1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NO PROCESSO CIVIL ELEITORAL AUTOR DANIEL BARROS SILVA ORIENTADOR PROF. CARLOS AFONSO LEITE LEOCADIO RIO DE JANEIRO 2010 2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NO PROCESSO CIVIL ELEITORAL Monografia apresentada à Universidade Candido Mendes – Instituto a Vez do Mestre, como requisito parcial para a conclusão do curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito Processual Civil. Por: Daniel Barros Silva. 3 AGRADECIMENTOS Aos meus pais, Telmo e Tereza, por todo o amor e carinho com que me cercaram durante todos esses anos. Ao meu amigo e colega de trabalho Marcelo, por todo o auxílio e sugestões que foram integralmente acolhidas e, ainda, a todas as pessoas que, direta e indiretamente, contribuíram para a confecção desse trabalho acadêmico. 4 DEDICATÓRIA Dedico a confecção da presente monografia ao meu recém-falecido avô Antônio, que muito se orgulhava de mim. 5 RESUMO A tutela antecipada é a antecipação dos efeitos materiais de uma sentença de mérito, concedida no bojo de um processo de conhecimento, a requerimento da parte, com base em um juízo de verossimilhança (de probabilidade). Com a inclusão da antecipação de tutela no ordenamento jurídico, o requerente passou a ter condições de obter, de imediato, os efeitos materiais que o provimento jurisdicional lhe concederia, em regra, somente ao final da demanda, com o trânsito em julgado da sentença. Existem cinco ações, próprias do arcabouço jurídico eleitoral, para que a Justiça Eleitoral possa conhecer e decidir as argüições de inelegibilidade ou falta de condição de elegibilidade, quais sejam Ação de Impugnação ao Registro de candidatura, Ação de Investigação Judicial Eleitoral, Recurso contra expedição de diploma, Ação de Impugnação de Mandato Eletivo e, ainda, as Representações, que podem ser: por captação de sufrágio (art. 41-A), por condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais (arts. 73 e 77) e captação ou gastos ilícitos de recursos durante a campanha (art. 30-A), todas da Lei nº 9504/97. É possível, em certos casos, a concessão da tutela antecipada em sede das ações cíveis tipicamente eleitorais, a fim de impedir (dependendo do momento e da ação civil eleitoral promovida) o registro, a diplomação, a posse e o posterior exercício do mandato eletivo, até que seja julgada definitivamente a ação. Em tese, seria sempre possível a utilização do instituto processual civil da tutela antecipatória em sede dessas ações eleitorais, pois entre o direito individual da parte consubstanciado na expectativa do candidato em se registrar, se diplomar, se empossar e exercer o mandato eletivo e o interesse da comunidade consubstanciado no perigo representado pela posse e exercício do poder de um candidato cuja eleição foi viciada pela corrupção ou abuso do poder, obviamente tem o Judiciário de amparar a coletividade, sendo preferível, evidentemente, se proteger o interesse público, devendo ser aplicados, em essência, os princípios da soberania do interesse público sobre o privado, da moralidade e o da razoabilidade. Entretanto, a legislação eleitoral (artigos 216 do Código Eleitoral e 15 da Lei Complementar nº 64/90) pertinente a alguma dessas ações eleitorais impõe uma proibição de que sejam adiantados os efeitos delas, mediante antecipação de tutela. Sendo assim, esses artigos representam óbice legal à concessão de tutela antecipatória nas seguintes ações eleitorais: Recurso contra expedição de diploma, Ação de Impugnação ao Registro de candidatura e Ação de Investigação Judicial Eleitoral que trate de inelegibilidade. Por outro lado, tem cabimento a concessão de tutela antecipada nas demais ações cíveis eleitorais, quais sejam, Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, Ação de Investigação Judicial Eleitoral que não trate de inelegibilidade e, ainda, as Representações por captação de sufrágio (art. 41-A), por condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais (arts. 73 e 77) e captação ou gastos ilícitos de recursos durante a campanha (art. 30-A), todas da Lei nº 9504/97. 6 METODOLOGIA O estudo aqui proposto foi levado a efeito a partir do método da pesquisa bibliográfica, em que se buscou o conhecimento em diversos tipos de publicações, como livros e artigos em jornais, revistas, internet e outros periódicos especializados, além de publicações oficiais da legislação e da jurisprudência. Por outro lado, a pesquisa que resultou nesta monografia também foi empreendida do método dogmático positivista, porque o que se pretendeu foi apenas analisar o cabimento da tutela antecipada no processo civil eleitoral, sob o ponto de vista específico do direito positivo brasileiro e com fundamento na dogmática desenvolvida pelos estudiosos que já se debruçaram sobre o tema anteriormente. Tratou-se, ainda, de uma pesquisa aplicada, porque visou produzir conhecimento para aplicação prática, mas também qualitativa, porque procurou entender a realidade a partir da interpretação e qualificação dos fenômenos estudados; e exploratória, porque buscou proporcionar maior conhecimento sobre a questão proposta, além de ser descritiva, porque visou à obtenção de um resultado puramente descritivo, sem a pretensão de uma análise crítica do tema. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO...................................................................................................... 9 CAPÍTULO I TUTELA ANTECIPATÓRIA................................................................................. 11 1.1 – DEFINIÇÃO................................................................................................. 11 1.2 – CARACTERÍSTICAS DA TUTELA ANTECIPADA E SUAS DIFERENÇAS PARA A TUTELA CAUTELAR ......................................................................... 13 1.3 – PRESSUPOSTOS OU REQUISITOS.......................................................... 15 1.4 – CONTEÚDO DA TUTELA ANTECIPATÓRIA............................................. 18 1.5 - NATUREZA JURÍDICA DO PROVIMENTO ANTECIPATÓRIO................ 19 1.6RESPONSABILIDADE DO BENEFICIADO PELA TUTELA ANTECIPATÓRIA............................................................................................... 19 1.7 – MOMENTO PARA REQUERER A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA............. 19 1.8 – RETRATAÇÃO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA............................... 21 CAPÍTULO II AÇÕES CÍVEIS TIPICAMENTE ELEITORAIS................................................... 23 2.1. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO DE CANDIDATURA............... 23 2.2. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL.................................. 26 2.3. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO................................. 30 8 2.4. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA................................. 33 2.5. REPRESENTAÇÕES............................................................................... 36 CAPÍTULO III TUTELA ANTECIPADA NAS AÇÕES CÍVEIS ELEITORAIS....................................................................................................... 38 CONCLUSÃO...................................................................................................... 50 BIBLIOGRAFIA................................................................................................... 53 9 INTRODUÇÃO O presente trabalho é um estudo sobre o cabimento da antecipação de tutela nas ações cíveis tipicamente eleitorais que visam obstruir ou findar o exercício de mandato eletivo, quer desde o nascedouro, quer quando já diplomado o candidato eleito. Nesse contexto, o trabalho dedica-se, no seu primeiro capítulo, a compreender o que é a Tutela Antecipada; dedica-se, ainda, a identificar, no segundo capítulo, quais são as ações cíveis tipicamente eleitorais que visam obstruir ou findar o exercício de mandato eletivo, quer desde o nascedouro, quer quando já diplomado o candidato eleito, bem como, no seu terceiro capítulo, a identificar também que limitações e obstáculos a Tutela antecipada encontra na legislação eleitoral pertinente às ações cíveis tipicamente eleitorais. O estudo do tema e das questões analisadas em torno do mesmo justifica-se pelo fato de que as normas eleitorais protegem precipuamente a lisura do pleito e não são dirigidas aos eleitores, aos partidos, nem aos candidatos, mas a todos. O Direito Eleitoral se municia de mecanismos para coibir a prática de condutas que possam violar a legitimidade das eleições, pugnando pela moralidade nos pleitos e assegurando a competição livre e igual para todos, "expulsando" do campo do jogo eleitoral aquele que não observou as regras previamente estabelecidas. A moral na política exige combate às diversas formas de corrupção e fraude, o abuso de poder econômico, político ou de autoridade, bem como o uso indevido dos meios de comunicação. Nesse cenário, a análise acerca da possibilidade de utilização do instituto processual civil da antecipação de tutela no processo civil eleitoral é de suma importância, já que a antecipação dos efeitos materiais da sentença de mérito ajudaria a combater a demora no julgamento das ações cíveis tipicamente eleitorais que alijam os candidatos da disputa eleitoral, impedem a sua diplomação ou frustram o exercício do seu mandato eletivo. 10 Na falta de disposição específica nas leis eleitorais acerca da tutela antecipatória, há que se socorrer das normas gerais do Código de Processo Civil. E, para isto, o Direito Processual Civil moderno oferece solução. São as medidas cuja antecipação liminar da tutela jurisdicional pode ser obtida quando estão presentes os requisitos legais para o seu deferimento, cuja base legal é o artigo 273 do referido Código. O exercício do mandato eletivo de um candidato eleito ilicitamente gera situação irreversível, somente reparável pela via da tutela antecipada obstativa. Entre o direito individual da parte (a expectativa do candidato em se registrar, se diplomar, se empossar e exercer o mandato eletivo) e o interesse da comunidade (perigo representado pela posse e exercício do poder de um candidato cuja eleição foi viciada pela corrupção ou abuso do poder), obviamente tem o Judiciário de amparar a coletividade, sendo preferível, evidentemente, se proteger o interesse público. Comprovando-se a verossimilhança da alegação e havendo receio de dano irreparável, é de se conceder a tutela antecipada, nos termos do art.273 do CPC, a fim de impedir, dependendo do momento e da ação cívil eleitoral promovida, o registro, a diplomação, a posse e o posterior exercício do mandato daqueles que obtiveram imoralmente o mandato eletivo, até que seja julgada definitivamente a ação, cumprindo-se, assim, as normas altamente moralizadoras previstas na Constituição-Cidadã de 1988. Visando um trabalho objetivo, cujo objeto de estudo seja bem delineado e especificado, a presente monografia dedica-se, especificamente, na apuração da possibilidade de se aplicar o instituto processual civil tutela antecipada no direito processual civil eleitoral brasileiro. A pesquisa abordou o cabimento da tutela antecipada no processo civil eleitoral brasileiro, à luz do direito processual civil eleitoral atualmente em vigor. A pesquisa não analisou o cabimento da tutela antecipada em todas as ações eleitorais, mas tão somente nas ações cíveis tipicamente eleitorais que visam obstruir ou findar o exercício de mandato eletivo, quer desde o nascedouro, quer quando já diplomado o candidato eleito. 