UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA ANNA MARIA TEIXEIRA LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS SOB O PRISMA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA Florianópolis 2010 1 ANNA MARIA TEIXEIRA LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS SOB O PRISMA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA Monografia apresentada ao Curso de Graduação do Curso de Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel. Orientadora: Profª. Andréia Régis Vaz Florianópolis 2010 2 ANNA MARIA TEIXEIRA LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS SOB O PRISMA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado pelo Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina. Florianópolis, de de 2010. Profª. e orientadora Andréia Régis Vaz Universidade do Sul de Santa Catarina Prof. Universidade do Sul de Santa Catarina Prof. Universidade do Sul de Santa Catarina 3 TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS SOB O PRISMA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA Declaro, para todos os fins de direito e que se fizerem necessários, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia. Estou ciente de que poderei responder administrativa, criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico. Florianópolis (SC), 14 de junho de 2010. ___________________________ Anna Maria Teixeira civil e 4 Para minha querida mãe, razão de todas as conquistas. Para meu marido Robert e meu filho João Pedro, amores da minha vida. 5 AGRADECIMENTOS A Deus, pois sem Ele, nada seria possível. Aos meus pais, pelo estímulo de cursar uma faculdade. Ao meu filho João Pedro, pelo tempo doado para a conclusão desta monografia. Ao meu marido Robert, pelo incentivo de sempre sonhar e acreditar no amanhã. Ao Exmo. Dr. Paulo Antônio Günther pela oportunidade de aprender mais sobre o direito penal e processual penal, e, pela ilustre sapiência repassada à minha pessoa todos os dias. Ao meu irmão Herlon, pelos brilhantes ensinamentos. Aos meus familiares, por sempre acreditarem em minha formação. A minha orientadora, Profª. Andréia Régis Vaz, pela paciência durante o percurso desta monografia, sempre com o seu generoso apoio e dedicação. A minha colega Renata, pela paciência de ler e reler este trabalho, ajudando-me com dicas para aprimorá-lo. Aos amigos e aos colegas de faculdade, pela força e pelo apoio doado para que esta etapa fosse findada, e pela amizade solidificada que, certamente, se eternizará. 6 É preferível prevenir os delitos a ter de puni-los; e todo legislador sábio deve antes procurar impedir o mal que repará-lo, pois uma boa legislação não é mais do que a arte de proporcionar aos homens a maior soma de bem estar possível e livrá-los de todos os pesares que se lhe possam causar, conforme o cálculo dos bens e dos males desta existência. Cesare Beccaria 7 RESUMO A presente monografia tem por objetivo demonstrar o entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre a concessão da liberdade provisória no crime de tráfico, em que pese haver vedações legais. No primeiro capítulo, conceitua-se o crime de tráfico de drogas e examina-se minuciosamente o histórico das legislações antitóxicas até os dias atuais; pois se pretende avaliar o delito e suas sanções ao longo dos anos. No capítulo seguinte, dá-se destaque ao instituto da liberdade provisória sob um todo, e faz-se uma análise em consonância com os princípios constitucionais do devido processo legal e da presunção de inocência. Posteriormente observa-se a vedação da liberdade provisória no crime de tráfico e sua aplicação como política criminal temerária. Por fim, apresentam-se análises jurisprudenciais do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal e suas respectivas posições sobre a concessão da liberdade provisória no crime de tráfico. Palavras-chave: Liberdade provisória. Tráfico de drogas. Vedação. Crime hediondo. Art. 44 da Lei 11.343/06. Princípio do devido processo legal. Princípio da presunção de inocência. 8 ABSTRACT This monograph aims to demonstrate an understanding of doctrine and jurisprudence on provisional release in the crime of trafficking, despite legal prohibitions there. The first chapter brings the concept of crime of trafficking drugs and History of laws antitoxic until today, we intend to analyze the crime and its penalties over the years. The next chapter deals with the institution of parole under a whole, being considered in line with the constitutional principles of due process and the presumption of innocence. Subsequent analyzes the seal parole for the crime of trafficking and their application as reckless criminal policy. Finally, analysis jurisprudence of the Court of St. Catherine, Court of Rio Grande do Sul, Superior Court and Supreme Court and their respective positions on the provisional release of the crime of trafficking. Key words: Bail. Drug trafficking. Seal. Heinous crime. Article 44 of Law 11.343/06. Principle of due process. Presumption of innocence. 9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................................10 2 DO CRIME DE TRÁFICO.......................................................................................12 2.1 CONCEITO DE CRIME DE TRÁFICO.................................................................13 2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA.....................................................................................13 2.3 NOVA POLÍTICA CRIMINAL DE COMBATE AO TRÁFICO DE DROGAS.........18 2.3.1 Processo de criminalização e ações para coibir o tráfico..........................20 2.3.2 Comparação entre as Leis n. 6.368/76 e n. 11.343/06..................................23 2.3.3 A Lei 11.343/06 e suas inovações..................................................................30 3 INSTITUTO DA LIBERDADE PROVISÓRIA..........................................................34 3.1 LIBERDADE PROVISÓRIA COMO DIREITO FUNDAMENTAL..........................35 3.2 LIBERDADE PROVISÓRIA E OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS................36 3.2.1 Princípio do Devido Processo Legal.............................................................39 3.2.2 Princípio da Presunção de Inocência............................................................41 3.3 LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO........................................45 3.3.1 Vedação à liberdade provisória nas Leis 8.072/90 e 11.343/06.................46 3.3.2 A vedação da liberdade provisória como política criminal temerária....50 4 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL: QUAL ENTENDIMENTO ACERCA DA CONCESSÃO DA LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO?............55 4.1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA................................................55 4.2 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL.........................................56 4.3 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA..................................................................59 4.4 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.......................................................................60 4.5 COMPARAÇÃO DE DECISÕES..........................................................................63 5 CONCLUSÃO.........................................................................................................64 REFERÊNCIAS..........................................................................................................66 ANEXO A – Jurisprudências Tribunal de Justiça de Santa Catarina..................72 ANEXO B - Jurisprudências Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.............72 ANEXO C – Jurisprudências Superior Tribunal de Justiça..................................72 ANEXO D – Jurisprudências Supremo Tribunal Federal......................................72 10 1 INTRODUÇÃO A tutela à liberdade da pessoa humana é considerada como uma das maiores conquistas do Direito Constitucional em nível global e impõe limitação ao Estado sobre o status libertatis de todo indivíduo. Nesta esteira, a conhecida e propagada Magna Carta Libertatum de João Sem-Terra, datada de 1215, estabelecia como regra geral, em seu item 39, o direito do acusado de responder em liberdade ao processo a ser julgado e, de modo algum, seria permitido ser molestado, ou seja, ele não poderia ser detido, nem privado de seus bens, nem exilado e tampouco colocado fora da lei. Tendo como norte o preceito básico e internacionalmente aceito por um Estado Democrático de Direito, a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, também quis cercar de garantias o direito à liberdade, exceto em determinadas hipóteses expressamente previstas em lei (CPP, art. 312). Desse modo, a própria Lei Maior consagra a liberdade como direito fundamental, posto que prevê o instituto da liberdade provisória e a exceção para a sua concessão. Tendo em vista a prática da política criminal temerária, o legislador, no Brasil, buscando, de todas as formas, conter a violência social e combater o tráfico internacional de drogas, tem editado leis penais extremamente severas, vedando a concessão da liberdade provisória e ferindo de morte princípios constitucionalmente consagrados, como o princípio do devido processo legal e o da presunção de inocência. É fato que a sociedade, leiga, tem clamado por justiça; contudo, o legislador e os operadores do Direito, por meio de sucessivos debates, devem se ater às graves consequências e terríveis injustiças que possam advir da vedação da liberdade provisória a todo acusado pela prática do delito de tráfico de drogas. Não se pode perder de vista – a despeito do fato de que, enquanto não se prova a culpa, todo o réu é inocente –, que o sistema carcerário, em vez de adotar 11 instrumentos que efetivamente busquem a ressocialização dos réus, tornou-se uma faculdade do crime, para não falar das superlotações dos presídios, das condições precárias em que vivem e do risco de vida que se corre dentro de uma prisão, em nosso país. A liberdade do cidadão é, pois, uma garantia constitucionalmente assegurada a todos e, tendo em vista o falho sistema prisional brasileiro, compete ao juiz analisar cada caso em concreto, antes de impingir a um indivíduo o triste e, por vezes, trágico destino de ser enviado a um de nossos presídios. A liberdade provisória é, nada mais, que o direito que o acusado tem de responder ao processo penal em liberdade, observados os requisitos legais, em substituição antecedente à prisão processual, quando esta não se justificar como instrumento processual necessário. Ou, dito de outra forma, a liberdade provisória constitui instrumento apto a evitar que se realize a prisão cautelar que esteja destituída de qualquer fundamentação legal, impedindo que o acusado seja levado preso sem razão que justifique esse ato que poderia causar graves sequelas na vida do mesmo. Trata-se de observar o princípio da presunção de inocência e do devido processo legal, tornando-se imperioso ao Estado, para condenar um acusado, provar a existência do fato criminoso e a sua autoria. Diante do surgimento da Lei n. 11.343/06, conhecida como a nova Lei Antidrogas, que vedou, em seu artigo 44, a concessão da liberdade provisória nos crimes previstos no artigo 33, caput, do citado diploma, a presente monografia, longe de pretender esgotar tema tão complexo, tem por escopo sopesar os diversos entendimentos acerca do crime de tráfico de drogas e da política criminal vigente no país, na busca pelo equilíbrio de responder, de forma mais incisiva e efetiva, no combate ao tráfico internacional e de assegurar aos investigados e acusados por esse tipo de crime a aplicação dos direitos fundamentais. A escolha do tema justifica-se pela necessidade de fomentar debates e discussões em busca de soluções que visem aperfeiçoar a legislação em vigor, norteando-se pela premissa de que a liberdade do indivíduo constitui regra no 12 ordenamento jurídico pátrio, cabendo ao juiz, mesmo diante de legislação especial, analisar a situação em concreto e julgar conforme os princípios constitucionalmente consagrados. A metodologia de pesquisa aqui utilizada foi a bibliográfica, tendo como base a consulta à legislação vigente, de maneira ampla, às obras de renomados doutrinadores criminais, a diversos artigos publicados em meio impresso e digital, além de farta pesquisa jurisprudencial acerca do assunto. Após a breve introdução, a presente monografia dedica um capítulo especial para tratar do crime de tráfico, trazendo sua conceituação, evolução histórica, ações que já foram adotadas para o combate ao tráfico, noções acerca da política criminal de combate ao tráfico de drogas, além de traçar um comparativo entre as Leis n. 6.368/76 e n. 11.343/06. O capítulo seguinte discorre sobre o instituto da liberdade provisória em relação à legislação penal extravagante que atualmente vigora no País, abordando os princípios constitucionais do devido processo legal e da presunção de inocência, frontalmente feridos pela vedação da concessão da liberdade provisória somente para os acusados de praticar o delito do tráfico de drogas. Depois, será destacada a questão da vedação da liberdade provisória em relação às Leis 8.072/90 e 11.343/06, para, ao final, discorrer sobre tal vedação como decorrência da política criminal temerária. O capítulo derradeiro traz, à baila, diversos julgados acerca da concessão da liberdade provisória ao acusado pela prática do crime de tráfico de drogas, por isso foram escolhidas apenas jurisprudências que concediam a benesse. 13 2 DO CRIME DE TRÁFICO O crime de tráfico de drogas é um delito tipificado por uma lei específica, Lei 11.343/06, e, segundo o art. 2º, caput, da Lei 8.072/90, é crime assemelhado a hediondo e, por conseqüência, é considerado um crime mais grave na esfera penal, razão pela qual os legisladores atribuem ao crime de tráfico de entorpecentes penas mais severas. Neste capítulo, será demonstrado o conceito do crime de tráfico bem como sua evolução histórica, desde o combate repressivo às drogas até o advento da Lei 11.343/06 e suas inovações. 2.1 CONCEITO DE CRIME DE TRÁFICO Ao buscar um conceito jurídico e penal de tráfico de drogas, percebe-se que a legislação (tanto atual quanto a anterior), não menciona expressamente qual a conduta (ou condutas) portadora deste nomen juris. Leal e Leal1 observam que nem o artigo 33, seus parágrafos e incisos, nem nenhum outro dispositivo incriminador “são assinalados com a rubrica ou a denominação legal de tráfico de drogas”. Neste sentido, Franco2 assinalou que na vigência da Lei Antidrogas anterior, "inexiste, no direito penal brasileiro, figura típica que atenda pelo nomen juris de tráfico ilícito de entorpecentes". Rodrigo da Rosa, sem tentar conceituar, explica acerca de sua caracterização: O tipo penal em questão é de ação múltipla ou conteúdo variado, ou seja, há várias condutas numa única norma incriminadora. O crime se concretiza com a ação de apenas uma única dentre as previstas, sendo mais de uma conduta o crime continuará sendo único. Para que ocorra o crime mostra-se 1 LEAL, João José; LEAL, Rodrigo José. Nova política criminal e controle do crime de tráfico ilícito de drogas . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1435, 6 jun. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9948>. Acesso em: 17 abr. 2010. 2 FRANCO, Alberto Silva. Crimes Hediondos. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 146. 14 necessário que o agente pratique qualquer um dos núcleos verbais sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. 3 Assim, a ausência de autorização equivale ao desvio. Quanto ao tipo objetivo, Luiz Flávio Gomes pontua: Os dezoito verbos contemplados no art. 12 da Lei 6.368/76 foram mantidos (sem acréscimo). São eles: importar (trazer de fora), exportar (enviar para fora), remeter (expedir, mandar), preparar (por em condições adequadas de uso), produzir (dar origem, gerar), fabricar (produzir a partir de matérias primas, manufaturar), adquirir (entrar na posse), vender (negociar em troca de valor), expor à venda (exibir para a venda), oferecer (tornar disponível), ter em depósito (posse protegida), transportar (levar, conduzir), trazer consigo (levar consigo, junto ao corpo), guardar (tomar conta, zelar para terceiro), prescrever (receitar), ministrar (aplicar), entregar (ceder) a consumo ou fornecer (abastecer) drogas, ainda que gratuitamente (amostra 4 grátis). O fato é que, talvez em virtude dessa multiplicidade de verbos utilizados para demarcar as ações proibidas sob a ameaça de pena criminal, a lei positiva não adotou um nomem juris específico para designar o tipo penal em exame. Acerca disso, Leal e Leal5 ponderam que, “Na verdade, tratando-se de crime de ação múltipla, torna-se difícil reduzir a uma única denominação jurídicopenal o sentido e o espaço de proibição representado por esse tipo penal tão multiforme”. Contudo, a doutrina penal e a jurisprudência têm utilizado, de forma corrente e sem divergência, a expressão “tráfico ilícito de drogas” para denominar o crime anteriormente descrito no artigo 12, caput, da Lei 6.368/76 e atualmente tipificado no artigo 33, caput, da Lei 11.343/06. Ainda, para Leal e Leal: Embora a comercialização da droga não seja a marca absolutamente obrigatória da ação criminosa, cremos que o que caracteriza o tráfico é a idéia de que a conduta incriminada - expressa por meio de qualquer um dos 3 ROSA, Rodrigo Silveira da. Comentários à nova Lei de combate às drogas que causam dependência. Prevenção e repressão. Sorocaba-SP: Editora Minelli, 2009, p. 90. 4 GOMES, Luiz Flavio (org.). Nova Lei de Drogas Comentada: Lei 11.343, de 23.08.2006. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 147. 5 LEAL, João José; LEAL, Rodrigo José. Nova política criminal e controle do crime de tráfico ilícito de drogas . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1435, 6 jun. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9948>. Acesso em: 17 abr. 2010. 15 dezoito verbos da descrição típica - seja praticada com a vontade de que a 6 droga seja transferida ou colocada na posse de terceiros para consumo. É mister observar, consoante entendimento de Guilherme de Souza Nucci, que: a Lei Antitóxicos continua a ser norma penal em branco. Existe órgão governamental próprio, vinculado ao Ministério da Saúde, encarregado do controle das drogas em geral, que entre nós é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que edita a relação das substâncias 7 entorpecentes proibidas. Tem-se, por norma penal em branco, segundo Silva: “a norma penal cujo complemento está contido em norma procedente de outra instância legislativa, como decreto, portaria, regulamento etc.” 8 No caso da Lei Antidrogas, a complementação é a Portaria n. 344/98, da Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde. Logo, não existe conceito único e fechado para o crime de tráfico de drogas, uma vez que o conceito de “droga” precisa ser definido. Destarte, para que o crime de tráfico de drogas seja configurado, além do agente incidir em um dos verbos descritos no art. 33 da Lei 11.343/06, a droga apreendida deve estar contida na lista de substâncias proibidas pela vigilância sanitária. 2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA A legislação específica concernente a tóxicos, no Brasil, iniciou-se praticamente com o Decreto n. 4.294, de 6 de julho de 1921, ao qual se seguiram outros diplomas legais, como os seguintes: Decreto n. 20.930, de 11 de janeiro de 1932; Decreto n. 24.505, de 26 de junho de 1934; Decreto-Lei n. 891, de 25 de novembro de 1938; Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); 6 LEAL, João José; LEAL, Rodrigo José. Nova política criminal e controle do crime de tráfico ilícito de drogas . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1435, 6 jun. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9948>. Acesso em: 17 abr. 2010. 7 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 747. 8 SILVA, José Geraldo da. Teoria do crime. Campinas-SP: Bookseller, 1999, p. 94. 16 Decreto n. 3.114, de 13 de março de 1942; Decreto-Lei n. 4.720, de 21 de setembro de 1942; Decreto-Lei n. 8.646, de 11 de janeiro de 1946; Decreto n. 20.397, de 14 de janeiro de 1946; Lei n. 159, de 1º de fevereiro de 1968; Decreto-Lei n. 385, de 26 de dezembro de 1968 e Decreto-Lei n. 573, de 11 de agosto de 1969.9 No entanto, é válido destacar que a primeira medida posta em ação foi o Decreto n. 11.481, de 1915, que ratificou a Convenção de Haia; em seguida, os Decretos n. 22.950, de 1933, n. 113, de 1924 e n. 2.994, de 1938, que ratificaram as Convenções de Genebra de 1925 e 1933.10 Eis que surgiu, então, a Lei n. 5.726, de 29 de outubro de 1971, que passou a ser conhecida como Lei Antitóxicos. Tal diploma, por ter conteúdo essencial, modificou o Código Penal, em seu art. 282 e §§. Àquele tempo, determinou também um processo próprio, de rito sumário, sendo apenas subsidiado pelo Código de Processo Penal. Também disciplinou sua forma de execução, estabeleceu medidas preventivas, assumindo aspectos médico-sociais de elevado padrão. Ao lado dos aspectos profiláticos, também estabeleceu medidas de recuperação. A partir dessa lei especial, surgiram inúmeras indagações, no sentido de se não seria o caso de incluir todas as hipóteses criminais dos toxicômanos, quer pela dependência em si, pelo uso e o tráfico de drogas, quer também pelos crimes praticados, de natureza diversa, levados a cabo pelo dependente. Dado ao caráter eminentemente preventivo e recuperador daquela lei, é de se crer que fosse bem melhor, se atentasse para os aspectos sociais do problema.11 Silva, Lavotenti e Genofre afirmam que: O uso de drogas é tão antigo quanto o próprio ser humano, e sempre apareceu, na história da humanidade, como parte de rituais mágicos e religiosos, além de serem utilizados para fins medicinais. Apesar de sempre existirem abusos, estes eram esporádicos, e ficavam limitados a casos 9 CARVALHO, Hilário Veiga de. A nova Lei Antitóxicos (Comentários). São Paulo: Bushatsky, 1973, p. 21-22. 10 CARVALHO, Hilário Veiga de. A nova lei Antitóxicos (Comentários). São Paulo: Bushatsky, 1973, p.22. 11 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Doutrina, prática, legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e Distribuidora, 2006, p. 23-24. 17 individuais, e, portanto não chegavam a afetar o tecido social e o 12 agrupamento humano. Todavia, com o passar dos tempos, determinados tipos de drogas, por causarem forte dependência física e psíquica, causaram sérios problemas de saúde para os seus usuários, afetando diretamente a sociedade, por isso passaram a ser reprimidas. A prevenção e a repressão ao tráfico e ao uso de drogas têm-se manifestado como uma das maiores preocupações do mundo contemporâneo, exigindo ampla mobilização dos mais diversos Estados, entre eles incluídos os grandes produtores da Ásia e da América Latina e os detentores dos grandes mercados consumidores como a América do Norte e a Europa. 13 Nesse contexto, a situação brasileira não se mostra nada favorável, uma vez que, de mero roteiro do tráfico internacional, o Brasil passou à condição pouco interessante de vigoroso produtor de maconha. Ademais, malgrado a instabilidade econômica, firma-se, paulatinamente, como mercado deveras promissor para as mais diversas espécies de psicotrópicos, sendo encontráveis entre nós substâncias tóxicas, até algum tempo atrás pouco comuns no território nacional, tais quais a heroína, o crack e o LSD.14 José Ernani de Carvalho Pacheco15 entende que o legislador, ciente do difícil quadro evolutivo de difusão do comércio e uso de drogas, vem, ao longo dos anos, buscando endurecer especialmente o tratamento conferido aos traficantes, impondo-lhes apenamentos mais rigorosos. Isto é claramente perceptível pelo exame da lei ora em exame, uma vez que não só as penas são bastante duras como, por outro lado, deixam-se de conceder ao acusado ou condenado por tráfico de tóxicos benefícios facultados a acusados ou condenados por outros delitos, conforme será mostrado no próximo capítulo. 12 SILVA, José Geraldo da; LAVOTENTI, Wilson; GENOFRE, Fabiano. Leis penais especiais anotadas. 8.ed. Campinas-SP: Millennium Editora, 2006, p. 179-180. 13 PACHECO, José Ernani de Carvalho. Tóxicos. Prática, Processo e Jurisprudência Criminal. 7.ed. Curitiba: Juruá, 2005, v. 3, p. 11. 14 PACHECO, José Ernani de Carvalho. Tóxicos. Prática, Processo e Jurisprudência Criminal. 7.ed. Curitiba: Juruá, 2005, v. 3, p. 11. 15 PACHECO, José Ernani de Carvalho. Tóxicos. Prática, Processo e Jurisprudência Criminal. 7.ed. Curitiba: Juruá, 2005, v. 3, p. 11. 18 A Constituição de 1988 veio confirmar que o tratamento diferenciado para os traficantes continua em plena marcha. Tanto assim que, por força de disposição constitucional (CF, art. 5º, XLII) o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins passou a ser inafiançável e insuscetível de graça ou indulto. De acordo com José Ernani de Carvalho: O lance derradeiro do processo de recrudescimento no trato aos traficantes deu-se com a entrada em vigor da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos). Tal lei, de duvidosa constitucionalidade, impediu que se concedesse liberdade provisória aos acusados por tráfico, e foi além, determinando que devem eles cumprir a pena restritiva da liberdade integralmente sob regime fechado. Dispõe também que apenas pode requerer livramento condicional o condenado por tal infração quando já tiver cumprido mais de dois terços da pena, havendo alteração fundamental no tocante à questão dos prazos processuais que, a partir da entrada em vigor da citada lei, passam a, de forma inadmissível, ser computados em dobro, relativamente aqueles originalmente previstos. O referido diploma traz ainda o disparate consubstanciado no fato de que a prisão temporária nos calos nela 16 previstos ser de 30 (trinta) dias (Art. 2º, § 3º, da Lei 8.072/90). Considerando a complexa realidade cotidiana, na questão dos entorpecentes, e as soluções oferecidas pela atual lei antidrogas, o presente estudo busca comparar as diferenças entre as Leis n. 6.368/76 e n. 11.343/06, destacando as inovações dessa última, e, em especial, abordando questões polêmicas, como a vedação da liberdade provisória pela lei nova. 2.3 NOVA POLÍTICA CRIMINAL DE COMBATE AO TRÁFICO DE DROGAS A atual Política Criminal de Combate ao Tráfico brasileiro foi instituída por meio do Conselho Nacional Antidrogas – CONAD, órgão responsável pela elaboração de ações de combate ao tráfico de drogas. Em 27 de outubro de 2005, o CONAD aprovou a nova Política Nacional sobre Drogas, decorrente do realinhamento da Política Nacional Antidrogas que vigia até então, anunciando: Por meio da realização de seis fóruns regionais e um nacional, representantes de diversos setores do governo e da sociedade decidiram 16 PACHECO, José Ernani de Carvalho. Tóxicos. Prática, Processo e Jurisprudência Criminal. 7.ed. Curitiba: Juruá, 2005, v. 3, p. 12. 19 pelas alterações incorporadas nesta nova versão. O Excelentíssimo Senhor Presidente da República, por meio de mensagem, destacou a participação da Secretaria Nacional Antidrogas, do Gabinete de Segurança Institucional, na articulação da sociedade com o objetivo de promover e facilitar o processo de realinhamento da Política Nacional. Destacou, ainda, a coresponsabilidade do governo e da sociedade no trabalho de redução da demanda e da oferta de drogas em nosso país. Atualmente, com o advento da Lei n. 11.343/2006, a atual Política Nacional de Combate ao Tráfico de Drogas ganha novos contornos, visto que a nova lei busca discernir a conduta de cada tipo de envolvimento com drogas. Conforme observa Ferreira de Melo: A categoria Política Criminal deve ser vista como um ramo da Política Jurídica, que exerce relevante papel corretivo epistemológico, ideológico e operacional em sua interrelação com o sistema jurídico vigente. Sua finalidade essencial é, segundo o autor, a de ‘buscar o direito adequado a cada época, tendo como balizamento de suas proposições os padrões éticos vigentes e a história cultural do respectivo povo’. Daí porque entende que Política e Direito são conceitos intimamente relacionados, devendo ser concebidos sempre ‘num sentido ético-social, identificados, tanto quanto 17 possível, com a idéia do justo, do correto, do legitimamente necessário’. Em seus estudos sobre essa categoria político-jurídica, Galvão18 conceitua Política Criminal como sendo um "conjunto de princípios e recomendações que orientam as ações da justiça criminal, seja no momento da elaboração legislativa ou da aplicação e execução da disposição normativa". Conforme Leal e Leal19, dentro da nova Política Criminal, a principal alteração foi a mudança no tratamento do usuário de drogas, visto com mais benevolência. No entanto, para os autores, não é o caso de se falar em descriminalização da conduta do usuário, mas em “mera despenalização”. Cumpre-nos elucidar que descriminizalizar significa não mais considerar como crime, ou seja, declarar o abolitio criminis. A conduta da descriminalização, segundo Sobrane20, “traduz a atuação legislativa em sentido contrário, ou seja, é a 17 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor-CPCJ/UNIVALI. 1998, p. 80. 18 GALVÃO, Fernando. Política Criminal. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p. 23. 19 LEAL, João José; LEAL, Rodrigo José. Nova política criminal e controle do crime de tráfico ilícito de drogas . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1435, 6 jun. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9948>. Acesso em: 17 abr. 2010. 20 SOBRANE, Sérgio Turra. Transação penal. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 7. 20 desconsideração de certa conduta como delito. É a destipificação de um fato diante do reconhecimento da desnecessidade de proteção penal ao bem jurídico tutelado”. O fato é que a Política Criminal brasileira de combate às drogas, ainda está sendo delineada, pois a Lei de Drogas é alvo de inúmeras polêmicas e celeumas. 2.3.1 Processo de Criminalização e ações para coibir o tráfico A seguir, serão destacadas, ainda que de forma sucinta, algumas das ações direcionadas ao combate do tráfico ilícito de drogas, ao longo dos últimos anos. [1] A Perspectiva Constitucional da Repressão das Drogas Ilícitas A Convenção Única sobre Estupefacientes (1961) formalizou o processo de transnacionalização do controle das drogas, buscando integrar as agências internacionais e os sistemas repressivos dos Estados signatários para o desenvolvimento harmônico de instrumentos de repressão. Após o árduo processo de redemocratização por que passou a sociedade civil e política brasileira, surgiu uma nova conjuntura nacional, inspirada no desejo de ruptura com as políticas autoritárias dos sucessivos Governos Militares. Nesse ínterim, imaginou-se que a Carta Constitucional, em matéria de repressão penal e abertura política implicaria profundas alterações. No entanto, o tratamento constitucional às drogas ilícitas reforçou o modelo beligerante vigente no período ditatorial, causando perplexidade aos movimentos político-criminais e criminológicos críticos que viam a Constituição como freio e não potencializador da violência institucional programada21. Especificamente no que concerne à questão das drogas, a Lei Maior equipara seu tratamento ao dos crimes hediondos (art. XLIII), produzindo efeitos no campo penal, processual e penitenciário. Um novo rumo na repressão e controle das drogas ilícitas foi claramente traçado com a edição da Lei dos Crimes Hediondos e, 21 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 43-44. 21 posteriormente, a elaboração da Lei do Crime Organizado (Lei 9.034/95), otimizando a política criminal belicista do período marcado pelo regime ditatorial22. Com a determinação de elaboração da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), e a previsão de inafiançabilidade e insuscetibilidade de graça ou anistia, a Constituição legitimou o estatuto que melhor pode ser enquadrado como fruto dos movimentos criminalizadores autoritários. [2] A posição da ONU e o Discurso Econômico-Transnacional face à Convenção de Viena A Convenção de Viena, ratificada pelo Brasil em 1991, consolida a política de repressão às drogas ilícitas de diversos tratados internacionais, sustentados e impostos pela agência de drogas norte-americana, no início dos anos 1980, pautando-se na premissa de que “(...) a erradicação do tráfico ilícito de entorpecentes é responsabilidade coletiva de todos e que, para esse fim, é necessária uma ação coordenada no nível da cooperação internacional”. A Convenção de Viena e os relatórios da ONU sobre fiscalização de entorpecentes serviram de base para o surgimento das legislações penais de maior impacto na política repressiva brasileira no período de pós-transição democrática23. [3] A Operação Rio (1994-1995) Durante o gradual processo de desmilitarização e redemocratização no País, o convênio firmado entre Governo do Rio de Janeiro, Governo Federal e Forças Armadas em 1994, objetivando a eliminação do tráfico de drogas dos morros cariocas, revivificou a defasada estrutura, concretizando o tipo ideal bélico de repressão penal que passou a nortear as políticas criminais e penitenciárias de combate ao crime. Assim, a Operação Rio concretizou o estereótipo da militarização do controle do crime, tendo por escopo eliminar a violência emanada do tráfico de drogas e capturar os líderes dos grupos que controlavam o crime organizado no Rio de Janeiro (Comando Vermelho e Terceiro Comando) e que geravam situação insustentável devido às contendas pelo controle dos pontos de venda de drogas. Os 22 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 44-45. 23 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 45-46. 22 resultados da ação militarizada, amplamente divulgados pela mídia, foram catastróficos, causando: “(a) insucesso no controle do tráfico e (b) inúmeras lesões aos direitos fundamentais da população residente nas áreas de intervenção (detenções ilegais, busca e apreensões sem autorização judicial)”24. [4] O Programa Nacional Antidrogas (PANAD) e a Adesão à Estratégia Hemisférica O Programa de Ação Nacional Antidrogas (PANAD), lançado em abril de 1996, buscou a harmonização e integração das políticas de segurança e de controle, a partir do objetivo de “prevenir, recuperar, reinserir os dependentes e reprimir o tráfico. Buscar e prestar ampla cooperação na matéria, no contexto internacional, procurando adequar a legislação nacional às convenções e acordos internacionais.”. Tal Programa era sustentado pelo discurso jurídico-político no que se refere à repressão ao tráfico de entorpecentes, bem como a universalização do discurso médico-jurídico em relação ao usuário/dependente. As estratégias repressivas centralizaram-se na sistematização do planejamento, avaliação e cooperação de informações, em ações conjuntas com organismos policiais internacionais. O passo decisivo na implementação do PANAD pautou-se na subscrição pelo Governo Federal, juntamente com outros 34 Estados, da Estratégia Antidrogas no Hemisfério “(...)elegendo a redução da demanda como componente-chave das políticas de enfrentamento do problema.”25. [5] O Fracasso da Política de combate e a Manutenção da Estratégia Antidrogas Após uma década de vigência do plano das Nações Unidas “Um Mundo Livre das Drogas”, que buscou a erradicação das drogas do hemisfério aprovado pela 2ª Cúpula das Américas (1998), os representantes dos países, das agências internacionais de controle e de organizações Não-Governamentais reuniram-se, em março de 2009, em Viena, para avaliar os efeitos de sua implementação e projetar 24 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 48-50. 25 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 53-54. 23 as ações futuras. Dentre os resultados constatados, vale destacar que a estratégia internacional de guerra às drogas sustentada pela criminalização: (a) não logrou os efeitos anunciados (idealistas) de eliminação do comércio ou de diminuição do consumo, (b) provocou a densificação no ciclo de violência com a produção de criminalidade subsidiária (comércio de armas, corrupção de agentes estatais, conflitos entre grupos p. ex.) e (c) gerou a vitimização de grupos vulneráveis (custo social da criminalização), dentre eles consumidores, dependentes e moradores de 26 áreas de risco . As discussões acerca das estratégias futuras restaram polarizadas entre a defesa de modelos redutores, compartilhada pela maioria dos países da Europa e da América Latina e as posições belicistas lideradas pelos Estados Unidos e apoiadas pelo Japão, Rússia, Itália e Colômbia. O texto final da declaração a inclusão de princípios e de ações centradas explicitamente no conceito de redução de danos, política de saúde pública sugerida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo International Drug Policy Consortium, coletivo de ONGs voltado ao tema sofreram rejeição por parte da ala repressista27. 2.3.2 Comparação entre as Leis n. 6.368/76 e n. 11.343/06 O presente tópico tem o objetivo de analisar as principais divergências entre Lei n. 11.343/2006 com a legislação anterior, verificando também as mudanças verificadas na Política Criminal. Antes da criação da Lei 11.343/06, legislação básica antidrogas era composta, na verdade, de duas leis: a 6.368, de 21 de outubro de 1976, e 10.409, de 11 de janeiro de 2002. Esta última adveio com a pretensão de substituir a Lei n. 6.368/76; entretanto, o projeto possuía tantos vícios de inconstitucionalidade e 26 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 55. 27 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 57. 24 deficiências técnicas que foi vetado em sua parte penal, somente tendo sido aprovada a sua parte processual.28 Observa Salo de Carvalho: Após a aprovação no âmbito legislativo, a íntegra do capítulo referente aos delitos e às penas recebeu veto da Presidência da República, entrando em vigor apenas sua parte processual. O veto da matéria penal derivou, na prática forense, situação anômala e inédita: a aplicação conjugada de dois textos com fundamentos e historicidade diversas. Assim, no que tange ao processo penal, a Lei 10.409/02 obteve plena vigência, restando a estrutura 29 material do direito penal (delitos e penas) atrelada à antiga Lei 6.368/76. Fernando Capez afirma que “a anterior legislação antitóxica se transformara em ‘um verdadeiro centauro do Direito’ vez que a parte penal continuava sendo a de 1976, enquanto a processual, a de 2002.”30 A Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006, veio pôr termo a essa lamentável situação, tanto que seu artigo 75 revogou expressamente os diplomas legais. A Lei n. 11.343/2006 tem aplicação, conforme ainda assinala Capez, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, tratando-se, portanto de diploma legislativo de caráter nacional e não apenas federal. Cabe, assim, destacar os objetivos da nova lei: 1. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD; 2. Prescreve medidas de prevenção ao uso indevido; 3. Prevê os novos crimes relativos às drogas; 31 4. Estabelece o novo procedimento criminal. Para melhor compreensão do tema, achou-se por bem transpor, a seguir, um quadro comparativo em que é possível visualizar com mais facilidade alguns regramentos que diferenciam a Lei 6.368/76 da nova Lei Antidrogas. Quadro comparativo de alterações nas definições de crimes e penas 28 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Legislação penal especial. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 4, p. 748. 29 CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: (Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06). 5ª Ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010. p. 60. 30 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Legislação penal especial. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 4, p. 748. 31 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Legislação penal especial. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 4, p. 748. 25 Lei 6.368/76 Lei 11.343/06 Art. 12 – Importar ou exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar; Art. 33 – Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - Reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Art. 12 (...) Art. 33 (...) § 1º - Nas mesmas penas incorre quem, indevidamente: § 1º - Nas mesmas penas incorre quem: I – importa ou exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda ou oferece, fornece ainda que gratuitamente, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda matéria-prima destinada a preparação de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica; I – importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matériaprima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas; II - semeia, cultiva ou faz a colheita de plantas destinadas à preparação de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica. II – semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas; § 2º Nas mesmas penas incorre, ainda, quem: § 1º (...) (...) (...) II - utiliza local de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, para uso indevido ou tráfico ilícito de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica. III – utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas. Art. 12 Art. 33 (...) § 2º § 2º Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga: I – induz, instiga ou auxilia alguém a usar entorpecente ou substância que determine dependência física ou psíquica; Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) diasmulta. 