Reformas administrativas no Brasil: Entre a governabilidade política e a governança gerencial Prof.Dr. Jawdat Abu-El-Haj Reformas administrativas no Brasil: Entre a governabilidade política e a governança gerencial I. II. III. IV. A crise da década de 1930 (transição consentida do rural ao industrial Os precursores da administração legal-racional (1930-1936) O DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público): a governança administrativa (1938-1945) O dilema do DASP: o dilema da legitimidade no pluralismo. Reformas administrativas no Brasil: Entre a governabilidade política e a governança gerencial. V. Antes do desenvolvimentismo: as missões externas (1945-1956). VI. Era JK e o consenso desenvolvimentista (19561961) VII. A crise do desenvolvimentismo (entre reformas de base e a produtividade econômica). VIII. Reforma empresarial do Estado: Decreto Lei-200 e a estruturação do moderno Estado brasileiro (1967-1974). Reformas administrativas no Brasil: Entre a governabilidade política e a governança gerencial. IX. Os limites estruturais do autoritarismo (19741979). X. A Constituição de 1988: novo pacto federativo, controle social e inflação (1988-1994). XI. Era FHC: capitalismo globalizado e a obsessão pela governabilidade (1994-2002) XII. Era Lula: inclusão social e mobilização política (Brasil perante um novo desafio político). I. A crise da década de 1930 (transição consentida do rural ao industrial) A. B. C. Crise econômica do café (colapso do preço internacional). A crise se estende para São Paulo causando dificuldades econômicas remanescentes da situação nas outras regiões. (Furtado e Love) Crise política: o uso instrumental do Estado (empreguismo e política cambial). Crise cultural: a compatibilidade entre a cultura brasileira e a modernidade (os clássicos: Buarque de Holanda, Freyre, Prado Júnior, etc.). A Revolução de 1930: mudança política A. A crítica do liberalismo e da competição partidária como nocivas à sociedade e seu progresso. B. Federalismo sinônimo de fragmentação política. Os meios: aperfeiçoamento dos instrumentos técnico-administrativos para viabilizar a modernidade (o positivismo gaúcho): A. A centralização política. B. B. Racionalização administrativa II. Os precursores da administração legalracional (1930-1936) A. Governo provisório (novembro de 1930 - julho de 1934): centralização administrativa com as fusões ministeriais e as interventorias estaduais. B. Subcomissão do Serviço Público 1934 (Comissão Mista de Reforma Econômica e Financeira) dirigida por Maurício Nabuco (mentor da reforma administrativa do Itamaraty). Diagnóstico: excessivas nomeações políticas para cargos administrativos. Metas: remanejamento de órgãos + concurso público + progressão dentro de carreira. II. Os precursores da administração legalracional (1930-1936) C. Reação das elites estaduais contra Comissão Nabuco (subcomissão José Bernardino 1935: aceitou o diagnóstico, porém recomendou a incorporação dos extranumerários, congelando de fato a reforma administrativa. D. A Comissão Presidencial 1936 (Comissão de Reajustamento) liderada por Luiz Simões Lopes (político gaúcho) e Moacir Brigges (diplomata). Conselho Federal do Serviço Público e Lei de Reajustamento dos Quadros e dos Vencimentos nas Repartições Federais. E. A Comissão Presidencial se inspirou nas reformas administrativas de FDR: President’s Committee on Administrativa Management Report (1936) e Brookings Institution Report (1937). O DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público): A governança administrativa (1938-1945) A. Criado oficialmente em 30 de julho de 1938 como um dos órgãos centrais do Estado Novo (10 de novembro de 1937 29 de outubro de 1945) (cérebro da administração pública racional-legal). Seria o centro organizador no novo serviço público, tendo cinco atribuições: Selecionar os candidatos aos cargos públicos federais. Readaptar os servidores públicos às novas normas administrativas. Padronizar as compras governamentais. Auxiliar administrativamente a Presidência da República. Inspecionar e avaliar o serviço público anualmente. O DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público): A governança administrativa (1938-1945) B. Compôs