11 CAPÍTULO I TUTELA ANTECIPATÓRIA 1.1 – DEFINIÇÃO Inicialmente, cumpre enfatizar que a pesquisa realizada acerca do instituto da tutela antecipada ficou circunscrita à tutela antecipada genérica, ou seja, àquela prevista no artigo 273 do Código de Processo Civil. Não foi objeto da pesquisa a denominada antecipação de tutela específica, que ocorre nos casos de antecipação de tutela nas obrigações de fazer, não fazer e dar coisa certa e incerta (artigo 461 do Código de Processo Civil). Seguindo linha de vanguarda na atuação perante o Congresso Nacional - que vinha examinando o projeto de reforma do Código de Processo Civil há mais de duas décadas -, magistrados engajados com propostas de reforma do processo civil conseguiram, em setembro de 1994, a aprovação de várias leis processuais, dentre elas a que previu a instituição da antecipação dos efeitos da tutela para o processo comum. Essa previsão foi inovadora para o procedimento comum – ordinário e sumário – do Código de Processo Civil, mas não era absolutamente desconhecida do direito processual brasileiro. Semelhante permissão era há muito prevista para os procedimentos especiais de jurisdição contenciosa, como as ações possessórias de força nova, exemplo típico e sempre utilizado para corroborar a conclusão de que código de processo previa o instituto para determinados conflitos. Com a inclusão da antecipação de tutela no ordenamento jurídico, o requerente passou a ter condições de obter, de imediato, os efeitos materiais que o provimento jurisdicional lhe concederia, em regra, somente ao final da demanda, com o trânsito em julgado da sentença. Conforme será explicado adiante, quando o tempo de espera, ou seja, a demora para obtenção de um provimento jurisdicional definitivo, colocar em 12 risco o próprio direito material em questão, não é adequada à utilização do processo cautelar e, sim, do instituto da tutela antecipada. Como exemplo, podemos citar a hipótese de alguém que, judicialmente, pleiteie a condenação do demandado ao pagamento de tratamento médico que o demandante necessita, com urgência, sob pena de não sobreviver em caso de demora. Neste caso, o dano da demora incidirá sobre o próprio direito material do demandante, razão pela qual a tutela antecipatória é o instituto processual civil a ser utilizado. Não é correto dizer que se pretende a antecipação do próprio provimento, e sim dos efeitos materiais que este provimento iria propiciar. Na verdade, o que se pretende é a antecipação dos efeitos materiais que a sentença de mérito iria produzir no futuro. Não é correto dizer que se pretende a antecipação da própria sentença, do próprio provimento jurisdicional ou do próprio provimento objeto litigioso do processo. Nem é um julgamento antecipado. O que se antecipa são os efeitos materiais de uma futura sentença de mérito. Isto posto, pode-se dizer que a tutela antecipada é a antecipação dos efeitos materiais de uma sentença de mérito, concedida no bojo de um processo de conhecimento, a requerimento da parte, com base em um juízo de verossimilhança (de probabilidade). Então, a tutela antecipada é concedida no bojo de um processo de conhecimento. O que se pretendeu por meio da instituição da antecipação de tutela foi possibilitar ao juiz, dentro do processo de conhecimento, garantir à parte a obtenção imediata daqueles efeitos materiais que somente seriam obtidos ao final da demanda, quando de seu trânsito em julgado. A tutela antecipada deve ser requerida pela parte. Não pode ser concedida de ofício porque versa sobre proteção do direito material. É o interessado quem deve requerer essa proteção do direito material do qual é titular, conforme nos ensina Sérgio Bermudes (“Bermudes, 1995, p. 13): O requerimento de uma tutela antecipada é feito por petição, nos próprios autos do processo, sem a abertura de apenso. Nada obsta a que, na própria inicial, demonstrando os pressupostos do “caput” do inciso I (não do inciso II que, evidentemente, só se verifica diante da resposta ou da conduta 13 protelatória do réu) e do parágrafo 2º do art. 273, o autor requeira, desde logo, a antecipação. O único autor que defendia expressamente a possibilidade de concessão de ofício de antecipação de tutela era Luiz Fux. Segundo o renomado autor, o legislador teria perdido uma grande oportunidade de avançar e permitir que o juiz concedesse a tutela antecipada de ofício, com vistas à proteção do direito material da parte (FUX, 2004, p.57). No entanto, o legislador teria preferido restringir a antecipação de tutela a requerimento dos interessados, conforme explicitado no caput do artigo 273 do Código de Processo Civil, na redação dada pela Lei nº 8.952, de 13/12/1994: Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994) II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. 1.2 – CARACTERÍSTICAS DA TUTELA ANTECIPADA E SUAS DIFERENÇAS PARA A TUTELA CAUTELAR A antecipação de tutela se inclui naquele rol de tutelas diferenciadas, pois ela não segue a regra do procedimento ordinário. O procedimento comum de rito ordinário é o que o nosso Código de Processo Civil estabeleceu como regra. Além do ordinário, temos o rito comum de procedimento sumário. Qualquer outro meio de se obter a tutela jurisdicional que não seja uma dessas espécies de procedimento será chamado de tutela diferenciada. Exemplos: Mandado de segurança, antecipação de tutela, ação cautelar, juizados especiais etc. Nessa linha de raciocínio, João Batista Lopes discorre sobre a tutela diferenciada (Lopes, p.40, 2009): 14 À luz dessas considerações é possível conceituar a tutela jurisdicional diferenciada como o conjunto de instrumentos e modelos para fazer o processo atuar pronta e eficazmente, garantindo a adequada proteção dos direitos segundo os princípios, regras e valores constantes da ordem jurídica. Inicialmente, uma primeira diferença básica entre as tutelas diferenciadas sumárias seria a de que enquanto a cautelar assegura condições para que seja obtido o pedido, ou seja, o bem da vida disputado, a antecipação de tutela adianta os efeitos desse pedido, ou de parte dele. A antecipação de tutela é hipótese de medida provisória, ou seja, sua duração vai até a prolação da sentença. A partir da prolação da sentença, se a sentença for de procedência mantendo a antecipação de tutela, a sentença é que irá absorver a antecipação de tutela e passará a produzir esses efeitos. A tutela antecipatória é, ainda, uma medida satisfativa e limitada (NERY JUNIOR E NERY, 2006, p.453). É considerada limitada porque ela não pode conceder mais do que a própria sentença de mérito concederia. Quanto à satisfatividade, percebe-se que as medidas satisfativas que realizam o direito substancial, concedidas desde logo (em sede de cognição sumária), embora, por regra, devessem ser obtidas por um juízo de certeza (cognição exauriente), tem natureza jurídica de tutela antecipatória e não de tutela cautelar, pois antecipam os efeitos que seriam produzidos quando da prestação jurisdicional definitiva. Podemos dizer, então, que a satisfatividade, por ser uma das características mais típicas ou próprias da tutela antecipatória, é requisito negativo da tutela jurisdicional de índole cautelar. Nesse sentido, cabe lembrar os ensinamentos de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (MARINONI E ARENHART, 2008, p.200): A distinção entre tutela antecipatória e a tutela cautelar é evidente. Cabe advertir foi introduzida no Código de Processo Civil justamente pela razão de que a doutrina e a jurisprudência anteriores ao ano de 1994 não admitiam que o autor pudesse obter a satisfação de seu direito mediante a ação cautelar, que nessa perspectiva seria usada como técnica de antecipação de tutela que deveria ser prestada pelo processo de conhecimento ou pelo processo de execução. Melhor explicando: como a prática forense evidenciou a necessidade de uma tutela mais célere, e assim da “antecipação da tutela”, e essa “antecipação” – segundo a jurisprudência – não podia ser obtida por meio da ação cautelar, o legislador corrigiu o Código de Processo Civil para viabilizar 15 tutela tempestiva e efetiva nos casos de “fundado receio de dano” e “abuso do direito de defesa”, nele inserindo o art. 273. Já a tutela cautelar é o provimento jurisdicional concedido, via de regra, em processo cautelar (pode ser concedido em processo de conhecimento ou de execução, conforme o § 7º do artigo 273 do Código de Processo Civil, reproduzido logo a seguir), capaz de assegurar a efetividade de uma futura atuação jurisdicional definitiva: Art. 273, § 7º - Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. Dessa forma, constata-se que a medida cautelar não satisfaz o direito substancial do demandante, apenas assegura sua futura satisfação. Nesse contexto, vale a pena transcrever a definição de medida cautelar de Humberto Theodoro Júnior (THEODORO, 1997, p.362/363): Medida cautelar é a providência concreta tomada pelo órgão judicial para eliminar uma situação de perigo para direito ou interesse do litigante, mediante a conservação do estado de fato ou de direito que envolve as partes, durante todo o tempo necessário para o desenvolvimento do processo principal. Isto é, durante todo tempo necessário para definição do direito no processo de conhecimento ou para realização coativa do direito do credor sobre o patrimônio do devedor no processo de execução. Dado o exposto, conclui-se que, quando o tempo de duração do processo gerar um perigo para o próprio direito material, não será adequada a utilização do processo cautelar, mas sim do instituto da tutela antecipatória. 1.3 – PRESSUPOSTOS OU REQUISITOS Antes da apresentação dos requisitos propriamente ditos, cabe ressaltar que há, segundo Teori Albino Zavasck, premissas de natureza constitucional a prestigiar os efeitos da tutela antecipada, a saber, (ZAVASCK, 2006, p.395): a) o princípio da necessidade, segundo o qual a "regra de solução (que é limitadora de direito fundamental) somente será legítima quando for real o conflito, ou seja, quando efetivamente 16 não for possível estabelecer um modo de convivência simultânea dos direitos fundamentais sob tensão"; b) o princípio da "menor restrição possível ou da proibição de excessos, associado ao da proporcionalidade, segundo o qual a restrição a direito fundamental, operada pela regra de solução, não poderá ir além do limite mínimo indispensável à harmonização pretendida"; c) o princípio da "salvaguarda do núcleo essencial, segundo o qual não é legítima a regra de solução, que a pretexto de harmonizar a convivência entre direitos fundamentais, opera a eliminação de um deles, ou lhe retira a sua substância elementar"; d) o princípio da segurança jurídica; e) o princípio da necessidade que não permite o abuso de direito. Como requisitos a serem observados para que haja a tutela antecipatória, é necessária a verificação de: A) existência de prova inequívoca que convença o juiz da verossimilhança da alegação, com fulcro no caput do art. 273 do Código de Processo Civil: O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: O termo “prova inequívoca” pode conduzir à idéia de que a prova deve induzir um grau de segurança tal ao juiz que implicaria quase um juízo de certeza da alegação, quando a lei exige apenas a verossimilhança. Todavia, segundo José Eduardo Carreira Alvim (ALVIM, 1995, p. 164): Prova inequívoca é aquela que leva o juiz a se convencer em um determinado sentido, ou seja, ela não pode deixar dúvidas acerca da autenticidade ou veracidade da alegação. Logo, é uma prova que não deixa dúvidas em relação a qual das partes irá se beneficiar. 17 Com relação ao termo “verossimilhança”, percebe-se que uma alegação pode ser possível (é aquilo que pode ser verdade), verossímil (é aquilo que tem a aparência de verdade) e provável (é aquilo que pode ser provado como verdade). Como o art. 273 do Código de Processo Civil estabelece a possibilidade de concessão de antecipação de tutela pautada na verossimilhança da alegação, exigindo, porém, sua demonstração através de uma prova inequívoca que convença o juízo, é possível verificar que, na verdade, o que pode ser provado como verdadeiro não é verossímil, mas sim provável. A antecipação de tutela é concedida com base no juízo de probabilidade, e não em um juízo de verossimilhança, como dispõe o artigo 273, caput, do Código de Processo Civil (CÂMARA, 2006, p.458). Isto porque aquele fato, ou aquela alegação, podem ser provados como verdadeiros, o que caracteriza a probabilidade exigida para a concessão da antecipação dos efeitos da tutela. B) requisito alternativo – fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (tutela antecipada de segurança, tutela antecipada protetiva – inciso I do artigo 273 do Código de Processo Civil) ; abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório (tutela antecipada de evidência ou punitiva – inciso II do artigo acima referido): I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. No caso do inciso I, a tutela antecipada é concedida em casos de urgência, quando além de a prova convencer o juiz da verossimilhança da alegação, há fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Ela pode ser concedida desde o início do processo sem problema algum. No caso do inciso II, a tutela antecipada não pode ser concedida não pode ser pleiteada no início do processo. Somente poderia ser concedida após a contestação, porque somente após tal contestação ficaria caracterizado o abuso do direito de defesa pelo réu ou o manifesto propósito protelatório dele. 18 C) Requisito negativo – irreversibilidade do provimento antecipatória, com fulcro no art. 273, § 2º do Código de Processo Civil: Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. Entretanto, há determinados casos em que irá ocorrer a irreversibilidade recíproca, ou seja, se porventura a antecipação de tutela for concedida, a situação se tornará irreversível para o réu ; se porventura ela for negada, ela se tornará irreversível para o autor (CÂMARA, 2006, p.462). Nesses casos, o juiz fica numa situação em que tanto a concessão da tutela quanto a sua não concessão ocasionarão a irreversibilidade do provimento para uma das partes. 