26 Art. 33 (...) § 3º - Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28. Art. 13 – Fabricar, adquirir, vender, fornecer ainda que gratuitamente, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto destinado à fabricação, preparação, produção ou transformação de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Art. 34 – Fabricar, adquirir, utilizar, transportar, oferecer, vender, distribuir, entregar a qualquer título, possuir, guardar ou fornecer, ainda que gratuitamente, maquinário, aparelho, instrumento ou qualquer objeto destinado à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - Reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 1.200 (mil e duzentos) a 2.000 (dois mil) dias-multa. Art. 14 - Associarem-se 2 (duas) ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos Arts. 12 ou 13 desta Lei: Art. 35 – Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 desta Lei: Pena - Reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Não há nesta lei dispositivo semelhante. Art. 37 – Colaborar, como informante, com grupo, organização ou associação destinados à prática de qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 desta Lei: Pena: reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e pagamento de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) dias-multa. Art. 15 – Prescrever ou ministrar culposamente, o médico, dentista, farmacêutico ou profissional de enfermagem substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, em de dose evidentemente maior que a necessária ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - Detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 30 (trinta) a 100 (cem) dias-multa. Art. 38 – Prescrever ou ministrar, culposamente, drogas, sem que delas necessite o paciente, ou fazê-lo em doses excessivas ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 200 (duzentos) dias-multa. 27 Não há nesta lei dispositivo semelhante. Art. 39. Conduzir embarcação ou aeronave após o consumo de drogas, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, além da apreensão do veículo, cassação da habilitação respectiva ou proibição de obtêla, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade aplicada, e pagamento de 200 (duzentos) a 400 (quatrocentos) dias-multa. Parágrafo único. As penas de prisão e multa, aplicadas cumulativamente com as demais, serão de 4 (quatro) a 6 (seis) anos e de 400 (quatrocentos) a 600 (seiscentos) dias-multa, se o veículo referido no caput deste artigo for de transporte coletivo de passageiros. Quadro 1 - Quadro comparativo de alterações nas definições de crimes e penas. Fonte: SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Doutrina, prática, legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e Distribuidora, 2006, p. 25-28; CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Legislação penal especial. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 4, p. 776 e seguintes; NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 747 e seguintes. Silveira32 verifica que a nova “Lei n. 11.343/06 ou criou tipos penais antes inexistentes, ou ampliou outros já existentes”, citando, como exemplo, o que ocorre com o artigo 38 que ampliou o conceito da norma antes definida no art. 15 da Lei n. 6.368/76. Na lei anterior, o artigo 15 classificava-se como crime próprio, ou seja, atingia somente uma determinada categoria de profissionais. Agora, o artigo 38 da nova lei ampliou a norma antes definida, porque retirou as categorias profissionais, de modo que a partir de agora, qualquer é passível de ser agente do tipo penal ora analisado. Na visão de Guilherme Nucci: O novo dispositivo (art. 38) não trouxe maiores alterações; continua a ser crime próprio e apenas abre a possibilidade de ser qualquer profissional de saúde, e observa que, logicamente, o mais comum serão os sujeitos já 32 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Doutrina, prática, legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e Distribuidora, 2006, p. 25-26. 28 apontados (médico, dentista, farmacêutico ou profissional da enfermagem). 33 Silveira34 também chama a atenção acerca do mencionado artigo, que o tipo penal previsto no art. 15 da Lei 6.368/76, previa a prescrição de substância entorpecente ou que determinasse dependência física ou psíquica, e na redação do artigo 38, ficou evidente a vontade do legislador de punir e sancionar somente quando prescrito de forma culposa, drogas. Destaca-se, também que o art. 33, § 3º da Lei n. 11.343/06, criou a tipificação da famosa “presença”, ou seja, do amigo que oferece entorpecentes em seu ciclo de amizades, sem objetivo de lucro. Nucci aponta além da conduta “oferecer” (oferecer como presente), outros requisitos para este novo tipo: a) agir em caráter eventual (sem continuidade ou freqüência); b) atuar sem objetivo de lucro (não é viável alcançar qualquer tipo de vantagem ou benefício); c) atingir pessoa do relacionamento do agente (alguém conhecido antes da oferta de droga); d) ter a finalidade de consumir a droga 35 em conjunto. Com a inserção desse tipo penal inédito, o legislador teve a intenção de abrandar a punição daquele que fornece substância entorpecente a um amigo, em qualquer lugar onde pretendam consumir a droga em conjunto, de modo que, fazendo-o em caráter eventual e sem visar lucro aplica-se a figura privilegiada. A finalidade de tal dispositivo é evitar a condenação por crime de tráfico ilícito de drogas, cuja pena mínima passa a ser cinco anos de reclusão. Esse tipo penal deixa a desejar, pois, para ser beneficiado, o agente deve se enquadrar, concomitantemente, nos quatro requisitos exigidos. Assim, por exemplo, se um indivíduo oferece droga, em uma festa, a alguém que acabou de conhecer, mesmo que seja sem finalidade de lucro e numa atitude isolada, não se aplica o disposto no 33 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 788. 34 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Doutrina, prática, legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e Distribuidora, 2006, p. 26. 35 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 781. 29 § 3º do art. 33 da nova lei; do mesmo modo, se oferecer droga a um amigo, e tal situação ocorra com frequência, também não se beneficia da figura privilegiada.36 Ainda em relação ao § 1º do art. 3º da Lei 11.343/2006, Capez destaca algumas modificações no que se relaciona ao tráfico de matéria-prima: - Modificou a redação do artigo, de forma que a expressão “ainda que gratuitamente” não se relaciona mais apenas à conduta de fornecer. - Inseriu expressamente a expressão: “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. - No tocante ao objeto material do crime, inseriu, ao lado da matéria-prima, 37 o insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas. O art. 36 da Lei n. 11.343/06 criou o tipo penal do financiador não somente do traficante, como também dos demais tipos penais definidos nos artigos 33, caput e § 1º, e 34 da lei. O art. 37 da nova Lei Antidrogas criou também o tipo penal do colaborador, como informante, com grupo, organização ou associação destinada à prática de qualquer dos crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º, e 34 da lei. Já o art. 39 da Lei n. 11.343/06 criou o tipo penal do condutor de embarcação ou aeronave após o consumo de drogas, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem. O Parágrafo único do mencionado artigo inclui ainda a agravante se o veículo referido no caput deste artigo for de transporte coletivo de passageiros38. Conforme entendimento de Silveira: “por fazer referência expressa a embarcações e aeronaves, o legislador excluiu veículos automotores como carros, ônibus, trens e afins e motocicletas, mesmo quando de transporte coletivo (táxis, lotações, metrôs e moto-taxi).” 39 36 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 781. 37 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Legislação penal especial. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 4, p. 776. 38 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Doutrina, prática, legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e Distribuidora, 2006, p. 27. 39 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Doutrina, prática, legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e Distribuidora, 2006, p. 27-28. 30 Outro ponto controvertido, também relativo à redação do caput do art. 39 da nova lei de drogas, refere-se à questão do lapso temporal “após o consumo de drogas”, a ser aferido pela Autoridade Judicial, do Representante do Ministério Público ou atém mesmo da Autoridade Policial. Nesse ponto, indaga Silveira40, como aferir se o flagranciado ou acusado consumiu entorpecentes há pouco tempo. Vale lembrar que por força de dispositivo constitucional, ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo, o que dificulta aferir se houve ou não consumo de drogas. Ainda que se admita exame clínico como prova, há que se verificar dois pontos: se o médico que realizou o exame é um perito ante as disposições do Código de Processo Penal (Médico Legista); e como saber o tipo de entorpecente consumido, se é sabido que, por meio de exame clínico, torna-se praticamente impossível aferir tal informação. Por tudo isso, o autor entende que tal dispositivo constitui letra morta na nova norma, pois apesar da boa intenção e boa vontade do legislador, “ele não dá aos operadores do direito da linha de frente, mecanismos para aferir a incidência do conteúdo do tipo penal e conseqüentemente aplicar a sanção penal”.41 2.3.3 A Lei 11343/06 e suas inovações Diante do exposto, percebe-se que a nova lei trabalha no sentido de abrandar a conduta do usuário de droga, em relação ao traficante, porque as leis anteriores, por trazer em excessivo rigor, desproporcional àqueles que tinham dolo para o comércio, criaram para o usuário/dependente o estigma de criminoso. Certo é que a problemática referente a drogas não atinge apenas uma parcela da população, mas, ao contrário, fere toda a coletividade. Aliás, diga-se de 40 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A agosto de 2006. Doutrina, prática, Distribuidora, 2006, p. 28-29. 41 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A agosto de 2006. Doutrina, prática, Distribuidora, 2006, p. 29. nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e 31 passagem, a questão do tráfico ilícito de drogas é hoje tratada em nível internacional. A Lei 6.368/76, criada há nada menos que duas décadas antes da nova lei, certamente não acompanhava os avanços da criminalidade contemporânea. Em 2002, quando foi editada a Lei n. 10.409, que tinha a finalidade de renovar o ordenamento jurídico, por conter inúmeras falhas e dispositivos inconstitucionais, não foi bem aceita e acabou sofrendo veto parcial. Desde então, iniciou-se a elaboração do projeto que culminou na nova Lei de Drogas, que acabou por revogar as duas anteriores, quais sejam, Lei n. 6.368/76 e Lei n. 10.409/2006. A nova lei manteve as dezoito condutas típicas constantes do revogado art. 12, caput, da Lei n. 6.368/76. Substituiu a expressão “substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica”, para utilizar a terminologia “droga”. As drogas permanecem sobre a atenção do Ministério da Saúde que periodicamente atualiza listas que estabelecem quais substâncias devem ser consideradas ilícitas. A partir da constatação de que o uso de drogas está disseminado na sociedade, e da ciência de toda ordem de problema que esse assunto enseja o Estado passa a tratar o consumo como um problema de saúde pública, buscandose, o tanto quanto possível, a mitigação de danos. A ordem do dia é tratar o usuário, recuperando-o para inseri-lo de volta à sociedade, e não taxá-lo de criminoso. Por conta disso, o legislador, na nova lei, buscou criar medidas que atendam ao usuário, trate-o e o reintegre. Assim, a lei aplicará aos usuários penas alternativas, em substituição às penas de privação de liberdade. Com o nítido propósito de diferenciar usuário de traficante de drogas, não mais se cogita a propositura de inquérito policial ao que for surpreendido com drogas para consumo próprio e, sim. termo circunstanciado, aplicando-lhe somente medidas educativas. 32 Em sendo assim, não haverá mais prisão do usuário/dependente. A priori, em vez da polícia em seu caminho, haverá o Juizado Criminal de plantão. Por outro lado, a nova lei foi ainda mais rigorosa para com aqueles que traficam. Detectando-se o dolo na prática delituosa, ou seja, para aqueles que comercializam drogas ilícitas, a pena é aumentada de três para cinco anos. Nesses delitos, o indivíduo que for réu primo, tiver bons antecedentes, não se dedicar nem se integrar às atividades criminosas, terá redução da pena de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços). A nova lei não apenas distingue usuário de traficante, como também pune com menos rigor o traficante de pequeno porte. De outra sorte, surge na Lei 11.343/06 a figura do “capitalista do tráfico” – indivíduo que obtém lucro ao financiar a produção, o comércio e a distribuição de drogas. Para fins do presente estudo, a questão mais polêmica gira em torno da vedação da liberdade provisória aos acusados de tráfico ilícito de drogas. Considerando os princípios constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal, muito se discute o motivo pelo qual a lei impõe a prisão mesmo em relação aos indivíduos que preenchem os requisitos para a concessão de tal benefício. Ademais, o teor da nova lei deixa de ser o combate enfreado contra as drogas, o conteúdo da Lei 11.3343/06 é pautado na idéia de prevenção das drogas, visando, também, uma melhor ressocialização, eis que a pena deixou de ser vista como meio de punição e imputação de sofrimentos. Salo de Carvalho afirma que “a lógica discursiva diferenciadora iniciada na década de 70 é consolidada no novo estatuto, em detrimento de projetos políticos alternativos moldados a partir das políticas públicas de redução de danos”. 42 42 CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: (Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06). 5ª Ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010. p. 68. 33 Nessa ordem de pensamento, quando preenchidos os requisitos legais, em que pese seja um crime hediondo, defende-se, aqui, a concessão da liberdade provisória. Mas esse tema será tratado com mais acuidade no próximo capítulo. 34 3 INSTITUTO DA LIBERDADE PROVISÓRIA Liberdade provisória é o direito do acusado de não ser preso durante a instrução do processo até seu julgamento final. Diz-se provisória, porquanto, pode a qualquer tempo, ser revogada. Pacheco define liberdade provisória como instituto processual (medida cautelar processual) que substitui a prisão em flagrante, se presentes determinados pressupostos de concessão e sob determinadas condições de manutenção da liberdade, cujo descumprimento 43 acarreta a revogação da liberdade e a restauração da prisão em flagrante. Mirabete44 sustenta que a liberdade provisória vem substituir a custódia provisória, atual ou iminente, com ou sem fiança, nas hipóteses de flagrante (CPP, arts. 301 a 310), em razão da pronúncia (CPP, art. 408, § 1º) e da sentença condenatória recorrível (CPP, art. 594). Por tal instituto, o acusado não é recolhido à prisão ou é posto em liberdade quando preso, vinculado ou não a certas obrigações que o prendem ao processo e ao juízo, com o fito de assegurar a sua presença ao processo sem o sacrifício da prisão provisória. Conforme explanado acima, verifica-se que lei determina dois tipos de liberdade provisória: com ou sem fiança. No primeiro caso, o indiciado ou réu, mediante quantia monetária, adquire o direito de responder o processo em liberdade; no segundo, a liberdade é concedida independentemente de pagamento. A liberdade provisória sem fiança pode ser com ou sem vinculação, ou seja, a liberdade sem vinculação se dá nos casos em que o réu se livra solto, consoante o disposto no art. 312, CPP; a liberdade com vinculação é aquela concedida mediante compromisso de comparecer a todos os atos do processo, nos termos do art. 310, CPP.45 43 PACHECO, Denílson Feitoza. Direito processual penal. Teoria, crítica e práxis. 4.ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006, p. 705. 44 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 18.ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 408. 45 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 563. 35 Vale lembrar que a liberdade é um direito constitucional, por isso a liberdade provisória não pode ser negada quando presentes os motivos que a autorizam. 3.1 LIBERDADE PROVISÓRIA COMO DIREITO FUNDAMENTAL A Constituição da República Federativa do Brasil estabelece, como direito fundamental do indivíduo, a liberdade de locomoção em todo o território nacional (art. 5°, XV, CF) assegurando-lhe o direito de ir, vir e permanecer. Portanto a regra no Brasil é a liberdade, a exceção é sua privação nos termos da lei. Para que haja privação dessa liberdade, como a própria Constituição diz, a lei tem de estabelecer (de acordo com a Carta Magna) os casos em que isso será possível, pois inerente ao direito de liberdade, há o princípio do devido processo legal, ou seja, para que haja a privação da liberdade, tem de haver previsão legal. Do contrário, haverá flagrante ilegalidade no ato de constrição.46 A Liberdade Provisória, em linhas gerais, é sempre imperiosa, conforme dito, em situações nas quais inexistem os requisitos elencados no art. 312 do Código de Processo Penal (que autorizam a prisão preventiva). Mesmo nas situações de prisão em flagrante, aquele que foi preso deve ser solto, ainda mais com a inserção do parágrafo único ao art. 310, da Lei n. 6.416/77, que estabeleceu como regra em nosso ordenamento, que a defesa do acusado deve ser feita em liberdade, ressalvadas as exceções já mencionadas. Conforme pontua Tourinho Filho47, (...) somente a sentença que põe fim ao processo é fonte legítima para restringir a liberdade pessoal a título de pena. Uma vez apurada a responsabilidade do réu, em regular o processo, em que tenha havido plena defesa, como exige e proclama a Carta Magna, seu encarceramento deve ser decretado como retribuição ao mal praticado. 46 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 653. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 31.ed. São Paulo: Saraiva, 2009, v. 3, p. 547-548. 47 36 Por essa razão, o instituto da liberdade provisória, como instrumento de preservação da liberdade de locomoção, e também do princípio da presunção de inocência, deve atravessar todos os momentos da persecução penal, apresenta-se como cautela indispensável, sobretudo nos casos em que o delito exibe pouca potencialidade ofensiva e quando o réu não apresenta nenhuma periculosidade.48 Vindo de encontro com os princípios constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal, a Lei n. 11.343/2006, recentemente, vedou, em seu artigo 44, a concessão da liberdade provisória no crime previsto no artigo 33, caput, do citado diploma. Desde então, muitas discussões jurídicas versam sobre o assunto e o presente estudo visa mostrar que tal regramento, imposto independentemente da gravidade objetiva do delito, é incompatível com princípios constitucionalmente consagrados pelo ordenamento jurídico brasileiro, conforme o exposto. Importa, antes, destacar a importância dos princípios constitucionais, muito bem assinalada pelo iminente José Afonso da Silva: (...) a Constituição vigente dá preferência aos direitos fundamentais, (...) o documento constitucional constitui um instrumento de sua proteção, enquanto a organização do Estado e dos Poderes fica subordinada a essa missão constitucional. (...) o conteúdo desse Título I sobre os princípios fundamentais indica que aí se têm os fundamentos do direito constitucional brasileiros, suas colunas mestras, o que, em última análise, constitui os 49 fundamentos do próprio ordenamento jurídico nacional. 3.2 LIBERDADE PROVISÓRIA E OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS Convém mencionar que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, contrariando as demais constituições que priorizavam a organização do Estado e deixavam em segundo plano o tratamento dos direitos fundamentais, promoveu uma reviravolta no constitucionalismo brasileiro, e os princípios que dão 48 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 561. SILVA, José Afonso et al. 20 anos da Constituição Cidadã. Rio de Janeiro: Fundação Konrad Adenauer, 2008, p. 19. 49 37 base à nossa Lei Maior devem ser observados pelos legisladores na criação de novas legislações, uma vez que, quando não observados, as legislações vigentes acabam sofrendo uma revogação tácita pelas decisões do Poder Judiciário, virando letra morta. Os direitos fundamentais foram incorporados às Constituições Brasileiras, de modo que dentro do Direito Constitucional Positivo, o Texto Magno elenca os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil. A Constituição de 1934 foi a primeira a adotar tal inspiração, sendo seguida pelas constituições posteriores. Quanto às Constituições anteriores (de 1824 e de 1891), manifestavam em seu texto o apego à concepção individualista dos direitos fundamentais. Notadamente chamada de “Constituição Cidadão”, a Declaração dos Direitos Fundamentais contida na Constituição Brasileira de 1988 é, indubitavelmente, a mais abrangente de todas as anteriores. Além de consagrar os "direitos e deveres individuais e coletivos", abre um capítulo para definir os “Direitos Sociais”. De modo geral, o reconhecimento e a proteção dos direitos fundamentais do homem encontram-se na base das Constituições democráticas contemporâneas. Os direitos fundamentais, em sua tradicional concepção, constituem os direitos de defesa, que visam à proteção de determinadas posições subjetivas contra a intervenção do poder estatal, seja por meio do não-impedimento da prática de determinado ato, pela não-intervenção em situações subjetivas, ou ainda, pela nãoeliminação de posições jurídicas. Nesse diapasão, os direitos fundamentais abarcam disposições definidoras de uma competência negativa do Poder Público, que fica obrigado, assim, a respeitar o núcleo de liberdade constitucionalmente assegurado. Nessa ordem de idéia, Mendes assinala que, A garantia de liberdade do indivíduo que os direitos fundamentais pretendem assegurar somente é exitosa no contexto de uma sociedade livre. Por outro lado, uma sociedade livre pressupõe a liberdade dos indivíduos e cidadãos, aptos a decidir sobre as questões de seu interesse e responsáveis pelas questões centrais de interesse da comunidade. Essas características condicionam e tipificam a estrutura e a função dos direitos fundamentais. Eles asseguram não apenas direitos subjetivos, mas também 50 os princípios objetivos da ordem constitucional e democrática. 50 MENDES, Gilmar Ferreira. Os Direitos Fundamentais e seus Múltiplos Significados na Ordem Constitucional. Revista Jurídica Virtual, nº 14, julho, 2000. Disponível em: 38 Conforme observa Moraes Os direitos humanos fundamentais, em sua concepção atualmente conhecida, surgiram como produto da fusão de várias fontes, desde tradições arraigadas nas diversas civilizações, até a conjugação dos pensamentos filosófico-jurídicos, das idéias surgidas com o cristianismo e 51 com o direito natural. De acordo com o mesmo autor, tais idéias culminaram em um ponto fundamental em comum, consistindo na limitação e controle dos abusos de poder do próprio Estado e de suas autoridades constituídas, bem como a consagração dos princípios da igualdade e da legalidade, norteando o Estado moderno e contemporâneo. Isto indica que a noção de direitos fundamentais antecede a idéia de constitucionalismo, que apenas “consagrou a necessidade de insculpir um rol mínimo de direitos humanos em um documento escrito, derivado diretamente da soberana vontade popular”. 52 Os direitos fundamentais constituem a base do ordenamento jurídico de um Estado Democrático de Direito. Nessa esteira, nossa Lei Maior consagra os direitos individuais, conferindo-lhes significado especial, uma vez que insere os direitos fundamentais no início do seu texto constitucional. Em contrapartida, os direitos humanos fundamentais consagrados pela Constituição Federal não são ilimitados, não podendo ser utilizados como um “escudo protetivo” da prática de atividades ilícitas, nem como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos – o que caracterizaria um desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito.53 Conforme destaca Ferreira Filho54, a principal finalidade dos direitos fundamentais é no sentido de “proteger os direitos do Homem contra os atos do Governo”, valendo ressaltar a vinculação direta dos órgãos estatais (Poderes <http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/revista/Rev-14/direitos_fund.htm>. Acesso em: 20 Maio.2010. 51 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 19. 52 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 19. 53 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 46. 54 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 22. 39 Legislativo e Executivo) a esses direitos e o seu dever de guardar-lhes estrita observância. Como a função dos princípios constitucionais é de proteger os direitos do Homem contra os atos do Governo, no caso de conflito de princípios deve-se aplicar o mais benéfico ao homem, tendo em vista sua hipossuficiência perante o Estado, ainda mais quando se tratar de conflito no âmbito do direito penal e processual penal, que é regido pelo princípio in dubio pro reo. Destaque-se, ainda, que tais direitos constituem cláusulas pétreas, devendo ter eficácia imediata. Com isso, o legislador constituinte, conforme dispõe no § 4º do art. 60, reconheceu que os direitos fundamentais são elementos integrantes da identidade e da continuidade da Constituição, sendo, portanto, considerada ilegítima qualquer reforma constitucional tendente a suprimi-los. Assim, atendendo à proposta da presente monografia, a seguir serão discutidos os princípios constitucionais do devido processo legal e da presunção de inocência que são inerentes ao princípio da liberdade e de fundamental importância para o ponto de vista ora defendido. 3.2.1 Princípio do devido processo legal Inicialmente, é importante esclarecer que o princípio do devido processo legal, de acordo com o art. 5º, LIV, da Constituição Federal, “consiste em assegurar à pessoa o direito de não ser privada de sua liberdade e de seus bens, sem a garantia de um processo desenvolvido na forma que estabelece a lei”.55 No âmbito processual, tem por fundamento garantir ao réu o “contraditório, a plenitude de defesa, a isonomia processual e a bilateralidade dos atos procedimentais”. 56 55 56 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p.254 SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à constituição. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 154. 40 Por isso, em qualquer decisão que impõe ao acusado uma das quatro espécies de prisões provisórias, a observância do princípio do devido processo legal é uma exigência indeclinável. A decretação da prisão provisória, seja qual for a espécie, deverá atender não somente ao seus próprios pressupostos legais, mas também aos requisitos da: autoridade competente, ordem escrita e fundamentada, bem como a todos aqueles princípios constitucionais do processo que compõe o devido processo legal. 57 O respectivo processo legal, conforme aponta Tourinho Filho guarda relação com uma série de direitos e garantias constitucionais: Presunção de inocência, duplo grau de jurisdição, direito de ser citado e de ser intimado de todas as decisões que comportem recurso, ampla defesa, contraditório, publicidade, juiz natural, imparcialidade do julgador, direito às vias recursais, proibição da reformatio in pejus, respeito à coisa julgada (ne bis in idem), proibição de provas colhidas ilicitamente, motivação das sentenças, celeridade processual, retroatividade da lei penal benigna, 58 dignidade da pessoa humana, integridade física, liberdade e igualdade. Esse processo legal é, hoje, incorporado não apenas na nossa Lei Maior, mas em todas as Constituições dos Estados contemporâneos. Antes disso, porém, ainda que não se apresentasse de forma expressa no ordenamento jurídico brasileiro, tal princípio sempre se fez presente e foi erigido à categoria de dogma constitucional a partir da Constituição de 1988, que estabelece: “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (CRFB/88, art. 5º, LIV). Com efeito, sendo a liberdade um dos direitos fundamentais do homem, é natural que a Constituição busque preservá-la. E no dizer de Tourinho Filho: “Sabe-se que a liberdade não é o direito de alguém fazer o que bem quiser e entender, mas sim o de fazer o que a lei não proíbe”. Sem os freios da lei, a liberdade desenfreada conduziria ao tumulto, à anarquia, aos caos, enfim. Daí permitir-se, na Magna Carta, a restrição à liberdade, desde que tal restrição não se faça com comedimento, dentro no limite do indispensável, do necessário, e, assim mesmo, cercada de reais garantias para que se 59 evitem extra limitações do Poder Público. 57 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 544. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. Atualizada até a Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 69. 59 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. Atualizada até a Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 639. 58 41 Essa é uma das razões pelas quais a decretação de prisões provisórias devem se dar apenas quando a medida for extremamente necessária e em caráter excepcional. As prisões não devem ser usadas indiscriminadamente, como instrumento de punição e controle da sociedade pelo Estado; essa é uma decorrência do princípio da presunção de inocência, que impede seja dispensado ao réu ou indiciado, no curso do processo, o mesmo tratamento que se dispensa aos condenados, impondo-lhes prisões provisórias com caráter punitivo. Para se decretar a prisão de um indivíduo, em virtude do princípio da presunção de inocência, é necessário que o processo que originou a decisão de encarceramento não tenha falhas, ou seja, tenha respeitado o devido processo legal. 60 Porquanto, “toda lei que não observa determinados critérios de elaboração legislativa, infringindo garantias fundamentais do indivíduo, será considerada inconstitucional por infringência deste princípio superior.” 61 3.1.2 Princípio da presunção de inocência A Constituição Federal de 1988 reconheceu a situação jurídica da inocência e com ela foi imposta a necessidade de toda e qualquer privação da liberdade ser devidamente fundamentada pela autoridade judicial.62 A presunção da inocência, princípio basilar do Estado de Direito, está consagrado no inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal, o qual estabelece que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, e tutela a liberdade pessoal de cada indivíduo.63 60 MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 545. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 18. ed. rev. e atual. 4. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007.p.7. 62 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 2008, p. 414. 63 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 339. 61 42 Esse princípio representa o coroamento do due process of law, constituindo um ato de fé no valor ético da pessoa, próprio de toda sociedade livre. Tourinho Filho64 assenta no reconhecimento dos princípios do direito natural como fundamento da sociedade, princípios que, aliados à soberania do povo e ao culto da liberdade, constituem os elementos essenciais da democracia. Nesse sentido, o princípio da presunção de inocência, ou, como diz 65 Mirabete , o princípio do estado de inocência, decorre diretamente do princípio do devido processo legal e se estriba no artigo 9º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, pelo qual toda pessoa se presume inocente até que tenha sido declarada culpada. Esse preceito se apresenta reiterado no artigo 26 da Declaração Americana de Direitos e Deveres, de 2 de maio de 1948, e no artigo 11 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU. Nesses termos, segundo Mirabete, haveria uma presunção de inocência do acusado da prática de uma infração penal até que uma sentença condenatória irrecorrível o declarasse culpado. Conclui-se que o princípio da presunção de inocência é um estado jurídico no qual o acusado é inocente até que seja declarado culpado por uma sentença transitada em julgado, daí porque é tratado também como “princípio de não-culpabilidade”. Bettiol66 enfatiza que a regra de presunção de inocência “vale como uma idéia-força, no sentido de impedir que o réu seja tratado como se já estivesse condenado, que sofre restrições de direito que não sejam necessárias à apuração dos fatos e ao cumprimento da lei penal, em suma, que não seja tratado como mero objeto de investigações, mas como sujeito de direitos, gozando de todas as garantias comuns ao devido processo legal, sobretudo ‘as garantias de plena defesa’.” Por conta disso, a Constituição brasileira declara que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, nos 64 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. Atualizada até a Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 71. 65 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 18.ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 21. 66 BETTIOL, 1999 apud GOMES, Luiz Flávio. Direito de apelar em liberdade. Conforme a Constituição Federal e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 41. 43 termos do artigo 5º. Inciso LVII, que de outro modo quer dizer que o acusado é inocente durante o desenvolvimento do processo e seu estado apenas se modifica por uma sentença condenatória transitada em julgado Gomes67 assinala, ainda, que uma das fundamentais consequências jurídicas decorrentes do princípio da presunção de inocência consiste na proibição da utilização da pena de prisão como “castigo antecipado”. O autor enfatiza que o referido princípio não proíbe a prisão cautelar ditada por razões excepcionais e tendentes a garantir o resultado do processo, concluindo que a prisão preventiva não é inconstitucional quando devidamente fundamentada. Não havendo, porém, tal motivação, explicitamente demonstrada, o decreto restritivo da liberdade é nulo de pleno direito e há que ser corrigido imediatamente, restaurando-se o ius libertatis.68 Para Moraes69, o direito de ser presumido inocente consagrado constitucionalmente pelo artigo 5º, inc. LVII, possui quatro funções básicas, a saber: - limitação à atividade legislativa; - critério condicionador das interpretações das normas vigentes; - critério de tratamento extra-processual em todos os seus aspectos (inocente); - obrigatoriedade de o ônus da prova da prática de um fato delituoso ser sempre do acusador. Destarte, a presunção de inocência condiciona toda condenação a uma atividade probatória produzida pela acusação e veda, taxativamente, a condenação, inexistindo as necessárias provas. Tal princípio, portanto, consubstancia-se no direito de não ser declarado culpado senão mediante sentença judicial com trânsito em julgado, ao término do devido processo legal, em que o acusado pôde fazer uso 67 GOMES, Luiz Flávio. Direito de apelar em liberdade. Conforme a Constituição Federal e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 42. 68 GOMES, Luiz Flávio. Direito de apelar em liberdade. Conforme a Constituição Federal e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 42. 69 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 267268. 44 de todos os meios de prova pertinentes para sua ampla defesa e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas pela acusação70. Em decorrência do princípio do estado de inocência, Mirabete conclui que: a) a restrição à liberdade do acusado antes da sentença definitiva só deve ser admitida a título de medida cautelar, de necessidade ou conveniência, segundo estabelece a lei processual; b) o réu não tem o dever de provar sua inocência; cabe ao acusador comprovar a sua culpa; c) para condenar o acusado, o juiz deve ter a convicção de que é ele responsável pelo delito, bastando, para a absolvição, a dúvida a respeito da 71 sua culpa (in dúbio pro reo). Tourinho Filho constata que a essência desse princípio é: “enquanto não definitivamente condenado, presume-se o réu inocente”. 72 Tourinho ainda acrescenta: Claro que a expressão “presunção de inocência” não pode ser interpretada ao pé da letra, literalmente, do contrário os inquéritos e os processos não seria toleráveis, visto não ser possível inquérito ou processo em relação a uma pessoa inocente. Sendo o homem presumidamente inocente, sua prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória implicaria antecipação da pena, e ninguém pode ser punido antecipadamente, antes de ser definitivamente condenado, a menos que a prisão seja indispensável 73 a título de cautela. Vale anotar, ainda, que, com a adesão do Brasil à Convenção Americana sobre Direitos humanos (Pacto de São José da Costa Rica), conforme Decreto n. 678, de 6-11-1992, vigora no país a regra instituída no artigo 8º, 2, da Convenção, segundo o qual: “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa”. 74 No crime de tráfico, em que pese seja equiparado a hediondo e tratado com maior gravidade, o Estado, como em qualquer outro delito, deve, durante a 70 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 268. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 18.ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 23. 72 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. Atualizada até a Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 72. 73 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. Atualizada até a Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 72. 74 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 18.ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 24. 71 45 persecução criminal, presumir a inocência do acusado, garantindo seus direitos constitucionais. Nesta senda, colhe-se da jurisprudência: A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem. - Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a culpabilidade. No sistema jurídico brasileiro, não se admite, por evidente incompatibilidade com o texto da Constituição, presunção de culpa em sede processual penal. Inexiste, em conseqüência, no modelo que consagra o processo penal democrático, a possibilidade jurídico-constitucional de culpa por mera suspeita ou por simples presunção. - Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes conseqüências, uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, 75 definitivamente, por sentença do Poder Judiciário. 3.2 LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO A vedação da liberdade provisória aos crimes de tráfico de drogas definidos nos arts. 33 e § 1º, e 34 a 37 da Lei 11.343/06 186, pauta-se no simples mandamento legal, constante no art. 44 da Lei de Tóxicos. A proibição da liberdade provisória no crime de tráfico não é novidade, uma vez que esse espírito já norteava a jurisprudência majoritária na vigência da Lei 6.368/76. Todavia, doutrina e jurisprudência sempre foram divergentes a respeito da validade de referida norma. De um lado, havia quem entendia que a proibição estava expressa e por isso não se devia conceder a liberdade provisória, sendo dispensável a análise de outros requisitos, bastando, portanto a vedação legal. Para outros, se 75 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 93056 / PE, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Julgamento: 16/12/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp> Acesso em 24 maio 2010. 46 ausentes os requisitos que autorizavam a decretação da prisão preventiva, era cabível a liberdade provisória. Entretanto, com o passar dos anos, era cada vez mais crescente a corrente que combatia a vedação cega do benefício processual.76 A Lei 11.343/06, na contramão da jurisprudência moderna, insistiu na proibição; contudo, logo em seguida, a Lei 11.464/07 alterou o inciso II do art. 2º da Lei 8.072/90, permitindo a liberdade provisória para crimes hediondos ou equiparados, o que fez com que a jurisprudência se posicionasse no sentido de que vedação da liberdade provisória disposta no art. 44 por si só não é requisito autorizador da custódia preventiva, devendo, nesse caso, ser concedida a liberdade provisória. Verifica-se que em face do princípio da isonomia, certamente esta permissão se estenderá à legislação, revogando de uma vez por todas o art. 44 da Nova Lei de Tóxicos e acabando formalmente com todas as discussões.77 3.2.1 Vedação à liberdade provisória nas leis 8.072/90 e 11.343/06 A Lei n. 8072/90, conhecida como Lei dos Crimes Hediondos, quis inovar no âmbito penal e processual penal, por tornar mais severa a abordagem dos crimes nela referidos, destacando-se, dentre elas, a vedação à concessão de fiança e liberdade provisória nos casos de crime hediondo ou assemelhado, que em seu inc. II, art. 2º dispunha: "os crimes hediondos, a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de fiança e liberdade provisória". De pronto a constitucionalidade da regra, por atentar contra os princípios da dignidade da pessoa humana, da humanização das penas, da proporcionalidade e da individualização da pena na fase executiva78. 