba confundindo os alunos, porque a ênfase no sentido de existência se faz tomando como ponto de equilíbrio o verbo existir que, por sua vez, concorda em número com o sujeito, como em “Existem muitos alunos na classe”. Dessa forma, os usuários da língua passam a empregar o verbo haver no plural, para mostrar que dominam a norma padrão, instaurando a concordância de número com o sintagma nominal, o que, de acordo com a Gramática Normativa, deveria restringir-se ao verbo existir. Sim, é possível aprender uma língua sem dominar sua nomenclatura técnica, logo, o professor não pode esquecer-se de que a norma padrão é uma idealização resultante de valores sobre como se acredita que a língua deva ser empregada, não uma língua. Essa constatação exige do professor de Língua Portuguesa postura autônoma e pesquisadora para elaborar atividades adequadas à realidade linguística dos alunos.