1.4 - CONTEÚDO DA TUTELA ANTECIPATÓRIA Com relação ao conteúdo de uma antecipação de tutela, vale dizer, em qual tipo de provimento judicial teria cabimento a utilização da tutela antecipada, Athos Gusmão Carneiro nos esclarece que (CARNEIRO, 2002, p.42): Qualquer provimento (condenatório, mandamental, executivo lato sensu, declaratório e constitutivo) jurisdicional possibilita a utilização do instituto processual civil da tutela antecipatória, porque, na verdade, há de se fazer a distinção entre a antecipação do provimento (que não é cabível) e antecipação dos efeitos materiais da sentença de mérito que se está pleiteando (que é cabível). Cabe fazer a pequena ressalva de que, nas sentenças mandamentais e executivas latu sensu, deve-se utilizar o artigo 461, §3º, do Código de Processo Civil, que é expresso no sentido da possibilidade da efetivação da tutela antecipada específica, que não foi objeto desta pesquisa, naquelas espécies de provimento: Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada. 19 1.5 - NATUREZA JURÍDICA DO PROVIMENTO ANTECIPATÓRIO Quanto a natureza jurídica do provimento antecipatório, há grande divergência doutrinária. Para Olvídio Araújo Batista da Silva (SILVA, 2001, p.135-140) e Teori Albino Zavascky (ZAVASCKI, 1997, p.99), trata-se de um título executivo. Para Luiz Guilherme Marinoni, apesar deste provimento possuir intrínseca executividade, não se trata de um título executivo (MARINONI, 2008, p.207/210). Por definição, o título executivo é aquele oriundo de uma sentença condenatória e que vai, obrigatoriamente, precisar de um processo de execução,o que não ocorre na efetivação do provimento antecipatório. E, por fim, segundo Marcelo Abelha Rodrigues, Luiz Fux e Gisele Santos Fernandes Góes, o provimento que antecipa os efeitos da tutela é uma decisão interlocutória de eficácia mandamental ou executiva lato sensu (RODRIGUES, 2003, p.203; FUX, 2004, p.64) ; GÓES, 2006, p.284). 1.6- RESPONSABILIDADE DO BENEFICIADO PELA TUTELA ANTECIPATÓRIA Considerando que a tutela antecipatória é concedida por meio de uma decisão interlocutória, podemos dizer que se ao final do processo for proferida sentença de improcedência, a antecipação concedida será cassada. Surge então a questão de saber se aquele que se beneficiou da antecipação de tutela responde por prejuízos ou danos causados a outra parte. Neste ponto, é importante recordar que a antecipação da tutela não pode ser concedida de ofício, somente a pedido. Há quem entenda, de forma isolada, que o beneficiado pela tutela antecipatória não pode ser condenado por perdas e danos quando ele se utilizou de medida legalmente prevista (SILVA, 2001, p.145). Entretanto, a melhor solução é ditada por Athos Gusmão Carneiro (CARNEIRO, 2002, p.42): Aquele que se beneficiou da concessão da tutela antecipada responde pelas perdas e danos que a medida ocasionar à outra parte, pois a responsabilidade é objetiva. Devese concatenar o artigo 475-O, com o artigo 811, ambos do Código de Processo Civil, que trata do procedimento cautelar. 1.7 – MOMENTO PARA REQUERER A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA A regra é a de que o pedido de antecipação de tutela seja formulado quando da petição inicial, mas na verdade este requerimento pode ser feito a qualquer momento no curso do processo. A antecipação de tutela pode ser concedida inclusive depois da instrução. 20 A antecipação de tutela pode ser concedida, inclusive, na própria sentença, até mesmo porque, segundo o art. 273, §5º, do Código de Processo Civil, o juiz poderá reexaminar a antecipação de tutela eventualmente concedida quando da prolação do mérito da causa: Concedida ou não a antecipação prosseguirá o processo até final julgamento. da tutela, O recurso cabível em face da tutela antecipada concedida na sentença seria a apelação. Nesse sentido, Nélson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery (NERY JÚNIOR e NERY, 2006, p.457): A sentença recorrida estaria “confirmando” a antecipação dos efeitos da tutela, o que caracterizaria a hipótese de apelação recebida sem efeito suspensivo, conforme previsto no artigo 520, inciso VII, do Código de Processo Civil. Art. 520 - A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo. Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que: VII - confirmar a antecipação dos efeitos da tutela. Sem o efeito suspensivo, para se impedir a produção imediata dos efeitos da tutela antecipatória concedida na sentença seria necessário pleitear a atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação, através de agravo de instrumento (artigo 522, caput, do Código de Processo Civil) ou por pedido formulado ao relator do recurso interposto, com base no art. 558 do referido Código: Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação,bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento. Art. 558. O relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara. 21 Parágrafo único - Aplicar-se-á o disposto neste artigo as hipóteses do art. 520. É possível também a concessão de tutela antecipatória após proferida a sentença. Pode ocorrer tanto no caso da antecipação de tutela recursal (quando o próprio Tribunal defere a antecipação de tutela), prevista no artigo 527, III, do Código de Processo Civil, como também, quando o próprio juiz de 1º grau de jurisdição, em sede de embargos de declaração opostos em face de sentença já proferida, venha a deferir a tutela antecipatória quando, por motivo de obscuridade, contradição ou omissão, o juiz não tenha se manifestado sobre esse pedido de tutela antecipatória, embora esta já tivesse sido requerida antes: Art. 527 - Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator: III - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão. 1.8 – RETRATAÇÃO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA A retratação da antecipação de tutela pode ser feita pelo juiz de ofício, sempre que ocorra alguma alteração das circunstâncias de fato que propiciaram a concessão da antecipação de tutela. Se as circunstâncias não se alterarem, o juiz não pode se retratar de ofício. Pode ocorrer a situação do juiz de 1º grau de jurisdição negar a tutela antecipatória, a parte agrava esta decisão e o Tribunal, ao julgar o agravo de instrumento, concede a antecipação de tutela recursal. Posteriormente, é proferida sentença de mérito do juiz de 1º grau. Nesse caso, segundo Athos Gusmão de Carneiro (CARNEIRO, 2002, p.106): A sentença de mérito proferida pelo juiz de 1º grau revoga a decisão do Tribunal que concedeu a antecipação de tutela recursal, pois a sentença é baseada em juízo de certeza, diga-se, cognição exauriente, ao passo que a outra decisão, a despeito de ser de um Tribunal, é baseada em juízo de verossimilhança (probabilidade). Pode ocorrer, ainda, que o juiz indefere a tutela antecipada e o Tribunal a concede em sede de agravo. Após, ocorrem circunstâncias modificativas da 22 situação processual no âmbito do 1º grau. Segundo Athos Gusmão Carneiro, o juiz de 1º grau pode revogar a antecipação de tutela concedida pelo Tribunal, alegando modificação nas circunstâncias de fato da causa (CARNEIRO, 2002, p.106). Por fim, quando a sentença é de improcedência, ela automaticamente revoga a tutela antecipada previamente deferida, salvo se o juiz, apesar de prolatar a sentença de improcedência, mantém a antecipação de tutela antes concedida. Tal situação deve estar expressa na sentença, com fulcro no artigo 520, VII, do Código de Processo Civil: Art. 520 - A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo. Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que: VII - confirmar a antecipação dos efeitos da tutela. 23 CAPÍTULO II AÇÕES CÍVEIS TIPICAMENTE ELEITORAIS A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabelece, em seu artigo 14, os pré-requisitos para candidaturas a cargos eletivos elegibilidade, como a nacionalidade brasileira, pleno exercício dos direitos políticos, alistamento eleitoral, domicílio eleitoral na circunscrição, filiação partidária e idade mínima, dependendo do cargo concorrido. Foi mais além a Constituição, ao trazer também expressamente neste artigo causas de inelegibilidade, incluindo os inalistáveis - estrangeiros e conscritos - e os analfabetos. Traz ainda outros casos e estabelece que lei complementar poderá ampliar o rol de inelegibilidade, estando hoje regulado pela Lei Complementar 64/90, com alterações posteriores. Desta forma, tem restringida a capacidade eleitoral passiva - ser votado: I - candidatos que incidam inelegibilidade presente na Carta Magna ou na Lei Complementar nº 64/90; II - candidatos assim declarados pela Justiça Eleitoral, com trânsito em julgado, com procedência de representação por abuso do poder econômico ou de autoridade ou utilização indevida de veículos ou meios comunicação social; III - Chefes do Executivo, sucessores e substitutos, para mais de um período subseqüente, dentre outras causas. Dentro desse contexto, existem cinco ações, próprias do arcabouço jurídico eleitoral, para que a Justiça Eleitoral possa conhecer e decidir as argüições de inelegibilidade ou falta de condição de elegibilidade. 2.1. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO DE CANDIDATURA Essa ação tem por objetivo inviabilizar o registro da candidatura de pessoa inelegível ou que não reúna as condições de elegibilidade ou que não tenha se desincompatibilizado nos prazos previstos por lei. 24 São três, portanto, os fundamentos dessa ação: 1- o não preenchimento das condições de elegibilidade; 2- estar o indivíduo impedido de candidatar-se por incorrer numa das regras de inelegibilidade; ou 3- estar o indivíduo impedido de candidatar-se por não ter se desincompatibilizado de cargo, emprego ou função pública ou privada, conforme determina a lei complementar nº 64/90. A existência de apenas um desses fundamentos é suficiente para impugnar uma candidatura, impedindo a homologação judicial da inscrição de um candidato no pleito eleitoral, de modo que o impugnado não obtenha o registro de sua candidatura, sem o qual não pode concorrer. Com relação ao escopo desta ação, vale a pena lembrar aqui dos ensinamentos de José Joel Cândido (CÂNDIDO, 2005, p.135): O objetivo dessa impugnação, que tem a natureza jurídica de uma verdadeira ação judicial, é impedir o deferimento do registro de candidatura do impugnado. Se o candidato já havia obtido o registro, a procedência definitiva da impugnação cancelará esse registro e, ainda, se o impugnado já estiver diplomado quando vier o trânsito em julgado da ação procedente, se declarará nula a diplomação, a eleição e o registro, impossibilitando o início ou a continuidade do exercício do mandato, conforme o art. 15 da Lei Complementar nº 64/90. Esta ação tem existência num certo momento do processo eleitoral, que se inicia nos cinco primeiros dias da publicação do pedido de registro (05 de julho ou, quando feito pelo candidato que estava na convenção, é 07 de julho) e se encerra, até 5 dias da publicação dos editais dos candidatos inscritos (a publicação é feita no Cartório Eleitoral, para as eleições municipais e no Diário Oficial da União, para as eleições nacionais). A ação de impugnação de registro de candidato está prevista no art. 97 do Código Eleitoral e no art. 3º da lei complementar nº 64/90 (a lei das inelegibilidades). Vale, atualmente, as disposições da lei complementar, por ser lei posterior. O Código Eleitoral aplica-se subsidiariamente, no que for preciso, para viabilizar o procedimento: Artigo 3º - Caberá a qualquer candidato, a partido político, coligação ou ao Ministério Público, no prazo de 5 (cinco) dias, contados da publicação do pedido de registro de candidato, impugná-lo em petição fundamentada. 