76 MARCÃO, Renato. Tóxicos Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006. Nova Lei de Drogas. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 371. 77 GOMES, Luiz Flávio. et.al. Lei de Drogas Comentada artigo por artigo: Lei 11.343/2006, de 23.08.2006. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 233. 78 SILVA, Marisya Souza e. Crimes hediondos & progressão de regime prisional. Curitiba: Juruá, 2007, p. 219. 47 É de se acreditar que o objetivo do legislador foi o de estabelecer maior rigor ao procedimento criminal referente aos crimes hediondos e assemelhados, buscando evitar a qualquer custo que o acusado se furte da aplicação da lei penal e gere um sentimento de impunidade. Conforme já mencionado anteriormente, não pode o legislador, sob o pretexto de atender ao apelo da sociedade que pede justiça como forma de combater a violência, ferir diversos preceitos constitucionais, dentre os quais, a vedação à liberdade do indivíduo, o devido processo legal, o princípio da presunção de inocência, dentre outros, para “demonstrar” o rigor aos crimes que causam maior ojeriza social. A partir da vigência da Lei n. 9.455/97, a chamada “Lei de Tortura”, a discussão tornou-se ainda mais acirrada, posto que a referida lei não proíbe a liberdade provisória nem o indulto. O art. 1º, § 7º desta Lei contempla somente o início de cumprimento da pena em regime fechado, enquanto que o art. 2º, § 1º da Lei dos Crimes Hediondos estabelece o regime fechado durante todo o período de execução que, aliás, se trata de um dos mais graves equívocos legislativos, posto que, além de querer imprimir rigor maior do que o próprio texto constitucional viola o princípio da individualização da pena, e inviabiliza a esperança de progressão e, por conseguinte, a ressocialização e o incentivo ao bom comportamento. Desde então, os entendimentos jurisprudenciais vêm defendendo a posição de que a brandura da Lei de Tortura, nos casos mencionados, estende-se, por analogia, aos crimes hediondos. Com o advento da Lei da Tortura (Lei n. 9.455/97), que expressamente admitiu, em seu artigo 1°, § 7°, a progressão para o crime de tortura (delito equiparado aos hediondos pelo legislador constituinte), a celeuma jurídica girava em torno da discussão para saber se essa última lei revogou ou não o referido art. 2° da Lei de Crimes Hediondos. Mais recentemente, a Lei n. 11.464/07 pôs uma pedra sobre essa discussão, ao alterar o artigo 2° da Lei 8.072, dei xando de proibir a concessão da liberdade provisória, além de tornar possível a concessão de progressão de regime 48 de cumprimento de pena também aos condenados pela prática de crimes hediondos. A Lei n. 11.343/2006, assim estabelece em seu polêmico artigo 44: o “Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1 , e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos. Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico.” Além de dispor que os crimes diretamente vinculados às atividades de traficância são “inafiançáveis e insuscetíveis de graça e anistia”, conforme preconiza a Lei Maior (CRFB/88, art. 5°, inc. XLIII), o legis lador infraconstitucional foi mais adiante e incluiu a proibição de liberdade provisória. Nascimento79 anota que, tendo o legislador permitido a liberdade provisória aos crimes hediondos, restou reformulado todo o sistema valorativo do ordenamento criminal, o que acarreta a necessária releitura axiológica de todas as regras criminais ligadas à liberdade provisória. E salienta que “proibir a liberdade provisória a crime equiparado ao hediondo quanto há permissão legal para concessão aos ontologicamente hediondos”, é ferir de morte os princípios da isonomia e da proporcionalidade. Para Luiz Flávio Gomes e Rogério C. Sanches80, ao proibir o beneplácito da liberdade provisória somente para o tráfico (e não para outros delitos considerados hediondos, alguns até mais graves, como o latrocínio, por exemplo), são desrespeitados princípios basilares do Direito Penal, como o da razoabilidade, da proporcionalidade e da isonomia. No dispositivo em comento, o legislador foi contundente ao estabelecer critérios semelhantes aos previstos no artigo 2° da lei n. 8.072/90, mas que 79 NASCIMENTO, José Moacyr Doretto. Da liberdade provisória no crime de tráfico de drogas. Princípio constitucional da isonomia e proporcionalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1562, 11 out. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10533>. Acesso em: 20 Maio.2010. 80 GOMES, Luiz Flávio; SANCHES, Rogério Cunha. Cabe liberdade provisória no tráfico de drogas? . Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1703, 29 fev. 2008. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10996>. Acesso em: 01 jun. 2009. 49 recentemente sofreu alteração pela Lei n. 11.464/07. Não houve proibição da progressão da pena, talvez em vista da tendência jurisprudencial de seguir a orientação do Supremo Tribunal Federal de que tal vedação fere o princípio da individualização da pena (CRFB/88, art. 5°, inc. XL VI). A lei 8.072/90 estabeleceu apenas a inafiançabilidade ao crime de tráfico, que, erroneamente, é interpretada como vedação à liberdade provisória. Guilherme de Souza Nucci elucida que a fiança tem por fim, primordialmente assegurar a liberdade provisória do indiciado ou réu, enquanto decorre o processo criminal, desde que preenchidas determinadas condições. Entregando valores seus ao Estado, estaria vinculado ao acompanhamento da instrução e interessado em apresentarse, em caso de condenação, para obter, de volta, o que pagou. Além disso, a fiança teria a finalidade de garantir o pagamento das custas, da indenização do dano causado pelo crime (se existente) e também da multa 81 (se for aplicada). No mesmo sentido, prossegue o autor: Atualmente, no entanto, o instituto da fiança encontra-se desmoralizado e quase não tem aplicação prática. Justifica-se a afirmação pela introdução, no Código de Processo Penal, do parágrafo único do art. 310, que autorizou a liberdade provisória, sem fiança, aceitando-se o compromisso do réu de comparecimento a todos os atos do processo, para qualquer delito. Ora, tal situação foi capaz de abranger delitos como o homicídio simples, cuja pena mínima é de seis anos de reclusão e considerado inafiançável (art. 323, I, CPP). Se o juiz pode conceder liberdade provisória para réus de crimes mais graves, por que não poderia fazer o mesmo quando o indivíduo cometesse um furto simples? Não tem cabimento, nem justiça, estabelecer a fiança para o crime menos grave, deixando em liberdade provisória desonerosa o autor de delito mais grave. Comungamos do entendimento exposto por Scarance Femandes: “Perdeu, assim, a fiança muito da sua importância. De regra, aquele que tem direito à liberdade provisória com fiança terá também direito à liberdade provisória sem fiança, e obviamente essa solução, por ser mais benéfica, é a que deve ser acolhida pelo juiz” (Processo penal constitucional, p. 310). É certo, lembra o mesmo autor, que a fiança ainda pode ter algumas vantagens, como o procedimento mais simplificado para a sua concessão, não se exigindo nem mesmo a oitiva prévia do Ministério Público, além de ser autorizada a fixação da fiança, em 82 alguns delitos, pela própria autoridade policial. Nesta senda, colhe-se o entendimento: como se observa, está gerada uma incongruência, pois nos casos em que o delito é inafiançável, o que faz presumir tratar-se de infração mais grave, não estando presentes os requisitos da prisão preventiva, deverá ser concedida liberdade provisória, ex parágrafo único do artigo 310 do CPP, ao passo que quando o crime é afiançável e a fiança deve ser arbitrada pela autoridade judiciária, em tese, a seguir-se letra da lei, deverá o indivíduo 81 82 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 2006, p. 625. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 2006, p. 625. 50 prestar fiança, sendo a infração presumidamente menos grave. Nos casos de fiança prestada junto à autoridade policial, a única vantagem é não ter de esperar os autos serem remetidos a juízo para concessão da liberdade provisória. Por outro lado, sempre que estiverem presentes os requisitos da preventiva, seja ou não afiançável, a infração, deverá a prisão ser decretada de ofício pelo magistrado, sendo incompatível com a fiança. Como os autos do flagrante devem ser remetidos a juízo o mais rápido possível, surge o questionamento: para que prestar fiança se a liberdade provisória é inexorável? Sim, pois ou há presença dos requisitos da preventiva e não há possibilidade de fiança ou então a liberdade será concedida por força do parágrafo único do artigo 310 do CPP, sem necessidade de pagamento de fiança. Por uma ilação lógica, não é isonômico admitir-se que um delito afiançável com fiança determinada pelo juiz implique em o acusado desembolsar a quantia e em um delito inafiançável, sem presença dos pressupostos da preventiva, seja concedida liberdade provisória pura e simples. A conseqüência é que nos casos de possibilidade de fiança arbitrada pelo juiz, a liberdade deverá vir por força do artigo 310, parágrafo único, sendo a exigência de fiança injusta. Resta, portanto, a fiança eficaz somente para aqueles casos em que o acusado pode vê-la arbitrada pela autoridade policial e prefere efetuar incontinenti o pagamento, sem aguardar a remessa do feito para juízo, onde a liberdade viria sem desembolso de 83 fiança. É incongruente, portanto, concluir que a Lei ao determinar a inafiançabilidade de um crime, consequentemente veda a concessão de liberdade provisória, uma vez que embora o art. 2º, II, da Lei 8.072 e a Constituição Federal afirmem que o tráfico ilícito de entorpecentes é insuscetível de fiança, não prevêem, expressamente, o cerceamento da liberdade. Desta feita, fica claro que a inafiançabilidade não se confunde com a possibilidade de concessão de liberdade provisória, pois, independerá, para a decretação da liberdade provisória, a gravidade do crime ou, ainda, se é ou não inafiançável, quando verificada a falta dos requisitos autorizadores da segregação cautelar, uma vez que a liberdade provisória é direito incondicional do acusado. 3.2.2 A vedação da liberdade provisória como política criminal temerária 83 MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Um panorama da fiança criminal à luz do parágrafo único do artigo 310 do CPP. Disponível em: <http://www.ufsm.br/direito/artigos/processo-penal/fiancacriminal. htm>. Acesso em: 17 maio. 2010. 51 Como bem explana Luiz Flávio Gomes84, a política criminal pautada no Direito Penal Mínimo, significa “mínima intervenção estatal, com máximas garantias”. No plano prático, nos três âmbitos do poder público pode e deve tal política ser aplicada e explica: a) compete ao poder Legislativo, trabalhando com o conceito de “merecimento de pena”, bem como com os princípios não intervencionistas, promover (formalmente) ampla descriminalização, despenalização e descarcerização; e de outra parte, impõe-se-lhe evitar ao máximo a criminalização de novas condutas, o aumento das penas ou a flexibilização dos critérios autorizadores da prisão cautelar; b) ao poder Executivo compete adotar uma inequívoca e inadiável política de prevenção do delito, dando prioridade aos processos de prevenção primária, sem se esquecer os demais, evidentemente; c) e quanto ao poder Judiciário, urge que o mesmo leve até suas últimas conseqüências a eficácia libertadora dos princípios intradogmáticos (âmbito penal), partindo da premissa de que a missão do Direito Penal é exclusivamente a de tutelar bens jurídicos e, ainda assim, de forma subsidiária e fragmentária (ultima ratio), bem como a eficácia garantidora dos princípios constitucionais, internacionais e processuais (âmbito processual) 85. No entanto, tendo em vista a dimensão internacional que o tráfico de drogas assumiu ao longo dos últimos anos, a política criminal para o combate a este tipo de delito também vem ganhando novos contornos. Conforme Silveira da Rosa86, a Política Criminal de Drogas da década de 90 contemplava dois discursos para a questão das drogas no País. O primeiro promulgava que a redução da oferta e da demanda poderia ocorrer por meio da intervenção penal, e, portanto, visava à total abstinência, isto é, um mundo sem 84 GOMES, Luiz Flávio. Direito de apelar em liberdade. Conforme a Constituição Federal e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 98-99. 85 GOMES, Luiz Flávio. Direito de apelar em liberdade. Conforme a Constituição Federal e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 98-99. 86 SILVEIRA DA ROSA, Rodrigo. Comentários à nova lei de combate às drogas que causam dependência. Prevenção e repressão. Sorocaba-SP: Editora Minelli, 2009, p. 38-39. 52 drogas. O segundo buscava uma linha prevencionista, direcionada para atividades referentes à redução de danos. A Lei n. 11.343/2006 abrange as duas tendências, de modo que: “a proibicionista ocupa-se contra a produção não autorizada e o tráfico ilícito de drogas, enquanto que a prevencionista é aplicada para o usuário e para o dependente”. Conforme Thums e Pacheco87, a Lei Antidrogas veda a concessão da liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico de drogas (art. 44), mas não há vínculo do juiz ao aspecto estritamente formal. Assinalam, também, que a proibição da liberdade provisória é um ranço autoritário do legislador e que os Tribunais Superiores contestam há muito tempo88. O fato é que o combate ao tráfico ilícito de drogas dirime as fronteiras entre as políticas de segurança e o direito penal. Sob o prisma do garantismo, temse que o direito e o processo penal devem representar as barreiras de contenção das violências constantemente decorrentes dos instrumentos da política repressiva.o choque de perspectiva advém da oposição entre segurança e garantias penais e processuais que devem ser respeitadas. O apego ao autoritarismo, a vontade de punitividade, tanto por parte dos operadores das agências penais quanto seu público espectador, enfim, o desejo generalizado de punição demonstra o velamento da percepção de que o processo de construção da Democracia é mesmo lento e sutil89. Não se pode olvidar, conforme observa Tourinho Filho90, que, mesmo admitindo a privação da liberdade individual, a Carta Constitucional de 1988 procurou resguardar o cidadão de toda e qualquer extralimitação do Poder Público. O autor ilustra tal premissa, apontando inúmeros princípios insertos no art. 5º, da Lei Maior, a saber: - inc. III (ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante); 87 THUMS, Gilberto; PACHECO, Vilmar. Nova lei de drogas. Crimes, investigação e processo. 2.ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008, p. 219. 88 THUMS, Gilberto; PACHECO, Vilmar. Nova lei de drogas. Crimes, investigação e processo. 2.ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008, p. 218. 89 CARVALHO. Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil. Estudo Criminológico e Dogmático da Lei 11.343/06. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 83-84. 90 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. Atualizada até a Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 639. 53 - inc. XLVII (não haverá penas... e) cruéis); - inc. XLVIII (a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado); - inc. XLIX (é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral); - inc. LIV (ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal); - inc. LXII (a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicado imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada); - inc. LXIII (o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado); - inc. LXIV (o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial); - inc. LXV (a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária); - inc. LXVI (ninguém será legado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança); e - inc. LXVIII (a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação). Além de todo esse embasamento constitucional, Luiz Flávio Gomes e Elisa Rudge91 apelam, ainda, para o bom senso do juiz para analisar cada caso em concreto antes de obedecer cegamente aos ditames do legislador, e afirmam: o juiz, no Estado constitucional e democrático de Direito, que aceita servilmente uma determinação abstrata e genérica do legislador no que diz 91 GOMES, Luiz Flávio; RUDGE Elisa M.Inconstitucionalidade da vedação da liberdade provisória no crime de tráfico de drogas, Abr.2009. Disponível em: <http://www.lfg.com.br> Acesso em: 21 Maio.2010. 54 respeito à concessão ou não da liberdade provisória, abre mão de uma importante parcela da sua função jurisdicional. Torna-se um ser inanimado, como dizia (em outro contexto) Montesquieu. No século XXI já não existe espaço para esse tipo de juiz vassalo (servil) do legislador. Nem tudo que o legislador escreve é válido. É a prudência e sabedoria do juiz que vai glosando o que o legislador faz de equivocado. Nesse sentido, Thums e Pacheco92 asseveram que “o juiz deve ter bom senso e equidade para avaliar as condutas tipificadas como tráfico e que mereçam a segregação provisória”. Indubitavelmente, é mister que qualquer assunto atinente ao combate ao tráfico de drogas, seja amplamente discutido por todos os setores da sociedade, visando construir mecanismos articulados, eficientes e efetivos para banir ou ao menos conter esse tipo de delinquência. Porém, não se pode deixar de observar e respeitar todos os direitos e garantias fundamentais tutelados pela Constituição Federal. A questão da vedação da liberdade provisória apenas àqueles acusados pelo tráfico de drogas é questão conflitante e que merece melhor análise e estudo por parte dos operadores do Direito. Se por um lado é louvável buscar o combate ao tráfico de drogas por outro deve o legislador agir com cautela e não se deixar levar pelo modismo ditado por uma histeria coletiva insurgida pela situação de violência e criminalidade que ameaça e reprime a sociedade em geral, podendo levar à bancarrota todo um rol de direitos fundamentais duramente conquistados no decorrer de séculos de lutas políticas e entraves sociais. Considerando a evolução moral da humanidade, até o ponto em que hoje se encontra, não se deve tolerar qualquer ofensa à dignidade da pessoa humana e o cerceamento de garantias processuais do acusado por prática desse ou qualquer outro tipo de crime. 92 THUMS, Gilberto; PACHECO, Vilmar. Nova lei de drogas. Crimes, investigação e processo. 2.ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008, p. 217. 55 4 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL: QUAL ENTENDIMENTO ACERCA DA CONCESSÃO DA LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO? Após a análise nos primeiros capítulos do crime de tráfico de drogas e da vedação da liberdade provisória para este delito, algumas jurisprudências do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal serão apreciadas neste capítulo, observando-se como se dá a aplicabilidade do tema na sociedade. 4.1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA Ao examinar algumas jurisprudências do Tribunal de Justiça de Santa Catarina sobre a concessão de liberdade provisória no crime de tráfico, observa-se que os julgadores do Egrégio Tribunal Catarinense praticamente não concedem a benesse. Na consulta para a formulação deste trabalho, acharam-se decisões que mesmo diante da primariedade, dos bons antecedentes, da residência e do emprego fixo, denegaram os pedidos, entendendo, que a vedação legal do art. 44 da Lei de Tóxicos e a inafiançabilidade disposta na Lei de Crimes Hediondos bastavam para indeferir o benefício. Contudo, acharam-se algumas jurisprudências que divergem desse entendimento, concedendo de imediato a liberdade provisória, quando a decisão da manutenção da segregação não é devidamente fundamentada93 e uma jurisprudência que outorga a benesse ante a dúvida da autoria de crime de narcotráfico da namorada de traficante que estava no momento da prisão de carona com este94. 93 Habeas Corpus n. 2006.048904-6, de Capital, Relator: José Gaspar Rubick, Juiz Prolator: Não Informado, Órgão Julgador: Primeira Câmara Criminal (Janeiro 2007), Julgado em: 16/01/2007; Habeas Corpus n. 2000.021883-9, de Chapecó, Relator: Maurílio Moreira Leite, Juiz Prolator: Não Informado, Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/11/2000; Habeas Corpus n. 1998.018402-9, de Urussanga, Relator: Amaral e Silva, Juiz Prolator: Não Informado, Órgão Julgador: Primeira Câmara Criminal, Julgado em: 09/03/1999. 94 Habeas Corpus n. 1997.000913-5, de Campos Novos, Relator: José Roberge, Juiz Prolator: Não Informado, Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 25/02/1997. 56 Destaca-se a decisão mais recente: HABEAS CORPUS - PRISÃO EM FLAGRANTE POR TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO - LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA EXCLUSIVAMENTE COM FUNDAMENTO NA VEDAÇÃO LEGAL DOS ARTS. 2º, II, DA LEI N. 8.072/90 E 44 DA LEI N. 11.343/06 - NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO ACERCA DA PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA SEGREGAÇÃO CAUTELAR INSCULPIDOS NO ART. 312 DO CPP - ORDEM 95 PARCIALMENTE CONCEDIDA. Como se pode notar, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina é bem intransigente em relação à concessão da liberdade provisória no crime de tráfico de drogas, apoiando muitas de suas decisões na vedação expressa do art. 44 da Lei 11.343/06 e erroneamente na inafiançabilidade disposta na Lei 8.072/90. 4.2 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, na grande maioria das jurisprudências pesquisadas sobre o tema, entende que o art. 44 da Lei 11.343/06 veda a concessão da liberdade, todavia para que haja a manutenção da segregação é indispensável à análise dos requisitos prescritos no art. 312 do Código de Processo Penal, ou seja, a privação da liberdade está sempre subordinada à comprovação concreta do periculum libertatis96. 95 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Habeas Corpus n. 2006.048904-6, de Capital, Relator: José Gaspar Rubick, Juiz Prolator: Não Informado, Órgão Julgador: Primeira Câmara Criminal (Janeiro 2007), Julgado em: 16/01/2007. Disponível em: <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/> Acesso em: 16 maio 2010. 96 Embargos Infringentes n. 70026685412, Comarca de origem: Canoas, Relator: Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, Primeiro Grupo de Câmaras Criminais, Julgado em: 07/11/2008; Recurso em Sentido Estrito nº 70016808842 , Comarca de origem: Santa Rosa, Relator: Elba Aparecida Nicolli Bastos, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/08/2007; Recurso em Sentido Estrito n. 70018254524, Comarca de origem: Gravataí, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Primeira Câmara Criminal, Julgado em: 14/02/2007, Recurso em Sentido Estrito n. 70016958324 , Comarca de origem: Santa Vitória do Palmar, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Primeira Câmara Criminal, Julgado em: 28/03/2007; Recurso em Sentido Estrito n. 70013978770, Comarca de origem: Santiago, Relator: Elba Aparecida Nicolli Bastos, Terceira Câmara Criminal, Julgado em: 16/03/2006; Recurso em Sentido Estrito n. 70012876421, Comarca de origem: Alegrete, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Primeira Câmara Criminal, Julgado em: 18/01/2006; Recurso em Sentido Estrito n. 70012664363, Comarca de origem: Viamão, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Primeira Câmara Criminal, Julgado em: 19/10/2005; Recurso em Sentido Estrito n. 70010899722, Comarca de origem: Canoas, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Primeira Câmara Criminal, Julgado em: 30/03/2005; Recurso em Sentido Estrito n. 70009042540, Comarca de origem; Porto Alegre, Relator: Antônio Carlos Netto 57 Sobre o tema, extrai-se do corpo do acórdão: É verdade que a Lei 8.072/90 veda a concessão da liberdade provisória a crimes hediondos e equiparados, mas nunca se dispensou o exame dos critérios de necessidade e, tendo entendido o magistrado desnecessária a prisão, não se encontra elementos para contestar sua apreciação dos fatos com o fim de revogar seu despacho. O Ministério Público também não trouxe elementos fáticos que comprovem a necessidade da segregação. A própria Lei 8.072/90, recentemente modificada pela 11.464/07 excluiu a proibição da liberdade provisória no artigo 2º, Inciso II. É verdade que a Lei 11.343/06, no artigo 44 veda o benefício para os presos em flagrante por delitos de tráfico de drogas, mas sua vigência é posterior e não poderia ser invocada como fundamento legal para manter a prisão. Ora, o juiz do processo que está mais próximo dos fatos e envolvido tem melhores condições de aferir o critério de necessidade para manter a segregação, apenas quando elementos concretos demonstrem com clareza que há motivos, entre os elencados no artigo 312 do Código de Processo Penal para que se restaure a prisão, revoga-se o despacho concessivo. Ora, como não se vislumbra motivos para que retornem os réus ao cárcere, 97 mantêm-se o despacho que concedeu a liberdade. Os magistrados gaúchos afirmam, reiteradamente, que na inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva, é possível ao réu responder o processo solto, consoante dispõe o parágrafo único do artigo 310 do Código de Processo Penal. Nesse sentido, destaca-se o julgado: EMENTA: RECURSO-CRIME. PRISÃO PREVENTIVA. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. Inconformidade acusatória quanto à decisão concessiva de liberdade provisória ao acusado. Não obstante tratar-se de crime equiparado a hediondo, a manutenção da custódia cautelar só se impõe quando se revelar necessária. Não configurados os pressupostos legais autorizadores da medida excepcional, sendo possível ao réu responder solto ao feito, consoante o disposto no artigo 310 do Código de Processo Penal. Negaram provimento. Decisão unânime. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70009042540, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de de Mangabeira, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/10/2004; Recurso em Sentido Estrito n. 70009006891, Comarca de origem: Santiago, Relator: Antônio Carlos Netto de Mangabeira, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/10/2004. 97 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso em Sentido Estrito nº 70016808842 , Comarca de origem: Santa Rosa, Relator: Elba Aparecida Nicolli Bastos, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/08/2007, Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/> Acesso em: 16 maio 2010. 58 Justiça do RS, Relator: Antônio Carlos Netto de Mangabeira, Julgado em 98 28/10/2004) Vale destacar a decisão de um recurso em sentido estrito em que o desembargador declara que a vedação imposta pela Lei 8.072/90 é inconstitucional, tendo em vista que, segundo dispõe a Constituição, a regra é a liberdade, não podendo, assim, uma legislação hierarquicamente inferior estabelecer de outra forma99. Em que pese a Lei de Crime Hediondos não vede mais a liberdade provisória para os crimes nela elencados, a fundamentação de hierarquia das normas vale para afirmar que o art. 44 da Lei 11.3430/06 também é inconstitucional. Assim, ressalta-se da fundamentação do Relator Antônio Carlos Netto de Mangabeira: Destarte, inexistem, nos autos, razões para se concluir que o indiciado possa pretender evadir-se do distrito da culpa. Também não há qualquer elemento que denote a pretensão de influir na coleta das provas ou prejudicar a ordem pública. E mais. A previsão legal contida no inciso II do art. 2º da Lei nº 8.072/90, que proíbe a concessão de liberdade provisória nos delitos hediondos, é inconstitucional, tendo em vista que, pela Lei Maior, a regra no Direito Penal é a liberdade, não podendo uma legislação hierarquicamente inferior estabelecer de outra forma. Não visualizada no almanaque a necessidade da manutenção da prisão cautelar do réu, impunha-se reconhecer-lhe o direito de responderem ao processo em liberdade, em face do artigo 310 do Código de Processo Penal, como o fez com propriedade a Dra. Juíza de Direito de 1ª instância. Pelo acima exposto, mantenho a decisão hostilizada e nego provimento ao 100 recurso ministerial. Ante o exposto, verifica-se que embora haja vedações à concessão do instituto da liberdade provisória, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do 98 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso em Sentido Estrito n. 70009006891, Comarca de origem: Santiago, Relator: Antônio Carlos Netto de Mangabeira, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/10/2004. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/> Acesso em: 16 maio 2010. 99 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso em Sentido Estrito n. 70009042540, Comarca de origem; Porto Alegre, Relator: Antônio Carlos Netto de Mangabeira, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/10/2004. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/> Acesso em: 16 maio 2010. 100 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso em Sentido Estrito n. 70009042540, Comarca de origem; Porto Alegre, Relator: Antônio Carlos Netto de Mangabeira, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/10/2004. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/> Acesso em: 16 maio 2010. 59 Sul é mais flexível em suas decisões, concedendo a benesse de imediato quando não preenchidos os requisitos elencados no art. 312 do Código de Processo Penal. Acreditam que é imprudente, quando não se revelar altamente necessário, manter um indivíduo segregado; até mesmo porque nossa Carta Magna defende o princípio da presunção de inocência e da liberdade. 4.3 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Analisando jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça do ano de 2010 concernentes à liberdade provisória no crime de tráfico de drogas, nota-se que o Egrégio Tribunal se posicionou majoritariamente, mesmo havendo vedação legislativa, pela concessão do benefício quando não preenchidos os requisitos previstos no art. 312, do CPP.101 Colhe-se dos julgados: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO. LAVAGEM DE CAPITAIS. CONDENAÇÃO. RÉ QUE RESPONDEU SOLTA À AÇÃO PENAL. DETERMINAÇÃO DE EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO SEM A DEVIDA FUNDAMENTAÇÃO. CONDENAÇÃO NÃO TRANSITADA EM JULGADO. APELAÇÃO CRIMINAL INTERPOSTA PELA DEFESA. CONSTRANGIMENTO EVIDENTE. LIMINAR CONFIRMADA. 1. Nos termos da liminar deferida, há evidente constrangimento na expedição de mandado de prisão em desfavor da paciente, após ter respondido ao processo em liberdade, sem que se indicasse a presença dos fundamentos da custódia provisória, conforme dicção do art. 312 do Código de Processo Penal, porquanto não transitada em julgado a condenação, revestindo-se portanto a medida de cautelaridade (Precedentes). 2. Ordem concedida em definitivo, para que a paciente aguarde em liberdade o julgamento da 102 apelação. Entendem, também, que é impossível a execução provisória da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da condenação, se o acusado 101 HC 146476 / SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Órgão Julgador: Quinta Turma, j. 13/04/2010, DJe 10/05/2010. HC 145553 / RO, Relator Ministro Jorge Mussi, Orgao Julgador: Quinta Turma, j. 16/03/2010, DJe 05/04/2010. HC 139412 / SC, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Órgão Julgador: Sexta Turma, j. 09/02/2010, DJe 22/03/2010. AgRg no REsp 1163453 / RS, Relator Ministro OG Fernandes, Orgao Julgador: Sexta Turma, j. 02/02/2010, DJe 01/03/2010. 102 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 145553 / RO, Relator Ministro Jorge Mussi, Orgao Julgador: Quinta Turma, j. 16/03/2010, DJe 05/04/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. 60 respondeu ao processo em liberdade e não estão presentes os pressupostos autorizadores da prisão preventiva (art. 312 do CPP).103 Extrai-se do corpo da ementa: Conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, toda custódia imposta antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória exige concreta fundamentação, nos termos do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal. 2. Se o magistrado de primeira instância indeferiu o pedido de liberdade provisória amparado apenas na vedação legal contida no art. 44 da Lei n. 11.343/06, na quantidade de droga (28 pedras de cocaína) e na repercussão social causada pelo delito, fica evidente o constrangimento ilegal. Tais motivos não se revelam idôneos para justificar a imprescindibilidade da medida extrema, destacando-seque já foi proferida sentença condenatória, sendo fixada a reprimenda no 104 mínimo legal. Dentre os acórdãos analisados achou-se, também, um habeas corpus em que a paciente foi posta em liberdade ante o excesso de prazo da prisão cautelar. O ministro relator sustenta que a vedação de liberdade provisória prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006 não afasta a ilegalidade da prisão cautelar, se caracterizado o excesso de prazo.105 Dessa feita, conclui-se que a jurisprudência dessa Corte tem proclamado que a prisão cautelar é medida de caráter excepcional, devendo ser imposta, ou mantida, apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada (art. 93, inciso IX, da Constituição Federal), as exigências do art. 312 do Código de Processo Penal.106 4.4 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 103 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 146476 / SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Órgão Julgador: Quinta Turma, j. 13/04/2010, DJe 10/05/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. 104 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 139412 / SC, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Órgão Julgador: Sexta Turma, j. 09/02/2010, DJe 22/03/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. 105 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 149589 / MG, Relator Ministro Celso Limongi, Órgão Julgador: Sexta Turma, j. 17/12/2009, DJe 22/02/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. 106 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 155384 / MG, Relator Ministro OG Fernandes, Órgão Julgador: Sexta Turma, j. 05/04/2010, DJe 19/04/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. 61 Ao observar as jurisprudências do Supremo Tribunal Federal disponibilizadas no sistema sobre concessão de liberdade provisória no crime de tráfico de drogas, observa-se que atualmente as decisões se posicionam no sentido de que sentença que veda a benesse fundamentando apenas no art. 44 da Lei 11.343/06 e no inciso II do art. 2º da Lei 8.072/90 afronta os princípios constitucionais da presunção da inocência, do devido processo legal e da dignidade da pessoa humana, uma vez que a segregação só pode ser mantida, quando presentes os requisitos autorizadores da prisão cautelar previstos no art. 312 do Código de Processo Penal.107 Neste sentido: A regra estabelecida na Constituição, bem assim na legislação infraconstitucional, é a liberdade. A prisão faz exceção a essa regra, de modo que, a admitir-se que o artigo 5º, inciso XLIII estabelece, além das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória, o conflito entre normas estaria instalado. 4. A inafiançabilidade não pode e não deve --considerados os princípios da presunção de inocência, da dignidade da pessoa humana, da ampla defesa e do devido processo legal --- constituir causa impeditiva da liberdade provisória. 5. Não se nega a acentuada nocividade da conduta do traficante de entorpecentes. Nocividade aferível pelos malefícios provocados no que concerne à saúde pública, exposta a sociedade a danos concretos e a riscos iminentes. Não obstante, a regra consagrada no ordenamento jurídico brasileiro é a liberdade; a prisão, a exceção. A regra cede a ela em situações marcadas pela demonstração cabal da necessidade da segregação ante tempus. Impõe-se, porém ao Juiz o dever de explicitar as razões pelas quais alguém deva ser preso ou mantido preso cautelarmente. 6. Situação de flagrante constrangimento ilegal a ensejar exceção à Súmula n. 691/STF. Ordem concedida a fim de 108 que o paciente seja posto em liberdade, se por al não estiver preso. E mais: EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. PRISÃO EM FLAGRANTE. 107 HC 100745 / SC, Relator(a): Min. EROS GRAU, Julgamento: 09/03/2010, Órgão Julgador: Segunda Turma. HC 100872 / MG, Relator(a): Min. EROS GRAU, Julgamento: 09/03/2010, Órgão Julgador: Segunda Turma. HC 96041 / SP, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. CEZAR PELUSO, Julgamento: 02/02/2010 Órgão Julgador: Segunda Turma. HC 97579 / MT, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EROS GRAU, Julgamento: 02/02/2010, Órgão Julgador: Segunda Turma. HC 101505 / SC, Relator(a): Min. EROS GRAU, Julgamento: 15/12/2009, Órgão Julgador: Segunda Turma. HC 93056 / PE, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Julgamento: 16/12/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma. HC 95538 / MG, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EROS GRAU, Julgamento: 11/11/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma. 108 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 100745 / SC, Relator(a): Min. EROS GRAU Julgamento: 09/03/2010 Órgão Julgador: Segunda Turma. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp> Acesso em 23 maio 2010. 62 GRAVIDADE DO CRIME. REFERÊNCIA HIPOTÉTICA À POSSIBILIDADE DE REITERAÇÃO DE INFRAÇÕES PENAIS. FUNDAMENTOS INIDÔNIOS PARA A CUSTÓDIA CAUTELAR. VEDAÇÃO DA CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA AO PRESO EM FLAGRANTE POR TRÁFICO DE ENTORPECENTES [ART. 44 DA LEI N. 11.343/06]. INCONSTITUCIONALIDADE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA, DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 1. A jurisprudência desta Corte está sedimentada no sentido de que a gravidade do crime não justifica, por si só, a necessidade da prisão preventiva. Precedentes. 2. A referência hipotética à mera possibilidade de reiteração de infrações penais, sem nenhum dado concreto que lhe dê amparo, não pode servir de supedâneo à prisão preventiva. Precedente. 3. A vedação da concessão de liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico de entorpecentes, veiculada pelo artigo 44 da lei n. 11.343/06, consubstancia afronta escancarada aos princípios da presunção da inocência, do devido processo legal e da dignidade da pessoa humana [arts. 1º, III, e 5º, LIV e LVII, da CB/88]. Daí a necessidade de adequação desses princípios à norma veiculada no artigo 5º, inciso XLII, da CB/88. 4. A inafiançabilidade, por si só, não pode e não deve constituir-se em causa impeditiva da liberdade provisória. 5. Não há antinomia na Constituição do Brasil. Se a regra nela estabelecida, bem assim na legislação infraconstitucional, é a liberdade, sendo a prisão a exceção, existiria conflito de normas se o artigo 5º, inciso XLII estabelecesse expressamente, além das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória. Nessa hipótese, o conflito dar-se-ia, sem dúvida, com os princípios da dignidade da pessoa humana, da presunção de inocência, da ampla e do devido processo legal. 6. É inadmissível, ante tais garantias constitucionais, possa alguém ser compelido a cumprir pena sem decisão transitada em julgado, além do mais impossibilitado de usufruir benefícios da execução penal. A inconstitucionalidade do preceito legal me parece inquestionável. Ordem concedida a fim de que a paciente aguarde em 109 liberdade o trânsito em julgado da sentença condenatória. Ante o exposto, percebe-se que as jurisprudências mais recentes sobre concessão de liberdade provisória, no crime de tráfico de drogas, concedem o benefício aos acusados que não preenchem os requisitos da prisão cautelar, pois a prisão cautelar não pode servir como instrumento de punição, infringindo princípios constitucionais e ceifando direitos fundamentais. Nesse diapasão, o Ministro Celso de Mello afirma que: A prisão cautelar não pode - e não deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. A prisão cautelar - que não deve ser confundida com a prisão penal não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas 109 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 97579 / MT, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EROS GRAU, Julgamento: 02/02/2010, Órgão Julgador: Segunda Turma. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp> Acesso em 24 maio 2010. 