cinco departamentos: Organização e coordenação, Empregados públicos. Extranumerários. Seleção e treinamento. Materiais. Uma sexta divisão, (Finanças) teria a missão de elaborar o orçamento da União (entrou em vigor em 1942) O DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público): A governança administrativa (1938-1945) C. William Willoughby, Henri Fayol e Luther Gulick foram as suas referências acadêmicas. Willoughby estabeleceu duas distinções: Governabilidade (os consensos político-partidários sobre os rumos de sociedades) e a governança (os mecanismos administrativos para alcançar metas objetivas). A governabilidade é uma típica arena de negociações entre representantes enquanto a governança é equivalente a Comissão Executiva de uma sociedade anônima de acionistas. Atividades de fins (serviços e utilidades públicas) e de meio (planejamento e administração) do Estado. Fayol: princípios administrativos (divisão de trabalho, autoridade, unidade de comando, unidade de direção, centralização, hierarquia e disciplina) e elementos administrativos (previsão de resultados, organização e comando). O DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público): A governança administrativa (1938-1945) D. Seis princípios da administração pública: Separação entre vida política e desempenho administrativo. Definição clara de regras. Permanência e estabilidade no emprego. Perfil profissional preciso demarca a institucionalização. Regras internas para evitar arbitrariedades. Isonomia salarial. O DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público): A governança administrativa (1938-1945) E. Além dos seis princípios, os daspianos acrescentaram outros três pertencentes ao princípio da centralização política e federativa: unidade da administração pública, centralização na União e esprit de corp (espírito do corpo). (o princípio que o Brasil pela sua tendência interna centrífuga requer mais centralização do que outros países ocidentais para alcançar o desenvolvimento). III. O dilema do DASP: Meritocracia gerencial e vulnerabilidade política. A. Colapso do Estado Novo retirou o apoio, levando ao seu enfraquecimento político e fracasso B. Reformas administrativas não se sustentam sem amplo apoio político-partidário. C. O DASP sobreviveu nos seus recursos humanos: Celso Furtado, Guerreiro Ramos, Lucas Lopes e Luiz Simões Lopes permaneceram na liderança administrativa do Estado brasileiro durante décadas. IV. Antes do desenvolvimentismo: As missões externas (1945-1956). A. O fim do DASP anunciou um vazio político e ideológico, prolongando-se até 1956 quando surgiu o consenso desenvolvimentista. B. Essa foi a fase dos confusos e oscilantes relatórios externos preparados pelas missões externas: Comissão Niemeyer (1931) e Cooke (1942) apoiaram a vocação industrial do Brasil. Missão Abbink (1948) foi contrária defendendo prioridade antiinflacionária e equilíbrio de contas. Comissão Mista Brasil - Estados Unidos retorna novamente ao tema industrial. VI. Era JK e o consenso desenvolvimentista (1956-1961) A. O consenso desenvolvimentista resumido pela posição de Roberto Campos: “...a opção pelo desenvolvimento implica a aceitação da idéia de que é mais importante maximizar o ritmo de desenvolvimento econômico, que corrigir as desigualdades sociais. Se o ritmo de desenvolvimento econômico é rápido, a desigualdade pode ser tolerável e pode ser corrigida a tempo. Se baixa o ritmo de desenvolvimento por falta de incentivos adequados, o exercício da justiça distributiva se transforma numa repartição de pobreza”. VI. Era JK e o consenso desenvolvimentista (1956-1961) B. Era JK centrou-se nas instituições econômicas: BNDES (financiamento) e CDN (Conselho Nacional de Desenvolvimento). Os ministérios sociais ficaram sob tutela dos partidos políticos. (governança seletiva). C. Motivos da decisão de JK: dificuldades políticas de Vargas e fragilidade política no Congresso e no judiciário. VI. Era JK e o consenso desenvolvimentista (1956-1961) D. O consenso desenvolvimentista causou sérios desequilíbrios políticos, sociais, econômicos e fiscais. Políticos: como no DASP o modelo dependia do comando político, amenizado por uma dotação orçamentária permanente