25 O Professor Marcos Ramayana, de forma lapidar, dá a base legal dessa ação (RAMAYANA, 2005, p. 172): Os arts. 3º a 17 da Lei Complementar nº 64/90 (Lei das Inelegibilidades), disciplinam a ação de impugnação de registro de candidatos. Para cada eleição, o Tribunal Superior Eleitoral expede uma resolução referente ao registro de candidatos que forma o arcabouço normativo. Registrem-se, ainda, os arts. 10 a 16 da Lei 9.504/97 (Lei das Eleições), que tratam do registro de candidatos, e os arts. 82 a 102 do Código Eleitoral. Marcos Ramayana. Direito Eleitoral. 4ª edição. Rio de Janeiro: Impetus, 2005, pág. 172. Essa ação pode ter como objeto, matéria constitucional ou infraconstitucional. As matérias que são levadas como causa de pedir nessas impugnações, às vezes, trazem em si, dentro de seu contexto, uma natureza constitucional e quando a matéria tratada é constitucional não incide o instituto da preclusão numa eventual deflagração futura. Então, se versar sobre matéria constitucional, a exemplo do domicílio eleitoral, não preclui. Se houver perdido o prazo da ação e o candidato venceu a eleição, é possível ajuizar a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo ou o Recurso contra a Diplomação. Já se tratar a ação de impugnação de registro de candidatura de exigência infraconstitucional, a exemplo de rejeição de contas ou transferência do domicílio eleitoral - art. 55 do Código Eleitoral, preclusa está a matéria. Até a fase de diplomação, existe efeito suspensivo - conforme aplicação parcial do art. 15 da Lei Complementar nº 64/90: Art. 15. Transitada em julgado a decisão que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se já expedido. Com o efeito suspensivo, o candidato participa da propaganda eleitoral normalmente, tem seu nome incluído na urna de votação, etc., ou seja, o candidato concorre por sua conta e risco. Concorre porque seria irreversível o contrário; se fosse inocente, não teria como voltar à eleição. Assim, até a fase de diplomação, a impugnação da candidatura tem efeito suspensivo. 26 Da diplomação em diante, porém, deverá o candidato eleito aguardar o julgamento do "lado de fora", não assumindo o cargo eletivo. Os votos ficam "guardados" - são nulos, para todos os efeitos, os votos dados a ele, até a decisão final (101, §3º, Código Eleitoral): §3º Considerar-se-á nulo o voto dado ao candidato que haja pedido o cancelamento de sua inscrição salvo na hipótese prevista no parágrafo anterior, in fine. 2.2. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL A Ação de investigação judicial eleitoral tem sua previsão no art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição Federal, disposições essas regulamentadas pela Lei Complementar nº 64/1990 (Lei de Inelegibilidades). Essa ação está prevista nos artigos 19 e 22 da referida Lei, tendo por objeto a exclusão da disputa eleitoral, através da sanção da inelegibilidade, de candidatos e de pessoas que tenham contribuído ou beneficiado àqueles na prática de atos potencialmente lesivos à normalidade e igualdade de um pleito eleitoral, consubstanciados em práticas de abuso, desvio ou uso indevido de poder econômico e político, constituindo-se em instrumento eficaz para a fundamentação de recurso contra a diplomação ou de ação de impugnação de mandato eletivo e buscando oferecer aos envolvidos no processo eleitoral, condições de normalidade e legitimidade das eleições e proteção do interesse público que consiste na lisura do pleito: Art. 19. As transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, abuso do poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de voto, serão apuradas mediante investigações jurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais. Parágrafo único. A apuração e a punição das transgressões mencionadas no caput deste artigo terão o objetivo de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Art. 22 - caput - Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à 27 Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: Logo, conforme o artigo 19 da Lei Complementar n.º 64/90, é cabível a instauração dessa ação nas seguintes hipóteses: - transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários e abuso do poder econômico ou político em detrimento da liberdade do voto. Já o artigo 22, do mesmo diploma legal, estende a possibilidade do ajuizamento dessa ação aos seguintes casos: - desvio ou abuso do poder de autoridade; - utilização indevida de veículos; - e utilização indevida dos meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político. Se a ação de investigação judicial eleitoral for julgada após as eleições e o candidato não vencer, ou desistir da candidatura, a ação não perde o objeto, porque ainda persistirá a aplicação de multa. Para esta ação surtir o efeito de inelegibilidade, tem que ser julgada antes das eleições, segundo o art. 22, XIV, da LC 64/90. Se for julgada após as eleições, será necessário o ajuizamento de Recurso contra a diplomação (com prova pré-constituída) ou Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (sem prova pré-constituída). Nesse sentido, nos ensina Pedro Decomain (DECOMAIN, 2001, p.71): Se a representação judicial para apuração de abuso do poder econômico ou político, ou também de uso indevido de veículos ou meios de comunicação, for julgada procedente, entendendo-se provado o abuso do poder econômico ou de autoridade, ou o uso indevido de veículo ou meio de comunicação em benefício de candidato, partido ou coligação, o registro do candidato beneficiado será cancelado. Se a representação for julgada procedente depois da eleição, será remetida cópia da decisão ao Ministério Público, para a interposição de recurso contra a diplomação, previsto pelo art. 262, inciso I, do Código Eleitoral, ou para propositura da ação de impugnação de mandato eletivo, com sede nos §§ 10 e 11, do art. 14, da própria Constituição Federal. Essas as regras dos incisos XIV e XV, do art. 22 da LC n. 64/1990. Delas se conclui que apenas a decisão de procedência da representação por abuso do poder econômico ou de autoridade, ou por uso indevido de meio ou veículo de comunicação, não acarreta anulação da eleição do candidato beneficiado, quando esta já tenha ocorrido, nem permite cassação 28 de seu mandato, se já tiver havido diplomação. Somente através da interposição do recurso contra diplomação, ou da propositura da ação de impugnação de mandato eletivo, é que poderão ser alcançados tais resultados. O instrumento processual utilizado é a Representação, desencadeando o procedimento denominado de investigação judicial eleitoral, de rito sumário, estabelecido no art. 22 da Lei Complementar nº 64/90, assegurado o contraditório e a ampla defesa, ocasionando ao final, se constatada a prática de atos potencialmente lesivos e tendentes a afetar a igualdade do pleito eleitoral, a declaração de inelegibilidade do candidato beneficiado e de todos quantos com este tenham contribuído. Segundo os ensinamentos de Fávila Ribeiro (RIBEIRO, 1993, p.108 e 109): Em essência o direito de representação é uma forma de exteriorização da liberdade política, estabelecendo peculiar relacionamento na vida pública, estando assegurado a qualquer pessoa utilizar a faculdade cívica de dirigir-se aos poderes públicos, de um modo geral, para imputar práticas abusivas perpetradas nos serviços públicos, ou que neles tenham repercussão. A ação de investigação judicial eleitoral é um procedimento administrativo eleitoral que tem curso perante a Corregedoria-Geral (será julgada pelo Tribunal Superior Eleitoral), nas eleições presidenciais; perante as Corregedorias Regionais (será julgada pelos Tribunais Regionais Eleitorais), nas eleições gerais (nos Tribunais, o relator é o Corregedor-Geral ou Regional Eleitoral, com poderes para quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico, desde que autorizado por lei) e perante os Juízes Eleitorais, nas eleições municipais. Não obstante isso, tem esse tipo de ação natureza investigatória, uma vez que atua como instrumento para apuração de infrações e crimes eleitorais. Apresenta ainda natureza jurisdicional de caráter constitutivo, quando impõe a algum candidato ou colaborador a cassação do registro, do mandato ou do diploma eleitoral, e declaratório, quando declara a inelegibilidade de algum dos candidatos ou colaborador. Derradeiramente, assume a ação de investigação judicial eleitoral natureza de medida preparatória para a ação de impugnação de mandato eletivo ou de recurso contra a diplomação, nas hipóteses em que a decisão for proferida 29 após as eleições, segundo estabelece o preceito constitucional inserido no art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição Federal: § 10 - O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. § 11 - A ação de impugnação de mandato tramitará em segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se temerária ou de manifesta má-fé. Essa ação como efeito declarar a inelegibilidade do requerido e de quem contribuiu com ele, por 3 anos (é ex tunc, retroage à data dos fatos), além de multa. Pelo descumprimento do art. 41-A (captação de sufrágio - doar, oferecer, prometer, entregar ao eleitor, para obter o voto, bem ou vantagem, como emprego ou função pública) da Lei nº 9504/97 não pode ser ajuizada esta ação, porque foi acrescentada por lei ordinária (Lei nº 9840/99) e não por lei complementar, que permite a inelegibilidade. Portanto, para declarar inelegibilidade, apenas por previsão em lei complementar, conforme expressa previsão da Carta Magna, no § 9º do seu artigo 14: § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. Tem como marco inicial o pedido de registro da candidatura e final, a diplomação. O objeto desta ação - abuso do poder econômico - pode até ser anterior ao registro da candidatura, desde que interposta a ação no período citado. Nesse sentido, cabe lembrar aqui o magistério de Adriano Soares da Costa (COSTA, 2002, p. 522): "Se houver, por exemplo, a utilização indevida de propaganda publicitária da administração pública, antes do período próprio para o registro de candidatura, com a finalidade de beneficiar a pessoa que viria a ser, posteriormente, escolhida como candidato do partido do governo, há abuso de poder político, passível de ser atacado por AIRC. Os fatos ocorreram antes das convenções partidárias, mas podem ser objeto da ação de impugnação de registro de candidato, pois 30 beneficiaram indevidamente o futuro candidato da situação, em detrimento da liberdade do voto. Os fatos ocorreram antes do registro de candidato; a AIJE apenas após o registro poderia ser ajuizada, pois se o beneficiado não conseguir ser indicado em convenção partidária, benefício algum obteve, pois nem sequer concorreu a cargo eletivo. Logo, a AIJE não poderá abarcar tais fatos, por serem tratados como matéria infraconstitucional, preclusa após o registro da candidatura. Ora, os não-candidatos, que podem figurar no pólo passivo da AIJE, são aqueles que beneficiaram o candidato (após o seu pedido de registro), formando com ele um litisconsórcio necessário não-unitário. O abuso de poder econômico e abuso de poder político são hipóteses causadoras de inelegibilidade, e como tais previstas na Lei Complementar 64/90. Destarte, se ocorrerem antes do registro, e não forem suscitadas quando da AIRC (Ação de Impugnação de Registro de Candidatura), precluirá a faculdade de vergastá-las por meio de AIJE, eis que não são causa de inelegibilidades decorrentes de preceito constitucional. Desse modo, cremos que a AIJE pode ser ajuizada em qualquer tempo, desde que entre o registro de candidato e a diplomação. Nem antes, nem depois. 2.3. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO É uma ação verdadeiramente constitucional eleitoral, extraindo dos parágrafos 10 e 11, da Constituição, sua essência jurígena, sua razão de existir, sua fonte primária e seus genéricos balizamentos legais, tais como prazo, termo a quo de ajuizamento e hipóteses de cabimento: § 10. O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. § 11. A ação de impugnação de mandato tramitará em segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se temerária ou de manifesta má-fé. Nesse sentido, adverte José Antônio Fichtner que (FICHTNER, 1998, p.12): Por ser norma constitucional, ela é que estabelece os parâmetros que irão balizar a aplicação do instituto, transferindose às regras infraconstitucionais o preenchimento que for necessário dos espaços deixados pelo texto constitucional com a finalidade de tornar o instituto mais eficaz e efetivo. É uma ação de direito constitucional eleitoral, cuja tutela reside na defesa dos direitos públicos políticos subjetivos ativos, protegendo-se as eleições contra a influência direta ou indireta dos abusos econômicos, corrupção e fraudes. 