63 destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em 110 benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal. 4.5 COMPARAÇÃO DE DECISÕES Frente às decisões citadas anteriormente, nota-se que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina é o único que persiste na vedação da liberdade provisória no crime de tráfico, apoiando-se, algumas vezes, única e exclusivamente no art. 44, da Lei de Drogas e, outras vezes, erroneamente na inafiançabilidade disposta na Lei de Crimes Hediondos. Os outros tribunais analisados entendem, majoritariamente, que a vedação da liberdade provisória, em qualquer que seja o delito deve ser fundamentada nos requisitos dispostos no art. 312 do Código de Processo Penal, sob pena de afrontar os princípios constitucionais do devido processo legal e da presunção de inocência, uma vez que é direito certo e objetivo do réu ser posto em liberdade, quando não preenchidos os pressupostos da prisão cautelar. Percebe-se que os Tribunais tendem a ser mais humanitários, analisando minuciosamente os direitos dos réus a fim de não ceifá-los, uma vez que a prisão não é um meio de punição, sua finalidade é a buscar a ressocialização dos condenados, todavia, o encarceramento em nosso país tornou-se uma faculdade do crime, com superlotações e condições precárias, razão pela qual a restrição da liberdade deve ocorrer apenas em casos excepcionais. 110 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 93056 / PE, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Julgamento: 16/12/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp> Acesso em 24 maio 2010. 64 5 CONCLUSÃO O presente trabalho teve como intuito mostrar que não mais se mostra aceitável que, em um sistema que objetiva a proteção dos direitos fundamentais do cidadão, exista legislação que determine o cerceamento de tais direitos. Não se pode permitir a manutenção da custódia cautelar, sem antes analisar a real necessidade daquela prisão e sem verificar se aquele indivíduo merece se manter aprisionado até o seu julgamento final, eis que se tratando de direito à liberdade, o mais correto seria possibilitar, mesmo diante da prática de crime de tráfico de drogas, a concessão da liberdade provisória. A vedação legal do art. 44 da Lei 11.343/06, não pode ser o único aspecto a ser analisado para embasar o indeferimento da benesse, devendo, igualmente, ser analisado se estão presentes os requisitos da prisão preventiva, pois, quando os magistrados observam os dois pressupostos, estão preservando os princípios fundamentais da presunção de inocência e do devido processo legal, uma vez que a segregação estará devidamente fundamentada. Até porque, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, não se pode presumir se uma pessoa é culpada, não sendo razoável, mantê-la aprisionada quando não haja ameaça à ordem pública ou à ordem econômica, a conveniência da instrução penal, ou a aplicação da lei penal. No decorrer do trabalho, foi visto que nossa Constituição é fundada em um sistema de garantias fundamentais e princípios que defendem a possibilidade de concessão da liberdade provisória aos crimes de tráfico, quando a liberdade for medida que se impõe, ou seja, quando não preenchidos os requisitos legais da custódia cautelar. Isso porque, mesmo havendo impeditivo legal na Lei de Tóxicos, o direito à liberdade se sobrepõe à vedação legal. Além de afrontar dos princípios constitucionais, vale lembrar que a vedação do art. 44 da Lei 11.343/06 vai de encontro com a Lei 11.464/07, que 65 alterou a Lei 8.072/90 e dispôs não mais existir vedação à liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados, e, sendo uma norma posterior e mais benéfica, prevaleceu sobre a proibição da Lei de Tóxicos. Assim, não há por que se falar em vedação da liberdade provisória em relação aos crimes de tráfico de drogas, pois mesmo existindo o art. 44 da Lei 11.343/06, o benefício poderá ser deferido com base na ausência dos requisitos da prisão preventiva, em respeito aos ditames constitucionais da inocência e do devido processo legal. Tal fato é verdade porque as jurisprudências colacionadas à monografia mostram, de forma contundente, o entendimento dos Tribunais pesquisados no sentido de que a liberdade provisória, sempre, deverá ser concedida, quando não preenchidos os requisitos do art. 312, do CPP, revogando, assim, tacitamente a vedação estabelecida pela Lei 11.343/06. . 66 REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10520: informação e documentação: trabalhos acadêmicos: apresentação. Rio de Janeiro, 2002. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14724: Apresentação de trabalhos acadêmicos, dissertações e teses. Rio de Janeiro, 2005. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação: elaboração. Rio de Janeiro, 2002. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 14 Abr.2010. BRASIL. Lei 10.409, de 11 de janeiro de 2002. Dispõe sobre a prevenção, o tratamento, a fiscalização, o controle e a repressão à produção, ao uso e ao tráfico ilícitos de produtos, substâncias ou drogas ilícitas que causem dependência física ou psíquica, assim elencados pelo Ministério da Saúde, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10409.htm>. Acesso em: 14 Abr.2010. BRASIL. Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11343.htm>. Acesso em: 14 Abr.2010. BRASIL. Lei 6.368, de 21 de outubro de 1976. Dispõe sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica, e dá outras providências. (Revogada pelo Lei n. 11.343, de 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6368.htm>. Acesso em 14 Abr.2010. BRASIL. Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos). Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/LEIS/L8072.htm> Acesso em: 4 Abr.2010. 67 BRASIL. Política Nacional Antidrogas. Disponível em: Out.2005. <http://www.almg.gov.br/eventos/imagens/politica_nacional_antidrogas.pdf> Acesso em: 17 Abr.2010. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 155384 / MG, Relator Ministro OG Fernandes, Órgão Julgador: Sexta Turma, j. 05/04/2010, DJe 19/04/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 146476 / SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Órgão Julgador: Quinta Turma, j. 13/04/2010, DJe 10/05/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 145553 / RO, Relator Ministro Jorge Mussi, Orgao Julgador: Quinta Turma, j. 16/03/2010, DJe 05/04/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 139412 / SC, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Órgão Julgador: Sexta Turma, j. 09/02/2010, DJe 22/03/2010. Disponível em: http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 149589 / MG, Relator Ministro Celso Limongi, Órgão Julgador: Sexta Turma, j. 17/12/2009, DJe 22/02/2010. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp> Acesso em 23 maio 2010. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 100745 / SC, Relator(a): Min. EROS GRAU, Julgamento: 09/03/2010, Órgão Julgador: Segunda Turma. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp> Acesso em 23 maio 2010. CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Legislação penal especial. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 4. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. CARVALHO, Hilário Veiga de. A nova lei Antitóxicos (Comentários). 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Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/> Acesso em 16 maio 2010. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso em Sentido Estrito n. 70009042540, Comarca de origem; Porto Alegre, Relator: Antônio Carlos Netto de Mangabeira, Segunda Câmara Criminal, Julgado em: 28/10/2004. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/> Acesso em 16 maio 2010. SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Habeas Corpus n. 2006.048904-6, de Capital, Relator: José Gaspar Rubick, Juiz Prolator: Não Informado, Órgão Julgador: Primeira Câmara Criminal (Janeiro 2007), Julgado em: 16/01/2007. Disponível em: <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/> Acesso em 16 maio 2010. SILVA, José Afonso et al..20 anos da Constituição Cidadã. Rio de Janeiro: Fundação Konrad Adenauer, 2008. SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à constituição. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. SILVA, Marisya Souza e. Crimes hediondos & progressão de regime prisional. Curitiba: Juruá, 2007. SILVEIRA DA ROSA, Rodrigo. Comentários à nova lei de combate às drogas que causam dependência. Prevenção e repressão. Sorocaba-SP: Editora Minelli, 2009. 71 SILVEIRA, Carlos Alberto Arruda. A nova Lei de Tóxicos comentada. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Doutrina, prática, legislação, jurisprudência. São Paulo: JLA Editora e Distribuidora, 2006. SOBRANE, Sérgio Turra. Transação penal. São Paulo: Saraiva, 2002. THUMS, Gilberto; PACHECO, Vilmar. Nova lei de drogas. Crimes, investigação e processo. 2.ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. Atualizada até a Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 31.ed. São Paulo: Saraiva, 2009, v. 3. 72 ANEXO A- Jurisprudências Tribunal de Justiça de Santa Catarina Habeas corpus n. 2006.048904-6, da Capital. Relator: Des. Gaspar Rubik. HABEAS CORPUS ¿ PRISÃO EM FLAGRANTE POR TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO ¿ LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDAEXCLUSIVAMENTE COM FUNDAMENTO NA VEDAÇÃO LEGAL DOS ARTS. 2º, II, DA LEI N. 8.072/90 E 44 DA LEI N. 11.343/06 ¿ NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO ACERCA DA PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA SEGREGAÇÃO CAUTELAR INSCULPIDOS NO ART. 312 DO CPP ¿ ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus n. 2006.048904-6, da Capital, em que é impetrante Marcelo Gonzaga, sendo paciente Daniel Cândido Veloso: ACORDAM, em Primeira Câmara Criminal, por votação unânime, conceder parcialmente a ordem para que o magistrado a quo, no prazo de 5 dias, fundamente a decisão de indeferimento de liberdade provisória, com base nos requisitos do art. 312 do CPP Custas na forma da lei. O advogado Marcelo Veloso impetra a presente ordem de habeas corpus sob o argumento de que Daniel Cândido Veloso, preso em flagrante e denunciado por infração aos arts. 12 da Lei n. 6.368/76 e 14 da Lei n. 10.826/03, sofre constrangimento ilegal decorrente do indeferimento de seu pedido de liberdade provisória tãosomente com base nos arts. 2º, II, da Lei n. 8.072/90 e 44 da Lei n. 11.343/06, sem que fosse avaliada a presença dos pressupostos e requisitos previstos pelo art. 312 do Código de Processo Penal. Indeferida a liminar e prestadas as informações requisitadas à autoridade apontada como coatora, os autos foram com vista à douta Procuradoria-Geral de Justiça, que opinou, em parecer do Dr. Luiz Fernando Sirydakis, pela denegação da ordem. É o relatório. A concessão parcial da ordem é, contudo, impositiva, pois consoante mais recente posicionamento das Cortes Superiores, sufragado por este Areópago, ¿não obstante o acusado ter sido denunciado por crime equiparado aos hediondos, faz-se imprescindível, para a manutenção da segregação cautelar, a justificativa cabal de sua imposição, a teor do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal¿ (Resp. n. 863272/CE. Rel. Min. Laurita Vaz, j. em 19/09/2006). E na hipótese observa-se que o MM. Juiz de Direito indeferiu o pedido de liberdade provisória formulado em favor do paciente apenas com fundamento na vedação legal ínsita nos arts. 2º, II, da Lei n. 8.072/90 e 44 da nova Lei de Drogas, o que, por si só, não constitui motivação idônea, sendo mister que se manifeste acerca da presença de qualquer das hipóteses que, aliadas aos indícios de autoria e materialidade delitivas, autorizam a prisão preventiva, à luz do disposto no art. 312 do Estatuto Adjetivo Penal. Nesse sentido vem iterativamente decidindo este Sodalício: ¿TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO COM BASE NA VEDAÇÃO DO ART. 2º, II, DA LEI 8.072/90. NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO SOBRE OS PRESSUPOSTOS E REQUISITOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS SUPERIORES E DESTA CORTE. CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM, PARA QUE A AUTORIDADE JUDICIÁRIA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA REAPRECIE O PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA E SE MANIFESTE SOBRE AS CIRCUNSTÂNCIAS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Conforme recente decisões das Cortes Superiores, o Magistrado, além de referência à vedação legal contida na Lei Especial, deve ainda enfatizar fundamentadamente a ocorrência dos pressupostos do artigo 312 do Código de Processo Penal, para negar a concessão do benefício de liberdade provisória àqueles denunciados por crime hediondo. Não basta apenas a referência a clara disposição legal. (Habeas corpus n. 2006.015020-0, da Capital, Relator Des. Solon d'Eça Neves, Primeira Câmara Criminal, julgado em 30 de maio de 2006)¿ (Habeas corpus n. 2006.037570-9, de São José. Rel. Des. Jorge Schaefer Martins, j. em 31/10/2006) 73 ¿PRISÃO EM FLAGRANTE - TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTE - LIBERDADE PROVISÓRIA - DECISÃO QUE INDEFERE O PEDIDO COM SUPEDÂNEO NA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS - QUESTÃO A SER EXAMINADA TENDO EM VISTA OS DISPOSITIVOS QUE REGEM A PRISÃO PREVENTIVA - NECESSIDADE DE NOVA MANIFESTAÇÃO ACERCA DO ASSUNTO - ORDEM CONCEDIDA, PARCIALMENTE, PARA QUE O JUIZ APRECIE A MATÉRIA¿ (Habeas corpus n. 2006.032255-7, de Criciúma. Rel. Des. Irineu João da Silva, j. em 26/09/2006). Não discrepa o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça: ¿HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. CUSTÓDIA MANTIDA PELA SENTENÇA DE PRONÚNCIA SEM MOTIVAÇÃO CONCRETA. 1. A prisão cautelar, providência processual de caráter excepcional, só deve ser imposta quando presente um dos motivos que autorizam sua adoção, elencados no artigo 312 do CPP, que devem estar claramente demonstrados, não resultando sua necessidade do fato de se tratar de crime hediondo. 2. No caso, tanto o decreto preventivo quanto a sentença de pronúncia não demonstram a existência de nenhum elemento em concreto para justificar a constrição do status libertatis do paciente, carecendo ambos os provimentos da devida fundamentação, em manifesta afronta ao princípio contido no artigo 93, IX, da Constituição Federal. 3. O entendimento majoritário desta Corte é no sentido de que o simples fato de se tratar de crime hediondo não impede, por si só, a concessão da liberdade ao paciente.¿ (HC n. 37599/SP. Rel. Min. Paulo Gallotti, j. em 24/05/2005) Por tais razões, pois, decide a Câmara, por votação unânime, concede parcialmente a ordem para que o magistrado a quo, no prazo de 5 dias, fundamente a decisão de indeferimento de liberdade provisória, com base nos requisitos do art. 312 do CPP. Participou do julgamento, com voto vencedor, o Exmo. Sr. Des. José Carlos Carstens Köhler, tendo exarado parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Luiz Fernando Sirydakis. Florianópolis, 16 de janeiro de 2007. AMARAL E SILVA Presidente c/ voto GASPAR RUBIK Relator Habeas corpus n. 00.021883-9, de Chapecó. Relator: Des. Maurílio Moreira Leite. Habeas-corpus. Tráfico ilícito de entorpecentes e receptação. Sentença condenatória que nega o direito de o réu apelar em liberdade, sem a devida fundamentação. Inadmissibilidade. Ordem concedida. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas-Corpus n. 00.021883-9, da Comarca de Chapecó, em que são impetrantes Rodrigo Jorge de Brito Antunes e Jorge Batista Antunes, sendo paciente Mickael Franke: ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conceder a ordem para que o paciente solto, se por outro motivo não estiver preso, aguarde solução do apelo interposto. Na comarca de Chapecó, 2ª Vara Criminal, Mickael Franke foi condenado pela prática dos crimes definidos nos artigos 12, da Lei n. 6.368/76, e 180, do Código Penal, com respectivas penas fixadas em 4 anos e 6 meses de reclusão, e 1 ano de reclusão, além das multas cabíveis às espécies. Determinado regime prisional integralmente fechado. Negado o benefício de aguardar solto solução de recurso que porventura viesse a ser interposto. Por meio de habeas-corpus, impetrado pelo Dr. Rodrigo J. de Brito Antunes, é pretendido que solto aguarde julgamento do recurso que interpôs, porquanto, embora preso inicialmente, respondeu solto a instrução criminal, por força de concessão de ordem de habeas-corpus. 74 Após as informações, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Dr. Valdir Vieira, manifestou-se pela concessão da ordem, quando afirmado: ¿Realmente, conforme colhe-se dos documentos acostados como requerimento inicial (fls. 07, 09 e 33), o paciente que se encontrava preso preventivamente por ordem expedida pela Juízo de Direito daquela comarca, obteve, a sua soltura, através de ordem de habeas-corpus. Sobre a questão, esse Tribunal, reiteradamente, tem decidido: ¿Habeas-corpus. Sentença condenatória. Pedido visando assegurar o direito do condenado de apelar em liberdade. Desnecessidade do recolhimento à prisão para o apelo uma vez que o paciente esteve em liberdade durante a fase de instrução. Ordem concedida¿ (Habeas-corpus n. 99.002957-3, de Anchieta¿. É o relatório. O paciente foi preso em decorrência de custódia cautelar, ainda na fase de inquérito, sendo beneficiado em 15 de agosto de 2000, por concessão de ordem de habeas-corpus, quando afirmado na ementa: ¿Prisão preventiva. Decreto desprovido da necessária fundamentação. Inobservância do disposto no artigo 15, do Código de Processo Penal. Ordem concedida. O decreto de prisão preventiva deve, necessariamente, ser fundamentado, expondo a real necessidade da medida em face de fatos concretos, não bastando, para tanto, mera citação ao dispositivo legal pertinente¿. Prolatada a sentença condenatória, foi determinada expedição de mandado de prisão, sob o seguinte fundamento: ¿Deixo de conceder-lhes o benefício de apelarem soltos por expressa disposição legal (Lei n. 8.072/90, artigo 2º, inciso II)¿. Tal dispositivo, diz respeito à impossibilidade de concessão de liberdade provisória com relação ao tráfico ilícito de entorpecentes, tendo por pressuposto, por óbvia conclusão, a ocorrência de prisão em flagrante. Não é a hipótese dos autos. Assim, a situação anterior, analisada no habeas-corpus referido, reapresenta-se, pois inocorrente qualquer fundamentação acerca da necessidade do recolhimento do paciente à prisão, não bastando a condenação, em que pese a gravidade do crime. Neste sentido, o posicionamento da jurisprudência: ¿Se o réu se encontrava, ao longo do processo em liberdade, o Juiz sentenciante para obstar o direito de apelar em liberdade deveria ter fundamentado concretamente sua decisão. A exigência de motivação vinculada não está afastada mesmo em sede de delitos hediondos. Writ concedido¿ (Habeas-corpus n. 6.682/É, Rel. Min. Félix Fischer ¿ DJU de 11/05/98, p. 134). Na mesma direção, decisões deste Tribunal de Justiça: ¿Habeas-corpus. Tráfico de drogas, concussão e prevaricação. Condenação. Crime hediondo. Sentença condenatória que nega aos pacientes o direito de recorrer em liberdade, muito embora tenham respondido soltos a todos os atos da instrução criminal, sem causar qualquer empecilho. Prisão sem fundamentação de sua necessidade. Inadmissibilidade. Inteligência do § 2º, do artigo 2º, da Lei n. 8.072/90. Ordem concedida¿ (Habeas-corpus n. 99.014341-4, de Campos Novos, Rel. Des. Alberto Costa). ¿Habeas-corpus. Tráfico de drogas. Crime hediondo. Condenação. Direito de recorrer em liberdade. Benefício negado. Paciente que respondeu ao processo em liberdade. Prisão sem fundamentação de sua necessidade. Inadmissibilidade. Exegese do art. 2º, parágrafo 2º, da Lei n. 8.072/90. Ordem concedida¿ (Habeas-corpus n. 12.543, Rel. Des. Álvaro Wandelli). Em face do exposto, a ordem é concedida para que o paciente solto, se por outro motivo não estiver preso, aguarde solução do apelo interposto. Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Irineu João da Silva e Torres Marques. Lavrou o parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Valdir Vieira. Florianópolis, 28 de novembrode 2000. Jorge Mussi PRESIDENTE COM VOTO Maurílio Moreira Leite RELATOR 75 Habeas corpus n. 98.018402-9, de Urussanga. Relator: Des. Amaral e Silva. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL ¿ HABEAS CORPUS ¿ PRISÃO PROVISÓRIA ¿ TRÁFICO ¿ AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO ¿ ORDEM CONCEDIDA. Para a decretação da prisão temporária é indispensável a demonstração de sua necessidade na instrução do inquérito policial, nos termos das Leis n.. 7.960/89 e 8.072/90. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus n. 98.018402-9, da comarca de Urussanga, em que é impetrante Dr. Arnildo Steckert Júnior, sendo paciente Aldoir Blasius: ACORDAM, em Primeira Câmara Criminal, por votação unânime, conceder a ordem, confirmando a liminar. I - RELATÓRIO: Alega o impetrante, em resumo, que para a decretação da prisão é necessário fundamento concreto, não bastando as declarações de adolescentes ouvidos sem curador e contraditório; que por ser primário, com residência fixa e profissão definida, não estão presentes os pressupostos das prisões temporária e preventiva, restando ferido o princípio da presunção de inocência. O Dr. Juiz prestou informações, esclarecendo que a segregação temporária impedirá ao ¿indiciado a possibilidade de causar possíveis dificuldades à investigação.¿ (fls. 60/62) Encontrando-se o Tribunal em recesso, a liminar foi deferida pelo Exmo. Sr. Des. João Martins (fls. 77/80), Presidente da Corte. A d. Procuradoria-Geral opina pela denegação da ordem. II - VOTO: 1 - Data venia da d. Procuradoria-Geral, a ordem merece ser concedida. O paciente se encontra preso por força de decreto de prisão temporária, com fundamento na necessidade da instrução do inquérito policial e para obstar a prática de tráfico: ¿Presente se encontram os pressupostos para a decretação da prisão temporária acauteladora, elencados no art. 1º da Lei 7.960/89, quais sejam, a imprescindibilidade da prisão do representado para a investigação criminal (inciso I) e a prova inicial de que também o representado seja autor do crime tipo do art. 12 da Lei 6.368/76 (inciso III, alínea n). Os testemunhos dos menores são coerentes e há laudo provisório toxicológico das substâncias apreendidas. Daí o fundamento desta medida cautelar. ¿Nas palavras de Julio F. Mirabete, in Processo Penal (Atlas, 1995, p. 389) `Entendeu-se que a gravidade e a repulsa social que provocam qualquer desses ilícitos (se referindo ao inciso III do art. 1º da Lei 7.960/89, entre eles previsto o tráfico de drogas) justificam a prisão temporária sem que, nessa hipótese, haja necessidade de ser ela imprescindível para as investigações ou que o agente não tenha residência fixa ou não forneça elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade.¿ (grifo nosso).¿ A Dra. Juíza, em sucinto despacho, apenas aludindo à possibilidade de causar dificuldades à investigação, não esclareceu os motivos atinentes à imprescindibilidade da prisão para a instrução do inquérito policial. Exigindo a Carta Política, art. 93, IX, como pressuposto de validade, a fundamentação das decisões que decretam a custódia provisória, a falta da explicitação dos motivos para a drástica medida, implica constrangimento ilegal, sanável pelo habeas corpus. Explica Julio Fabbrini Mirabete: ¿O despacho em que se decretar a prisão temporária deve ser fundamentado, e, como na hipótese de prisão preventiva, não são suficientes meras expressões formais ou repetição dos dizeres da lei. Deve a autoridade judiciária, apreciando os fundamentos de fato e de direito do pedido, motivar convenientemente a decisão, referindo-se aos pressupostos exigidos em lei conforme a hipótese.¿ (in Código de Processo Penal Interpretado, 4ª ed., São Paulo : Atlas, 1996, p. 375) 76 E anotou: ¿Necessidade de fundamentação da prisão temporária ¿ TARS: `A prisão temporária é medida processual cautelar destinada a permitir ou a facilitar a atividade investigativa da polícia judiciária. É determinada pela autoridade judicial provocada por representação da autoridade policial ou a requerimento do MP, aplicando-se somente aos crimes elencados no art. 1º, inc. III, da Lei n. 7.960/89. Tal medida deve ser informada pelo princípio da necessidade, sendo insuficiente o decreto judicial que não faz alusão ao crime que teria o paciente praticado e tampouco à diligência investigatória que a polícia judiciária pretende realizar, para a execução da qual a prisão temporária do paciente se mostra necessária¿ (JTAERGS 88/37).¿ (in op. cit.) Do Colendo STJ: ¿RHC - PROCESSUAL PENAL - PRISÃO TEMPORÁRIA - FUNDAMENTAÇÃO - A PRISÃO TEMPORÁRIA, EXCEÇÃO AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE LIBERDADE, DEVE SER FUNDAMENTADA; SEGUE A REGRA IMPERATIVA DO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.¿ (RHC n. 4611/MA ¿ rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro ¿ j. 30.05.95 ¿ DJU 20.05.96) Idêntico o entendimento desta Egrégia Corte: ¿HABEAS CORPUS. PEDIDO DE REVOGAÇÃO DO DECRETO DE PRISÃO TEMPORÁRIA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO, NO DECRETO JUDICIAL, DOS REAIS MOTIVOS QUE DERAM ENSEJO AO SEQÜESTRO PROVISÓRIO DO PACIENTE. DECISUM INSUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO. EXEGESE DO ART. 2º, § 2º, DA LEI 7.960/89. PACIENTE PRIMÁRIO, COM RESIDÊNCIA FIXA, PROFISSÃO DEFINIDA E QUE COMPARECEU ESPONTANEAMENTE PERANTE A AUTORIDADE POLICIAL. COMPROVAÇÃO, ADEMAIS, DE ATIVIDADE LABORAL LÍCITA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEGÁVEL. ORDEM CONCEDIDA.¿ (HC n. 97.009402-7, de Santo Amaro da Imperatriz, rel. Des. Jorge Mussi) Do despacho do ilustrado Des. João Martins, que deferiu a liminar: ¿No tocante à possibilidade de decretação da prisão temporária nos crimes do art. 12 da Lei n. 6.368/76, nada há a discutir. ¿No entanto, não há, tanto no decreto de prisão temporária, transcrito acima em sua fundamentação, como nos demais elementos apresentados, nenhuma indicação de quais seriam as dificuldades na apuração do crime, se, conforme manifestação do representante do Ministério Público na comarca, a residência do paciente foi revistada (fl. 49), e os menores informam, com idênticas palavras, que compraram a droga em sua casa (fls. 06/07), onde nada foi encontrado. ¿Por outro lado, segundo as informações complementares prestadas pela ilustre Juíza de Direito Substituta, nem mesmo houve pedido de busca domiciliar na residência do paciente (fl. 76). ¿Em outras palavras, não se demonstrou a necessidade da prisão, porquanto é preciso que haja, nos autos, elementos que conduzam o Juiz ao temor de que o réu está impondo dificuldades na apuração da verdade real.¿ 2 - Pelo exposto, concedo a ordem, confirmando a liminar. III - DECISÃO: Acompanharam o voto do relator. Concederam a ordem. Participaram do julgamento com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Genésio Nolli e Paulo Gallotti. Lavrou parecer, pela d. Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Vilmar José Loef. Florianópolis, 09 de março de 1999. Amaral e Silva PRESIDENTE E RELATOR Habeas-Corpus nº 97.000913-5, de Campos Novos. Relator Desembargador José Roberge. 77 HABEAS-CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. LIBERDADE PROVISÓRIA. DÚVIDA RAZOÁVEL SOBRE A PARTICIPAÇÃO DE OCUPANTE DE VEÍCULO NO TRÁFICO REALIZADO PELO PROPRIETÁRIO DO MESMO. Havendo um mínimo de dúvida razoável sobre a adequação do fato, se afigura possível a concessão da liberdade provisória para evitar eventual injustiça consistente em manter no cárcere agente não envolvido com o transporte da droga. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas-Corpus nº 97.000913-5, da comarca de Campos Novos, em que é impetrante a Dra. Oraida Medeiros, sendo paciente Andréia Neuman: ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conceder a ordem. 1- A advogada Oraida Medeiros impetra em favor de Andréia Neuman, ordem de habeas-corpus, dizendo que a paciente foi presa em Campos Novos, quando viajava com seu namorado no carro (Kadett) de propriedade deste. Em revista efetuada no veículo, teria sido encontrado cerca de 430 gramas de cocaína, do que resultaram ambos incursos no artigo 12, da Lei 6.368/76. Diz mais que é possível conceder à paciente, liberdade provisória, porque em face do inciso LVII, do artigo 5º, da Constituição Federal, ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Prestadas as informações, manifestou-se a douta Procuradoria-Geral de Justiça pela concessão da ordem. 2- Como se sabe, o tráfico de tóxicos é delito dos mais graves, que vem afligindo e pondo em sobressalto toda a sociedade. Classificado dentre aqueles tidos como hediondo, é inafiançável, insuscetível de graça ou anistia e até deprogressão de regime. Veda-se ao réu a liberdade provisória e a pena deverá ser cumprida integralmente em regime fechado, além da afirmação de que, nos casos de condenação, não pode recorrer em liberdade. Mas, cada caso merece análise adequada, amoldada à própria realidade. ¿O Juiz não é um frio aplicador da lei, pois, se fosse assim, uma simples máquina poderia ser programada para sentenciar¿. No caso vertente, a concessão da liberdade provisória à paciente é medida de prudência que está indicada a ser adotada. Ora, a paciente foi autuada em flagrante quando foi encontrada no veículo de seu namorado, regular quantidade de cocaína. O Co-réu a convidara para ir à cidade de Chapecó, a fim de conhecer seus familiares. Em Campos Novos pararam, já madrugada a dentro para fazer um lanche, quando foram abordados pelos policiais. Narra ela que não tinha conhecimento da existência do pacote e nem do seu conteúdo. Posteriormente, foi que Vilson, o namorado, contou que o pacote continha cocaína. Essa mesma versão foi narrada pelo co-denunciado, afirmando que convidou sua namorada, a paciente, para viajar, mas ela de nada sabia, embora já fosse sua intenção vender cocaína em Campos Novos. Sabe-se que a co-participação do caroneiro no tráfico de drogas, não é de fácil comprovação. A paciente é menor, estudante, primária; sabe-se, também,que tanto a classificação, quanto a autoria não podem ser analisadas com profundidade no âmbito estreito do habeas-corpus. Ocorre, entretanto, que as peças que instruem estes autos não revelam a co-participação da paciente no tráfico. Há, no mínimo, dúvida razoável sobre a adequação do fato pelo que se afigura possível, como salienta a douta Procuradoria-Geral de Justiça, a concessão da liberdade provisória, mediante condições de comparecimento aos atos do processo, quando exigida sua presença, evitando-se eventual injustiça com reflexos graves. É conhecido o precedente do STF em decisão da lavra do eminente Ministro Moreira Alves, publicada em RT 584/431. Diante desses fatos, concede-se a liberdade provisória à paciente nos termos acima. Participaram do julgamento, com votos vencedores os Exmos. Srs. Des. Alberto Costa e Jorge Mussi, e lavrou parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Ex.mo. Sr. Dr. Hipólito Luiz Piazza. Florianópolis, 25 de fevereiro de 1997. José Roberge PRESIDENTE E RELATOR 78 ANEXO B- Jurisprudências Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. TRÁFICO DE DROGAS. ARTIGO 310 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INEXISTÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO PRÉVIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. MERA IRREGULARIDADE. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Em que pese haja determinação legal no sentido de que o juiz ouça previamente o Ministério Público antes da concessão da liberdade provisória, na hipótese, isso acabou ocasionando mera irregularidade, pois os requisitos para a manutenção da prisão cautelar do embargante não estão presentes. A ordem pública não se mostra abalada com a soltura, porque o réu não responde a outros processos. Também a conveniência da instrução penal não justifica a prisão, pelo menos nada foi demonstrado nesse sentido. Não se pode afirmar que, no momento, o réu irá frustrar a aplicação da lei penal, pois não praticou nenhum ato passível de gerar essa presunção. Assim, não estando presentes os pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal, a ausência de oitiva do Ministério Público antes da concessão da liberdade provisória constituiu mera irregularidade, devendo prevalecer o voto minoritário. Ademais, o princípio da instrumentalidade das formas preceitua que, mesmo violada a forma prevista na lei, se o ato atingiu sua finalidade, não há razão para declarar a nulidade do ato. Destarte, mesmo que a concessão da liberdade provisória tenha violado o procedimento previsto no Código de Processo Penal, como o ato atingiu o fim proposto (a soltura do acusado, pois não estavam presentes os requisitos da prisão preventiva), deve ser preservado. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Embargos acolhidos. EMBARGOS INFRINGENTES PRIMEIRO GRUPO CRIMINAL Nº 70026685412 COMARCA DE CANOAS LUCIANO MONTEBLANCO DE LIMA MINISTÉRIO PÚBLICO EMBARGANTE EMBARGADO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. 79 Acordam os Desembargadores integrantes do Primeiro Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em acolher os Embargos Infringentes, vencidos os Desembargadores Manuel Martinez Lucas, José Antônio Cidade Pitrez e Lais Rogéria Alves Barbosa. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. JAIME PITERMAN, DES. IVAN LEOMAR BRUXEL, DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS, DES. JOSÉ ANTÔNIO CIDADE PITREZ, DES.ª LAIS ROGÉRIA ALVES BARBOSA E DES. MARCO AURÉLIO DE OLIVEIRA CANOSA. Porto Alegre, 07 de novembro de 2008. DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA, Relator. RELATÓRIO DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA (RELATOR) Na Comarca de Canoas, foi interposto pelo Ministério Público recurso em sentido estrito contra a decisão que, tomando ciência do auto de prisão em flagrante de Luciano Monteblanco de Lima, por ausência dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal, deixou de decretar sua prisão preventiva e concedeulhe liberdade provisória, sem que fosse ouvido o órgão recorrente. A 1ª Câmara Criminal deste Tribunal, por maioria, Desembargadores Marcel Esquivel Hoppe (relator) e Manuel José Martinez Lucas, deram provimento ao recurso, desconstituindo a decisão recorrida, restando vencido o Des. Ivan Leomar Bruxel, que entendia não ser necessária a oitiva do agente ministerial (fls. 94/99). Com base no voto vencido, Luciano Monteblando de Lima, através da Defensoria Pública, interpôs embargos infringentes, buscando sua prevalência (fls. 103/107). A Procuradora de Justiça, Dra. Carmen Luiza Dias de Azambuja, opinou pelo acolhimento parcial da irresignação (fls. 110/111). 80 Remetam-se aos demais integrantes do Grupo as cópias dos documentos de fls. 42/45, 94/99, 103/107 e 110/111. É o relatório. VOTOS DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA (RELATOR) Os embargos são tempestivos e preenchem os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais são conhecidos. No mérito, merecem prosperar. Como referido no relatório, na comarca de Canoas, o juiz Paulo Augusto Irion da Silva, depois de receber o auto de prisão em flagrante do agravante, pela prática, em tese, de delito de tráfico de drogas, proferiu a seguinte decisão (fls. 42/45): “Ciente do presente auto de prisão em flagrante vez que obedecidas às exigências constitucionais e Iegais. Passo a examinar a situação de manutenção da prisão em flagrante ou da concessão de liberdade provisória ao flagrado Preliminarmente registro que esposo entendimento de que a regra inserta no artigo 370 do CPP, ao referir que a liberdade provisória somente pode ser concedida depois de ouvir o Ministério Público, não foi recepcionada pela Constituição Federal. Com efeito, quando está em jogo a liberdade de locomoção de um indivíduo, o que é um direito fundamental assegurado constitucionalmente, bem como por ser o direito a liberdade provisória também um direito fundamental, cumpre somente e exclusivamente ao Poder Judiciário, que é o verdadeiro guardião destes direitos, examinar da possibilidade ou não de sua concessão, sem precisar ouvir opinião de quem, no sistema acusatório vigente, é parte no processo, não atuando como fiscal da lei. No mérito, não vislumbro as hipóteses que autorizam a prisão preventiva, com o que não há como ser mantida a prisão em flagrante, pelas razões que passo a externar. 81 Trago, inicialmente, a lição doutrinária abaixo, como preâmbulo, para definir como regra a ser obedecida inafastavelmente, quando está em jogo a liberdade pessoal de alguém, antes de ter contra si uma sentença condenatória transitada em julgado que lhe prive a liberdade, que é o Princípio do favor libertatis. “O Princípio da Proporcionalidade funciona como o pressuposto chave na regulação da prisão provisional em todo Estado de Direito, e tem a função de conseguir uma solução do conflito entre o direito a liberdade pessoal e o direito a segurança do indivíduo, garantidas pelas necessidades iniludíveis de uma persecução penal eficaz. Assim, os legisladores, juízes, e aplicadores do Direito devem respeitá-lo para equilibrar e delimitar o ponto médio entre estes direitos opostos que entram em conflito, porquanto não cabe falar em aplicação matemática das normativas referentes a este instituto. O Princípio da Proporcionalidade parte da hierarquia de valores constitucionalmente consagrada, que pressupõe como princípio supremo o do favor libertatis.” (SANGUINÉ, Odone. Prisión Provisional y Derechos Fundamentales. Tirant lo Bllanch. Vallencia, 2003. p. 638) Tradução livre do subscritor. Já tenho colocado, em inúmeras decisões, de que a prisão cautelar, e a prisão em flagrante é uma de suas espécies — aquela que prende alguém que ainda não foi declarado culpado, isto é que se encontra em estado de inocência, nos termos da Constituição Federal - somente pode ser decretada ou mantida em duas situações, pois são as únicas que autorizam a restrição ao princípio fundamental do Estado de Inocência, que são: 1- necessidade da instrução criminal; 2- assegurar a futura aplicação da lei penal. No caso em exame, pelos elementos até agora obtidos, nada há a indicar que o flagrado possa, estando em liberdade, prejudicar a regularidade da instrução criminar, afastando-se, de conseguinte, esta primeira possibilidade de compatibilizar a prisão provisória com o estado de inocência. A outra possibilidade de tornar a prisão cautelar constitucional, isto é, compatível com o direito de liberdade e o estado de inocência, 82 afigura-se quando resultar demonstrado que o acusado procura, de forma concreta, impedir a aplicação da lei penal. Trata-se, agora, da cautela do processo de execução. No caso em exame, nada resta no sentido de que o flagrado possa evadir-se impedindo, com isto, caso condenado, que as penas sejam cumpridas. Outros argumentos, com a máxima vênia e respeito a quem os defendem — garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, periculosidade, gravidade do crime, sentimento de impunidade, prestígio da atividade jurisdicional — não podem mais sustentar prisões provisórias, pois flagrantemente violadores do direito fundamental do estado de inocência. Em relação as duas primeiras pode-se argumentar que são normas vigentes, já que previstas no artigo 372 do Código de Processo Penal, mas inválidas por afrontarem a Constituição Federal. Com isto, quero registrar que a prisão cautelar em nome da garantia da ordem pública não subsiste ao crivo constitucional, pois fere o princípio do estado de inocência, por não ter cautelaridade processual, bem como por pressupor culpa e não inocência, pois ao se dizer que se prende para preservar a ordem pública, parte-se da premissa de que tal pessoa é culpada e atentou contra esta “ordem pública” Em relação a sensação de impunidade não se pode pensar nela neste momento, pois do contrário a prisão cautelar teria de ser obrigatória, bem como por que somente há de se cogitar em impunidade quando em situações de comprovação de culpa não ocorrer a aplicação de penas Por fim, em relação ao prestígio da atividade jurisdicional, considero que este Poder restará prestigiado, com legitimidade perante a sociedade, quando atuar pautado ma (sic) ordem constitucional, dando garantias ao cidadão de observância da lei maior, que torna claro que a prisão cautelar é medida excepcionalíssima. Assim, não havendo justificativa constitucional para manter-se a prisão em flagrante, impõe-se a concessão da liberdade provisória, o que faço com base no artigo 5º, LXVI, da Constituição Federal e art 310, § único, do Código de Processo Penal, mediante compromisso de comparecimento a todos os atos do processo que deverá ser firmado, em cartório, no prazo de cinco (05) dias.” 83 Irresignado, o Ministério Público ingressou com recurso em sentido estrito, aduzindo, preliminarmente, a nulidade da decisão, vez que concedida a liberdade provisória ao flagrado sem a sua oitiva. No mérito, após discorrer sobre a constitucionalidade da prisão preventiva, manifestou estarem presentes seus requisitos. A 1ª Câmara Criminal deste Tribunal, em sessão realizada em 1º/agosto/2008, por maioria, acolheu a preliminar suscitada, desconstituindo o decisum, para que fosse determinada a oitiva do Ministério Público. Os presentes embargos infringentes buscam a prevalência do voto minoritário, de lavra do Des. Ivan Leomar Bruxel, que entendeu ser desnecessária, no caso, a participação do órgão ministerial. Como se vê, a divergência, no caso, cinge-se à necessidade ou não da ouvida do Ministério Público, no caso de prisão em flagrante, quando o magistrado entende deva ser concedida a liberdade provisória, por ausentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva, previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal. O voto majoritário está assim redigido (fls. 95 a 98): “Recentemente, em 11/6/2008, no julgamento do recurso em sentido estrito nº 70023733231, da lavra do colega Des. Rel. Manuel José Martinez Lucas, votei de acordo com seu voto no sentido de que é indispensável a oitiva do Ministério Público antes do magistrado decidir sobre a concessão da liberdade provisória nos termos do art. 310 do Código de Processo Penal. Assim foi o voto do Colega: ‘Acolho a preliminar de nulidade invocada na peça recursal. Efetivamente, mostra-se indispensável a prévia oitiva do Ministério Público para a concessão de liberdade provisória, nos precisos termos do art. 310 do Código de Processo Penal, que é taxativo nesse sentido: “Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato nas condições do art. 19, I, II e III do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a 84 todos os atos do processo, sob pena de revogação”. No mesmo entendimento é a doutrina pátria: “Em qualquer caso, o juiz deve ouvir o Ministério Público” (Julio Fabbrini Mirabete, Código de Processo Penal Interpretado, Ed. Atlas, 5ª ed., pág. 404). Ainda, também é o entendimento da jurisprudência amplamente dominante de nosso tribunal, conforme fazem exemplo as ementas a seguir transcritas: CORREIÇÃO PARCIAL. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. MINISTÉRIO PÚBLICO. INTERVENÇÃO OBRIGATÓRIA. Inconformidade ministerial quanto à decisão judicial que concedeu a liberdade provisória ao apenado, sem a prévia manifestação do órgão acusatório. De fato, a lei determina que o Parquet seja ouvido antes da concessão do benefício liberatório, nos termos do art. 310 do CPP. Deram provimento. Decisão unânime. (Correição Parcial Nº 70009049545, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Carlos Netto de Mangabeira, Julgado em 18/11/2004). CORREIÇÃO PARCIAL. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA DEFERIDA SEM A PRÉVIA OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DECISÃO QUE VIOLA NORMA PROCESSUAL ART. 310, PARÁGRAFO ÚNICO, DO C.P.P, SUBTRAINDO DO AGENTE MINISTERIAL O DIREITO DE OPINAR SOBRE A POSSIBILIDADE E CONVENIÊNCIA DO BENEFÍCIO. CORREIÇÃO PROCEDENTE. (Correição Parcial Nº 70009335175, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Julgado em 06/10/2004). CORREICAO PARCIAL. E INDISPENSAVEL A PREVIA OITIVA DO MP PARA A CONCESSAO DE LIBERDADE PROVISORIA, NOS PRECISOS TERMOS DO ART. 310 DO CPP. CORREICAO DEFERIDA. (Correição Parcial Nº 70004744082, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator Vencido: Gaspar Marques Batista, Redator para Acordão: Constantino Lisbôa de Azevedo, Julgado em 22/08/2002).’ 85 Em face ao exposto, ACOLHO A PRELIMINAR de nulidade, para desconstituir a decisão atacada. Dessa forma, como o caso dos autos se trata de situação idêntica acolho a preliminar de nulidade desconstituindo a decisão recorrida.” Já o voto minoritário assim se manifestou (fls. 98/99): “Com a devida vênia, ouso divergir do eminente Relator. É que, já faz algum tempo, sustento que a ausência de oportunidade ao Ministério Público para que se manifeste, previamente, a respeito da concessão da liberdade provisória, não se constitui em nulidade, mas tão só em irregularidade. Embora seja verdadeira a expressão legal, contida no artigo 310 e seu parágrafo único, do Código de Processo Penal, não menos verdadeira é a determinação constitucional (art. 5º, LXV) de que ‘a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária’. E a resposta sobre a hierarquia das disposições é evidente. Assim, pelos fundamentos adotados, sendo ilegal a prisão, o relaxamento será imediato. E, se houve necessidade de recolher, antes, a manifestação do Ministério Público, deixará de ser imediata. Aliás, ainda pendente de votação no Senado, mas já aprovado na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei n° 4.208-C, de 2.001, ao dar nova redação ao artigo 310 do Código de Processo Penal, dá à Lei ordinária redação conforme a Constituição, e não faz qualquer referência à prévia manifestação do Ministério Público. De maneira que a opção feita pelo Magistrado, de cumprir a Constituição Federal, desprezando o Código de Processo Penal, que a ela ainda não está alinhado, não existe nulidade a ser declarada. Por este motivo, o voto é pelo improvimento ao recurso.” Pois bem. 86 Em pesquisa à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não encontrei decisão sobre o tema. Porém, com relação ao Superior Tribunal de Justiça, encontrei dois precedentes, que reputam mera irregularidade a inexistência de oitiva do Ministério Público antes da concessão da liberdade provisória quando ausentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal. “RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA SEM PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DO ÓRGÃO MINISTERIAL. ART. 310, CAPUT, DO CPP. IRREGULARIDADE FORMAL. AUSÊNCIA DE NULIDADE. PRECEDENTE. PRESENÇA DOS REQUISITOS PARA A CUSTÓDIA CAUTELAR. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N.º 7 DO STJ. 1. Não estando presentes os pressupostos e motivos autorizadores da prisão preventiva, a ausência de prévia manifestação do Ministério Público, para a concessão de liberdade provisória, é apenas uma irregularidade formal, que não pode ser considerada causa de nulidade da concessão do benefício. Precedente. 2. A questão de fundo, relativa à presença ou não dos requisitos para sustentar a custódia cautelar, implica, necessariamente, o revolvimento da matéria fático-probatória constante dos autos, impossível na via estreita do recurso especial. Súmula n.º 7 do Tribunal Superior de Justiça. 3. Recurso desprovido.” (REsp 711.042/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Superior Tribunal de Justiça, Quinta Turma, julgado em 23/05/2006, DJ 19/06/2006 p. 185). “HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA SEM PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DO ÓRGÃO MINISTERIAL. IRREGULARIDADE PRECEDENTE. ART. FORMAL. 310, CAPUT, AUSÊNCIA DE DO CPP. NULIDADE. 87 1. Não estando presentes os pressupostos e motivos autorizadores da prisão preventiva, a ausência de prévia manifestação do Ministério Público, para a concessão de liberdade provisória, é apenas uma irregularidade formal, que não pode ser considerada causa de nulidade da concessão do benefício. Precedente. 2. Ordem concedida para que seja assegurado ao Paciente o benefício da liberdade provisória, mediante condições a serem estabelecidas pelo juízo processante, sem prejuízo de eventual decretação de custódia cautelar, devidamente fundamentada.” (HC 32.059/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 11/04/2006, DJ 08/05/2006 p. 242) Destarte, em que pese haja determinação legal no sentido de que o magistrado ouça previamente o Ministério Público antes da concessão da liberdade provisória, na hipótese, entendo que isso acabou ocasionando mera irregularidade, pois os requisitos para a manutenção da prisão cautelar do embargante não estão presentes. A ordem pública não se mostra abalada com a soltura, porque o acusado não responde a outros processos (fl. 41). Também a conveniência da instrução criminal não justifica a prisão, pelo menos nada foi demonstrado nesse sentido. Não se pode afirmar que, no momento, o acusado irá frustrar a aplicação da lei penal, pois não praticou nenhum ato passível de gerar essa presunção. Assim, não estando presentes os pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal, a ausência de prévia oitiva do Ministério Público constituiu mera irregularidade, devendo prevalecer o voto vencido. Ademais, o princípio da instrumentalidade das formas preceitua que, mesmo violada a forma prevista na lei, se o ato atingiu sua finalidade, não há razão para declarar a nulidade do ato. Então, mesmo que a concessão da liberdade provisória tenha violado o procedimento previsto no Código de Processo Penal, como o ato atingiu o fim 88 proposto (a soltura do acusado, pois não estavam presentes os requisitos da prisão preventiva), deve ser preservado. Ante o exposto, acolho os embargos. É o voto. FAB/agm. DES. JAIME PITERMAN (REVISOR) - De acordo com o Relator. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL - De acordo com o Relator. DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS Com a vênia do eminente Relator, desacolho os embargos, pelos mesmos fundamentos do voto condutor do acórdão embargado. DES. JOSÉ ANTÔNIO CIDADE PITREZ Divirjo do voto do eminente Relator, com a devida vênia, para rejeitar os embargos infringentes, acompanhando o voto do Dês. Lucas. DES.ª LAIS ROGÉRIA ALVES BARBOSA Eminentes Colegas. Data vênia do posicionamento adotado pelo eminente Des. Relator, entendo de modo diverso. Explico. No caso em tela, impendia que o Juízo a quo em sendo processado o exame quanto a mantença ou não da custódia dele decorrente, ouvisse, previamente, o Ministério Público, visto que não pode ser olvidada, a meu sentir, a expressa disposição contida no artigo 310 do CPP, aplicável à espécie. Neste sentido, a jurisprudência desta Corte: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ART. 310 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PARA A CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA É INDISPENSÁVEL A PRÉVIA OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, CONFORME TEXTO LEGAL, DOUTRINA COLACIONADA JURISPRUDENCIAL. Quando E o DOMINANTE magistrado aprecia ENTENDIMENTO pedido de liberdade provisória, já houve anterior decisão judicial decretando ou homologando a prisão, e é isso que motiva a necessidade de prévia oitiva do Ministério Público antes de proferir nova decisão sobre o direito de liberdade do indivíduo já apreciado anteriormente. Preliminar acolhida, por maioria. Decisão desconstituída. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70025271099, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 10/09/2008) 89 CORREIÇÃO PARCIAL. ART. 310 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PARA A CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA É INDISPENSÁVEL A PRÉVIA OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, CONFORME TEXTO LEGAL DO CPP. CORREIÇÃO PARCIAL DEFERIDA. (Correição Parcial Nº 70024581977, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jaime Piterman, Julgado em 14/08/2008) RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. LIBERDADE PROVISÓRIA. CONCESSÃO. PREVIA OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NECESSIDADE. É nula a decisão que concede liberdade provisória à agente preso em flagrante, sem prévia oitiva do Ministério Público. Preliminar acolhida. Unânime. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70023468358, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em 24/04/2008) RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. ART. 310 DO CPP. AUSÊNCIA DE PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NULIDADE. Constitui nulidade a determinar a cassação da decisão judicial que concedeu liberdade provisória à acusada presa em flagrante, sem ouvir, previamente, o Ministério Público, nos termos do art. 310 do CPP. 2. PRISÃO EM FLAGRANTE. DELITO DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES ¿ ART. 12 DA LEI N. 6.368/76. LIBERDADE PROVISÓRIA. CABIMENTO. HABEAS CORPUS, DE OFÍCIO. A regra proibitiva da liberdade provisória aos agentes de crimes hediondos ou a eles equiparados não é absoluta. Situações há em que o juiz está autorizado a concedê-la, desde que o faça em decisão fundamentada. Ocorre que, se isso é possível quando se trata de sentença condenatória, por maior razão quando se trata de liberdade provisória. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70012136099, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Danúbio Edon Franco, Julgado em 27/10/2005) “CORREIÇÃO PARCIAL. CONCESSÃO DE LIBERDADE, SEM MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL. Não mais prendendo o flagrante por si, o magistrado, mesmo ao homologá-lo, vê-se compelido a, imediatamente, examinar a presença dos requisitos autorizadores da prisão preventiva, sob pena de configurar-se a ilegalidade da custódia, com o conseqüente abuso de poder. Pedido improcedente. (05 FLS - D) (CORREIÇÃO PARCIAL Nº 70005372321, SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: LUÍS CARLOS ÁVILA DE CARVALHO LEITE, JULGADO EM 19/12/2002) CORREICAO PARCIAL. E INDISPENSAVEL A PREVIA OITIVA DO MP PARA A CONCESSAO DE LIBERDADE PROVISORIA, NOS PRECISOS TERMOS DO ART. 310 DO CPP. CORREICAO DEFERIDA. (05 FLS) (CORREIÇÃO PARCIAL Nº 90 70004744082, QUARTA CÂMARA CRIMINAL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: GASPAR MARQUES BATISTA, JULGADO EM 22/08/2002)”. Assim, voto pelo desacolhimento dos presentes embargos. DES. MARCO AURÉLIO DE OLIVEIRA CANOSA Eminentes Colegas. Não conheço dos embargos na extensão examinada pelo douto Relator. Com efeito, o âmbito da divergência, segundo verifico, dizia somente com a necessidade ou não de oitiva do Ministério Público para a concessão da liberdade provisória. Assim, se estamos alcançando provimento aos embargos infringentes por entender que houve mera irregularidade, o recurso em sentido estrito deverá retornar à Câmara para prosseguir no julgamento, ou seja, para decidir o mérito: cabimento ou não de liberdade provisória para o caso. A Câmara não se pronunciou sobre o mérito e assim não podemos avançar. É como voto. DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA - Presidente - Embargos Infringentes nº 70026685412, Comarca de Canoas: "POR MAIORIA, ACOLHERAM OS EMBARGOS, VENCIDOS OS DES. LUCAS, PITREZ E LAIS." Julgador(a) de 1º Grau: PAULO AUGUSTO OLIVEIRA IRION RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – TRAFICO – LIBERDADE PROVISÓRIA – REQUISITOS – ARTIGO 312. Não subsistindo motivos para a manutenção da prisão por qualquer dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal, desnecessária a segregação, não há razões para a restauração. NEGADO PROVIMENTO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 70016808842 MINISTERIO PUBLICO CARLOS CAPELETTO DIONATAN SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL REGIME DE EXCEÇÃO COMARCA DE SANTA ROSA RECORRENTE IOP RECORRIDO 91 LEONIRA BEATRIZ BRABO IOP RECORRIDO JOSE PEDRO SANTOS RECORRIDO DE OLIVEIRA ADEMIR CRISTIANO RABE RECORRIDO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Criminal - Regime de Exceção do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso defensivo. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores DES. SYLVIO BAPTISTA NETO (PRESIDENTE) E DES. JOSÉ ANTÔNIO HIRT PREISS. Porto Alegre, 28 de agosto de 2007. DES.ª ELBA APARECIDA NICOLLI BASTOS, Relatora. RELATÓRIO DES.ª ELBA APARECIDA NICOLLI BASTOS (RELATORA): Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público contra a decisão (fls. 241/243) que concedeu liberdade provisória aos réus CARLOS DIONATAN IOP CAPELETTO, JOSÉ PEDRO DE OLIVEIRA SANTOS E ADEMIR CRISTIANO RABE. Em suas razões (fls. 05/15), o agente ministerial alega que há prova da materialidade e indícios de autoria no tocante aos acusados, uma vez que a “res furtivae” foi apreendida, bem como 135 (cento e trinta e cinco) gramas de maconha, como narra a peça exordial: 1º FATO: “Entre os dias 25 e 27 de janeiro de 2006, em circunstâncias de horário e local ainda não suficientemente esclarecidas, mas em Santa Rosa/RS, os denunciados CARLOS DIONATAN IOP CAPELETTO, JOSÉ PEDRO DE OLIVEIRA SANTOS, LEONIRA BEATRIZ BRABO 92 IOP e ADEMIR CRISTIANO RABE acompanhados dos menores infratores CLAYTON BIAZI e ANGÉLICA DE FÁTIMA ROUZADO KUNZLER, em comunhão de esforços e acordo de vontades, receberam e ocultaram, em proveito próprio ou alheio, um conjunto composto por um par de brincos e uma corrente com pingente, chapeado a ouro, seis pares de brincos, chapeados a ouro, quatro brincos, modelos diversos, chapeados a ouro, um brinco, em ouro, com pérola, quatro bombas de chimarrão, uma jaqueta, moletom, cor laranja, feminina, uma jaqueta jeans, feminina, com bordado, um cachimbo, um aparelho de som, marca Britânia, com um CD, uma pochete preta, Fila, um alicate, uma máquina fotográfica digital, marca Sony, com cabo e estojo, um coldre, cor preta, uma sacola de viagem, um binóculo, marca Super Zenith, com estojo, um conjunto de seis cordas de violão, marca Clássico, treze chaves de fenda, tamanhos diversos, um alicate, pequeno, um conjunto de seis chaves “L”, um barbeador, marca Philips, Philishave, um aparelho DVD, marca Philips, modelo 3005, com controle remoto, trinta e seis cartuchos, calibre 32, Lapus, um revólver, calibre 32, marca Detetive, um punhal, cabo de osso, bainha em couro, dois punhais, cabo de plástico,com bainha, uma faca, com chaira, cabo de plástico, cor preta e bainha em couro, duas facas, com chaira, cabo de osso, com bainha em couro e duas facas, com chaira, cabo em chifre, bainha em couro, coisas que sabiam ser produto de crime. Na ocasião, os denunciados acompanhados dos adolescentes CLAYTON BIAZI e ANGÉLICA DE FÁTIMA ROUZADO KUNZLER receberam e ocultaram a “res furtivae”, sabendo da origem ilícita dos bens, uma vez que furtados no dia 25 e 26 de janeiro de 2006, conforme COP Nº 944952/06 e ocorrências policiais nºs 555/06 e 582/06, provenientes da 1º Delegacia de Polícia de Santa Rosa. A “res furtivae” foi apreendida, restituída às vítimas e avaliada em R$ 5.116,39 (cinco mil, cento e dezesseis e trinta e nove centavos), conforme fls. 42/43, 44, 45, 46, 47, 48, 89, 106, 108 e 92/94. 2º FATO: No dia 27 de janeiro de 2006, por volta das 10h, na Rua Irmã Gilberta, 224, fundos, Vila Agrícola, n/c, os denunciados CARLOS DIONATAN IOP CAPELETTO, JOSÉ PEDRO DE OLIVEIRA SANTOS, LEONIRA BEATRIZ BRABO IOP e ADEMIR CRISTIANO RABE acompanhados dos menores infratores CLAYTON BIAZI e ANGÉLICA DE FÁTIMA ROUZADO KUNZLER, em comunhão de esforços e acordo de vontades, tinham em depósito na sua residência, para fins de fornecimento, aproximadamente 135 (cento e trinta e cinco) gramas de substância denominada “Cannabis Sativa”, vulgarmente conhecida como maconha, que determina dependência física ou psíquica, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (conforme laudo de constatação da natureza da substância das fls. 52/53). Ressalte-se que o princípio ativo desta substância entorpecente, de uso proscrito no Brasil, encontra-se estampado na Portaria nº 344/98, atualizada pela Resoluçao nº 03 de 08/01/2004, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. 93 Na oportunidade, a equipe de investigação da Polícia Civil, de posse de mandado de busca e apreensão, em buscas na residência dos denunciados encontraram o entorpecente acima citado. Os denunciado CARLOS DIONATAN IOP CAPELETTO, JOSÉ PEDRO DE OLIVEIRA SANTOS, LEONIRA BEATRIZ BRABO IOP E ADEMIR CRISTIANO RABE associaram-se, de forma eventual, para a perpetração do crime de tráfico ilícito de entorpecentes.” O recurso foi contra-arrazoado (fls. 258/270); a decisão mantida (fl. 271). Nesta Instância, a Dra. Procurador de Justiça, Jacqueline Fagundes Rosenfeld, opinou pelo provimento do apelo ministerial (fls. 273/276). É o relatório. VOTOS DES.ª ELBA APARECIDA NICOLLI BASTOS (RELATORA): CARLOS DIONATAN IOP CAPELETTO, JOSÉ PEDRO DE OLIVEIRA SANTOS e ADEMIR CRISTIANO RABE foram presos em flagrante no dia 27 de janeiro de 2006, por força de mandado de busca e apreensão, enquanto dormiam na residência Leonira Iop (também denunciada), apreendidos além de objetos receptados 135g de maconha destinada a venda a terceiros. Denunciados, apresentaram as alegações preliminares (fl. 232), tendo o Dr. Juiz de Direito Dr. André Sünel Dorneles (fl. 241) recebida a denúncia, em 24 de abril de 2006, concedida a liberdade provisória, entendendo não mais existir abalo à ordem pública para manter a prisão, nem há qualquer indicação possam atentar contra a instrução ou evadir-se do distrito da culpa, portanto, não sendo necessária a segregação, concedeu-lhes a liberdade. O Ministério Público recorreu em sentido estrito em 07 de julho de 2006, tendo após a formalização sido remetido ao Tribunal, distribuído à 2ª Câmara Criminal. Em razão da aposentadoria do Relator original, redistribuído a esta relatora em Regime de Exceção em 16 de julho de 2007. Nega-se Provimento ao recurso. Embora o decurso do tempo não seja motivo para negar provimento à pretensão de segregação, a verdade é que decorridos 16 meses da concessão da liberdade, realmente torna-se difícil aferir a necessidade de restaurar a prisão em flagrante dos réus. Certamente, a ordem pública, decorrido tanto tempo do fato se entender-se que a restauração da prisão tem este fundamento, está mais ligada à 94 gravidade do crime cometido, eis que se afeitos a violarem a paz e a tranqüilidade públicas, já teriam voltado a delinqüir. É verdade que a Lei 8.072/90 veda a concessão da liberdade provisória a crimes hediondos e equiparados, mas nunca se dispensou o exame dos critérios de necessidade e, tendo entendido o magistrado desnecessária a prisão, não se encontra elementos para contestar sua apreciação dos fatos com o fim de revogar seu despacho. O Ministério Público também não trouxe elementos fáticos que comprovem a necessidade da segregação. A própria Lei 8.072/90, recentemente modificada pela 11.464/07 excluiu a proibição da liberdade provisória no artigo 2º, Inciso II. É verdade que a Lei 11.343/06, no artigo 44 veda o benefício para os presos em flagrante por delitos de tráfico de drogas, mas sua vigência é posterior e não poderia ser invocada como fundamento legal para manter a prisão. Ora, o juiz do processo que está mais próximo dos fatos e envolvidos tem melhores condições de aferir o critério de necessidade para manter a segregação, apenas quando elementos concretos demonstrem com clareza que há motivos, entre os elencados no artigo 312 do Código de Processo Penal para que se restaure a prisão, revoga-se o despacho concessivo. Ora, como não se vislumbra motivos para que retornem os réus ao cárcere, mantêm-se o despacho que concedeu a liberdade. NEGADO PROVIMENTO. DES. SYLVIO BAPTISTA NETO (PRESIDENTE) - De acordo. DES. JOSÉ ANTÔNIO HIRT PREISS - De acordo. DES. SYLVIO BAPTISTA NETO - PRESIDENTE - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 70016808842, COMARCA DE SANTA ROSA: "À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DEFENSIVO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE PROVISÓRIA CONCEDIDA. Acusado preso em flagrante com 64 gramas de crack, 6 gramas de cocaína e 2 gramas de maconha. MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA CUSTÓDIA PREVENTIVA. Por se tratar de medida excepcional, a privação da liberdade está sempre subordinada à comprovação concreta do periculum libertatis, 95 consubstanciado nas hipóteses previstas no artigo 312 do CPP. Não se verificando a necessidade da constrição, a liberdade se impõe. O simples fato de ser hediondo o crime, ou equiparado, não impede a concessão da liberdade. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO IMPROVIDO. MAIORIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Nº 70018254524 COMARCA DE GRAVATAÍ MINISTÉRIO PÚBLICO RECORRENTE GEOVANE CAETANO BATISTA RECORRIDO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam, os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, vencido o Presidente, em negar provimento ao recurso ministerial. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. RANOLFO VIEIRA (PRESIDENTE) E DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS. Porto Alegre, 14 de fevereiro de 2007. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL, Relator. RELATÓRIO DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (RELATOR) Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público contra a decisão que concedeu liberdade provisória ao denunciado GEOVANE CAETANO BATISTA. Sustenta o agente ministerial que o réu foi preso em flagrante, em razão do crime de tráfico ilícito de entorpecentes. Sustenta que a prisão é necessária para assegurar o bom andamento da ação penal, garantir a ordem 96 pública e possibilitar a aplicação da lei penal. O delito é hediondo com expressa vedação legal à concessão da liberdade provisória. Há indícios da prova da materialidade e autoria. Requer o provimento do presente recurso, para que seja reformada a decisão que concedeu a liberdade provisória ao recorrido, restabelecendo-se a prisão cautelar. A Defesa apresentou contra-razões (fls. 49/53) no sentido da manutenção da concessão da liberdade. A decisão foi mantida (fl. 54). O Procurador de Justiça Sérgio Guimarães Britto, nesta instância, manifesta-se, pelo provimento do recurso. É o relatório. VOTOS DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (RELATOR) A irresignação do Ministério Público decorre da concessão da liberdade provisória ao acusado por tráfico de drogas que estava preso em virtude de flagrante homologado. Fora preso, e depois denunciado, por trazer consigo, para fins de comércio, aproximadamente 64 gramas de crack, 6 gramas de cocaína e 2 gramas de maconha. Em 17 de agosto de 2006, a magistrada, Amita A. Leão Barcellos Milleto, deferiu a liberdade provisória do recorrido, mediante condições. Assim decidiu: “Tenho que não se fazem mais presentes os requisitos ensejadores da prisão cautelar de GEOVANE CAETANO BATISTA, consoante verificado na instrução do feito. Ademais, o acusado não registra antecedentes nesta comarca”. (fl. 27) Dúvidas parecem não existir a respeito da existência do fato, o mesmo podendo ser dito com respeito à autoria. Os indicativos dos autos apontam neste sentido. Mas não é isto que aqui se discute. A prisão preventiva, por sua vez, tem lugar em casos especiais, não apenas quando há fortes indícios de autoria e comprovada existência do delito, mas onde a liberdade do agente pode comprometer a instrução do processo. 97 É preciso que se diga, aliás, que o simples fato de ser hediondo o crime, ou equiparado, não é causa impeditiva da liberdade provisória. Neste sentido: Crime de tráfico ilícito de entorpecentes. Prisão em flagrante. Liberdade provisória. Indeferimento. Ausência de concreta fundamentação para a manutenção da custódia cautelar. Precedentes do STJ. ‘Ainda que o crime seja classificado como hediondo pela Lei n° 8.072/90, a simples alegação da natureza hedionda do crime cometido pelo agente do delito não é per si justificadora do indeferimento do pedido de liberdade provisória, devendo, também, a autoridade judicial fundamentar e discorrer sobre os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Precedentes do STJ. Hábeas corpus concedido’. (HC n° 33.322/SP, 5ª Turma, rel. min. LAURITA VAZ, j. 6.4.04, v.u., DJU 17.5.04, p. 263). De outra banda, também não vejo qualquer elemento concreto a indicar que a liberdade do recorrido poderá ameaçar a ordem pública. Não registra antecedentes e não vislumbro indícios de fuga ou frustração da lei penal. Ademais, a prova oral já foi coletada, não havendo necessidade da segregação para evitar prejuízo à instrução criminal. Assim, pela gravidade da medida, revelava-se imprescindível a indicação de razões objetivas, que demonstrassem motivos concretos suscetíveis de autorizar sua imposição. No caso, todavia, tais razões inexistem, com o que a decisão, por seus fundamentos, sustenta-se. Assim já se pronunciou a jurisprudência: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. LIBERDADE PROVISÓRIA. Se a juíza não reconheceu a necessidade da manutenção da prisão, é de ser mantida a liberdade provisória concedida. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70013795588, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Genacéia da Silva Alberton, Julgado em 22/03/2006) RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RÉUS INDICIADOS POR TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Recurso improvido. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70012876421, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 18/01/2006) No caso concreto, o recorrente não aponta elementos concretos a justificar a prisão preventiva. Ante o exposto, nego provimento ao recurso do Ministério Público. DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS - De acordo com o Des. Ivan Leomar Bruxel. DES. RANOLFO VIEIRA (PRESIDENTE) 98 Reitero posicionamento que tenho manifestado sobre o disposto no art. 2º, II, da Lei nº 8.072/90: A prisão em flagrante por imputada prática de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins decorre diretamente de mandamento constitucional expresso no art. 5º, inciso XLIII: “a lei considerará crimes inafiançáveis ... o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ...” Sendo inafiançável tal crime, vale dizer proibida a liberdade provisória,mesmo que o preso pague fiança, com mais razão não pode o aplicador do direito conceder liberdade provisória sem fiança. A hipótese não guarda correspondência com a prisão preventiva, disciplinada nos art. 312 e seguintes do CPP. Este tem sido o reiterado entendimento do Supremo Tribunal Federal. Ad exemplum, esta decisão monocrática, dentre muitas outras, com negativa de liminar em hábeas-córpus onde o tema é ventilado, que reproduzo em parte: “Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de CHARLES TAVARES RAMOS, contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça, nos autos do HC 39.344. O paciente foi preso em flagrante pela prática do crime de tráfico de entorpecentes, art. 12 da Lei 6368/76. (...) Sustenta o impetrante que o fato de o crime cometido pelo paciente ser equiparado a hediondo e inafiançável não obsta a possibilidade de ser-lhe concedida a liberdade provisória, prevista no art. 310 do Código de Processo Penal. Afirma que nem a Constituição Federal nem a Lei de Tóxicos 10.409/2002 proíbem tal concessão e que, portanto, admitir-se que nenhum acusado de crime hediondo ou equiparado tenha direito à liberdade provisória, tão somente pela gravidade em abstrato do crime, sem levar em consideração as circunstâncias pessoais do acusado, seria inconstitucional, por criar uma espécie de prisão obrigatória em patente violação ao princípio fundamental da presunção de inocência. Invoca precedentes desta Corte no sentido de que não se deve decretar a prisão preventiva de réu denunciado por crime hediondo apenas em função da natureza do crime e de sua gravidade em abstrato, mas tão somente quando presentes os requisitos autorizadores do art. 312 do Código de Processo Penal. Alega, por fim, que a decisão (à fls. 28) que negou provimento ao pedido de liberdade provisória do paciente não foi adequadamente fundamentada, pois não demonstrou estarem presentes os requisitos autorizadores da prisão cautelar do art. 312 do Código de Processo Penal, o que considera essencial para todas as 99 espécies de prisão de natureza cautelar. Assim, requer, liminarmente a concessão da liberdade provisória ao paciente, mediante termo de comparecimento obrigatório a todos os atos processuais. Decido. Não obstante as alegações do impetrante no sentido de demonstrar a inconstitucionalidade do art. 2º, II, da Lei 8072/90 - que veda a concessão de liberdade provisória aos crimes hediondos - a jurisprudência deste Tribunal firmou entendimento de que o atacado dispositivo é constitucional. Confira-se: "EMENTA: I. (...) II. Crime hediondo: prisão em flagrante proibição da liberdade provisória: inteligência. Da proibição da liberdade provisória nos processos por crimes hediondos - contida no art. 2º, II, da L 8072 e decorrente, aliás, da inafiançabilidade imposta pela Constituição -, não se subtrai a hipótese de não ocorrência no caso dos motivos autorizadores da prisão preventiva." (HC 83.468 Rel Min. Sepúlveda Pertence DJ 27/02/2004; Ver também: HC 80.886 Rel. Min. Sepúlveda Pertence DJ 10/08/2001, HC 80168 Rel. Min. Sepúlveda Pertence DJ 13/10/2000) Ademais, em cognição sumária, tenho que não merece prosperar a alegação do impetrante de que a decisão do juiz de primeira instância que negou a concessão da liberdade provisória ao paciente carece de fundamentação por não ter demonstrado estarem presentes os pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal. A presença desses pressupostos é irrelevante no caso em questão, tendo em vista que o paciente foi preso em flagrante, espécie de prisão revestida de cautelaridade. Do exposto indefiro a liminar. (...) Brasília, 27 de maio de 2005. Ministro JOAQUIM BARBOSA Relator”. (HC 85989/PE – extraído da página do STF na Internet – grifei). São as razões pelas quais, rogando vênia aos eminentes colegas, dou provimento ao recurso para restabelecer a prisão cautelar do recorrido. DES. RANOLFO VIEIRA - Presidente - Recurso em Sentido Estrito nº 70018254524, Comarca de Gravataí: "POR MAIORIA, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO MINISTERIAL. FICOU VENCIDO O PRESIDENTE." Julgador(a) de 1º Grau: AMITA ANTONIA LEAO BARCELLOS 10 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RÉUS INDICIADOS POR TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE, EIS QUE NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Recurso improvido. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 70016958324 PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL COMARCA DE SANTA VITÓRIA DO PALMAR RECORRENTE MINISTÉRIO PÚBLICO VINICIUS SODRE RECORRIDO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (PRESIDENTE) E DES. MARCEL ESQUIVEL HOPPE. Porto Alegre, 28 de março de 2007. DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS, Relator. RELATÓRIO DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR) Na Comarca de Santa Vitória do Palmar, o Ministério Público, com base no art. 581, inc. V, do CPP, interpôs recurso em sentido estrito contra a decisão que deferiu o pedido de liberdade provisória de VINICIUS SODRE, acusado da prática do delito de tráfico de entorpecentes. 10 Nas razões (fls. 03/06), menciona estarem presentes os requisitos autorizadores da segregação cautelar previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Sustenta a prova da existência do crime e a existência de indícios suficientes de autoria. Ao final, requer provimento, visando a decretação da prisão preventiva do réu. Em contra-razões (fls. 28/29), a defesa manifestou-se pelo improvimento do recurso. Mantida a decisão hostilizada (fl. 35), vieram os autos a este Tribunal. Nesta instância, o parecer do Dr. Procurador de Justiça é pelo provimento do recurso. É o relatório. VOTOS DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR) Afirma o ilustre Promotor de Justiça, em suas razões recursais, que o ora recorrido foi indiciado como incurso nas sanções do art. 12 da Lei nº 6.368/76, crime equiparado a hediondo e, portanto, insuscetível de liberdade provisória. Como os colegas não ignoram, mesmo quando se trata de crime legalmente definido como hediondo, venho admitindo, em alguns casos, a concessão de liberdade provisória, ainda que na grande maioria das vezes fique vencido neste órgão fracionário. Isso porque o recebimento da denúncia não implica em nenhum reconhecimento prévio da prática da traficância, a ensejar a obrigatória segregação do réu. Conseqüentemente, o enquadramento provisório do acusado em algum dos crimes definidos como hediondos não pode, per se, impedir a concessão de liberdade provisória, sem que se façam presentes os pressupostos da prisão contidos no art. 312 do Código de Processo Penal. A prisão preventiva é medida excepcional, que só se justifica quando necessária à garantia da ordem pública ou à conveniência da instrução penal ou então para assegurar eventual execução da pena a ser imposta. 10 Conforme leciona FERNANDO CAPEZ, em sua obra ‘Curso de Processo Penal’, 7ª ed., p. 232: “A prisão preventiva é uma espécie de prisão provisória, possuindo natureza tipicamente cautelar, pois visa garantir a eficácia de um futuro provimento jurisdicional, o qual poderá tornar-se inútil em algumas hipóteses, se o acusado permanecer em liberdade até que haja um pronunciamento jurisdicional definitivo. Tratando-se de prisão cautelar, reveste-se do caráter de excepcionalidade, na medida em que somente poderá ser decretada quando necessária, isto é, se ficar demonstrado o periculum in mora. Nesse sentido já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo: ‘ a prisão provisória é medida de extrema exceção. Só se justifica em casos excepcionais, onde a segregação preventiva, embora um mal, seja indispensável. Deve, pois, ser evitada porque é uma punição antecipada’ (RS, 531/301)”. A jurisprudência do STJ segue a mesma orientação: “PROCESSUAL PENAL. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME HEDIONDO. LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. Em se tratando de crime hediondo, isoladamente, não há impedimento da liberdade provisória, diante dos princípios constitucionais regentes da matéria (liberdade provisória, presunção de inocência etc.). Faz-se mister, então, que, ao lado da configuração idealizada pela Lei nº 8.072/90, seja demonstrada também a necessidade da prisão. 2. A manutenção do flagrante só se justifica quando presentes os requisitos ensejadores da prisão preventiva, nos moldes do art. 310, parágrafo único, do CPP. O fundamento único da configuração de crime hediondo ou afim, sem qualquer outra demonstração de tal necessidade, nem tampouco da presença dos requisitos autorizadores daquela medida não justifica a manutenção da restrição da liberdade decorrente do flagrante.Habeas corpus concedido”. (HC nº 18.635-DF, Rel. Min. Fernando Gonçalves). “PENAL. PROCESSUAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. 1. Mesmo se tratando de crime hediondo, a gravidade do delito, por si só, não enseja a decretação de prisão preventiva, que exige o atendimento aos pressupostos inscritos no CPP, art. 312, mediante a exposição de motivos concretos, a indicar a necessidade da cautela. 2. Ordem de habeas corpus deferida, para conceder liberdade provisória ao acusado, sem prejuízo de eventual decretação de prisão preventiva, devidamente fundamentada”. (HC nº 11.631MG, Rel. Min. Edson Vidigal). Na presente hipótese, não vislumbro a presença dos requisitos ensejadores da custódia preventiva. 10 Não há indicativo de que o réu esteja dificultando a instrução criminal, que se encontra quase encerrada, pendente a inquirição de uma testemunha. Também não há informação de que pretenda evadir-se da comarca, eis que em liberdade desde agosto de 2006. É primário e tem residência fixa. Não há nos autos, portanto, nenhum outro elemento a indicar a necessidade da segregação provisória do acusado. Em face do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É o voto. LM DES. MARCEL ESQUIVEL HOPPE - De acordo. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (PRESIDENTE) - De acordo. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL - Presidente - Recurso em Sentido Estrito nº 70016958324, Comarca de Santa Vitória do Palmar: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME." RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – CONCESSÃO DA LIBERDADE – DELITO HEDIONDO – FLAGRANTE – EXCEÇÃO À PRISÃO – DESNECESSIDADE. A vedação da liberdade provisória aos delitos elencados na Lei 8.072/90, disposição do artigo 2º, II, não é absoluta, comporta exceção (artigo 2º, § 2º) quando o juiz, examinando o critério de conveniência, entender desnecessária a manutenção da segregação, fundamentando seu despacho a concederá. NEGADO PROVIMENTO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 70013978770 MINISTÉRIO PÚBLICO ANDERSON PAULO TRINDADE DA SILVA TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL COMARCA DE SANTIAGO RECORRENTE RECORRIDO 10 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso do Ministério Público. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores DES. VLADIMIR GIACOMUZZI (PRESIDENTE) E DES. JOSÉ ANTÔNIO HIRT PREISS. Porto Alegre, 16 de março de 2006. DESA. ELBA APARECIDA NICOLLI BASTOS, Relatora. RELATÓRIO DESA. ELBA APARECIDA NICOLLI BASTOS (RELATORA): O Ministério Público, inconformado com a decisão da MMª. Magistrada da Vara Criminal da Comarca de Santiago que concedeu a liberdade provisória ao réu ANDERSON PAULO TRINDADE DA SILVA (folha 05), denunciado por infração ao artigo 12, caput, § 2º, inciso I, combinado com o artigo 18, inciso III, ambos da Lei 6.368/76, interpôs RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. O recurso foi recebido, por cabível e tempestivo (folha 04). Em razões (folhas 25/30), o Dr. Promotora de Justiça alegou, em síntese, que as causas da decretação cautelar da prisão ainda se mantém hígidas, não autorizando a concessão da liberdade provisória. Os autos dão conta da materialidade e da autoria e o delito pelo qual o acusado está sendo processado, é crime equiparado a hediondo, sendo vedada sua liberdade provisória, pelo artigo 2º, § 2º da Lei 8072/90, prescindindo da presença dos pressupostos ensejadores do artigo 312 do Código de Processo Penal, portanto irretorquível a necessidade de manutenção da segregação para a garantia da ordem pública. Pugnou pelo restabelecimento da prisão. 