para o BNDE. Social: aceleração da industrialização deflagrou uma urbanização onde ritmo de assalariamento superou o do crescimento. Econômico: elevação da inflação. Fiscal: endividamento externo e grave déficit governamental. VII. A crise do desenvolvimentismo (entre reformas de base e a produtividade econômica). A. Jango assume logo após a renuncia de Jânio (25 de agosto de 1961) e inicia uma linha de expansão do mercado interno (reformas de base: distribuição da terra, financiamento interno com a redução das remessas para o exterior e investimentos sociais). B. Na linha oposta, as elites conservadoras defendiam aumento da produtividade agrária. C. Crítica conservadora de Jango: a. toda reforma social é de cunho comunista e b. todo conflito leva a desordem e colapso de autoridade. VIII. Reforma empresarial do Estado: Decreto Lei-200 e a estruturação do moderno Estado brasileiro (1967-1974) A. B. C. D. Decreto-Lei 200 (25 de fev. de 1967), obra de Hélio Beltrão (Ministro de Planejamento) organiza o imenso Estado brasileiro em quatro pilares: Administração direta, Autarquias e Fundações, empresas mistas e empresas públicas. Estabelece o princípio da autonomia gerencial como meio de tornar o Estado mais ativo e preparado para promover projetos complexos de desenvolvimento econômico (captação de fundos privados, alianças internacionais e tecnificação). Empresas estatais se transformam em campeãs de produtividade e desempenho (Eletrobrás, Telebrás, Siderbrás, Petrobrás) compatíveis com os padrões internacionais. O dilema desse modelo: limitado as demandas das classes A & b e, portanto sofre de desequilíbrios estruturais. IX. Os limites estruturais de autoritarismo (1974-1979). A. B. Crise econômica acelera a centralização administrativa do regime em dois momentos: 19 de março de1974 (redução da autonomia com a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico (órgão de controle da Presidência da República) e mais ainda em dezembro de 1979 com o SEST (Secretaria Especial das Empresas Estatais). A retomada de centralização implicava no uso do setor público como meio de controle inflacionário por intermédio dos preços de utilidades públicas X. A Constituição de 1988: Novo pacto federativo, controle social e inflação (1988-1994). A. B. C. D. O problema inflacionário: oito planos em cinco anos: Plano Cruzado (março - dez 1986), Plano Bresser (junho - dez 1987), Plano Arroz com Feijão (1988), Plano Verão (janeiro - junho 1989), Plano Collor I (março-abril 1990), Plano Collor II (jan. abril 1991) e Plano Marcílio (jan. - abril 1992). Novo pacto federativo (municípios com prerrogativas para políticas sociais) artigos 18 e 34 da Constituição de 1988. Universalização dos direitos sociais. Participação social como substituto de planejamento técnico-administrativo. XI. Era FHC: Capitalismo globalizado e a obsessão pela governabilidade (1994-2002) A. B. C. D. E. Controle inflacionário. Reformas estruturais para viabilizar o ingresso do Brasil no capitalismo globalizado. Privatização como meio de modernização econômica. Reforma gerencial de 1995: Estado flexível capaz de aperfeiçoar as decisões políticas. Recuperação dos poderes da União com Fundo Social Emergencial. XII. Era Lula: inclusão social e mobilização política (Brasil perante um novo desafio político e de desenvolvimento). A. B. C. D. Prioridade para a política de inclusão social. Multinacionais brasileiras como instrumento de desenvolvimento econômico. Coalizão política reforçando a governabilidade sem clara governança (modelo pluralista: grupo econômico, partido, região, estado, município que se mobilizam alcançam objetivos). Ampliação do mercado interno através do consumo das classes C e D (perigo de desindustrialização). XII. Era Lula: inclusão social e mobilização política (Brasil perante um novo desafio político e de desenvolvimento). E. Elevado custo Brasil, tornando o país pouco competitivo comparado aos outros emergentes. F. Perigo da erosão da autoridade presidencial com fim das grandes reformas. G. Retorno da política dos governadores. H. Desequilíbrios regionais e dificuldade da integração interna. Prof. Jawdat Abu-El-Haj Professor associado da Universidade Federal do Ceará (UFC)