31 O abuso de poder exclusivamente político não é suficiente para ensejar o ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo, conforme recente jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. § 10 DO ARTIGO 14 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL: CAUSAS ENSEJADORAS. 1. O abuso de poder exclusivamente político não dá ensejo ao ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo (§ 10 do artigo 14 da Constituição Federal). 2. Se o abuso de poder político consistir em conduta configuradora de abuso de poder econômico ou corrupção (entendida essa no sentido coloquial e não tecnicamente penal), é possível o manejo da ação de impugnação de mandato eletivo. 3. Há abuso de poder econômico ou corrupção na utilização de empresa concessionária de serviço público para o transporte de eleitores, a título gratuito, em benefício de determinada campanha eleitoral. Recurso desprovido. (TSE, Respe nº 28.040, Ac. nº 28.040, de 22/04/2008, Rel. Min. Carlos Ayres Britto) A ação de impugnação de mandato eletivo é um instrumento jurídico previsto na Constituição para a cassação de mandato eletivo obtido por meio de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude. Como a ação visa impugnar mandato eletivo, ou seja, cassar uma manifestação de vontade do eleitor, a gravidade do fato que ensejar a ação deve estar alicerçada em indícios ou provas da prática de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude. Em outras palavras, as provas necessariamente devem ser suficientemente convincentes, cabais e de idoneidade inegável. Então, não precisa ter prova pré-constituída, ou seja, permite-se dilação probatória. Ajuizando essa ação, pode-se efetuar a produção de provas depois, como a oitiva de testemunhas. O procedimento é o Rito Sumário Eleitoral, ou seja, o previsto no artigo 3º da Lei Complementar nº 64/90, o mesmo rito da Ação de impugnação de Registro de Candidatura, de acordo o atual entendimento do Tribunal Superior Eleitoral: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. NULIDADE. VOTOS. CANDIDATO QUE DEU CAUSA. INTERESSE DE AGIR. AUSÊNCIA. POTENCIALIDADE DA CONDUTA. REEXAME. SÚMULAS NOS 7/STJ E 279/STF. ACOLHIMENTO SEM EFEITOS MODIFICATIVOS. 32 1. Na espécie, descabe falar em omissão do v. acórdão no tocante à aplicação do procedimento previsto na Lei Complementar nº 64/90. Tanto a captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei das Eleições), afastada pela e. Corte Regional, quanto o abuso de poder econômico, em sede de AIME (art.14, § 10, da CR), ensejador, in casu, da cassação do mandato, obedecem ao rito aplicado pelo juízo eleitoral e previsto na Lei Complementar nº 64/90. 2. No caso de abuso de poder, em sede de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), prevista no art. 14, § 10, da CR, a utilização do procedimento da Lei Complementar nº 64/90 impõe-se por construção jurisprudencial (Respe 25.443, Rel. e. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 10.3.2006; Respe nº 25.986/RR, Rel. e. Min. José Delgado, DJ de 27.10.2006). (TSE, ERespe nº 28.391, Ac. nº 28.391, de 05/06/2008, Rel. Min. Felix Fischer) Será competente para conhecer e julgar a ação o mesmo órgão jurisdicional que tiver competência para registrar e diplomar o réu. E, ainda, os legitimados para ajuizar a ação de impugnação de mandato eletivo são Ministério Público, partidos políticos e coligações, e os candidatos. Adriano Soares da Costa, elenca, ainda, o eleitor, sustentando que a Constituição da República, ao contemplá-la, não enumerou os legitimados, não cabendo, portanto, uma exegese restritiva infraconstitucional (COSTA,1998, p.328). Mister se faz destacar que o prazo de 15 dias, contados da diplomação, para ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo é decadencial e o seu ajuizamento extemporâneo acarreta a perda do direito de impugnar o mandato almejado. Esta ação exige potencialidade do dano, sendo instrumento de proteção das eleições e não do eleitor e, uma vez julgada procedente, eventual recurso interposto não terá efeito suspensivo, sendo que o eleito fica do "lado de fora", não podendo assumir o cargo, até decisão final. Logo, não há que se falar na incidência dos artigos 216 (este só poderá ser aplicado em caso de recurso contra a expedição de diploma, mas não em sede de ação de impugnação de mandato eletivo) e 224 do Código Eleitoral (essa ação é dirigida contra o mandato, não tendo por objeto a nulidade do pleito), incidindo apenas o artigo 257 do referido Código, segundo a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: Medida cautelar. Agravo regimental. Ação de impugnação de mandato eletivo. Art. 14, § 10, da Constituição 33 Federal. Abuso do poder econômico, fraude e corrupção eleitoral. Execução do julgado. Diplomação do segundo colocado. Ausência de trânsito em julgado. Aplicação do art. 216 do Código Eleitoral. Impossibilidade. 1. Nos casos em que esta Corte já se manifestou em ação de impugnação de mandato eletivo, mantendo decisão que determinou a cassação do mandato, não há se falar em óbice à execução por força do art. 216 do CE. Incidência do art. 257 do CE. (TSE, AMC n.º 1.272, Ac. n.º 1.272, de 12.8.2003, Rel. Min. Fernando Neves) MEDIDA CAUTELAR PARA DAR EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CABIMENTO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. RECURSO ESPECIAL RECEBIDO. NÃOINCIDÊNCIA DOS ARTS. 224 E 216 DO CÓDIGO ELEITORAL. PRECEDENTES. Não incide o art. 224 do Código Eleitoral em ação de impugnação de mandato eletivo. Essa ação é dirigida contra o mandato, não tendo por objeto a nulidade do pleito. Precedentes: Ac. n.º 21.176/AL, rel. Min. Carlos Velloso, DJ 15.8.2003, página 124; Ac. n.º 1.277/SP, rel. Min. Fernando Neves, DJ 12.9.2003, página 121; Ac. n.º 15.891/BA, rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 17.12.99, página 171; Ac. n.º 3.030/PB, rel. Min. Luiz Carlos Madeira, DJ 6.9.2002, página 206; Ac. n.º 3.032/PB, rel. Min. Luiz Carlos Madeira, DJ 22.11.2002. O art. 216 do Código Eleitoral tem seu âmbito de incidência restrito às hipóteses de recurso contra expedição de diploma. Não se aplica aos casos de ação de impugnação de mandato eletivo. Precedentes: Ac. n.º 1.277/SP, rel. Min. Fernando Neves, DJ 12.9.2003; Ac. n.º 1.049/PB, rel. desig. Min. Fernando Neves, DJ 6.9.2002; Ac. n.º 19.895/SC, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 28.2.2003. Procedente a ação no juízo eleitoral e no Tribunal Regional, caracterizado o periculum in mora e o fumus boni iuris, defere-se o pedido liminar, determinando-se o afastamento dos requeridos dos cargos de prefeito e viceprefeito e a diplomação e posse dos segundos colocados. (TSE, MC n.º 1.320, Ac. n.º 1.320, de 19/2/2004, Rel. Min. Luiz Carlos Madeira). 2.4. RECURSO CONTRA A DIPLOMAÇÃO OU EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA Além dos recursos previstos na legislação civil, o Código Eleitoral traz uma espécie sui generis: o Recurso Contra Expedição de Diploma, instrumento hábil à desconstituição dos diplomas expedidos pela Justiça Eleitoral, sendo cabível em razão de inelegibilidade, erros no cálculo do quociente eleitoral e partidário, dentre outras hipóteses previstas no art. 262 do Código Eleitoral: 34 Art. 262. O recurso contra expedição de diploma caberá somente nos seguintes casos: I - inelegibilidade ou incompatibilidade de candidato; II - errônea interpretação da lei quanto à aplicação do sistema de representação proporcional ; III - erro de direito ou de fato na apuração final, quanto à determinação do quociente eleitoral ou partidário, contagem de votos e classificação de candidato, ou a sua contemplação sob determinada legenda; IV - concessão ou denegação do diploma em manifesta contradição com a prova dos autos, nas hipóteses do art. 222 desta Lei, e do art. 41-A da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997. Na eleição municipal, o juiz eleitoral processa o recurso, mas o julgamento é perante o Tribunal Regional Eleitoral; na geral, quem processa é o Tribunal Regional Eleitoral e o Tribunal Superior Eleitoral profere julgamento. Não existe Recurso contra a diplomação na eleição presidencial. Apesar do nome, o recurso tem natureza de ação e deve ser interposto num prazo de três dias após a diplomação do candidato. É importante destacar o fato de ser o ato da diplomação um pré-requisito da efetiva prestação jurisdicional eleitoral. Nesse sentida, ensina Marcos Ramayana (RAMAYANA, 2006, p.439): Na verdade, é a diplomação um pressuposto processual de existência válida para a admissão de viabilidade do exercício do direito de ação, ou ainda, um pressuposto de admissibilidade recursal, pois cabe ao juiz ou Tribunal, antes de ingressar no mérito do RCD, observar se a parte constante do pólo passivo foi diplomada. A prestação jurisdicional no RCD subordina-se ao exame da diplomação como pressuposto processual e, em conseqüência, sem a devida constatação do pré-requisito, ocorrerá a extinção prematura do processo sem julgamento do mérito aplicando, subsidiariamente, o disposto no artigo 267 do Código de Processo Civil. Em se tratando de Recurso contra a diplomação, tem inteira aplicação o artigo 216 do Código Eleitoral: 35 Art. 216. Enquanto o Tribunal Superior não decidir o recurso interposto contra a expedição do diploma, poderá o diplomado exercer o mandato em toda a sua plenitude. Ao aplicar o artigo 216, fica assegurado ao candidato diplomado tomar posse e exercer o mandato eletivo até resultado final do recurso contra a diplomação, conforme jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: (...) Recurso contra a expedição de diploma. Procedência fundada no art. 41-A da Lei no 9.504/97. Aplicação do art. 216 do Código Eleitoral. Dissídio jurisprudencial não configurado. A execução da decisão condenatória proferida por TRE, em sede de recurso contra a expedição de diploma, está condicionada à apreciação pelo TSE em grau de recurso. Agravo a que se nega provimento." NE: "(...) em sede de recurso contra a expedição de diploma, a questão não consiste em aplicar ou afastar a regra do art. 15 da LC no 64/90, tal como nos julgados com base no art. 41-A da Lei no 9.504/97, em sede de representação ou investigação judicial, mas sim, na incidência do art. 16 do CE, dispositivo que garante, expressamente ao diplomado o exercício de seu mandato até a manifestação do TSE (...). (Ac. no 4.025, de 25/3/2003, rel. Min. Ellen Gracie.) O recurso Contra a Expedição de Diploma deve ser instruído com elementos probatórios que demonstrem a existência do fato que justifique e fundamente a cassação do diploma. Esta via processual não serve para apurar a prática do ilícito imputado, mas para cassar ou conferir diploma, quando cabalmente comprovada e configurada uma das hipóteses elencadas no artigo 262 do Código Eleitoral. O recorrente também pode especificar, na petição inicial, provas que pretenda ver produzidas. Na hipótese do inciso IV do artigo 262 do Código Eleitoral, utiliza-se prova pré-constituída (igual ao mandado de segurança), que é aquela produzida em outros autos, em que tenha sido oportunizado contraditório e ampla defesa, via de regra, em ação de investigação judicial eleitoral, sem que haja obrigatoriedade de ter havido sobre ela pronunciamento judicial, ou trânsito em julgado. Provido o recurso contra a diplomação, o recorrido se tornará inelegível para o tempo previsto no dispositivo legal que embasou o recurso. Desprovido o recurso, a decisão ensejará recurso especial ou ordinário, dependendo da eleição. 