10 Com as contra-razões (folha 161/163), a manutenção da decisão recorrida (folha 164) e o parecer do Procurador de Justiça, Dr. Luiz Henrique Barbosa Lima Faria Corrêa que opinou pelo provimento do recurso ministerial (folhas 168/173), vieram os autos conclusos para reexame. É o relatório. VOTOS DESA. ELBA APARECIDA NICOLLI BASTOS (RELATORA): O MINISTÉRIO PÚBLICO, inconformado com a decisão da MMª. Juíza de Direito de Santiago - Vara Criminal que concedeu liberdade a ANDERSON PAULO TRINDADE DA SILVA, preso em flagrante por incurso nas sanções do artigo 12, caput, § 2º, inciso I, combinado com o artigo 18, inciso III, ambos da Lei 6.368/76, recorreu para que seja restabelecida a prisão originada com o flagrante, por se tratar de crime hediondo para o qual incabível a benesse. É de improver-se o recurso. O recorrido foi preso em flagrante em 19 de setembro de 2005, por volta das 17 horas e 45 minutos, em via pública, abordado e revistado por policiais, por estar junto a outros jovens em atitude suspeita, apreendidas consigo 5,73 gramas de maconha. Homologado o flagrante (folha 109), a Drª. Juíza de Direito manteve a prisão (folhas 111v/112v), entendendo presentes os requisitos estabelecidos no artigo 312, do Código de Processo Penal e por força da vedação legal contida no artigo 2º, da Lei 8072/90. Indeferida a liberdade provisória (folha 116), mais de uma vez, quando do despacho que determinou a citação do réu. Após o interrogatório, entendeu a Drª. Juíza de Direito em conceder a liberdade pelos seguintes motivos: “(...) O réu foi preso em flagrante delito, sendo que o respectivo auto foi homologado em 20 de setembro de 2005, e a segregação cautelar foi mantida, decisão de fls. 106/107. Quanto ao pedido de concessão de liberdade provisória, ressalto que ante a excepcionalidade da segregação 10 cautelar a mesma apenas se justifica quando verificada sua necessidade, o que deve ser entendido também quanto aos delitos equiparados a hediondos, muito embora a respectiva lei vede esta possibilidade. Desta forma, a regra prevista no artigo 2º, inciso II, da Lei 8.072/90, deve ter interpretação conjugada com o princípio da presunção de inocência. Muito embora em sede de análise da segregação cautelar não caiba análise do mérito, deve ser considerada a diminuta quantidade de droga apreendida com o réu, 5,73g de maconha, e o teor do interrogatório, que traz a possibilidade de que o delito venha a ser desclassificado para os termos do artigo 16, da Lei 6368/76. Diante disso, tenho que não subsistem os motivos que determinaram a necessidade da segregação cautelar, sendo a medida extrema e privativa de liberdade, excessiva no presente caso”. Não merece reparo a decisão monocrática exposta conforme a apreciação pessoal do juiz no caso concreto. Conquanto seja vedada a liberdade provisória aos autores de delitos elencados entre os hediondos e equiparados, conforme disposição do artigo 2º, inciso II, da Lei 8.072/90, a disposição não é absoluta, estando submetida ao critério de necessidade e conveniência que orienta qualquer prisão cautelar, por sua natureza provisória anterior à sentença condenatória com trânsito em julgado. O que se depreende do contexto recolhido é que flagrado com uma porção de maconha (5,73g) em via pública, alegou ser para consumo próprio. Denunciado pelo Ministério Público pelo artigo 12, caput, § 2º, inciso I, combinado com o artigo 18, inciso III, ambos da Lei 6.368/76, mesmo sem adiantar o mérito, apreciando perfunctoriamente os elementos fáticos, entendeu a Magistrada em conceder a liberdade ao réu, fundamentando na desnecessidade dentro de sua apreciação, quando do interrogatório. 10 O recorrente não trouxe elementos fortes para que se reforme a decisão concessiva pelo juiz da causa, esta por sua proximidade com os fatos e o réu pode melhor reavaliar a necessidade segregatória. Mesmo que a regra seja a vedação da liberdade provisória para os delitos hediondos e equiparados, o § 2º da Lei 8072/90 prevê o mesmo diploma que quando da sentença condenatória recorrível o juiz decidirá fundamentadamente se o réu pode apelar em liberdade, evidente que com maior razão o mesmo critério se aplica à prisão cautelar no curso do processo. O juiz, expondo fundamentadamente os motivos da desnecessidade de manter a segregação, poderá conceder a liberdade. Caso motivada a segregação nos elementos do artigo 312 do Código de Processo Penal e tenham eles se dissipado ou se claro o desaparecimento da necessidade e conveniência de prisão fundada na Lei 8.072/90, ou ainda, se duvidosas as circunstâncias iniciais postas, a concederá. Não merece reforma o despacho judicial que concedeu a liberdade a ANDERSON PAULO TRINDADE DA SILVA, por entender haver desaparecido os motivos da prisão cautelar. NEGADO PROVIMENTO. DES. VLADIMIR GIACOMUZZI (PRESIDENTE) - De acordo. DES. JOSÉ ANTÔNIO HIRT PREISS - De acordo. DES. VLADIMIR GIACOMUZZI - Presidente - Recurso em Sentido Estrito nº 70013978770, Comarca de Santiago: "À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO". Julgador(a) de 1º Grau: ANA PAULA NICHEL RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RÉUS INDICIADOS POR TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Recurso improvido. 10 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Nº 70012876421 COMARCA DE ALEGRETE MINISTERIO PUBLICO RECORRENTE JORGE ANTONIO BRUM RECORRIDO ANDERSON PEREIRA DE MELO RECORRIDO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (PRESIDENTE) E DES. MARCEL ESQUIVEL HOPPE. Porto Alegre, 18 de janeiro de 2006. DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS, Relator. RELATÓRIO DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR) Na Comarca de Alegrete, o Ministério Público, com base no art. 581, inc. V, do CPP, interpôs Recurso em Sentido Estrito contra a decisão que revogou as prisões preventivas de ANDERSON PEREIRA DE MELO e JORGE ANTÔNIO BRUM, em processo que restaram denunciados como incursos nas sanções do art. 12, caput, da Lei 6.368/76. 10 Não constou cópia da denúncia nos autos. Nas razões (fls. 04/11), o órgão ministerial requer a revogação da liberdade provisória concedida aos acusados, em razão da vedação contida no art. 2º, inciso II, da Lei 8.072/90, em que inviabiliza a concessão da liberdade provisória aos acusados de crimes hediondos. Desde já, prequestiona o artigo citado anteriormente, bem como o art. 5º, inciso LXVI, da CF. Revela a necessidade de ser mantida a segregação cautelar, em razão garantia da ordem pública. Menciona que os recorridos foram presos, em flagrante delito, comercializando drogas, em local conhecido por essa prática. Ao final, requer o provimento, com objetivo de restabelecer a prisão de ANDERSON e JORGE. Em contra-razões (fls. 58/63 e 64/67), as defesas requereram o improvimento do apelo ministerial. Mantida a decisão hostilizada (fl. 69), vieram os autos a este Tribunal. Nesta instância, o parecer do Dr. Procurador de Justiça é pelo provimento do recurso. É o relatório. VOTO DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR) Fundamenta-se o presente recurso na alegada necessidade de decretar-se a prisão preventiva dos denunciados JORGE ANTONIO BRUM e ANDERSON PEREIRA DE MELO, porque existentes indícios da traficância, delito equiparado a crime hediondo e, portanto, insuscetível de liberdade provisória. Como os colegas não ignoram, mesmo quando se trata de crime legalmente definido como hediondo, venho admitindo, em alguns casos, a concessão de liberdade provisória, ainda que na grande maioria das vezes fique vencido neste órgão fracionário. Isso porque o recebimento da denúncia não implica em nenhum reconhecimento prévio da prática da traficância, a ensejar a obrigatória segregação do réu. 11 Conseqüentemente, o enquadramento provisório do acusado em algum dos crimes definidos como hediondos não pode, per se, impedir a concessão de liberdade provisória, sem que se façam presentes os pressupostos da prisão contidos no art. 312 do Código de Processo Penal. Como já referi por ocasião do Mandado de Segurança nº 70011625902, impetrado pelo agente ministerial para agregar efeito suspensivo ao presente recurso, a prisão preventiva é medida excepcional, que só se justifica quando necessária à garantia da ordem pública ou à conveniência da instrução penal ou então para assegurar eventual execução da pena a ser imposta. Conforme leciona FERNANDO CAPEZ, em sua obra ‘Curso de Processo Penal’, 7ª ed., p. 232: “A prisão preventiva é uma espécie de prisão provisória, possuindo natureza tipicamente cautelar, pois visa garantir a eficácia de um futuro provimento jurisdicional, o qual poderá tornar-se inútil em algumas hipóteses, se o acusado permanecer em liberdade até que haja um pronunciamento jurisdicional definitivo. Tratando-se de prisão cautelar, reveste-se do caráter de excepcionalidade, na medida em que somente poderá ser decretada quando necessária, isto é, se ficar demonstrado o periculum in mora. Nesse sentido já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo: ‘ a prisão provisória é medida de extrema exceção. Só se justifica em casos excepcionais, onde a segregação preventiva, embora um mal, seja indispensável. Deve, pois, ser evitada porque é uma punição antecipada’ (RS, 531/301)”. Na presente hipótese não vislumbro a presença dos requisitos ensejadores da custódia preventiva. A quantidade de droga apreendida não é excessiva para um usuário, condição declarada pelo co-réu JORGE que, segundo este e as testemunhas Luis André Rodrigues Martins e Vagner Carvalho Moura, é morador da casa onde foi localizada a droga, bem como os demais objetos apreendidos no local (um saco com cola de sapateiro, seringa usada, cédula de R$ 1,00 e outra de R$ 2,00), sendo que o co-réu ANDERSON responde a outro processo pelo delito do art. 16 da Lei nº 6.368/76 e JORGE não registra antecedentes (fls. 30/34). As declarações de Luis André Rodrigues Martins e Vagner Carvalho Moura, dando conta de que os acusados também vendiam drogas são provas extrajudiciais, portanto, dependentes do contraditório. 11 Não há por sua vez, indícios de que os réus estejam dificultando a instrução criminal ou pretendam evadir-se da comarca de Alegrete, eis que em liberdade desde abril do ano transacto. Por derradeiro, no sentido da possibilidade de concessão de liberdade provisória a réu denunciado por crime dito hediondo, são os seguintes precedentes do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSUAL PENAL. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME HEDIONDO. LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 4. Em se tratando de crime hediondo, isoladamente, não há impedimento da liberdade provisória, diante dos princípios constitucionais regentes da matéria (liberdade provisória, presunção de inocência etc.). Faz-se mister, então, que, ao lado da configuração idealizada pela Lei nº 8.072/90, seja demonstrada também a necessidade da prisão. 5. A manutenção do flagrante só se justifica quando presentes os requisitos ensejadores da prisão preventiva, nos moldes do art. 310, parágrafo único, do CPP. O fundamento único da configuração de crime hediondo ou afim, sem qualquer outra demonstração de tal necessidade, nem tampouco da presença dos requisitos autorizadores daquela medida não justifica a manutenção da restrição da liberdade decorrente do flagrante.Habeas corpus concedido”. (HC nº 18.635-DF, Rel. Min. Fernando Gonçalves). “PENAL. PROCESSUAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. 3. Mesmo se tratando de crime hediondo, a gravidade do delito, por si só, não enseja a decretação de prisão preventiva, que exige o atendimento aos pressupostos inscritos no CPP, art. 312, mediante a exposição de motivos concretos, a indicar a necessidade da cautela. 4. Ordem de habeas corpus deferida, para conceder liberdade provisória ao acusado, sem prejuízo de eventual decretação de prisão preventiva, devidamente fundamentada”. (HC nº 11.631MG, Rel. Min. Edson Vidigal). Diante de tais circunstâncias, justifica-se a manutenção da liberdade provisória dos réus. Em face do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É o voto. LM 11 DES. MARCEL ESQUIVEL HOPPE - De acordo. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (PRESIDENTE) - De acordo. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL - PRESIDENTE - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 70012876421, COMARCA DE ALEGRETE: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME." RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. LIBERDADE PROVISÓRIA. MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA CUSTÓDIA PREVENTIVA. POR SE TRATAR DE MEDIDA EXCEPCIONAL, A PRIVAÇÃO DA LIBERDADE ESTÁ SEMPRE SUBORDINADA À COMPROVAÇÃO CONCRETA DO PERICULUM LIBERTATIS, CONSUBSTANCIADO NAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ARTIGO 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NÃO SE VERIFICANDO A NECESSIDADE DA CONSTRIÇÃO, A LIBERDADE SE IMPÕE. O SIMPLES FATO DE SER HEDIONDO O CRIME, OU EQUIPARADO, NÃO IMPEDE A CONCESSÃO DA LIBERDADE. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO MINISTERIAL IMPROVIDO. UNÂNIME. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Nº 70012664363 COMARCA DE VIAMÃO MINISTÉRIO PÚBLICO RECORRENTE FABRÍCIO ANDRÉ VIEIRA RECORRIDO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam, os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao recurso ministerial. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. JOSÉ ANTÔNIO HIRT PREISS E DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS. Porto Alegre, 19 de outubro de 2005. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL. 11 Relator. RELATÓRIO DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (RELATOR) Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público visando desconstituir decisão que concedeu o benefício da liberdade provisória a FABRÍCIO ANDRÉ VIEIRA. Nas razões, refere o Promotor de Justiça que é necessária a manutenção da custódia do investigado, uma vez que foi preso em flagrante delito na posse de substância entorpecente, destinada, segundo os elementos até o momento coligidos, à traficância, configurando a prática do delito de tráfico ilícito de entorpecentes. Sustenta a expressa vedação legal à concessão de liberdade provisória, uma vez que o delito em tela é considerado crime equiparado a hediondo. Por fim, prequestiona o artigo 2º, inciso II, da Lei n° 8.072/90. Diante disso, o Ministério Público requer o provimento do recurso, com o restabelecimento da prisão do recorrente. Em contra-razões, a defesa postula pela manutenção da liberdade provisória. A decisão foi mantida (fl. 45). Em parecer, o Procurador de Justiça Sérgio Guimarães Britto opina pelo provimento do recurso. É o relatório. VOTOS DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (RELATOR) O ora recorrido, juntamente com Elias Miranda Gonçalves, foi preso em flagrante em virtude da suspeita da prática do crime previsto no art. 12 da Lei n° 6.368/76. A Juíza Jaqueline Höfler homologou o auto de prisão em flagrante (fl. 14), no entanto, no mesmo dia concedeu liberdade provisória, pois entendeu não estarem presentes os requisitos da prisão preventiva (fl. 37). Quando da decisão de fl. 37, escreveu: “Os autuados foram presos em flagrante por delito, em tese, de tráfico de entorpecentes, após abordagem de rotina realizada por policiais militares, ocasião em que 11 encontraram no moleton de Fabrício aproximadamente 40g de maconha e no bolso da calça de Elias a quantidade de 5g da mesma substância. Os autuados foram abordados enquanto caminhavam pela via pública. Em que pese o delito imputado aos autuados ser equiparado aqueles elencados na Lei dos Crimes Hediondos, entendo que não estão presentes os requisitos necessários para manter a segregação dos mesmos. Ocorre que a prisão cautelar é medida de cunho excepcional, cabendo sua manutenção somente nas hipóteses em que se mostre efetivamente necessária para a garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. E, no caso em exame, tais circunstâncias não estão presentes. A gravidade do delito, por si só, não é motivo à segregação...No tocante à Fabrício, embora certidão de antecedentes indique que possui condenação, a certidão da VEC desta Comarca informa que o mesmo foi absolvido em sede de embargos infringentes, não tendo ocorrido ainda o trânsito em julgado. Dessa forma, vislumbrando, em tese, possível desclassificação para posse de substância entorpecente, e não havendo motivos para decretar a prisão preventiva dos acusados, a concessão da liberdade provisória se impõe”. O Ministério Público, ao recorrer, fundamenta a sua pretensão apenas na gravidade do delito, por ser equiparado a hediondo, trazendo referências jurisprudenciais. Nada aponta, objetivamente, a respeito dos requisitos descritos no artigo 312 do Código de Processo Penal, para justificar a prisão. Fica restrito à natureza do fato, afastando porte para uso próprio, referindo que o relatório lavrado pelos Policiais Militares menciona que o flagrado Elias teria adquirido a substância entorpecente de Fabrício. Assim, entendo que não apontou, o Ministério Público, elementos indicativos da necessidade da prisão, aqueles relacionados no artigo 312 do Código de Processo Penal. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RÉUS INDICIADOS POR TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. NÃO PRESENCIADOS OS REQUISITOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. RECURSO IMPROVIDO. (RSE 70 010 899 722, TJRS, 1ª C. Criminal, Rel. Des. Manuel José Martinez LUCAS, 30MAR05, unânime) Crime de tráfico ilícito de entorpecentes. Prisão em flagrante. Liberdade provisória. Indeferimento. Ausência de concreta fundamentação para a manutenção da custódia cautelar. Precedentes do STJ. 11 ‘Ainda que o crime seja classificado como hediondo pela Lei n° 8.072/90, a simples alegação da natureza hedionda do crime cometido pelo agente do delito não é per si justificadora do indeferimento do pedido de liberdade provisória, devendo, também, a autoridade judicial fundamentar e discorrer sobre os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Precedentes do STJ. Hábeas corpus concedido’. (HC n° 33.322/SP, 5ª Turma, rel. min. LAURITA VAZ, j. 6.4.04, v.u., DJU 17.5.04, p. 263). Pela sistemática do nosso Direito Positivo, a prisão preventiva é medida de exceção, sendo cabível, somente, em situações especiais. Aboliu-se o caráter obrigatório, ou seja, somente deve ser determinada uma vez preenchidos os requisitos legais dos arts. 312 e seguintes do CPP. Inexistem indicativos de fuga, de reiteração da conduta criminosa ou prejuízo à instrução criminal. Ante o exposto, nego provimento ao recurso ministerial. DES. JOSÉ ANTÔNIO HIRT PREISS - De acordo. DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS - De acordo. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL - Presidente - Recurso em Sentido Estrito nº 70012664363, Comarca de Viamão: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME." Julgador(a) de 1º Grau: JAQUELINE HOFLER. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RÉUS INDICIADOS POR TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. NÃO PRESENCIADOS OS REQUISITOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Recurso improvido. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 70010899722 MINISTERIO PUBLICO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL COMARCA DE CANOAS RECORRENTE TIAGO LARROSA DA ROZA RECORRIDO GILBERTO CAMARGO DOS SANTOS RECORRIDO MARCIO DA SILVA VIANA RECORRIDO 11 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. RANOLFO VIEIRA (PRESIDENTE) E DES. IVAN LEOMAR BRUXEL. Porto Alegre, 30 de março de 2005. DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS, Relator. RELATÓRIO DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR) Na Comarca de Canoas, o MINISTÉRIO PÚBLICO, com base no art. 581, inc. V, do Código de Processo Penal, interpõe Recurso em Sentido Estrito contra a decisão que concedeu a liberdade provisória aos acusados TIAGO LARROSA DA ROZA, GILBERTO CAMARGO DOS SANTOS e MARCIO DA SILVA VIANA. Em suas razões (fls.41/44) alega ser vedada a concessão de liberdade provisória nos crimes denominados hediondos, conforme disposto no art. 2º, inciso II, da Lei 8.072/90. Menciona que a proibição visa reprimir os delitos causadores de imensos danos à sociedade. Ao final, requer seja cassada a decisão para possibilitar expedição do mandado de prisão. A defesa em contra-razões (fls.59/61) requer a manutenção da decisão. Em juízo de retratação foi mantida a decisão hostilizada (fl.64) Nesta instância, o parecer do Dr Procurador de Justiça é pelo provimento do recurso. 11 É o relatório. VOTOS DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR) Afirma o ilustre Promotor de Justiça em suas razões recursais que os ora recorridos foram indiciados como incurso nas sanções do art. 12 c/c 18 da Lei nº 6.368/76, crime equiparado a hediondo, insuscetível de liberdade provisória. Como os colegas não ignoram, mesmo quando se trata de crime legalmente definido como hediondo, ou outro a este equiparado, como é o tráfico ilícito de entorpecentes, venho admitindo, em alguns casos, a concessão da liberdade provisória, ainda que na maioria das vezes fique vencido neste órgão fracionário. Isto porque não é o Promotor de Justiça, ao oferecer a denúncia, e muito menos o Delegado de Polícia, ao instaurar o inquérito policial, quem vai definir a capitulação legal do fato praticado, a qual só se tornará certa com a sentença transitada em julgado. Ademais, sabe-se que freqüentemente o réu denunciado como incurso nas sanções do art. 12 da Lei de Tóxicos acaba condenado por infração ao art. 16 do referido texto legal, operando-se a desclassificação em decorrência da prova coletada. Conseqüentemente, o enquadramento provisório do acusado em algum dos crimes legalmente definidos como hediondos não pode, per se, impedir a concessão da liberdade provisória, sem que sequer tenha o julgador a possibilidade de examinar o caso concreto e verificar se efetivamente estão presentes na espécie os pressupostos da prisão cautelar. Nesse sentido são os seguintes precedentes do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSUAL PENAL. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME HEDIONDO. LIBERDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 7. Em se tratando de crime hediondo, isoladamente, não há impedimento da liberdade provisória, diante dos princípios constitucionais regentes da matéria (liberdade provisória, presunção de inocência etc.). Faz-se mister, então, que, ao lado da configuração idealizada pela Lei nº 8.072/90, seja demonstrada também a necessidade da prisão. 11 8. A manutenção do flagrante só se justifica quando presentes os requisitos ensejadores da prisão preventiva, nos moldes do art. 310, parágrafo único, do CPP. O fundamento único da configuração de crime hediondo ou afim, sem qualquer outra demonstração de tal necessidade, nem tampouco da presença dos requisitos autorizadores daquela medida não justifica a manutenção da restrição da liberdade decorrente do flagrante.Habeas corpus concedido”. (HC nº 18.635-DF, Rel. Min. Fernando Gonçalves). “PENAL. PROCESSUAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. 5. Mesmo se tratando de crime hediondo, a gravidade do delito, por si só, não enseja a decretação de prisão preventiva, que exige o atendimento aos pressupostos inscritos no CPP, art. 312, mediante a exposição de motivos concretos, a indicar a necessidade da cautela. 6. Ordem de habeas corpus deferida, para conceder liberdade provisória ao acusado, sem prejuízo de eventual decretação de prisão preventiva, devidamente fundamentada”. (HC nº 11.631MG, Rel. Min. Edson Vidigal). De outra parte, não se acham presentes os elementos indicativos da prisão preventiva estabelecidos no art. 312 do Código de Processo Penal. Não há indicativo de que os réus estejam dificultando a instrução criminal ou pretendam evadir-se da comarca de Canoas. Quando intimados os réus Tiago e Gilberto em dezembro p.p. foram localizados no endereço declinado (certidão de fl. 63), estando em liberdade provisória desde julho/2004. Também não se pode invocar a conveniência da instrução criminal. As testemunhas da acusação são quase todas policiais, não se presumindo ameaça dos réus sobre a prova.Todas essas circunstâncias, portanto, justificam a manutenção da liberdade provisória concedida aos acusados Em face do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É o voto. DES. RANOLFO VIEIRA (PRESIDENTE) - De acordo. DES. IVAN LEOMAR BRUXEL - De acordo. DES. RANOLFO VIEIRA - Presidente - Recurso em Sentido Estrito nº 70010899722, Comarca de Canoas: "RECURSO IMPROVIDO. UNÂNIME." LM 11 RECURSO-CRIME. PREVENTIVA. PRISÃO TRÁFICO DE ENTORPECENTES. Inconformidade acusatória quanto à decisão concessiva de liberdade provisória ao acusado. Não obstante tratar-se de crime equiparado a hediondo, a manutenção da custódia cautelar só se impõe quando se revelar necessária. Não configurados os pressupostos legais autorizadores da medida excepcional, sendo possível ao réu responder solto ao feito, consoante o disposto no artigo 310 do Código de Processo Penal. Negaram provimento. Decisão unânime. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 70009042540 SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL COMARCA DE PORTO ALEGRE MINISTÉRIO PÚBLICO, RECORRENTE ALDENI ALVES SILVEIRA, RECORRIDO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Decide a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, improver o recurso da Justiça Pública. 12 Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. JOSÉ ANTÔNIO CIDADE PITREZ E DESA. LAIS ROGÉRIA ALVES BARBOSA. Porto Alegre, 28 de outubro de 2004. DES. ANTONIO CARLOS NETTO MANGABEIRA, Relator. RELATÓRIO DES. ANTONIO CARLOS NETTO MANGABEIRA (RELATOR) O Ministério Público interpôs o presente Recurso em Sentido Estrito, com fulcro no art. 581, inciso V, do CPP (fl. 02), contra decisão do juízo de 1º grau, que concedeu a liberdade provisória ao réu ALDENI ALVES SILVEIRA (fl. 28). Juntou aos autos, os documentos de fls. 03/30. Apresentou suas razões recursais às fls. 33/36. Nesta ocasião, sustentou, em síntese, que, de acordo com o art. 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90, os crimes hediondos, e a estes equiparados, são insuscetíveis de liberdade provisória. Alegou, ainda, a existência de elementos suficientes a comprovarem a autoria e materialidade delituosas, em relação ao recorrido. Afirmou, por outro lado, que o crime perpetrado pelo réu é de extrema gravidade social, o que representa 12 risco à ordem pública, além de risco à instrução criminal, pois não comprovou residência fixa e emprego lícito. Pugnou, assim, pelo conhecimento e provimento do recurso, sendo cassada a decisão concessiva da liberdade provisória de ALDENI. A defensora pública do recorrido contra-arrazoou o recurso ministerial às fls. 39/41, requerendo seu improvimento e a conseqüente confirmação da decisão hostilizada. Mantida a decisão guerreada, por sues próprios e jurídicos fundamentos, subiram os autos (fl. 42). Nesta instância, emitiu parecer o Dr. Procurador de Justiça, manifestando-se pelo provimento do recurso da acusação (fls. 44/46). É o relatório. VOTOS DES. ANTONIO CARLOS NETTO MANGABEIRA (RELATOR) Não procede o inconformismo ministerial. O réu ALDENI ALVES SILVEIRA foi denunciado pela prática do delito de tráfico ilícito de entorpecentes, por fato ocorrido em 19 de março de 2004. Na ocasião, o acusado trazia consigo, para fins de comercialização, certa quantidade de “maconha”, “crack”, e cocaína. Assim, o réu responde a processo-crime pelo cometimento do delito previsto no art. 12, caput, da Lei nº 6.368/76, equiparado a hediondo pela Lei n° 8.072/90. O diploma legal antes mencionado contém a vedação de liberdade provisória aos que estejam sendo processados por infrações ali arroladas (artigo 2°, inciso II, in fine). Inaceitável, no entanto, a obrigatoriedade da custódia por cuidar-se de crime hediondo, sob pena de admitir-se o regresso da prisão preventiva obrigatória, banida de nosso ordenamento processual penal, além de evidente a ofensa ao princípio da presunção de inocência. 12 O encarceramento ad cautelam só deve ser adotado quando se revelar necessário; se existirem dados concretos a refletirem a imperiosidade da medida para a garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. In casu, não estão caracterizados os pressupostos legais constantes no artigo 312 do Código do Rito. Conforme muito bem salientou a magistrada a quo, na decisão hostilizada, à fl. 28: “(...) O acusado não registra antecedentes criminais. Apesar de não ter comprovado residência fixa e trabalho lícito, nada indica que irá se furtar à aplicação da Lei Penal (...)”. Destarte, inexistem, nos autos, razões para se concluir que o indiciado possa pretender evadir-se do distrito da culpa. Também não há qualquer elemento que denote a pretensão de influir na coleta das provas ou prejudicar a ordem pública. E mais. A previsão legal contida no inciso II do art. 2º da Lei nº 8.072/90, que proíbe a concessão de liberdade provisória nos delitos hediondos, é inconstitucional, tendo em vista que, pela Lei Maior, a regra no Direito Penal é a liberdade, não podendo uma legislação hierarquicamente inferior estabelecer de outra forma. Não visualizada no almanaque a necessidade da manutenção da prisão cautelar do réu, impunha-se reconhecer-lhe o direito de responderem ao processo em liberdade, em face do artigo 310 do Código de Processo Penal, como o fez com propriedade a Dra. Juíza de Direito de 1ª instância. Pelo acima exposto, mantenho a decisão hostilizada e nego provimento ao recurso ministerial. É o voto. DES. JOSÉ ANTÔNIO CIDADE PITREZ Ressalvando a afirmativa constante do voto do eminente Relator, quanto à inconstitucionalidade do artigo 2º - II, da Lei nº 8.072/90, que para mim inocorre, com base na jurisprudência do STF, estou acompanhando o mencionado voto, negando provimento ao recurso. 12 DESA. LAIS ROGÉRIA ALVES BARBOSA - De acordo com o Des. Pitrez. Julgador(a) de 1º Grau: MARTINHA TERRA SALOMON 12 ANEXO C- Jurisprudências Superior Tribunal de Justiça Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 146.476 - SP (2009/0172984-8) RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO IMPETRANTE : MARCELO AUGUSTO PIRES GALVÃO E OUTRO IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO PACIENTE : VANIA RIBEIRO DAS NEVES EMENTA HC LIBERATÓRIO. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 12, CAPUT DA LEI 6.368/76 C/C O ART. 62, I DO CPB). PENA TOTAL: 5 ANOS E 10 MESES DE RECLUSÃO. REGIME INICIAL FECHADO. CONDENAÇÃO CONFIRMADA EM SEGUNDO GRAU. EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. ACUSADA QUE PERMANECEU SOLTA DURANTE A INSTRUÇÃO CRIMINAL. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA PARA A PRISÃO CAUTELAR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. PRECEDENTES DO STJ E STF. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL DEVIDAMENTE JUSTIFICADA. ELEVADA CULPABILIDADE, CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO E GRANDE QUANTIDADE DE DROGA (68 KG DE MACONHA). REGIME PRISIONAL ADEQUADO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A APLICAÇÃO DO REDUTOR DO ART. 33, § 4o. DA LEI 11.343/06. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. CONCLUSÃO DIVERSA QUE DEMANDARIA AMPLA DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPROPRIEDADE DO MANDAMUS. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, PARA PERMITIR QUE A PACIENTE AGUARDE EM LIBERDADE O TRÂNSITO EM JULGADO DE SUA CONDENAÇÃO. 1. Esta Corte, acompanhando entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal, tem entendido pela impossibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da condenação, se o acusado respondeu ao processo em liberdade e não estão presentes os pressupostos autorizadores da prisão preventiva (art. 312 do CPP). 2. Ressalva, porém, do ponto de vista do Relator, pois a Lei 11.719/08, que alterou profundamente a sistemática do processo penal brasileiro e introduziu a proibição de prisão do réu para apelar, manteve, no entanto, o art. 393 do CPP, segundo o qual, é efeito da sentença condenatória recorrível ser o réu 12 preso ou conservado na prisão. Dessa forma, ausente constrangimento ilegal na determinação de prisão após o julgamento da Apelação defensiva pelo Tribunal Estadual que confirma a condenação do acusado. 3. Na hipótese, devidamente motivada pelo Julgador a fixação da pena-base acima do mínimo legal, com base em aspectos concretos (intensa culpabilidade, modus operandi e quantidade da droga), inviável a alteração da sanção imposta na via exígua do mandamus. 4. Reconhecidas circunstâncias judiciais desfavoráveis, tanto que a pena-base foi fixada acima do mínimo legal e assim mantida, não há ilegalidade Documento: 9245438 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 10/05/2010 Página 1 de 3 Superior Tribunal de Justiça na fixação do regime fechado para o início do cumprimento da reprimenda. 5. A 5a. Turma desta Corte entende ser inadmissível a combinação das Leis 6.368/76 e 11.343/06, com a aplicação somente dos aspectos benéficos de uma e outra, sob pena de o Julgador usurpar as funções do legislador ordinário, criando outra norma legal inexistente no ordenamento jurídico; dessa forma, tem-se proclamado que a solução que atende ao princípio da retroatividade da lei mais benéfica (art. 2o. do CPB e 5o., XL da CF/88), sem todavia, quebrar a unidade lógica do sistema jurídico, vedando ao intérprete extrair apenas os conteúdos das normas que julgue conveniente, é aquela que permite a aplicação, em sua integralidade, de uma ou de outra Lei, competindo ao Magistrado singular, ao Juiz da VEC ou ao Tribunal Estadual decidir, diante do caso concreto, aquilo que for melhor ao acusado ou sentenciado). 6. Na hipótese, todavia, a discussão revela-se desimportante, pois, tanto o MM. Juiz de primeiro grau como o Tribunal Estadual frisaram que a paciente liderava o comércio de drogas, sendo responsável pelo provimento dos meios necessários para a consecução do empreendimento criminoso e pela coordenação dos demais envolvidos e rever tal conclusão mostra-se inadmissível na via exígua do mandamus, dada a indisfarçável necessidade de dilação probatória; dessa forma, insuficiente o predicado da primariedade para a aplicação da benesse 12 prevista no art. 33, § 4o. da Lei 11.343/06, mormente se evidenciada a dedicação a atividades criminosas. 7. Ordem parcialmente concedida, com a ressalva do entendimento pessoal do Relator, apenas e tão-somente para permitir que a paciente aguarde em liberdade o trânsito em julgado de sua condenação proferida nos autos da Ação Penal 10/99-A. Documento: 9245438 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 10/05/2010 Página 2 de 3 Superior Tribunal de Justiça ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder parcialmente a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Felix Fischer, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília/DF, 13 de abril de 2010(Data do Julgamento). NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO MINISTRO RELATOR Documento: 9245438 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 10/05/2010 Página 3 de 3 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 146.476 - SP (2009/0172984-8) RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO IMPETRANTE : MARCELO AUGUSTO PIRES GALVÃO E OUTRO IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO PACIENTE : VANIA RIBEIRO DAS NEVES RELATÓRIO 1. Trata-se de Habeas Corpus , com pedido de liminar, impetrado em favor de VÂNIA RIBEIRO DAS NEVES, apontando como autoridade coatora o TJSP. 2. Depreende-se dos autos que a paciente foi condenada, em primeiro grau, por tráfico e associação eventual para o tráfico de drogas (art. 12, caput, c/c o art. 18, III da Lei 6.368/76 c/c o art. 62, I do CPB) às penas de 7 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão, em regime integralmente fechado e 233 diasmulta, sendo-lhe garantido o direito de recorrer em liberdade. 3. Interposta Apelação pela Defesa, o recurso foi parcialmente 12 provido, para afastar a necessidade de cumprimento da pena privativa de liberdade em regime integralmente fechado, bem como para excluir a causa de aumento do art. 18, III da Lei 6.368/76, reduzindo-se a pena para 5 anos e 10 meses de reclusão e 175 dias-multa. Em decorrência do referido julgamento, o Tribunal de Justiça Paulista determinou a expedição de mandado de prisão. 4. No presente mandamus , alega-se, em síntese, (a) constrangimento ilegal pela determinação de prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, uma vez que a paciente respondeu em liberdade o processo, desde o seu início, ausente motivação concreta para a constrição cautelar; (b) ilegalidade na elevação da pena-base 2 anos acima do mínimo legal, (c) bem como no afastamento da redução especial de pena prevista no art. 33, § 4o. da Lei 11.343/06; (d) possibilidade do cumprimento da pena em regime inicial semiaberto. Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 15 Superior Tribunal de Justiça 5. Deferiu-se o pedido liminar apenas e tão-somente para que a paciente aguardasse em liberdade o julgamento deste HC pela Colenda 5a. Turma desta Corte (fls. 79/80). 6. Prestadas as informações solicitadas (fls. 87/117), o MPF, em parecer subscrito pelo ilustre Subprocurador-Geral da República DURVAL TADEU GUIMARÃES, manifestou-se pela denegação da ordem (fls. 119/122). 7. É o que havia de relevante para relatar. Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 15 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 146.476 - SP (2009/0172984-8) RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO IMPETRANTE : MARCELO AUGUSTO PIRES GALVÃO E OUTRO IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO PACIENTE : VANIA RIBEIRO DAS NEVES VOTO HC LIBERATÓRIO. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 12, CAPUT DA LEI 6.368/76 C/C O ART. 62, I DO CPB). PENA TOTAL: 5 ANOS E 10 MESES DE RECLUSÃO. REGIME INICIAL FECHADO. CONDENAÇÃO CONFIRMADA EM SEGUNDO GRAU. EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. ACUSADA QUE PERMANECEU SOLTA DURANTE A INSTRUÇÃO 12 CRIMINAL. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA PARA A PRISÃO CAUTELAR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. PRECEDENTES DO STJ E STF. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL DEVIDAMENTE JUSTIFICADA. ELEVADA CULPABILIDADE, CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO E GRANDE QUANTIDADE DE DROGA (68 KG DE MACONHA). REGIME PRISIONAL ADEQUADO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A APLICAÇÃO DO REDUTOR DO ART. 33, § 4o. DA LEI 11.343/06. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. CONCLUSÃO DIVERSA QUE DEMANDARIA AMPLA DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPROPRIEDADE DO MANDAMUS. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, PARA PERMITIR QUE A PACIENTE AGUARDE EM LIBERDADE O TRÂNSITO EM JULGADO DE SUA CONDENAÇÃO. 1. Esta Corte, acompanhando entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal, tem entendido pela impossibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da condenação, se o acusado respondeu ao processo em liberdade e não estão presentes os pressupostos autorizadores da prisão preventiva (art. 312 do CPP). 2. Ressalva, porém, do ponto de vista do Relator, pois a Lei 11.719/08, que alterou profundamente a sistemática do processo penal brasileiro e introduziu a proibição de prisão do réu para apelar, manteve, no entanto, o art. 393 do CPP, segundo o qual, é efeito da sentença condenatória recorrível ser o réu preso ou conservado na prisão. Dessa forma, ausente constrangimento ilegal na determinação de prisão após o julgamento da Apelação defensiva pelo Tribunal Estadual que confirma a Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 3 de 15 Superior Tribunal de Justiça condenação do acusado. 3. Na hipótese, devidamente motivada pelo Julgador a fixação da pena-base acima do mínimo legal, com base em aspectos concretos (intensa culpabilidade, modus operandi e quantidade da droga), inviável a alteração da sanção imposta na via exígua do mandamus. 4. Reconhecidas circunstâncias judiciais desfavoráveis, tanto que a pena-base foi fixada acima do mínimo legal e assim mantida, não há ilegalidade na fixação do regime fechado para o início do cumprimento da reprimenda. 5. A 5a. Turma desta Corte entende ser inadmissível a combinação das Leis 6.368/76 e 11.343/06, com a aplicação somente dos aspectos benéficos de uma e outra, sob pena de o Julgador usurpar as funções do legislador ordinário, criando outra norma legal inexistente no ordenamento jurídico; dessa forma, tem-se proclamado que a solução que atende ao princípio da retroatividade da lei mais benéfica (art. 2o. do CPB e 5o., XL da CF/88), sem todavia, quebrar a unidade lógica do sistema jurídico, vedando ao intérprete extrair apenas os conteúdos das normas que julgue conveniente, é aquela que permite a aplicação, em sua integralidade, de uma ou de outra Lei, competindo ao Magistrado singular, ao Juiz da VEC ou ao Tribunal Estadual decidir, diante do caso concreto, aquilo que for melhor ao acusado ou sentenciado). 