36 2.5. REPRESENTAÇÕES São cabíveis nos casos do candidato incorrer em captação de sufrágio (art. 41-A), condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais (arts. 73 e 77) e captação ou gastos ilícitos de recursos durante a campanha (art. 30-A), todos na Lei nº 9504/97. Quem julga as ações ligadas à compra de voto é o Juiz Auxiliar (propaganda, 30-A, 41-A e 73 da Lei nº 9504/97). Se Juiz Auxiliar verifica abuso de poder econômico, não pode continuar; deve remeter a representação ao Tribunal Competente (Tribunal Regional Eleitoral ou Tribunal Superior Eleitoral). O prazo máximo para Representação (do art. 41-A) por compra de voto é a data da diplomação. Nesse caso, segue-se o rito do art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 - o Rito Ordinário Eleitoral, mais complexo e extenso, e apenas os requisitos da inicial estão previstos no art. 96 da Lei nº 9504/97. Quanto à representação de condutas vedadas aos agentes públicos em campanha (arts. 73 e 77), incluído o popular "uso da máquina", segue o rito e também os requisitos previstos no art. 96 - é o Rito Sumaríssimo Eleitoral, com notificação imediata do reclamado para apresentação de defesa em quarenta e oito horas, e posterior decisão em vinte e quatro horas. O art. 30-A foi a novidade inserida pela Lei 11300/06 e se refere à captação e aos gastos ilícitos de recursos - segue o Rito Ordinário Eleitoral, do art. 22, Lei Complementar nº 64/90, pois vai precisar descobrir a origem do dinheiro e provar que o candidato sabia a sua origem - por exemplo, do exterior, sendo, então, negado a expedição ou cassado o diploma outorgado. No caso da eleição proporcional, se o feito é julgado antes das eleições, declaram-se nulos os votos obtidos pelo candidato; se julga depois das eleições, os votos daquele candidato vão para a sua legenda partidária (175, § 4º do Código Eleitoral). Porém, não se aplica o art. 175, §4º, na eleição proporcional 37 em que houve compra de voto (art. 41-A da Lei nº 9504) - os votos não vão para a legenda, caracterizando a aplicação da "Teoria dos frutos da árvore envenenada". Se a nulidade dos votos de uma eleição for correspondente a 50% + 1, haverão novas eleições (art. 224, Código Eleitoral), o que, em tese, permitiria ao candidato que sofreu representação concorrer na nova eleição, haja vista os art. 30-A da Lei nº 9504/97 e art. 41-A da Lei nº 9504/97 não declararem a inelegibilidade, pois aprovados por lei ordinária. A atual posição do Tribunal Superior Eleitoral, porém, segue o entendimento de que, pelo Princípio da Razoabilidade, ninguém pode alegar a própria torpeza: quem deu causa à nulidade das eleições (41-A / 30-A, se teve 50% + 1 dos votos), não pode concorrer de novo: Eleição majoritária municipal. Renovação. Art. 224 do Código Eleitoral. Prefeito e vice-prefeito que tiveram seus diplomas cassados por ofensa ao art. 41-A da Lei no 9.504/97. Registros. Indeferimento. Prevendo o art. 222 do Código Eleitoral a captação de sufrágio como fator de nulidade da votação, aplicase o art. 224 do mesmo diploma nos casos em que houver a incidência do art. 41-A da Lei no 9.504/97, se a nulidade atingir mais de metade dos votos. Havendo renovação da eleição, por força do art. 224 do Código Eleitoral, os candidatos não concorrem a um novo mandato, mas, sim, disputam completar o período restante de mandato cujo pleito foi anulado (iniciado em 1o.1.2001, findando em 31.12.2004). Aquele que tiver contra si decisão com base no art. 41-A não poderá participar da renovação do pleito, por haver dado causa a sua anulação. Observância ao princípio da razoabilidade. Recursos especiais conhecidos pela divergência, a que se negam provimento, confirmando a decisão que indeferiu os registros dos recorrentes. (Ac. no 19.878, de 10.9.2002, rel. Min. Luiz Carlos Madeira.) 38 CAPÍTULO III TUTELA ANTECIPADA NAS AÇÕES CÍVEIS ELEITORAIS A procura pela instituição de mecanismos de prestação da tutela jurisdicional em menor espaço de tempo, seja pelos procedimentos especiais abreviados, com a admissão de decisões que antecipam o bem da vida pretendido pelo autor, seja pela supressão de etapas, como o procedimento monitório ou injuncional, que dispensa o tradicional processo de conhecimento, são exemplos significativos de que o legislador constatou a necessidade de conservar uma forma diferenciada para a composição de determinados conflitos, seja por seus aspectos de maior repercussão social e/ou econômica, seja por simples critério de política legislativa. Quando se menciona justa composição dos conflitos, pretende-se dar a tal categoria o entendimento de que a decisão judicial será justa se for igualmente proferida com razoável celeridade. Sem prejudicar o direito do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV, da Constituição da República), mas sem pretender mais ainda transformá-la em simples papel destituído de eficácia ou utilidade para o vencedor. Corroborando tal raciocínio, cabe lembrar o magistério de José Eduardo Carreira Alvim (CARREIRA ALVIM, 1995, p.5/6): (...) Um Estado que não dispõe de condições de ministrar uma justiça rápida pelo método mais seguro, que é o processo de cognição plena, tem de contentar-se em ministrá-la com base na probabilidade proporcionada pela cognição sumária. A segurança (garantismo) cede lugar à urgência (urgenza) em função das exigências sociais. E não se pense que a justiça sumária seja menos justa do que a ordinária, porque o que estraga a justiça, minando a sua credibilidade, não é o rito que adota, mas a morosidade de máquina judiciária. O tempo continua sendo o inimigo número um do processo, mas o processo não pode prescindir dele, ainda que reduzido, pelo que um processo demorado não proporciona à parte senão uma justiça pela metade (CARNELUTTI). Nesse mesmo sentido, (MARINONI, 2008, p. 199/200): nos ensina Luiz Guilherme Marinoni 39 Em última análise, é correto dizer que a técnica antecipatória visa apenas a distribuir o ônus do tempo do processo. É preciso que os operadores do direito compreendam a importância do novo instituto e o usem de forma adequada. Não há motivos para timidez no seu uso, pois o remédio surgiu para eliminar um mal que já está instalado, uma vez que o tempo sempre prejudicou o autor que tem razão. É necessário que o juiz compreenda que não pode haver efetividade sem riscos (...). A antecipação dos efeitos materiais da sentença de mérito, se cabível, ajudaria a combater a demora no julgamento das ações cíveis tipicamente eleitorais (que foram objeto de pesquisa e analisadas no capítulo II) que alijam os candidatos da disputa eleitoral, impedem a sua diplomação ou frustram o exercício do seu mandato eletivo. Na falta de disposição específica nas leis eleitorais, há que se socorrer das normas gerais do Código de Processo Civil. E, para isto, o Direito Processual Civil moderno oferece solução. São as medidas cuja antecipação liminar da tutela jurisdicional (artigo 273 do referido Código) pode ser obtida quando estão presentes os requisitos que doutrina e jurisprudência apontam como fundamentais para o seu deferimento. Impõe-se observar que há o pressuposto do "direito em estado de periclitação" como requisito indispensável à concessão da tutela. Ora, a posse de um candidato eleito ilicitamente gera situação irreversível, somente reparável pela via da tutela antecipada obstativa. Entre o direito individual da parte e o interesse da comunidade obviamente tem o Judiciário de amparar a coletividade. Posto isto, entre a expectativa do candidato em se empossar e o perigo representado pela posse e exercício do poder de um candidato cuja eleição foi viciada pela corrupção ou abuso do poder, preferível, evidentemente, se proteger o interesse público. Comprovando-se a verossimilhança da alegação e havendo receio de dano irreparável, é de se conceder a tutela antecipada, nos termos do art. 273 do CPC, a fim de impedir a posse daqueles que obtiveram imoralmente o mandato até que seja julgada definitivamente a ação que visa a sua impugnação, cumprindo-se, assim, as normas altamente moralizadoras previstas na 40 Constituição-cidadã de 1988. É a razoabilidade dos efeitos pretendidos com o provimento jurisdicional. Nesse sentido, cabe lembrar aqui os ensinamentos de Emerson Garcia, comentando acerca da possibilidade, em tese, de aplicação da antecipação da tutela aos feitos eleitorais – analisando especialmente o caso da ação de impugnação de mandato eletivo: (GARCIA, 2000, p.212-215): Em tese, afigura-se perfeitamente possível que os pressupostos necessários ao deferimento da antecipação de tutela estejam presentes na ação de impugnação de mandato eletivo, não olvidando-se certas peculiaridades pertinentes à mesma. Quaisquer atos que afastem a normalidade e a legitimidade das eleições devem ser coibidos, evitando-se que o desvirtuamento da vontade popular inicie um ciclo vicioso que culminará com a prática de danos irreversíveis ao erário e aos demais interesses públicos. Para tanto, poder-se-ia utilizar a antecipação de tutela, com o imediato afastamento do diplomado do cargo, resultando em maior efetividade do processo e credibilidade dos institutos que visam tutelar o procedimento eletivo. Instruída a ação com decisão proferida em Investigação Judicial Eleitoral na qual tenha sido reconhecida a prática do ato abusivo, suprido estará o pressuposto pertinente à prova da probabilidade do alegado; o mesmo podendo ocorrer com a apresentação de provas outras que não a investigação. O fundado receio de dano irreparável restará demonstrado sempre que o obrar do autor do ato abusivo denotar seu despreparo para a gestão da coisa pública, expondo-a a fundados risco; o mesmo ocorrendo com a degradação de princípios que o impeçam de participar da edição de normas de conduta que serão seguidas pela coletividade. No que concerne ao abuso do direito de defesa e ao manifesto propósito protelatório, serão os mesmos passíveis de demonstração no decorrer do feito. Por derradeiro, a decisão que antecipar os efeitos pretendidos por ocasião do provimento final, com o conseqüente afastamento do diplomado de exercício do cargo para o qual foi eleito será passível de reversão em caso de reforma do decisório pelo Juízo ad quem. Continuando a analisar a possibilidade, em tese, de aplicação deste instituto nos feitos eleitorais, encontra-se um forte argumento doutrinário em contrário, qual seja a existência do perigo de irreversibilidade do provimento antecipado, com fulcro no artigo 273, § 2º, do Código de Processo Civil: § 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. 41 Nesse sentido, cabe citar o magistério do grande doutrinador Adriano Soares da Costa que elenca o perigo de irreversibilidade do provimento antecipado como o seu segundo fundamento básico pelo qual entende não ser cabível a tutela antecipatória nos feitos eleitorais (COSTA, 2001, p.30/31): Em sede de ações tipicamente eleitorais (Ação de Impugnação de Registro de Candidato, Ação de Investigação Judicial Eleitoral, Recurso contra Diplomação e ação de Impugnação de Mandato Eletivo) não tem cabimento a antecipação da tutela, por dois fundamentos básicos: (b) pela própria compostura interna da antecipação da tutela, tal qual regrada pelo art.273, § 2º do CPC, pelo qual é vedada a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. Como todas as ações tipicamente eleitorais visam obstruir ou findar o exercício de mandato eletivo (quer desde o nascedouro, quer já quando diplomado o candidato eleito), seria de todo impertinente a antecipação de tutela. Ainda, no mesmo sentido, só que se referindo somente à ação de impugnação de mandato eletivo, cabe lembrar os ensinamentos de Pedro Henrique Távora Niess (NIESS, 2000. p. 304): (...) em se tratando de ação de impugnação de mandato eletivo, não cabe a concessão de tutela antecipada em desfavor do réu, a fim de afastá-lo do cargo para o qual foi eleito, pois eventual decreto de improcedência daquela ação não proporcionaria reparo eficiente ao seu afastamento, nos termos da nova redação do § 2º do art. 273 do CPC. O argumento deles (de que haveria irreversibilidade do provimento antecipado, contrariando o disposto no artigo 273,§2º, do Código de Processo Civil) concentra-se na idéia de que o afastamento do cargo, em decorrência da tutela antecipada concedida em sede de ações tipicamente eleitorais (que visam obstruir ou findar o exercício de mandato eletivo - quer desde o nascedouro, quer já quando diplomado o candidato eleito) poderia causar prejuízo irreversível ao réu, pois não haveria suspensão quanto à fruição do mandato eletivo, o que acarretaria a irreversibilidade da decisão, já que o demandado não mais poderia exercer o mandato durante o período correspondente àquele em que esteve afastado. 42 Entretanto, deve-se ter um cuidado muito grande ao se interpretar o artigo 273, § 2º, do Código de Processo Civil, uma vez que, se os juízes nunca concederem tutela antecipada, quando sua concessão puder causar prejuízo irreversível ao réu, estarão enfraquecendo ao extremo tal instituto. Corroborando tal raciocínio crítico, Marinoni explica o porquê do equívoco (MARINONI, 2008, p. 229/230): Em virtude dessa regra, seria possível pensar que o juiz não pode conceder tutela antecipatória quando ela puder causar prejuízo irreversível ao réu. Contudo, se a tutela antecipatória, no caso do artigo 273, I, tem por objetivo evitar um dano irreparável ao direito provável (é importante lembrar que o requerente da tutela antecipatória deve demonstrar um direito provável), não há como não admitir a concessão dessa tutela sob o simples argumento de que ela pode trazer um prejuízo irreversível ao réu. Seria como dizer que o direito provável deve ser sempre sacrificado diante da possibilidade de prejuízo irreversível ao direito improvável. (...) Como está claro, nos casos em que o direito do autor (que deve ser mostrado como provável, uma vez que a probabilidade do direito é requisito para a própria concessão da tutela antecipatória) está sendo ameaçado por dano irreparável ou de difícil reparação, é ilógico não se conceder a tutela antecipatória com base no argumento de que ela pode trazer um dano ao direito que é improvável. O direito constitucional à adequada tutela jurisdicional estaria sendo negado se o juiz estivesse impedido de conceder a tutela antecipatória apenas porque corre o risco de causar prejuízo irreversível. Neste particular, aliás, o egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a exigência da irreversibilidade inserta no §2º do artigo 273 do Código de Processo Civil não pode ser levada ao extremo, sob pena do novel instituto da tutela antecipatória não cumprir a excelsa missão a que se destina, cuja decisão ficou assim ementada: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. INTELIGÊNCIA DO ART. 273, § 2º, DO CPC. PRECEDENTES. 1. O perigo de irreversibilidade do provimento adiantado, óbice legal à concessão da antecipação da tutela, nos termos do artigo 273, § 2º, do CPC, deve ser interpretado com grano salis, sob pena de se inviabilizar o instituto. 2. Irreversibilidade é um conceito relativo, que deve ser apreciado ad hoc e de forma contextual, levando em conta, dentre outros fatores, o valor atribuído pelo ordenamento constitucional e legal aos bens jurídicos em confronto e também o caráter irreversível, já não do que o juiz dá, mas do que se deixa de dar, ou seja, a 43 irreversibilidade da ofensa que se pretende evitar ou mesmo da ausência de intervenção judicial de amparo. 3. Agravo Regimental não provido (STJ, 2ªTurma, Resp 144.656/ES, rel. Min. Adhemar Maciel, DJU 27.10.1997). Em sede de antecipação de tutela, há casos em que pode ocorrer a irreversibilidade recíproca, ou seja, se porventura a antecipação de tutela for concedida, a situação se tornará irreversível para o réu; se porventura ela for negada, ela se tornará irreversível para o autor. Nestes casos, o juiz se encontra numa situação em que tanto a concessão da tutela quanto a sua não concessão ocasionarão a irreversibilidade para uma das partes. Ainda que se entenda ser este o caso das ações cíveis tipicamente eleitorais (que foram objeto de pesquisa e analisadas no capítulo II), deve-se optar pela concessão da tutela antecipatória, aplicando-se, além do princípio constitucional da razoabilidade (estando presentes os seus requisitos: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito), a teoria da ponderação dos interesses, ou seja, devem-se ponderar os interesses em jogo para tentar, na medida do possível, proteger o interesse mais relevante, que será, em se tratando dessas ações cíveis tipicamente eleitorais, o interesse público em alijar os candidatos que causaram lesão, na seara eleitoral, aos bens jurídicos moralidade e probidade, impedindo, com isso, a sua diplomação ou frustrando o exercício do seu mandato eletivo. Nesse sentido, em nome dos princípios da razoabilidade e da soberania do interesse público sobre o privado, mas sem dizer ser caso de irreversibilidade recíproca, Emerson Garcia critica o argumento de Adriano Soares da Costa referente à vedação à concessão de antecipação da tutela por haver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado nas ações tipicamente eleitorais: (GARCIA, 2000, p. 212-215): Neste particular, deve-se frisar que não impressiona o argumento de que o afastamento do cargo não suspenderá a fruição do mandato, o que acarretaria a irreversibilidade da decisão, já que o demandado não mais poderia exercer o cargo durante o período correspondente àquele em que esteve afastado. Esta linha de raciocínio ao mais leve sopro se espalha e desvanece, pois em qualquer causa, qualquer que seja o objeto mediato, aquele que sofre os efeitos da antecipação de tutela ficará definitivamente privado do bem jurídico durante o lapso em que a decisão é irreversível. No cotejo entre os graves danos que o autor do abuso já demonstrou ser capaz de perpetrar e a impossibilidade de exercer parte de seu mandato, àquele deve ser atribuída primazia, tudo devendo ser feito para 44 evitá-lo. O meio é adequado ao fim colimado; o afastamento imediato do diplomado é necessário para salvaguardar o interesse público; e o bem jurídico sacrificado é de valor inferior ao do bem preservado, devendo ser aqui aplicado, em essência, o princípio da soberania do interesse público sobre o privado. Após analisar e concluir que, em tese e a princípio, seria cabível a concessão de tutela antecipada nas ações cíveis tipicamente eleitorais, torna-se necessário discorrer se existem e, em caso positivo, quais limitações e obstáculos a tutela antecipada encontra na legislação eleitoral pertinente às referidas ações eleitorais. Um outro forte argumento doutrinário contrário à concessão de antecipação de tutela nas ações cíveis tipicamente eleitorais seria justamente o de que a legislação eleitoral pertinente às referidas ações eleitorais impõe uma proibição no sentido de ser absolutamente vedado que sejam adiantados os efeitos dessas ações eleitorais, mediante liminares ou antecipação de tutela. Segundo tal entendimento, tal proibição constaria dos artigos 216 do Código Eleitoral e 15 da Lei Complementar nº 64/90: Art. 216 do Código Eleitoral - Enquanto o Tribunal Superior não decidir o recurso interposto contra a expedição do diploma, poderá o diplomado exercer o mandato em toda a sua plenitude. Art. 15 da Lei Complementar nº 64/90 - Transitada em julgado a decisão que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se já expedido. Nesse sentido, cabe lembrar o magistério de Adriano Soares da Costa que, ao se posicionar contra o cabimento de tutela antecipada em sede de ações tipicamente eleitorais, citando o argumento acima referido como o primeiro fundamento básico a justificar a sua posição (COSTA, 2001, p.30/31) Em sede de ações tipicamente eleitorais (Ação de Impugnação de Registro de Candidato, Ação de Investigação Judicial Eleitoral, Recurso contra Diplomação e ação de Impugnação de Mandato Eletivo) não tem cabimento a antecipação da tutela, por dois fundamentos básicos: (a) as ações tipicamente eleitorais são impedidas de adiantar seus efeitos, mediante liminares ou antecipação de tutela, pela proibição contida nos arts. 216 do CE e 15 da LC 64/90. Segundo esses artigos, a 45 inelegibilidade de candidato, com a conseqüente anulação da diplomação e registro, apenas pode ocorrer quando transitada em julgado a decisão judicial. Tais artigos não podem ser apenas lidos como dispondo sobre a concessão de efeito suspensivo a recurso eleitoral, pois eles têm amplitude maior, é dizer: mais do que darem efeito suspensivo a recursos eleitorais, visam impedir a consecução, ainda que provisória, de impedimento ao pré-candidato ou candidato concorrerem às eleições. Obviamente que se isso ocorresse, haveria irreversibilidade da situação negativa do candidato, com gravame definitivo para o prélio eleitoral. O entendimento do ilustre doutrinador encontra-se, com a devida vênia, parcialmente equivocado, haja vista que o mesmo fez uma generalização no sentido de que quaisquer ações tipicamente eleitorais são impedidas de adiantar seus efeitos, mediante liminares ou antecipação de tutela, pela proibição contida nos arts. 216 do Código Eleitoral e o artigo 15 da Lei Complementar 64/90, o que não pode ser admitido como verdadeiro. Deve-se analisar o cabimento da tutela antecipada, individualmente, em cada uma das ações eleitorais e isso deverá ser feito a partir da análise quanto à aplicabilidade dos artigos 216 do Código Eleitoral e 15 da Lei Complementar 64/90, ou seja, verificar em qual (is) ação (ões) eleitoral (is) pode ser aplicado cada um desses artigos. Com relação ao recurso contra expedição de diploma tem inteira aplicação o artigo 216 do Código Eleitoral, portanto, não caberia a tutela antecipada. Com relação à ação de impugnação de mandato eletivo, não haveria óbice legal algum à concessão da tutela antecipatória, uma vez que não se aplicam nenhum dos referidos artigos a ela, conforme a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: MEDIDA CAUTELAR. AIME. ACÓRDÃO. EXECUÇÃO ANTES DA PUBLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. LIMINAR. DEFERIMENTO PARCIAL. AGRAVO REGIMENTAL. TEMPESTIVO. ARGUMENTOS NÃO SUFICIENTES PARA AFASTAR A DECISÃO. DESPROVIDO. (...) 3. São imediatos os efeitos da decisão proferida em sede de ação de impugnação de mandato eletivo, aguardando-se apenas a publicação, não incidindo os arts. 216 do Código Eleitoral e 15 da LC no 64/90. (Resp 28391/CE – Relator José Augusto Delgado – Decisão Publicada em 14/04/2008). 46 Nesse sentido, cabe lembrar o magistério de Rui Stoco e Leandro de Oliveira Stoco (STOCO, 2006, p. 37 e 38): A nosso ver, entretando, há casos em que seria possível e até necessária a concessão de antecipação de tutela para afastar o candidato eleito, como por exemplo, quando a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo decorra de uma investigação judicial julgada após a diplomação, onde restou cabalmente comprovada a prática de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. Nesses casos, o perigo da demora na prestação jurisdicional favoreceria o candidato eleito de forma ilegítima, o que poderia ser ruinoso para a Administração Pública e para a ordem democrática, além do que a probabilidade de reversão da cassação do mandato seria, a rigor, menor do que a de sua manutenção. Portanto, seria mais ruinosa procedência da ação quando o mandato eletivo do réu já tivesse expirado, do que o afastamento desse do cargo, initio litis, através de medida cautelar e preventiva, de modo a resguardar a moralidade pública e a lisura do pleito eleitoral. E mais, com o advento da Res./TSE nº 21.634, voltada para as eleições realizadas em 2004 – que vedou expressa e definitivamente a aplicação contida no artigo 216 do Código Eleitoral para a AIME-, àquele que tiver seu mandato impugnado em primeira instância não será, de regra, garantido o seu exercício, enquanto pendente de apreciação pelas Cortes Superiores. Esse posicionamento expresso naquela orientação leva-nos a crer em uma maior flexibilidade por parte da orientação pretoriana quanto à presunção de legitimidade do pleito. Assim, uma vez verificados os pressupostos autorizadores da antecipação de tutela, sua concessão não mais esbarraria naquela presunção de legitimidade da eleição ou no conteúdo do artigo 216 do Código Eleitoral. Com relação à Ação de Impugnação de Registro de Candidatura, por ser de inteira aplicação o artigo 15 da Lei Complementar nº 64/90 a esta ação eleitoral, não caberia a concessão de tutela antecipada, haja vista ser necessário o trânsito em julgado da decisão que reconhece a inelegibilidade. Já no caso da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, somente naquela que trate de inelegibilidade (investigação judicial eleitoral por abuso do poder econômico ou político), será também aplicado o artigo 15 da Lei Complementar nº 64/90, devendo-se aguardar o trânsito em julgado da decisão para que se lhe proceda à execução, não cabendo, portanto, concessão de tutela antecipada. Nos demais casos de investigação judicial eleitoral, que não versem sobre inelegibilidade, por não ser aplicável o artigo 15 da Lei Complementar nº 64/90, não haveria óbice legal à concessão de tutela antecipada. Os entendimentos aqui expostos sobre o 47 cabimento, à luz da legislação eleitoral, de tutela antecipada nessas duas ações eleitorais são corroborados pela jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: MEDIDA CAUTELAR. AGRAVO INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. LC APLICABILIDADE. REGIMENTAL. n° 64/90, AÇÃO ART. DE 15 1. A execução dos julgados é, de regra, imediata, uma vez que os recursos eleitorais não têm efeito suspensivo. 