6. Na hipótese, todavia, a discussão revela-se desimportante, pois, tanto o MM. Juiz de primeiro grau como o Tribunal Estadual frisaram 12 que a paciente liderava o comércio de drogas, sendo responsável pelo provimento dos meios necessários para a consecução do empreendimento criminoso e pela coordenação dos demais envolvidos e rever tal conclusão mostra-se inadmissível na via exígua do mandamus, dada a indisfarçável necessidade de dilação probatória; dessa forma, insuficiente o predicado da primariedade para a aplicação da benesse prevista no art. 33, § 4o. da Lei 11.343/06, mormente se evidenciada a dedicação a atividades criminosas. 7. Ordem parcialmente concedida, com a ressalva do entendimento pessoal do Relator, apenas e tão-somente para permitir que a paciente aguarde em liberdade o trânsito em julgado de sua condenação proferida nos autos da Ação Penal 10/99-A. 1. Ressai dos autos que a paciente foi denunciada, com dois corréus, por tráfico de drogas e associação eventual para o tráfico (art. 12, caput, Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 4 de 15 Superior Tribunal de Justiça c/c o art. 18, III da Lei 6.368/76), apreendida, para fins de comercialização, aproximadamente 68 kg de maconha, além de petrechos para embalagem e distribuição da droga (2 serras eletrônicas, máquinas de embalagem a vácuo, 2 balanças digitais, 2 impressoras de etiquetas), tendo respondido ao processo em liberdade. Foi condenada, em primeiro grau, à pena de 7 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão, em regime integralmente fechado, mais pagamento de 233 diasmulta. 2. O Tribunal Paulista deu parcial provimento ao recurso defensivo, para estabelecer o regime inicial fechado, bem como excluir a causa de aumento de pena do art. 18, III da Lei 6.368/76, reduzindo a sanção para 5 anos e 10 meses de reclusão e 175 dias multa, determinando, todavia, a imediata expedição de mandado de prisão. O aresto restou assim ementado: Apelação Criminal. Tráfico de Entorpecente. Arguição de nulidade do laudo de exame químico-toxicológico não acolhida. Perícia realizada por peritos oficiais e que apurou a existência de substância entorpecente, especificando-a. O não detalhamento da metodologia adotada não acarreta a nulidade do laudo. Preliminar de nulidade da sentença não reconhecida. Perfeita correlação entre a acusação e o julgado. Prova da autoria. Suficiência do coligido para a condenação. Associação eventual entre maiores. A causa de aumento de pena do artigo 18, inciso III, primeira parte da Lei 6.368/76 deixou de existir com a entrada em vigor da Lei 11.343/06. Progressão de regime de pena. Cabimento. Decorrência da entrada em vigor da Lei 11.464/07, que alterou dispositivos da Lei 8.072/90 (artigo 2o., § § 1o. e 2o. da Lei 8.072/90, com a redação dada pela Lei 11.464/07). Inaplicabilidade do § 4o. do artigo 33 da Lei 11.343/06 aos ilícitos da Lei 6.368/76. Recurso parcialmente provido para, aplicando as novas leis 13 (11.343/06 e 11.464/07), afastar a causa de aumento de pena (prevista na primeira parte do inciso III do artigo 18 da Lei 6.368/76) e o óbice à progressão, reduzindo-se a pena para 5 anos e 10 meses de reclusão e 175 Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 5 de 15 Superior Tribunal de Justiça dias-multa. (fls. 103). 3. Quanto ao direito da paciente de permanecer em liberdade, pedindo vênia aos posicionamentos em contrário, ouso consignar que, ao meu sentir, tendo sido apreciado o recurso de Apelação, a prisão é mera conseqüência da decisão penal condenatória. Com efeito, os demais recursos cabíveis (Especial e Extraordinário) não têm, de regra, efeito suspensivo, de forma a impedir a imediata execução do julgado. 4. Esta Corte Superior de Justiça antes também abraçava esse entendimento, como se observa do enunciado da Súmula 267/STJ, segundo a qual a interposição de recurso, sem efeito suspensivo, contra decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão. 5. Todavia, recentes julgados desta Corte vêm acompanhando decisão proferida pelo Plenário do colendo Supremo Tribunal Federal, na qual ficou consignado que ofende o princípio da não-culpabilidade a execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, ressalvada a hipótese de prisão cautelar do réu, desde que presentes os requisitos autorizadores previstos no art. 312 do CPP (HC 84.078/MG, Rel. Min. EROS GRAU, Informativo 534/STF). Confira-se, por todos, o seguinte precedente: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 17 DA LEI Nº 7.492/86. ALEGAÇÃO DE NULIDADE NO JULGAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO, EM RAZÃO DA JUNTADA DE DOCUMENTOS, POR PARTE DO PARQUET, SEM QUE A DEFESA SOBRE ELES PUDESSE SE MANIFESTAR. INOCORRÊNCIA DA APONTADA NULIDADE, HAJA VISTA QUE O E. TRIBUNAL A QUO NÃO UTILIZOU, EM MOMENTO ALGUM, O MATERIAL PROBATÓRIO JUNTADO AOS AUTOS PARA FUNDAMENTAR A CONDENAÇÃO IMPOSTA AO PACIENTE. EXECUÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL VERIFICADO DE ACORDO COM RECENTE ENTENDIMENTO DO C. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. (...). 3. Ressalvado o entendimento pessoal do relator, tendo em vista recente decisão proferida pelo Plenário do c. Supremo Tribunal Federal, Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 6 de 15 Superior Tribunal de Justiça 13 "Ofende o princípio da não-culpabilidade a execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, ressalvada a hipótese de prisão cautelar do réu, desde que presentes os requisitos autorizadores previstos no art. 312 do CPP" (Informativo nº 534/STF - HC 84.078/MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau). 4. Habeas corpus parcialmente concedido para determinar que o paciente aguarde em liberdade o trânsito em julgado da condenação. (HC 103.429/SP, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJe 23.03.09). 6. Na mesma tessitura, destacam-se os seguintes jugados do STF: HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PENDÊNCIA DE RECURSO DE NATUREZA EXTRAORDINÁRIA. RÉU QUE AGUARDOU, EM LIBERDADE, O JULGAMENTO DA APELAÇÃO. DECRETO DE PRISÃO CARENTE DE FUNDAMENTAÇÃO VÁLIDA. GARANTIA DA FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS E DIREITO À PRESUNÇÃO DE NÃO-CULPABILIDADE. LIMINAR DEFERIDA. ORIENTAÇÃO DO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. No julgamento do HC 84.078, da relatoria do ministro Eros Grau, o Plenário do Supremo Tribunal Federal assentou, por maioria de votos, a inconstitucionalidade da execução provisória da pena. Isto por entender que o exaurimento das instâncias ordinárias não afasta, automaticamente, o direito à presunção de não-culpabilidade. 2. Em matéria de prisão provisória, a garantia da fundamentação das decisões judiciais consiste na demonstração da necessidade da custódia cautelar, a teor do inciso LXI do art. 5º da Carta Magna e do artigo 312 do Código de Processo Penal. A falta de fundamentação do decreto de prisão inverte a lógica elementar da Constituição, que presume a não-culpabilidade do indivíduo até o momento do trânsito em julgado de sentença penal condenatória (inciso LVII do art. 5º da CF). 3. Na concreta situação dos autos, contra o paciente que aguardou em liberdade o julgamento da apelação interposta pela defesa foi expedido mandado de prisão sem nenhum fundamento idôneo. 4. Ordem concedida. (HC 93.062/MG, Rel. Min. CARLOS BRITTO, DJe 13.03.09). Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 7 de 15 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA "EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA". ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O art. 637 do CPP estabelece que "[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença". A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória. A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art. 5º, inciso LVII, que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". 2. Daí que os preceitos veiculados pela Lei n. 7.210/84, além 13 de adequados à ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art. 637 do CPP. 3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. 4. A ampla defesa, não se a pode visualizar de modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão. 5. Prisão temporária, restrição dos efeitos da interposição de recursos em matéria penal e punição exemplar, sem qualquer contemplação, nos "crimes hediondos" exprimem muito bem o sentimento que EVANDRO LINS sintetizou na seguinte assertiva: "Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um pouco ao próprio delinqüente". 6. A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados --- não do processo penal. A prestigiar-se o princípio constitucional, dizem, os tribunais [leia-se STJ e STF] serão inundados por recursos especiais e extraordinários e subseqüentes agravos e embargos, além do que "ninguém mais será preso". Eis o que poderia ser apontado como incitação à "jurisprudência defensiva", que, no extremo, reduz a amplitude ou mesmo amputa garantias constitucionais. A comodidade, a Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 8 de 15 Superior Tribunal de Justiça melhor operacionalidade de funcionamento do STF não pode ser lograda a esse preço. 7. No RE 482.006, relator o Ministro Lewandowski, quando foi debatida a constitucionalidade de preceito de lei estadual mineira que impõe a redução de vencimentos de servidores públicos afastados de suas funções por responderem a processo penal em razão da suposta prática de crime funcional [art. 2º da Lei n. 2.364/61, que deu nova redação à Lei n. 869/52], o STF afirmou, por unanimidade, que o preceito implica flagrante violação do disposto no inciso LVII do art. 5º da Constituição do Brasil. Isso porque --disse o relator --- "a se admitir a redução da remuneração dos servidores em tais hipóteses, estar-se-ia validando verdadeira antecipação de pena, sem que esta tenha sido precedida do devido processo legal, e antes mesmo de qualquer condenação, nada importando que haja previsão de devolução das diferenças, em caso de absolvição". Daí porque a Corte decidiu, por unanimidade, sonoramente, no sentido do não recebimento do preceito da lei estadual pela Constituição de 1.988, afirmando de modo unânime a impossibilidade de antecipação de qualquer efeito afeto à propriedade anteriormente ao seu trânsito em julgado. A Corte que vigorosamente prestigia o disposto no preceito constitucional em nome da garantia da propriedade não a deve negar quando se trate da garantia da liberdade, mesmo porque a propriedade tem mais a ver com as elites; a ameaça às liberdades alcança de modo efetivo as classes subalternas. 8. Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas, inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade (art. 1º, III, da Constituição do 13 Brasil). É inadmissível a sua exclusão social, sem que sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as singularidades de cada infração penal, o que somente se pode apurar plenamente quando transitada em julgado a condenação de cada qual. Ordem concedida. (HC 94.408/MG, Rel. Min. EROS GRAU, DJe 27.03.09) 7. Na hipótese, é fato que a ré permaneceu solta durante a instrução criminal. Entretanto, foi determinada a expedição de mandado de prisão após o julgamento da Apelação, não havendo qualquer menção à presença dos requisitos autorizadores para a constrição cautelar previstos no art. 312 do CPP. 8. Ademais, pende de julgamento os Embargos Declaratórios opostos ao acórdão da Apelação pela defesa, conforme informações colhidas no endereço eletrônico do TJSP, de forma que, de qualquer forma, ainda não esgotada Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 9 de 15 Superior Tribunal de Justiça a instância ordinária. Assim, de rigor o reconhecimento de ser prematura qualquer determinação de prisão cautelar. 9. Quanto à dosimetria da reprimenda, o MM. Juiz justificou adequadamente a fixação da pena-base acima do mínimo legal, nos seguintes termos: Para a melhor definição, portanto, da pena-base justa e compatível com o crime de tráfico apurado, é de ser levado em conta que, apesar da primariedade e os referenciais de bons antecedentes e aparente dedicação à vida honesta, militam contra a acusada a maior e mais grave reprovabilidade da conduta em desfavor da avaliação que este sentenciante faz do juízo de sua culpabilidade penal, evidenciada não apenas pela orquestração da estruturação montada ao recebimento, preparo e embalamento da droga (qual seja, em porto ermo de cidade onde nenhum dos envolvidos, líder ou asseclas, era radicado ao tempo da prisão, em imóvel locado em nome de terceiros supostamente inocentes, lesados em sua confiança à guisa da traição aos liames afetivos de um deles), mas também pela incorporação, no empreendimento delitivo, de maquinário de porte industrial para sua consecução, de custo presumivelmente alto (donde de avalia o potencial do investimento empregado para consecução criminosa, qualificando gravemente a situação em julgamento), e ainda a quantidade elevada de entorpecentes apreendidos - ou seja, 67,380 kg (sessenta e sete quilos e trezentos e oitenta gramas) de maconha -. tudo a evidenciar aos olhos do julgador a dedicação empresarial da acusada, em conluio com outrem, à prática do crime imputado, assemelhado pela Lei aos hediondos. Estas considerações são necessárias para justificar o maior rigor punitivo na dosagem da pena-base do crime de tráfico, que fica inicialmente fixada em 05 (cinco) anos de reclusão, mais pagamento de 150 (cento e cinquenta) dias-multa. Não concorrem atenuantes e a agravante do art. 62, I do Código Penal cumpre ser reconhecida na espécie, porque bem denotado, da 13 situação avaliada aos autos, a organização e provimento da estruturação do empreendimento criminoso pela acusada, pessoa que, por intermédio de Silvaldo e colaboração de Luiz Alberto (corréus definitivamente condenados), iniludivelmente liderava o comércio clandestino de drogas apurado. Por conta disto, ficam majoradas as penas-base em um sexto, resultando em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, mais pagamento de 175 (cento e setenta e cinco) dias-multa. (fls. 95) Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 10de 15 Superior Tribunal de Justiça 10. O acórdão impugnado acrescentou: A essas considerações acresça-se que a acusada não deu mostra de arrependimento, sequer reconhecendo o erro, que exerceu atividade criminosa para obter proveito econômico, embora tivesse atividade outra que lhe propiciava rendimento suficiente para viver, e que a chefia de tráfico em tamanha proporção revela acentuada culpabilidade. Observe-se, ainda, que a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4o. da Lei 11.343/06 é incabível para os ilícitos da Lei 6.368/76, consoante já decidiu este Tribunal. (fls. 113). 11. Saliente-se que a revisão da pena imposta pelas instâncias ordinárias na Ação de Habeas Corpus , segundo a jurisprudência pacífica desta Corte, somente é admitida em situações excepcionais, quando constatado evidente abuso ou ilegalidade, passível de conhecimento sem maiores digressões sobre aspectos fáticos ou subjetivos. Na hipótese, devidamente motivada pelo Julgador a fixação da pena-base acima do mínimo legal, com base em aspectos concretos (intensa culpabilidade, modus operandi e quantidade da droga), inviável a alteração da sanção imposta na via exígua do mandamus. 12. Quanto ao regime prisional, este STJ acolhe o entendimento de que, após o STF declarar a inconstitucionalidade do art. 2o., § 1o. da Lei 8.072/90, que vedava a progressão de regime nos casos de crimes hediondos e a eles equiparados, a fixação do regime prisional para condenados por tráfico de drogas na vigência da Lei 6.368/76, à falta de dispositivo legal normativo próprio, deve ser feita à luz do que determina o art. 33 do CPB (HC 71.787/SC, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES, DJU 03.11.08); por isso, reconhecidas circunstâncias judiciais desfavoráveis ao paciente, tanto que a pena-base foi fixada acima do mínimo legal e assim mantida, impõe-se a fixação do regime fechado para o início do cumprimento da reprimenda. Nesse sentido, confira-se: HABEAS CORPUS. PENAL. TRÁFICO. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. CULPABILIDADE. MOTIVOS. VALORAÇÃO NEGATIVA. 13 FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ART. 33, § 3º, DA LEI N.º 11.343/2006. APLICAÇÃO NO PATAMAR DE 1/4 DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 11de 15 Superior Tribunal de Justiça CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. 1. A valoração negativa das circunstâncias judiciais referentes à culpabilidade e aos motivos restou devidamente fundamentada na intensidade do dolo, no modus operandi e no objetivo visado com a prática criminosa, consideradas as circunstâncias e peculiaridades do caso concreto, o que autoriza a exasperação da pena-base acima do mínimo legal. 2. O art. 42 da Lei 11.343/2006 impõe ao Juiz considerar, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da droga, tanto na fixação da pena-base, quanto na determinação do grau de redução da causa de diminuição de pena prevista no § 4.º do art. 33 do mesmo diploma legal. (...). 4. Ordem denegada. (HC 117.280/MS, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 14/12/2009) (...). REGIME PRISIONAL. CRIME EQUIPARADO À HEDIONDO. COMETIMENTO ANTES DA VIGÊNCIA DAS LEIS 11.343/06 E 11.464/07. FIXAÇÃO EM MODO DIVERSO DO FECHADO. POSSIBILIDADE. CONCURSO MATERIAL. SOMATÓRIO DE PENAS SUPERIOR A SEIS ANOS. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. EXECUÇÃO NO MODO MAIS RIGOROSO ACERTADA. CONSTRANGIMENTO INOCORRENTE. 1. Diante da declaração da inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º, com a redação dada pela Lei n. 8.072/90, perfeitamente possível, aos condenados por crimes hediondos ou equiparados, a fixação de quaisquer dos regimes prisionais legalmente previstos, devendo a nova redação conferida ao citado dispositivo legal pela Lei n. 11.464/07 atingir somente os casos posteriores à sua entrada em vigor. 2. Tendo a sanção-básica sido estabelecida um pouco acima do mínimo legalmente previsto para o tipo, diante da presença de circunstância judicial desfavorável, e observada a quantidade de pena definitivamente irrogada, diante do concurso material de crime, correta a imposição do modo fechado para o resgate da sanção corporal. 3. Ordem parcialmente concedida para anular em parte a sentença condenatória no tocante à dosimetria e fixar a sanção do paciente definitivamente em 6 anos e 6 meses de reclusão e pagamento de 65 Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 12de 15 Superior Tribunal de Justiça dias-multa, mantidos, no mais a sentença e o acórdão combatidos. (HC 84.147/SP, Rel. Min. JORGE MUSSI, Dje 15.03.2010). 13. Alega-se, por fim, no presente writ, a ocorrência de constrangimento ilegal decorrente da não aplicação do art. 33, § 4o. da Lei 11.343/06 (nova Lei de Drogas) pelo Tribunal a quo ao caso em questão, sob o singelo argumento de impossibilidade de combinação de leis. 14. A 5a. Turma desta Corte entende ser inadmissível a combinação 13 das Leis 6.368/76 e 11.343/06, com a aplicação somente dos aspectos benéficos de uma e outra, sob pena de o Julgador usurpar as funções do legislador ordinário, criando outra norma legal inexistente no ordenamento jurídico; dessa forma, tem-se proclamado que a solução que atende ao princípio da retroatividade da lei mais benéfica (art. 2o. do CPB e 5o., XL da CF/88), sem todavia, quebrar a unidade lógica do sistema jurídico, vedando ao intérprete extrair apenas os conteúdos das normas que julgue conveniente, é aquela que permite a aplicação, em sua integralidade, de uma ou de outra Lei, competindo ao Magistrado singular, ao Juiz da VEC ou ao Tribunal Estadual decidir, diante do caso concreto, aquilo que for melhor ao acusado ou sentenciado (HC 93.593/SP, Rel. Min. LAURITA VAZ, Dje 08.02.2010). 15. Na hipótese, contudo, a discussão revela-se desimportante, pois, tanto o MM. Juiz de primeiro grau como o Tribunal Estadual frisaram que a paciente liderava o comércio de drogas, sendo responsável pelo provimento dos meios necessários para a consecução do empreendimento criminoso e pela coordenação dos demais envolvidos, de forma que não ressai, extreme de dúvidas, como seria de rigor em HC, que preenche os requisitos necessários à fruição da referida benesse legal, sendo insuficiente o predicado da primariedade, mormente se evidenciada sua dedicação a atividades criminosas. 16. Rever tal conclusão mostra-se inadmissível na via exígua do mandamus , dada a indisfarçável necessidade de dilação probatória. A propósito: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 13de 15 Superior Tribunal de Justiça COMETIMENTO NA VIGÊNCIA DA LEI 6.368/76. ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06. COMBINAÇÃO DE LEIS. IMPOSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE AOS FATOS ANTERIORES. EMPREGO DE UMA OU OUTRA LEGISLAÇÃO, EM SUA INTEGRALIDADE. PERMISSIBILIDADE. PRECEDENTES. REQUISITOS SUBJETIVOS. NÃO PREENCHIMENTO. DEDICAÇÃO À ATIVIDADES CRIMINOSAS. NEGATIVA DE MITIGAÇÃO JUSTIFICADA. 1. A Quinta Turma deste Superior Tribunal de Justiça vem decidindo pela impossibilidade de combinação das leis no tempo, permitindo a aplicação da nova regra mais benigna, trazida pela Lei 11.343/06, ao crime 13 de narcotráfico cometido na vigência da Lei 6.368/76, somente se o cálculo da redução for efetuado sobre a pena-base cominada ao delito do art. 33 da Lei n. 11.343/06. (...). 3. Inocorre constrangimento ilegal quando a Corte originária entende que a agente não satisfaz as exigências para a aplicação da causa de especial redução de pena disposta no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, diante da quantidade de droga apreendida em seu poder e da existência de outras anotações referentes a prática de tráfico, que levou à conclusão de que se dedicava à atividades criminosas. 4. Para concluir-se que a condenado não se dedicava à atividades ilícitas, necessário o revolvimento de todo o conjunto fático-probatório colacionado durante a instrução criminal, o que é incabível na via estreita do remédio constitucional. (...). (HC 134.002/RJ, Rel. Min. JORGE MUSSI, DJe 15/03/2010) PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES PRATICADO NA VIGÊNCIA DA LEI 6.368/76. GUARDA E PREPARO DE 1,68 GRAMAS DE MACONHA, DISTRIBUÍDA EM 8 EMBALAGENS PLÁSTICAS. CAUSA DE AUMENTO DE PENA. ART. 18, IV, DA LEI 6.368/76. CRIME COMETIDO PRÓXIMO A INSTITUIÇÃO DE ENSINO. PROFUNDO REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. NÃO-CABIMENTO. SUPERVENIÊNCIA DO ART. 40, III, DA LEI 11.343/06. DIMINUIÇÃO DO PERCENTUAL DA MAJORANTE. RETROATIVIDADE DA LEI NOVA MAIS BENÉFICA. AUMENTO DA PENA-BASE. INQUÉRITOS E AÇÕES PENAIS EM ANDAMENTO. MAUS ANTECEDENTES. Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 14de 15 Superior Tribunal de Justiça CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL VALORADA NEGATIVAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. QUESTÃO NÃO-APRECIADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA. ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. FUNDAMENTO VÁLIDO. IMPOSSIBILIDADE DE REFORMA. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, CONCEDIDA. (...). 5. Tendo sido adequadamente motivada a inaplicabilidade da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, ao concluir pelo não-cumprimento dos requisitos legais, diante da comprovação de que os pacientes se dedicavam a atividades criminosas, rever tal posicionamento implicaria aprofundado reexame da matéria fático-probatória, providência incabível na via estreita do habeas corpus. 6. Ordem parcialmente conhecida e, nessa extensão, concedida para fixar a pena dos pacientes em 3 anos e 6 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, além do pagamento de 58 dias-multa. (HC 142.241/RJ, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, Dje 01.02.2010). 17. Ante o exposto, ressalvado o posicionamento pessoal do relator a respeito do tema, concede-se parcialmente a ordem, apenas e tão-somente para permitir que a paciente aguarde em liberdade o trânsito em julgado de sua 13 condenação proferida nos autos da Ação Penal 10/99-A. 18. É o voto. Documento: 9215288 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 15de 15 HABEAS CORPUS Nº 139.412 - SC (2009/0116052-9) RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA IMPETRANTE : JAILTON BORGES - DEFENSOR DATIVO IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA PACIENTE : ALVACIR MACHADO (PRESA) EMENTA HABEAS CORPUS . TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. REPERCUSSÃO DO DELITO. VEDAÇÃO LEGAL. MEDIDA QUE NÃO SE JUSTIFICA. POUCA DROGA. PENA FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. Conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, toda custódia imposta antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória exige concreta fundamentação, nos termos do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal. 2. Se o magistrado de primeira instância indeferiu o pedido de liberdade provisória amparado apenas na vedação legal contida no art. 44 da Lei n. 11.343/06, na quantidade de droga (28 pedras de cocaína) e na repercussão social causada pelo delito, fica evidente o constrangimento ilegal. Tais motivos não se revelam idôneos para justificar a imprescindibilidade da medida extrema, destacando-se que já foi proferida sentença condenatória, sendo fixada a reprimenda no mínimo legal. 3. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o inquérito policial é procedimento inquisitivo e não sujeito ao contraditório, razão pela qual a realização de interrogatório sem a presença de advogado não é causa de nulidade. 4. Ordem parcialmente concedida para garantir à paciente o direito de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, concedeu parcialmente a ordem de habeas corpus, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora, ressalvando entendimento do Sr. Ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE)." Os Srs. Ministros Og Fernandes e Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Nilson Naves e Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP). Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Documento: 8369964 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 22/03/2010 Página 1 de 2 Superior Tribunal de Justiça Brasília, 09 de fevereiro de 2010(Data do Julgamento) Ministra Maria Thereza de Assis Moura Relatora Documento: 8369964 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 22/03/2010 Página 2 de 2 13 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 139.412 - SC (2009/0116052-9) RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA IMPETRANTE : JAILTON BORGES - DEFENSOR DATIVO IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA PACIENTE : ALVACIR MACHADO (PRESA) RELATÓRIO MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de ALVACIR MACHADO, apontando-se como autoridade coatora o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (HC n.º 2009.021031-6). Narra a impetração que a paciente foi presa em flagrante pela prática, em tese, do delito descrito no art. 33 da Lei n.º 11.343/06. A defesa requereu sua liberdade provisória, mas o pedido foi indeferido em decisão assim fundamentada, no que interessa (fl. 29): O crescente comércio e uso de substâncias capazes de causar dependência física ou psíquica entre os jovens, adultos e até mesmo de crianças nesta Comarca estão a exigir uma atuação objetiva e concreta das autoridades públicas na sua preservação e repreensão. Ocorre que em relação ao crime de tráfico de drogas existe vedação legal expressa para a concessão do art. 44 da Lei n. 11.343/06, sendo este fundamento suficiente para ensejar o indeferimento do pedido. Destaco a jurisprudência do TJSC: (...) Outrossim, considerando a quantidade de droga apreendida (cerca de 28 pedras de cocaína), necessária se faz a manutenção da prisão como forma de garantir a ordem pública, tendo em vista a repercussão negativa que esta espécie de crime provoca na sociedade. Por tais razões, pois, que subsistiram ainda que seja a acusada primária e possuidora de bons antecedentes, bem como ter profissão definida (que, ao menos em tese, não teria impedido enveredasse para a prática criminosa), e residência fixa, INDEFIRO por ora o pedido de liberdade provisória da acusada. Irresignada, ajuizou prévio writ, perante o Tribunal de origem, mas a ordem foi denegada. O acórdão recebeu a seguinte ementa (fl. 18): CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS TRÁFICO DE DROGAS (...) Não há nulidade no auto de prisão em flagrante pela ausência de advogado ao interrogatório, estando o preso devidamente cientificado pela autoridade policial de suas garantias constitucionais. Não é viável a análise aprofundada da prova na via estreita do writ, sendo a desclassificação para o artigo 28 da Lei n. 11.343/06 possível somente quando extreme de dúvida. Havendo a Constituição Federal proibido para indiciados ou acusados Documento: 8165236 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 1 de 7 Superior Tribunal de Justiça por crimes hediondos e equiparados o benefício da fiança, afronta a lógica em tais delitos admitir liberdade provisória sem fiança. Sustenta o impetrante que o processo é nulo, porque a acusada, em seu interrogatório, não foi assistida por um defensor. Afirma que este é um direito 14 irrenunciável, sendo um dever da autoridade policial possibilitar que a acusada seja ouvida na fase policial na presença de um defensor, constituído ou nomeado. Alega, ainda, que não existem elementos concretos, nos autos, que demonstrem a necessidade da custódia cautelar da paciente. Aduz que a paciente é mera usuária de drogas, o que certamente restará provado na instrução. Argumenta que a quantidade de droga apreendida (4, 7 g) demonstra que ela se destinava ao consumo próprio. Requer a concessão de liberdade provisória à paciente. Antes de examinar o pedido liminar, solicitei informações, prestadas às fls. 45/59. O Ministério Público Federal opina pela denegação da ordem (fls. 77/79). Conforme informação recebida do Juízo de origem via fax, a paciente foi condenada à pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, e multa, tendo sido interposta apelação pela Defesa, ainda em tramitação. Na sentença, a magistrada preservou sua custódia cautelar sob os seguintes motivos: Nego à condenada Alvacir Machado o direito de recorrer em liberdade, uma vez que, ciente da condenação, facilmente poderá evadir-se, obstando a aplicação da lei penal. Ademais, a medida também se afigura adequada, uma vez que não há qualquer segurança de que solta não voltará a delinquir. É o relatório. Documento: 8165236 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 2 de 7 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 139.412 - SC (2009/0116052-9) EMENTA HABEAS CORPUS . TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. REPERCUSSÃO DO DELITO. VEDAÇÃO LEGAL. MEDIDA QUE NÃO SE JUSTIFICA. POUCA DROGA. PENA FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. Conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, toda custódia imposta antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória exige concreta fundamentação, nos termos do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal. 2. Se o magistrado de primeira instância indeferiu o pedido de liberdade provisória amparado apenas na vedação legal contida no art. 44 da Lei n. 11.343/06, na quantidade de droga (28 pedras de cocaína) e na repercussão social causada pelo delito, fica evidente o constrangimento ilegal. Tais motivos não se revelam idôneos para justificar a imprescindibilidade da medida extrema, destacando-se que já foi proferida sentença condenatória, sendo fixada a reprimenda no mínimo legal. 3. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o inquérito policial é procedimento inquisitivo e não sujeito ao contraditório, razão pela qual a realização de interrogatório sem a presença de advogado não é causa de nulidade. 4. Ordem parcialmente concedida para garantir à paciente o direito de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação. VOTO MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA(Relatora): Conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, toda 14 custódia imposta antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória exige concreta fundamentação, nos termos do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal. Na hipótese, no tocante à custódia cautelar, entendo presente o constrangimento ilegal, pois o magistrado de primeira instância indeferiu o pedido de liberdade provisória amparado apenas na vedação legal contida no art. 44 da Lei n. 11.343/06, na quantidade de droga (28 pedras de cocaína) e na repercussão social causada pelo delito. Tais motivos não se revelam idôneos para justificar a imprescindibilidade da medida extrema, sendo pacífica a compreensão desta Sexta Turma de que a decisão deve fundar-se em fatos concretos, não bastando a referência à repercussão do crime ou à vedação legal. Ademais, embora, em certos casos, o quantum da droga possa indicar a Documento: 8165236 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 3 de 7 Superior Tribunal de Justiça necessidade da custódia para a garantia da ordem pública, em razão da concreta gravidade da conduta criminosa, a hipótese é diversa. Isso porque não se pode considerar excessiva a quantidade de entorpecente apreendida (4,7g de cocaína e 6,1g de crack), destacando-se que já foi proferida sentença condenatória, sendo fixada a reprimenda no mínimo legal. Ao condenar a paciente, a magistrada preservou sua prisão cautelar, mais um vez, sem comprovar a necessidade da medida, amparada apenas na presunção de que, solta, a paciente poderia evadir-se ou voltar a delinquir. Confiram-se os precedentes do Superior Tribunal de Justiça: HABEAS CORPUS . TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DE OCUPAÇÃO LÍCITA. VEDAÇÃO DO ART. 44 DA LEI Nº 11.343/2006. MOTIVOS, POR SI SÓS, INSUFICIENTES. ORDEM CONCEDIDA. 1. Fica evidente o constrangimento ilegal se foi indeferida a liberdade provisória do paciente tão somente porque ele não teria comprovado efetivamente possuir ocupação lícita, presumindo-se, por isso, que oferece risco à ordem pública, sem a demonstração concreta da presença de quaisquer dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. 2. A simples alusão à vedação contida no art. 44 da Lei nº 11.343/2006 não basta para indeferir a liberdade provisória, se não demonstrada a real imprescindibilidade da medida extrema. 3. Habeas corpus concedido para garantir ao paciente o direito de recorrer em liberdade, se por outro motivo não estiver preso, mediante assinatura de termo de compromisso de comparecimento a todos os atos do processo, devendo ser expedido alvará de soltura clausulado. (HC 127.498/GO, minha Relatoria, SEXTA TURMA, julgado em 24/11/2009, DJe 14/12/2009) HABEAS CORPUS . TRÁFICO DE ENTORPECENTES. DESENTRANHAMENTO DE PROVAS PRODUZIDAS EM AUDIÊNCIA DECLARADA NULA. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Se a audiência foi declarada nula pelo E. Tribunal Estadual, não há razão para o indeferimento do pedido formulado pela defesa, de desentranhamento das provas nela produzidas. 2. A circunstância de ter o agente respondido ao processo preso, só por só, é insuficiente como fundamento para a negativa do benefício de recorrer 14 em liberdade. 3. A vedação legal prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, desacompanhada de outros elementos idôneos que demonstrem a necessidade da segregação cautelar, não representa óbice à concessão do benefício do recurso em liberdade. 4. Ordem concedida para autorizar o desentranhamento dos documentos declarados nulos; e para conceder o benefício do recurso em liberdade. (HC 135.879/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 18/12/2009) Documento: 8165236 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 4 de 7 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS . LATROCÍNIO. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTOS GENÉRICOS. NATUREZA E GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. POSSIBILIDADE DE FUGA. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS A JUSTIFICAR A SEGREGAÇÃO ANTECIPADA. ORDEM CONCEDIDA. 1 - A prisão cautelar, assim entendida aquela que antecede a condenação transitada em julgado, só pode ser imposta se evidenciada, com explícita fundamentação, a necessidade da rigorosa providência. 2 - Não se mostra idônea a manutenção da custódia cautelar com base na gravidade abstrata e na natureza hedionda do delito, com considerações de ordem genérica sobre a credibilidade do Poder Judiciário e conjectura da possibilidade de fuga do acusado, notadamente se não demonstrada de forma concreta a imprescindibilidade da medida extrema. 3 - Habeas corpus concedido. (HC 110.269/PE, Rel. Ministro HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE), SEXTA TURMA, julgado em 03/11/2009, DJe 23/11/2009) PROCESSUAL PENAL – RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS – PRISÃO EM FLAGRANTE DELITO – LIBERDADE PROVISÓRIA – RESGUARDO DA ORDEM PÚBLICA – GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO – REPERCUSSÃO SOCIAL – ANTECIPAÇÃO DO CUMPRIMENTO DA REPRIMENDA – AFRONTA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE NÃO-CULPABILIDADE – PEQUENA QUANTIDADE DE DROGAS – TRINTA E UM INVÓLUCROS DE MACONHA – IMPOSSIBILIDADE DE COMPARAÇÃO COM OS GRANDES TRAFICANTES QUE ASSOLAM O PAÍS – VEDAÇÃO LEGAL – IMPOSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO. 1. A gravidade abstrata do delito atribuído ao agente é insuficiente para a manutenção de sua prisão provisória, sob pena de afronta à garantia constitucional de presunção de não-culpabilidade. Precedentes. 2. Da mesma forma, a invocação da repercussão social do delito não se presta para a justificação da constrição cautelar, sob pena de antecipação do cumprimento da reprimenda, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio, notadamente quando a quantidade de drogas encontrada em poder dos agentes não se mostra expressiva. Precedentes. 3. Unicamente a vedação legal contida no artigo 44 da Lei 11.343/2006 é insuficiente para o indeferimento da liberdade provisória, notadamente em 14 face da edição da Lei 11.464/2007, posterior e geral em relação a todo e qualquer crime hediondo e/ou assemelhado. Precedentes. 4. Dado provimento ao recurso para deferir ao recorrente os benefícios da liberdade provisória. (RHC 24.349/MG, Rel. Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado em 11/11/2008, DJe 01/12/2008) No tocante à alegação de nulidade, sem razão o impetrante, pois é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o inquérito policial é Documento: 8165236 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 5 de 7 Superior Tribunal de Justiça procedimento inquisitivo e não sujeito ao contraditório, razão pela qual a realização de interrogatório sem a presença de advogado não é causa de nulidade. Confiram-se os precedentes desta Corte: PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS . ART. 214 C/C ART. 224, ALÍNEA A, DO CP. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ADVOGADO NO INTERROGATÓRIO POLICIAL E NÃO ARROLAMENTO DE TESTEMUNHAS PELA DEFESA. NULIDADES. INEXISTENTES. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 2º DA LEI Nº 8.072/90 DECLARADA PELO STF. REGIME ADEQUADO SEMI-ABERTO. EXECUÇÃO DA PENA ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. RECURSOS ESPECIAL E EXTRAORDINÁRIO. EFEITO DEVOLUTIVO. I - A decadência como causa de extinção da punibilidade (art. 107, inciso IV, do CP) consiste na perda do direito de promover a ação penal privada ou de apresentar a representação nos casos de ação penal pública condicionada dentro do prazo legal, o que, no caso, não correu, haja vista que os fatos ocorreram até o início de 2003 e a representação foi ofertada pela genitora da vítima em 10/03/2003. II - Como o inquérito policial é um procedimento administrativo informativo, de natureza inquisitiva, e não observa os princípios do contraditório e ampla defesa, a ausência de advogado no interrogatório policial não acarreta a nulidade do processo. III - (...) Habeas corpus parcialmente concedido. (HC 86.800/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 18/12/2007, DJe 05/05/2008) RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS . PROCESSUAL PENAL. PECULATO. EVENTUAIS VÍCIOS DO INQUÉRITO NÃO CONTAMINAM A AÇÃO PENAL. INTERROGATÓRIO NA FASE INQUISITÓRIA SEM A PRESENÇA DE DEFENSOR. AUSÊNCIA DE NULIDADE. PROCEDIMENTO DESPROVIDO DE CONTRADITÓRIO E DE AMPLA DEFESA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA PECULATO CULPOSO. EXAME DE PROVAS. VIA INADEQUADA. 1. Eventuais irregularidades ocorridas na fase inquisitorial não contaminam o desenvolvimento da ação penal, tendo em vista ser o Inquérito Policial peça meramente informativa e não probatória. Precedentes desta Corte. 2. A realização do interrogatório, na fase do Inquérito Policial, sem a presença de seu defensor, não enseja qualquer nulidade, tendo em vista 14 tratar-se de procedimento inquisitivo, no qual não se fazem presentes os princípios do contraditório e da ampla defesa. 3. Afigura-se inviável a apreciação do pedido de desclassificação do delito, de peculato doloso para o culposo, diante da necessidade do minucioso exame do material cognitivo carreado aos autos, o que é vedado na angusta via do habeas corpus. 4. Recurso desprovido. Documento: 8165236 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 6 de 7 Superior Tribunal de Justiça (RHC 16.047/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 09/05/2006, DJ 12/06/2006 p. 499) E do Supremo Tribunal Federal: EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. "HABEAS CORPUS". DEFICIÊNCIA DA DEFESA. IRREGULARIDADE NO INQUÉRITO POLICIAL. INTERROGATÓRIO. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. I. A deficiência da defesa só anulará o processo se houver prova de prejuízo para o réu. Súmula 523. II. Por se tratar de peça meramente informativa da denúncia ou da queixa, eventual irregularidade no inquérito policial não contamina o processo, nem enseja a sua anulação. III. A ausência de advogado no interrogatório do réu não vicia o ato, mesmo porque o defensor do acusado não pode intervir ou influir nas perguntas e nas respostas. CPP, art. 187. IV. H.C. indeferido. (HC 74198/SP, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, DJ 06-12-1996) Diante do exposto, concedo parcialmente o habeas corpus para garantir à paciente o direito de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação, se por outro motivo não estiver presa, mediante assinatura de termo de compromisso de comparecimento a todos os atos do processo. É como voto. Documento: 8165236 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 7 de 7 O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE): Senhora Ministra Presidente, acompanho o voto de V. Exa., ressalvando, contudo, meu entendimento no sentido de que o óbice à concessão da liberdade provisória para os acusados da prática dos delitos de tráfico de drogas presos em flagrante, previsto no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, é motivo bastante para o indeferimento da benesse. Concedo em parte a ordem de habeas corpus. Documento: Superior Tribunal de Justiça AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.163.453 - RS (2009/0207360-7) RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES AGRAVANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL AGRAVADO : EVERTON GUEDES NUNES (PRESO) ADVOGADO : LÉA BRITO KASPER - DEFENSORA PÚBLICA E OUTROS INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL 14 EMENTA AGRAVO REGIMENTAL. JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL POR DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR. OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA. VEDAÇÃO LEGAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ACÓRDÃO MANTIDO COM BASE NA JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA DESTA CORTE. 1. De registrar, inicialmente, que o julgamento monocrático, com fundamento em precedentes de uma das Turmas integrantes da Terceira Seção desta Corte, não viola o disposto no art. 557, § 1º, do Código de Processo Civil, ou o art. 38 da Lei nº 8.038/90. 2. Ademais, o cabimento do recurso de agravo regimental das decisões singulares proferidas pelo relator, afasta a alegada ofensa ao princípio da colegialidade. 3. Inexistindo divergência na Sexta Turma deste Tribunal quanto à possibilidade de concessão de liberdade provisória a acusado de crime hediondo ou equiparado, nas hipóteses em que não estejam presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, não há razão para modificar a decisão agravada, que deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Nilson Naves votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Documento: 7953281 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 01/03/2010 Página 1 de 2 Superior Tribunal de Justiça Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves. Brasília (DF), 02 de fevereiro de 2010 (data do julgamento). MINISTRO OG FERNANDES Relator Documento: 7953281 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 01/03/2010 Página 2 de 2 Superior Tribunal de Justiça 14 AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.163.453 - RS (2009/0207360-7) RELATÓRIO O SR. MINISTRO OG FERNANDES: Trata-se de agravo regimental interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão de minha lavra, que negou seguimento ao recurso especial. Alega o agravante que a decisão recorrida não poderia ter sido proferida monocraticamente, uma vez que a matéria versada no recurso especial ainda não se encontra pacificada. Além disso, repisa as razões apresentadas no apelo especial quanto ao mérito da questão controvertida nos autos, anotando que a vedação expressa do art. 44 da Lei de Tráfico de Entorpecentes, por si só, é fundamento suficiente para não conceder a liberdade provisória ao acusado preso em flagrante. É o relatório. Documento: 7953282 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 6 Superior Tribunal de Justiça AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.163.453 - RS (2009/0207360-7) VOTO O SR. MINISTRO OG FERNANDES (RELATOR): De registrar, inicialmente, que o julgamento monocrático, com fundamento em precedentes de de uma das Turmas integrantes da Terceira Seção desta Corte, não viola o disposto no art. 557, § 1º, do Código de Processo Civil, ou o art. 38 da Lei nº 8.038/90. Ademais, o cabimento do recurso de agravo regimental das decisões singulares proferidas pelo relator, afasta a alegada ofensa ao princípio da colegialidade. Nesse sentido, veja-se: AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PRISÃO CAUTELAR. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. LEGALIDADE. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO. 1 - Estão ausentes os requisitos da custódia cautelar, sendo inidônea a fundamentação utilizada pelo Juízo de primeiro grau, quando a motivação não está baseada em dados concretos dos autos a justificarem a medida excepcional, sendo que inexistem fatos indicativos de que o réu voltará a delinquir e se furtar à aplicação da lei penal. 2 - O artigo 557, caput, do Código de Processo Civil, combinado com o artigo 3º do Código de Processo Penal, possibilita ao relator que negue seguimento ao recurso, com fundamento na jurisprudência dominante, de forma monocrática, o que não ofende o princípio da 14 colegialidade . 3 - Havendo erro material no julgado, é possível sua correção, de ofício. 4 - Agravo interno ao qual se nega provimento. De ofício, corrige-se erro material no dispositivo da decisão agravada, nos termos da fundamentação. (AgRg no REsp 706044/PR, Relator Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), DJe 07/12/2009) - sem grifos no original Com efeito, inexistindo divergência na Sexta Turma desta Corte Documento: 7953282 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 6 Superior Tribunal de Justiça quanto à possibilidade de concessão de liberdade provisória a acusado de crime hediondo ou equiparado, nas hipóteses em que não estejam presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, não há razão para modificar a decisão agravada, que deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, os quais submeto ao Colegiado para serem confirmados: Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Publico do Estado do Rio Grande do Sul com arrimo no art. 105, III, "a", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça daquele Estado. Consta dos autos que o recorrido, juntamente com outra pessoa, foi preso em flagrante, em 30 de dezembro de 2008, pela suposta prática do crime tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, por trazer consigo 36 (trinta e seis) pedrinhas de crack, sendo mantida a custódia cautelar pelo Juiz de primeiro grau. Inconformada, a defesa manejou habeas corpus perante o Tribunal de origem que, por unanimidade de votos, concedeu a ordem para deferir ao ora recorrido o benefício da liberdade provisória. Opostos embargos de declaração, foram rejeitados. Daí o presente recurso especial, no qual o Parquet sustenta violação do art. 44, caput, da Lei 11.343/06, ao fundamento de que a natureza hedionda do delito é suficiente para justificar a segregação cautelar. A Subprocuradoria-Geral da República manifestou-se pelo provimento do apelo. Decido. A irresignação não merece acolhida. Com efeito, para a decretação da prisão preventiva exige-se decisão devidamente fundamentada, com a demonstração inequívoca do motivo justificado da necessidade de imposição da custódia antecipada, nos termos do art. 93, IX, da Constituição Federal e 312 do Código de Processo Penal. No caso vertente, o acórdão recorrido encontra-se em harmonia com o entendimento que vem sendo adotado pela Sexta Turma desta Corte 14 no sentido de que a hediondez do crime e a vedação abstrata do art. 44 da Lei 11.343/06, não impedem, por si só, a concessão da liberdade provisória. Nesse sentido: Habeas corpus. Tráfico de entorpecentes. Prisão em flagrante. Liberdade provisória negada. Falta de fundamentação. Art. 312 do Código de Processo Penal. Ordem concedida. 1. A prisão cautelar, providência processual de caráter excepcional, só deve ser imposta quando verificado um dos Documento: 7953282 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 3 de 6 Superior Tribunal de Justiça motivos que autorizam sua adoção, que deve restar claramente demonstrado, tudo em consonância com o disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal. 2. Mesmo nas hipóteses de crimes hediondos ou equiparados, é imprescindível que se demonstre, com base em elementos concretos, a necessidade da custódia, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, não bastando a referência à vedação à liberdade provisória contida no art. 2º, II, da Lei nº 8.072/1990, hoje não mais existente em razão da derrogação levada a efeito pela Lei nº 11.464/2007. 3. Com o advento da Lei nº 11.343/2006 (nova Lei de Drogas), que, na mesma linha do que dispunha a Lei de Crimes Hediondos, veda, no seu artigo 44, a concessão da liberdade provisória aos acusados da prática de tráfico de entorpecentes presos em flagrante, penso que a compreensão deva ser a mesma, vale dizer, exige-se motivação concreta para a manutenção da segregação cautelar. (...) 5. Habeas corpus concedido. (HC-89.599, Relator para o acórdão Ministro Paulo Gallotti, DJe de 18.8.08.) PRISÃO EM FLAGRANTE (TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS). LIBERDADE PROVISÓRIA (INDEFERIMENTO). FUNDAMENTAÇÃO (GRAVIDADE DOS FATOS E VEDAÇÃO LEGAL). COAÇÃO (EXISTÊNCIA). SENTENÇA (TRÂNSITO EM JULGADO). 1. Sendo lícito ao juiz, no caso de prisão em flagrante, conceder ao réu liberdade provisória (Cód. de Pr. Penal, art. 310, parágrafo único), o seu ato, seja ele qual for, não prescindirá de fundamentação. 2. Toda e qualquer prisão que tenha caráter de medida cautelar há de vir, sempre e sempre, efetivamente fundamentada. É o sistema – decorre das normas que informam o ordenamento jurídico brasileiro. 3. Se o indeferimento da liberdade provisória está apoiado na gravidade dos fatos, tal aspecto é insuficiente para justificar, a 14 contento, a manutenção de medida de índole excepcional. 4. Também não é suficiente, evidentemente, a reportação, e simples, ao frio texto da lei (por exemplo, ao art. 44 da Lei nº 11.343/06), porque, se assim fosse, a prisão provisória passaria a ter caráter de prisão obrigatória, e não é esse o seu caráter. 5. Admite-se a liberdade provisória, mesmo que se trate de crime inafiançável. 6. Caso no qual o ato judicial que indeferiu a liberdade provisória carece de suficiente motivação; falta-lhe, portanto, validade, decorrendo daí ilegal coação. Documento: 7953282 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 4 de 6 Superior Tribunal de Justiça 7. Do mesmo modo, se à superveniente sentença penal condenatória falta persuasiva motivação, o melhor dos entendimentos é o de que a ré poderá, em liberdade, aguardar o trânsito em julgado. 8. Ordem de habeas corpus concedida. (HC nº 112.947/MG, Relator o Ministro Nilson Naves, DJe de 3/8/2009) HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. FUNDAMENTOS INIDÔNEOS. VEDAÇÃO DA LEI Nº 11.343/2006. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. AUSÊNCIA DE REQUISITOS PARA A MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. ORDEM CONCEDIDA. 1. A Sexta Turma desta Corte vem decidindo no sentido de que, com o advento da Lei nº 11.464/2007, que alterou a redação do art. 2º, II, da Lei 8.072/90, tornou-se possível a concessão de liberdade provisória aos crimes hediondos ou equiparados, nas hipóteses em que não estejam presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal. 2. No caso, a negativa da liberdade provisória está fundamentada tão-só na gravidade abstrata do crime, nas conseqüências que ele causa à sociedade e, sobretudo, na sua hediondez, motivação, por certo, insuficiente para manter a prisão cautelar. (...) (HC 115.630/DF, de minha relatoria, DJe de 02.3.09). De notar que, além de invocar a gravidade abstrata da infração, o magistrado alicerçou sua decisão em conjecturas e presunções de que, em liberdade, o recorrido poderia colocar em risco a ordem pública, sem indicar qualquer dado concreto sobre a imprescindibilidade da medida extrema, o que evidencia o constrangimento ilegal, mostrando-se correto o acórdão hostilizado." Em reforço, cito recente julgado do Supremo Tribunal Federal: AÇÃO PENAL. Tráfico de entorpecentes. Prisão em flagrante. Manutenção. Art. 44 da Lei nº 11.343/06. Insuficiência. Incidência do art. 310 do CPP. Superveniência de sentença condenatória. Negativa 15 de apelação em liberdade fundada na necessidade de restabelecimento da ordem pública, abalada pela gravidade do crime. Inadmissibilidade. Razões que não autorizam a prisão cautelar. Ofensa ao art. 5º, LVII, da CF. Precedentes. Ordem concedida de ofício. A mera referência ao art. 44 da Lei nº 11.343/06, ou a suposta exigência do clamor público e da credibilidade da Justiça, para Documento: 7953282 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 5 de 6 Superior Tribunal de Justiça restabelecimento da ordem social abalada pela gravidade do fato, não são suficientes a manter a prisão em flagrante, que deve observar os requisitos de cautelaridade dispostos no art. 312 do CPP. (HC 101055/GO, Relator Min. CEZAR PELUSO, DJe 18-12-2009) Colho, ainda, o seguinte precedente da Sexta Turma: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. VEDAÇÃO DO ART. 44 DA LEI Nº 11.343/2006. ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. REINCIDÊNCIA. FUNDAMENTO INSUFICIENTE. ORDEM CONCEDIDA. 1. É pacífica na Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça a compressão de que se exige concreta motivação para a manutenção de qualquer prisão cautelar, inclusive nas hipóteses de crimes hediondos e de tráfico de drogas, sendo de rigor a demonstração da presença dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. 2. A simples alusão à vedação contida no art. 44 da Lei nº 11.343/2006 não basta para indeferir a liberdade provisória, se não demonstrada a real imprescindibilidade da medida extrema. 3. A reincidência, por si só, também não é fundamento válido para justificar a segregação cautelar, conforme entendimento pacificado nesta Corte. 4. Ordem concedida para garantir aos pacientes o direito de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação, mediante assinatura de termo de compromisso de comparecimento a todos os atos do processo, devendo ser expedido alvará de soltura clausulado. (HC 115580/MG, Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe 09/11/2009) Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental. É como voto. Documento: 7953282 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 6 de 6 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 149.589 - MG (2009/0194215-3) 15 RELATOR : MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) IMPETRANTE : LUIZ PAULO DE SOUZA JUNIOR ADVOGADO : SÍLVIO LOPES DE SOUZA IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PACIENTE : LUIZ PAULO DE SOUZA JUNIOR (PRESO) EMENTA HABEAS CORPUS . TRÁFICO. PRISÃO CAUTELAR. EXCESSO DE PRAZO. SENTENÇA ANULADA. COAÇÃO ILEGAL CARACTERIZADA. ORDEM CONCEDIDA. 1. Se a sentença foi anulada em grau de recurso e o paciente está preso por mais de um ano e meio, está caracterizado o excesso de prazo de duração da cautelar. 2. A vedação de liberdade provisória prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006 não afasta a ilegalidade da prisão cautelar, se caracterizado o excesso de prazo. 3. Ordem concedida, para relaxar a prisão e outorgar ao paciente o benefício de responder ao processo em liberdade. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Nilson Naves, Maria Thereza de Assis Moura e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE). Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves. Brasília, 17 de dezembro de 2009(Data do Julgamento) MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) Relator Documento: 7388964 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 22/02/2010 Página 1 de 1 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 149.589 - MG (2009/0194215-3) RELATOR : MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) IMPETRANTE : LUIZ PAULO DE SOUZA JUNIOR ADVOGADO : SÍLVIO LOPES DE SOUZA IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PACIENTE : LUIZ PAULO DE SOUZA JUNIOR (PRESO) RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (Relator): Trata-se de habeas corpus impetrado em benefício de Luiz Paulo de Souza Júnior, sob alegação de coação ilegal por parte do E. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Aduz o impetrante que o paciente, preso em 02 de abril de 2008, foi condenado a nove anos de reclusão, em regime prisional fechado, por infração aos artigos 33, caput; e 15 35, caput, ambos da Lei nº 11.343/2006. O MM. Juiz sentenciante não concedeu ao paciente o benefício de recorrer em liberdade. Interposto recurso de apelação criminal o Tribunal impetrado acolheu a preliminar de negativa de prestação jurisdicional e anulou a r. sentença, determinando que outra seja proferida, com análise das teses defensivas e prévia intimação das partes para se manifestarem sobre o laudo de transcrição juntado aos autos a fls. 414/471. Diante da omissão do v. acórdão, no tocante à custódia cautelar do paciente, foram opostos embargos declaratórios, os quais foram acolhidos em parte, mantida a prisão cautelar. Acrescenta o impetrante que o paciente é primário, possui residência fixa e não registra antecedentes criminais. Preenche ele, portanto, os requisitos para responder ao processo em liberdade. Ademais, como a sentença foi anulada, não se pode dizer que a instrução processual está encerrada e, assim, está caracterizado o constrangimento ilegal por excesso de prazo. Pleiteia o impetrante, em liminar, seja outorgado ao paciente o benefício de aguardar o julgamento em liberdade, expedindo-se alvará de soltura; e a concessão da ordem, ao final, para tornar definitiva tal medida (fls. 2 a 5). A liminar foi concedida a fls. 63/64. Documento: 7384206 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 6 Superior Tribunal de Justiça O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais prestou as informações de fls. 70/73. O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem (fls. 86/88). É o relatório. Documento: 7384206 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 6 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 149.589 - MG (2009/0194215-3) RELATOR : MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) IMPETRANTE : LUIZ PAULO DE SOUZA JUNIOR ADVOGADO : SÍLVIO LOPES DE SOUZA IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PACIENTE : LUIZ PAULO DE SOUZA JUNIOR (PRESO) VOTO O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (Relator): O paciente fora condenado ao total de nove anos de reclusão, pela prática dos delitos previstos nos artigos 33; e 35; da Lei nº 11.343/2006, por sentença datada de 10 de outubro de 2008. Na data da prolação da r. sentença condenatória, o paciente estava preso havia oito meses, desde a prisão em flagrante, ocorrida em 02 de fevereiro de 2008. No julgamento do recurso de apelação interposto pela defesa, o E. Tribunal impetrado anulou a sentença, por falta de análise das teses apresentadas em alegações finais. Não se pronunciou a Corte Estadual sobre 15 a prisão cautelar do paciente. Em embargos de declaração, o E. Tribunal manteve a segregação provisória, sob os seguintes fundamentos: " (...) Analisando o acórdão embargado, verifica-se que, de fato, deixou a decisão de se manifestar acerca da possibilidade de expedição de alvará de soltura ao embargante. Há muito se firmou em nossos tribunais o entendimento de que a anulação da sentença monocrática não enseja, por si só, a revogação da custódia preventiva, sobretudo quando o recorrente permaneceu preso durante toda a instrução criminal e, ainda, subsistentes os motivos que a justificaram. Na oportunidade, observo que o réu respondeu preso à ação penal, e assim deverá permanecer, não se verificando qualquer ilegalidade na prisão e diante da vedação da concessão da liberdade provisória aos réus processados por crime de tráfico, como no caso em tela, deixo de expedir Alvará de Soltura. (...) Com tais considerações, acolho parcialmente os embargos, Documento: 7384206 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 3 de 6 Superior Tribunal de Justiça para suprir a omissão em relação à expedição de alvará de soltura, sem efeitos modificativos". Em primeiro lugar, cumpre anotar que a vedação prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006 não impede a concessão da liberdade provisória, só por só, conforme entendimento adotado por esta E. Sexta Turma. Confiram-se: Prisão em flagrante (tráfico ilícito de drogas). Liberdade provisória (indeferimento). Fundamentação (gravidade dos fatos e vedação legal). Coação (existência). Sentença condenatória (superveniência). Apelação em liberdade (possibilidade). 1. Sendo lícito ao juiz, no caso de prisão em flagrante, conceder ao réu liberdade provisória (Cód. de Pr. Penal, art. 310, parágrafo único), o seu ato, seja ele qual for, não prescindirá de fundamentação. 2. Toda e qualquer prisão que tenha caráter de medida cautelar há de vir, sempre e sempre, efetivamente fundamentada. É o sistema – decorre das normas que informam o ordenamento jurídico brasileiro. 3. Se o indeferimento da liberdade provisória está apoiado na gravidade dos fatos, tal aspecto é insuficiente para justificar, a contento, a manutenção de medida de índole excepcional. 4. Também não é suficiente, evidentemente, a reportação, e simples, ao frio texto da lei (por exemplo, ao art. 44 da Lei nº 11.343/06), porque, se assim fosse, a prisão provisória 15 passaria a ter caráter de prisão obrigatória, e não é esse o seu caráter. 5. Admite-se a liberdade provisória, mesmo que se trate de crime inafiançável. 6. Caso no qual o ato judicial que indeferiu a liberdade provisória carece de suficiente motivação; falta-lhe, portanto, validade, decorrendo daí ilegal coação. 7. Do mesmo modo, se à superveniente sentença penal condenatória falta persuasiva motivação, o melhor dos entendimentos é o de que o réu poderá, em liberdade, aguardar o julgamento da apelação. 8. Habeas corpus concedido. (Habeas corpus nº 102973/SP, relator Ministro Nilson Naves, j, em 16/06/2009). HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. EXCESSO DE PRAZO. NECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DE CARTAS PRECATÓRIAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO. PRISÃO EM FLAGRANTE. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. Documento: 7384206 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 4 de 6 Superior Tribunal de Justiça FUNDAMENTOS GENÉRICOS. VEDAÇÃO DA LEI Nº 11.343/2006. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. AUSÊNCIA DE REQUISITOS PARA A MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. ORDEM CONCEDIDA. 1. Não há constrangimento ilegal se o alegado excesso de prazo decorre da necessidade de oitiva de testemunhas por meio de cartas precatórias. 2. A Sexta Turma desta Corte vem decido no sentido de que, com o advento da Lei nº 11.464/2007, que alterou a redação do art. 2º, II, da Lei 8.072/90, tornou-se possível a concessão de liberdade provisória aos crimes hediondos ou equiparados, nas hipóteses que não estejam presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal. 3. No caso, a negativa da liberdade provisória não está fundamentada em fatos concretos, mas tão-só na vedação legal, gravidade abstrata do crime e em referências vagas às conseqüências que ele causa na sociedade. 4. Ordem concedida para deferir liberdade provisória à paciente, mediante compromisso de comparecer a todos os atos do processo, sob pena de revogação. (Habeas corpus nº 109451/SP, relator Ministro Og Fernandes, j. em 11/11/2008). Passando-se à análise do caso concreto, verifica-se que, da data da prisão, 02 de fevereiro de 2008, até a do julgamento dos embargos de declaração, em 20 de agosto de 2009, o paciente permaneceu preso por mais de um ano e meio. Com efeito, com a anulação da sentença, deve ser analisado se 15 está caracterizada a coação ilegal, por excesso de prazo na formação da culpa. E a resposta é positiva, porque, se o E. Tribunal impetrado anulou a r. sentença, tal fato se deveu à omissão do julgador, que deixou de analisar as alegações da defesa. Em outras palavras, o paciente não pode ser prejudicado pela demora de prestação jurisdicional válida, de tal arte que a concessão da liberdade provisória é de rigor. É certo que, como anotado pelo E. Tribunal impetrado, a anulação da sentença não enseja a revogação da prisão, só por só. Mas, o excesso de prazo de duração da cautelar torna ilegal a prisão, como se vê dos seguintes julgados: Documento: 7384206 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 5 de 6 Superior Tribunal de Justiça PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO. 1. LIBERDADE PROVISÓRIA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. REITERAÇÃO DELITIVA E MODUS OPERANDI. ELEMENTOS CONCRETOS DE CAUTELARIDADE. INDICAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. 2. EXCESSO DE PRAZO. ANULAÇÃO DO PROCESSO, EM SEDE DE APELAÇÃO, DESDE AS ALEGAÇÕES FINAIS. AUTOS PARADOS AGUARDANDO A CIÊNCIA DO ACÓRDÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. 3. ORDEM CONCEDIDA EM PARTE. 1. A reiteração delitiva e a peculiaridade do modus operandi podem demonstrar a necessidade cautelar da custódia, desde que baseados em elementos concretos dos autos. 2. Configura-se excesso de prazo com relação ao paciente, preso há mais de 2 anos e 3 meses, com a anulação do processo desde as alegações finais operada em sede de apelação, mormente considerando que os autos encontram-se parados no tribunal há mais de 5 meses aguardando a ciência do acórdão pelo Ministério Público. 3. Ordem concedida em parte, para conceder a liberdade provisória ao paciente, expedindo-se alvará de soltura clausulado, se por outro motivo não estiver preso. (Habeas corpus nº 95325/SC, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, j. em 22/04/2008). Diante do exposto, concedo a ordem, para relaxar a prisão e outorgar ao paciente o benefício de responder ao processo em liberdade, referendada a liminar. Documento: 7384206 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 6 de 6 HABEAS CORPUS Nº 155.384 - MG (2009/0234851-6) RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES IMPETRANTE : TÚLIO PASSARELLI VICENTINI TEIXEIRA E OUTRO IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PACIENTE : WILLIAN RODRIGUES MENDES BATISTA (PRESO) EMENTA HABEAS CORPUS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO 15 DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. INDEFERIMENTO DA LIBERDADE PROVISÓRIA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. DECISÃO FUNDAMENTADA. 1. A jurisprudência desta Corte tem proclamado que a prisão cautelar é medida de caráter excepcional, devendo ser imposta, ou mantida, apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada (art. 93, inciso IX, da Constituição Federal), as exigências do art. 312 do Código de Processo Penal. 2. No caso, a custódia está devidamente justificada na garantia da ordem pública, pois o paciente é acusado de estar associado a outras três pessoas para o tráfico de drogas, sendo preso em flagrante em uma chácara onde guardava cerca de 1.789 invólucros de cocaína prontos para a comercialização (totalizando 535,8 g), provenientes de outro município do Estado de Minas Gerais, tudo a indicar a presença de periculosidade social reveladora da necessidade da prisão. 3. Ordem denegada. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Nilson Naves votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves. Brasília (DF), 05 de abril de 2010 (data do julgamento). MINISTRO OG FERNANDES Relator Documento: 8914711 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 19/04/2010 Página 1 de 1 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 155.384 - MG (2009/0234851-6) RELATÓRIO O SR. MINISTRO OG FERNANDES: O presente habeas corpus, deduzido em benefício de Willian Rodrigues Mendes Batista, volta-se contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que indeferiu o writ lá impetrado. O paciente, preso em flagrante em 4/7/2009, foi denunciado por tráfico e associação para o tráfico de drogas. Pretende-se a concessão da liberdade provisória, porque a custódia estaria amparada apenas na gravidade abstrata da infração. 15 Indeferida a liminar e prestadas as informações, a Subprocuradoria-Geral da República opinou pela denegação da ordem. É o relatório. Documento: 8914703 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 6 Superior Tribunal de Justiça HABEAS CORPUS Nº 155.384 - MG (2009/0234851-6) VOTO O SR. MINISTRO OG FERNANDES (RELATOR): Importante a leitura da denúncia, para o conhecimento dos fatos (fls. 170/172): Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, no dia 04/07/2009, por volta das 06:20h, na Estrada dos Papagaios, Chácara nº 31, localidade de Cachoeira do Choro, zona rural do município de Curvelo/MG, os denunciados Roberto Esteves Gomes, Willian Rodrigues Mendes Batista, Adriano Machado Paulino e Edson Marques Esteves, em unidade de desígnios, guardavam, para levar a consumo de terceiros, 535,38 g (quinhentos e trinta e cinco gramas e trinta e oito centigramas) da substância "cocaína" (laudo de constatação de fl. 49), forma sólida, de cor branca, acondicionada em 1789 (mil setecentos e oitenta e nove) invólucros de plástico de cor azul, substância esta causadora de dependência física e psíquica, em desacordo com determinação legal e regulamentar. Ressalte-se que os denunciados associaram-se com o fito de praticar o delito previsto no art. 33, caput da Lei 11.343/06, sendo o acusado Edson líder do bando e responsável pela administração dos negócios ilícitos, adquirindo, transportando, oferecendo e vendendo a droga a terceiros. Segundo consta, no dia dos fatos, Policiais Militares, em cumprimento a um mandado de busca e apreensão, dirigiram-se à chácara do denunciado Edson Marques Esteves. Ao chegarem no imóvel, os milicianos encontraram o denunciado Roberto E. Gomes, responsável pela vigília do local e por guardar a droga, bem como os denunciados Willian Rodrigues Mendes Batista e Adriano Machado Paulino, os quais transportaram a droga supramencionada do Município de Betim/MG para a chácara do denunciado Edson, sendo responsáveis, também, pela preparação, embalagem e venda da substância de entorpecentes. Durante as buscas na chácara, os milicianos lograram êxito em encontrar dentro de um buraco no solo, próximo a uma bananeira, a droga supramencionada, a qual estava embalada, pronta para ser comercializada. Foram apreendidos também os seguintes objetos: 1 (um) relógio, marca "emporio armani"; 5 (cinco) tesouras; 4 (quatro) isqueiros; 5 (cinco) carregadores de celular; 1 (uma) pulseira; documentos pessoais dos denunciados e de outras pessoas; CRLV da motocicleta Honda/CG 150 Titan, placa HBV-0919; CRLV do veículo Tempra, placa JLE-5898; CRLV da motocicleta HONDA/CBX 250, 15 Twister, placa HKN-4004; 02 (duas) carteiras; 3 (três) chips para Documento: 8914703 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 6 Superior Tribunal de Justiça celular; 1 (uma) cédula de um dólar; 1 (uma) cédula de cinquenta reais; 1 (uma) cédula de mil guaranis; 2 (dois) capacetes; 5 (cinco) cartões magnéticos; 7 (sete) cartuchos cal. 380 auto, marca CBC, intactos (laudo de constatação de fl. 46); e 01 (um) carregador de munições. Ante o exposto, o Ministério Público denuncia Roberto Esteves Gomes, Willian Rodrigues Mendes Batista, Adriano Machado Paulino e Edson Marques Esteves, como incursos nas sanções do art. 33, caput, c.c art. 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, requerendo que após a autuação desta, sejam os mesmos citados para responder a acusação e processados na forma estabelecida pelo artigo 48 e seguintes da referida lei, até final condenação. O pedido de liberdade provisória formulado pelo paciente foi assim indeferido (fls. 87/89): Trata-se de pedido de liberdade provisória em favor do acusado Willian Rodrigues Mendes Batista, já qualificado na inicial, pelos seguintes termos. Aduz a defesa que o acusado encontra-se preso em flagrante delito, por ter supostamente praticado crime tipificado no art. 33 da Lei 11.343-2006. Sustenta que não estão presentes os requisitos autorizadores da custódia preventiva, não havendo que se falar em risco a ordem pública ou a conveniência da instrução criminal em caso de soltura do requerente. O Ministério Público se manifestou às fls. 41-42 opinando contrariamente à concessão de liberdade provisória. É o breve relatório. A priori, cumpre salientar que o acusado foi preso pela prática do crime tipificado no art. 33 da Lei 11.343-2006, tráfico de drogas. Não obstante tal assertiva, considerando que a concessão de liberdade provisória somente poderá ser deferida quando ausentes os requisitos da prisão preventiva, cumpre sejam os mesmos examinados nos presentes autos. Do exame dos elementos probatórios contidos no inquérito policial, verifica-se a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade do crime narrado na denúncia. Às fs. 27-33 consta cópia do APF onde foram ouvidas testemunhas que noticiaram que o acusado foi preso por ter sido encontrado com quantidade considerável de droga, supostamente trazida da cidade de Betim para ser comercializada na presente Comarca. Assim sendo, nos termos do art. 311 do CPP, entendo estar presente nos autos prova da existência do crime pelo qual o acusado foi preso, bem como indícios suficientes de autoria. Documento: 8914703 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 3 de 6 15 Superior Tribunal de Justiça A prisão preventiva tendo como fundamento a garantia da ordem pública visa impedir que o agente, solto, continue a delinquir, existindo, pois, evidente perigo social decorrente da demora em se aguardar o provimento definitivo, visto que até o trânsito em julgado da decisão condenatória, caso venha a ocorrer, o sujeito já terá cometido inúmeros delitos. A gravidade do delito, a forma de seu cometimento, bem como a repercussão social do mesmo estão inseridas no contexto da ordem pública, conforme leciona Guilherme Nucci: "Entende-se pela expressão a necessidade de se manter a ordem na sociedade, que, via de regra, é abalada pela prática de um delito. Se este for grave de repercussão social, com reflexos negativos e traumáticos na vida de muitos, propiciando aqueles que tomam conhecimento da sua realização um forte sentimento de impunidade e de insegurança, cabe ao judiciário determinar o recolhimento do agente. A garantia da ordem pública deve ser visualizada binômio gravidade da infração + repercussão social. Fato que merece ser comentado é que na presente comarca nos últimos tempos vem aumentando consideravelmente a ocorrência de crime de tráfico de drogas, fato este que deve ser reprimido pelo poder judiciário, por ser um dos poderes responsável pela manutenção da ordem social. Cumpre salientar que a presente comarca é composta de cinco municípios, com uma população de aproximadamente 90.000 habitantes, sendo uma comarca pacata e de baixa criminalidade. Sendo assim, o crime sub judice causou uma grave repercussão social, gerando intranquilidade na população. Outrossim, o fato do acusado ser primário e ter residência fixa não induz necessariamente a concessão de liberdade provisória. Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, in verbis : "Não obstante a primariedade, o trabalho e a residência fixa no distrito da culpa, afasta-se a alegação de constrangimento ilegal consubstanciada na negativa de liberdade provisória, porquanto merece subsistir a prisão em flagrante pelo crime tipificado no art. 157, § 2º, I e II do Código Penal, não havendo falar em inobservância do princípio da presunção de inocência, pois o crime foi cometido com grave ameaça, uso de arma de fogo e ainda concurso de agentes. Impende colocar em destaque a necessidade da custódia preventiva, na espécie como garantia da ordem pública de modo a impedir a constante repetição de atos nocivos, como os noticiados nos autos, que trazem intranquilidade e desassossego à população. Precedentes da Corte (RHC 8.319 - SP, 6ª T, rel. Fernando Gonçalves, Documento: 8914703 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 4 de 6 16 Superior Tribunal de Justiça 20.04.1999, v. u. DJ 24.05.1999, p. 201) Considerando que o conceito de garantia da Ordem Pública visa prevenir a reprodução de fatos criminosos, considerando, ainda que a conveniência da medida de prisão preventiva deve ser revelada pela sensibilidade do Juiz à reação do meio ambiente à ação criminosa, entendo estarem presentes os requisitos da prisão preventiva. Diante do exposto, indefiro o pedido de liberdade provisória do acusado. A jurisprudência desta Corte tem proclamado que a prisão cautelar é medida de caráter excepcional, devendo ser imposta, ou mantida, apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada (art. 93, inciso IX, da Constituição Federal), as exigências do art. 312 do Código de Processo Penal. No caso, penso que a custódia está devidamente justificada na garantia da ordem pública, pois, como se viu, o paciente é acusado de estar associado a outras três pessoas para o tráfico de drogas, sendo preso em flagrante em uma chácara onde guardava cerca de 1.789 invólucros de cocaína prontos para a comercialização (totalizando 535,8 g), provenientes de outro município do Estado de Minas Gerais, tudo a indicar a presença de periculosidade social reveladora da necessidade da prisão. Confiram-se os seguintes precedentes: HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – PRISÃO EM FLAGRANTE – MANUTENÇÃO DA ORDEM PÚBLICA – MODUS OPERANDI – WRIT DENEGADO 1. A Lei 11.464/2007, ao suprimir do artigo 2º, II da Lei 8.072/1990 a vedação à liberdade provisória nos crimes hediondos, adequou a lei infraconstitucional ao texto da Carta Política de 1988, sendo admissível a manutenção do acusado no cárcere apenas quando demonstrados os requisitos autorizadores de sua prisão preventiva. 2. A concreta periculosidade do agente, revelada pelo modus operandi com que teria supostamente agido, porquanto teria sido flagrado na posse de quantidade superior a dez quilos de maconha, que seria transportada para outra cidade, é suficiente para motivar a necessidade da manutenção de sua prisão preventiva, a bem do resguardo da ordem pública. Precedentes. 3. Ordem denegada. (HC nº 120.895/MS, Relatora a Desembargadora convocada Jane Documento: 8914703 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 5 de 6 Superior Tribunal de Justiça Silva, DJe de 23/3/09) 16 PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ARMAS E CONTRABANDO. 1. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. REITERAÇÃO DELITIVA. MODUS OPERANDI. CUSTÓDIA FUNDAMENTADA EM ELEMENTOS CONCRETOS. POSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. 2. ADVENTO DE SENTENÇA QUE NÃO APRESENTA NOVOS FUNDAMENTOS DA CUSTÓDIA. CONHECIMENTO POR ESTA CORTE. POSSIBILIDADE. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INOCORRÊNCIA. 3. ORDEM DENEGADA. 1. A probabilidade concreta de reiteração delitiva e a peculiaridade do modus operandi podem demonstrar a necessidade cautelar, da medida, principalmente por pesar sobre o paciente a acusação de estar envolvido com esquema de tráfico internacional de munição de uso restrito, da qual desempenharia o papel de importador. 2. Não torna prejudicado o writ o advento de sentença que apenas reitera os mesmos argumentos da decisão anterior, sem apresentar novos fundamentos para a custódia. Precedentes. 3. Ordem denegada. (HC nº 66.633/RJ, Relatora a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 17/3/08) Diante do exposto, denego a ordem. É o voto. Documento: 8914703 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 6 de 6 16 ANEXO D- Jurisprudências Supremo Tribunal Federal 16 16 16 16 16