2. As disposições da Lei Complementar n° 64/90, art. 15, são aplicáveis tanto ao processo de impugnação ao registro da candidatura, quanto ao de investigação judicial por abuso do poder econômico ou político. 3. Agravo regimental a que se dá provimento. (MC 966/AC – Relator Waldemar Zveiter– Publicado em 23/03/2001) Mandado de segurança. Resolução. Novas eleições. Cargos prefeito e vice-prefeito. Ausência de trânsito em julgado de decisão que reconhece a inelegibilidade. Registro de candidatura. Incidência do art. 15 da LC nº 64/90. Liminar. Deferimento. A garantia expressa no art. 15 da Lei Complementar nº 64/90 decorre da presunção de elegibilidade. Essa presunção opera tanto quando se reconhece a inelegibilidade de uma situação anterior - no processo de registro -, como quando resulta de inelegibilidade numa situação posterior - reconhecida em processo de investigação judicial eleitoral (Lei Complementar nº 64/90, art. 22, XIV e XV). Há necessidade de se prevenir a perturbação que decorreria de uma nova eleição, enquanto não houver o acertamento judicial definitivo sobre a elegibilidade ou não. Ordem concedida, liminar confirmada. (MS 3275/PE – Relator Luiz Carlos Lopes Madeira – Publicado em 02/09/2005) O entendimento de que não cabe tutela antecipatória na Ação de Investigação Judicial Eleitoral que trate de inelegibilidade (investigação judicial eleitoral por abuso do poder econômico ou político) também é sustentado, com brilhantismo, pelo doutrinador José Jairo Gomes (GOMES, 2008, p.393): Apesar de seu reconhecido valor para a efetividade do processo, não tem cabimento em sede de AIJE. É que – conforme prevêem os incisos XIV e XV do artigo 22 da LC nº 64/90 – o efeito da decisão consiste na “cassação do registro do candidato” (se for julgada procedente antes do pleito) e na decretação de inelegibilidade. No entanto, o artigo 15 desse mesmo diploma complementar exige o trânsito em julgado da decisão que, declarando a inelegibilidade do candidato, negue o registro ou o cancele se já expedido. No que concerne à inelegibilidade do candidato, por restringir o exercício de direitos políticos, não se afigura cabível a antecipação. 48 Com relação às Representações por captação de sufrágio (art. 41-A), por condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais (arts. 73 e 77) e captação ou gastos ilícitos de recursos durante a campanha (art. 30-A), todos da Lei nº 9504/97, não haveria óbice legal à concessão de tutela antecipada, pois não há sanção de inelegibilidade a atrair a aplicação do artigo 15 da Lei Complementar nº 64/90, o que leva à execução imediata da decisão que cassar o registro ou o diploma. Nesse sentido, o Tribunal Superior Eleitoral também tem decidido: Mandado de segurança. Ação de investigação judicial eleitoral. Art. 30-A da Lei nº 9.504/97. Execução imediata. Agravo regimental improvido. Por não versar sobre inelegibilidade o art. 30-A da Lei das Eleições, a execução deve ser imediata, nos termos dos arts. 41-A e 73 da mesma lei. (MS 3567/MG – Relator ANTONIO CEZAR PELUZO – Publicado em 12/02/2008) Recurso em mandado de segurança. Impetração. Ato. Juiz eleitoral. Excepcionalidade. Não-configuração. Trânsito em julgado. Decisão. Investigação judicial. Possibilidade. Execução. Condenação. (...) 2. É possível a execução imediata da decisão no que diz respeito às sanções de cassação de registro ou diploma previstas nos arts. 41-A e 73 da Lei nº 9.504/97, conforme iterativa jurisprudência desta Corte (...). (RMS 436/RS – Relator Carlos Eduardo Caputo Bastos Madeira – Publicado em 18/09/2006) REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILEGAL DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL AFASTADA. INFRAÇÃO CONFIGURADA. IMEDIATA CASSAÇÃO DO DIPLOMA. Segundo já teve ocasião de assentar esta Corte, a cassação do diploma por infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 não implica declaração de inelegibilidade. O escopo do legislador, nessa hipótese, é o de afastar imediatamente da disputa aquele que no curso da campanha eleitoral incidiu no tipo captação de sufrágio vedada por lei. (...) (Respe 19644/SE – Relator Raphael de Barros Monteiro Filho – Publicado em 14/02/2003) No mesmo sentido, com relação à Ação por captação ou gastos ilícitos de recursos durante a campanha (art. 30-A da Lei nº 9504/97), cabe lembrar o magistério de José Jairo Gomes no sentido de que não existe óbice à concessão de tutela antecipatória (GOMES, 2008, p.415): 49 Ademais, considerando que a decisão judicial deve ser aplicada imediatamente, porquanto o recurso eleitoral não é revestido de efeito suspensivo (CE, art.257), nem se aplica o disposto no artigo 216 do Código Eleitoral, tampouco o artigo 15 da Lei de Inelegibilidades, tem-se que nenhum óbice existe à concessão de liminar visando a suspensão da expedição de diploma. No mesmo sentido, com relação à Ação por captação de sufrágio (art. 41-A da Lei nº 9504/97), José Jairo Gomes sustenta que seria cabível um pedido de tutela antecipatória, concernente à cassação do diploma, após a proclamação do resultado das eleições: (GOMES, 2008, p.426): (...) Se o pedido de antecipação de tutela for julgado depois da proclamação dos resultados das eleições , em, tese, não se vislumbra óbice ao seu acolhimento, desde que existam provas materiais robustas a autorizar esta medida. Pode-se cogitar o direito difuso de não ser expedido diploma obtido por via espúria, o que fatalmente levará ao exercício ilegítimo do mandato eletivo. Se, de um lado, é incontestável a soberania das urnas, de outro, há que se ponderar o direito político difuso relativamente ao exercício do mandato somente por quem o tenha alcançado legitimamente, com observância das regras e dos procedimentos legais. Indubitavelmente, é irreparável o dano difuso provocado por quem, tendo exercido mandato durante algum tempo, perde-o em virtude de decisão emanada da Justiça Eleitoral. Afinal, a que título os cidadãos devem obedecer a atos e leis produzidos por quem jamais deveria ter sido investido na representação popular. 50 CONCLUSÃO A pesquisa realizada na presente monográfica analisou o cabimento da antecipação de tutela nas ações cíveis tipicamente eleitorais que visam obstruir ou findar o exercício de mandato eletivo, quer desde o nascedouro, quer quando já diplomado o candidato eleito. Na falta de disposição específica nas leis eleitorais acerca da tutela antecipatória, há que se socorrer das normas gerais do Código de Processo Civil. E, para isto, o Direito Processual Civil moderno oferece solução. São as medidas cuja antecipação liminar da tutela jurisdicional pode ser obtida quando estão presentes os requisitos legais para o seu deferimento, cuja base legal é o artigo 273 do referido Código. O exercício do mandato eletivo de um candidato eleito ilicitamente gera situação irreversível, somente reparável pela via da tutela antecipada obstativa. Entre o direito individual da parte (a expectativa do candidato em se registrar, se diplomar, se empossar e exercer o mandato eletivo) e o interesse da comunidade (perigo representado pela posse e exercício do poder de um candidato cuja eleição foi viciada pela corrupção ou abuso do poder), obviamente tem o Judiciário de amparar a coletividade, sendo preferível, evidentemente, se proteger o interesse público. Comprovando-se a verossimilhança da alegação e havendo receio de dano irreparável, é de se conceder a tutela antecipada, nos termos do art.273 do CPC, a fim de impedir, dependendo do momento e da ação civil eleitoral promovida, o registro, a diplomação, a posse e o posterior exercício do mandato daqueles que obtiveram imoralmente o mandato eletivo, até que seja julgada definitivamente a ação, cumprindo-se, assim, as normas altamente moralizadoras previstas na Constituição-Cidadã de 1988. Um dos argumentos mais fortes apresentados, contrário à concessão de tutela antecipatória e com fulcro no artigo 273, §2º, do Código Processual Civil, reside na idéia de que o afastamento do cargo, em decorrência da tutela 51 antecipada concedida em sede de ações tipicamente eleitorais, poderia causar prejuízo irreversível ao réu, pois não haveria suspensão quanto à fruição do mandato eletivo, o que acarretaria a irreversibilidade da decisão, já que o demandado não mais poderia exercer o mandato durante o período correspondente àquele em que esteve afastado. Entretanto, a presente monografia demonstra que tal argumento não merece prosperar, seja porque esta não é a melhor interpretação que se pode extrair do artigo 273, § 2º, do diploma processual civil (o direito constitucional à adequada tutela jurisdicional estaria sendo negado se o juiz estivesse sempre impedido de conceder a tutela antecipatória apenas porque corre o risco de causar prejuízo irreversível - o direito provável do autor não pode ser sacrificado diante da possibilidade de prejuízo irreversível ao direito improvável do réu), seja porque em qualquer causa, qualquer que seja o objeto mediato, aquele que sofre os efeitos da antecipação de tutela ficará definitivamente privado do bem jurídico durante o lapso em que a decisão é irreversível. Em sede de ações eleitorais, no cotejo entre os graves danos que o autor do abuso já demonstrou ser capaz de perpetrar e a impossibilidade de exercer parte de seu mandato, àquele deve ser atribuída primazia, tudo devendo ser feito para evitá-lo (o meio é adequado ao fim colimado; o afastamento imediato do candidato é necessário para salvaguardar o interesse público; e o bem jurídico sacrificado é de valor inferior ao do bem preservado, devendo ser aplicados, em essência, os princípios da soberania do interesse público sobre o privado, da moralidade e o da razoabilidade). Um outro forte argumento doutrinário contrário à concessão de antecipação de tutela nas ações cíveis tipicamente eleitorais seria justamente o de que a legislação eleitoral pertinente às referidas ações eleitorais (artigos 216 do Código Eleitoral e 15 da Lei Complementar nº 64/90) impõe uma proibição no sentido de ser absolutamente vedado que sejam adiantados os efeitos dessas ações eleitorais, mediante liminares ou antecipação de tutela. Todavia, a presente monografia demonstra ser parcialmente correto tal entendimento, visto que a pesquisa realizada analisou o cabimento da tutela antecipada, individualmente, em cada uma das ações eleitorais e isso foi feito a partir da análise quanto à aplicabilidade dos artigos 216 do Código Eleitoral e 15 da Lei Complementar 64/90. Ao proceder à referida análise, verificou-se que esses artigos só poderiam 52 ser aplicados em algumas das ações cíveis típicas eleitorais, apenas constituindo óbice legal à concessão de tutela antecipatória nessas ações eleitorais, quais sejam: recurso contra expedição de diploma, Ação de Impugnação ao Registro de candidatura e Ação de Investigação Judicial Eleitoral que trate de inelegibilidade. Por outro lado, a pesquisa concluiu ter cabimento a concessão de tutela antecipada nas demais ações cíveis eleitorais: Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, Ação de Investigação Judicial Eleitoral que não trate de inelegibilidade e, ainda, as Representações por captação de sufrágio (art. 41-A), por condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais (arts. 73 e 77) e captação ou gastos ilícitos de recursos durante a campanha (art. 30-A), todas da Lei nº 9504/97. Dado o exposto, a tese de que é possível a concessão da tutela antecipada, a fim de impedir (dependendo do momento e da ação civil eleitoral promovida) o registro, a diplomação, a posse e o posterior exercício do mandato eletivo, até que seja julgada definitivamente a ação, não merece uma acolhida integral e sim parcial, visto que, conforme demonstra a presente monografia, a despeito de, em tese, ser possível a utilização do instituto processual civil da tutela antecipatória em sede dessas ações eleitorais, a legislação eleitoral pertinente a alguma dessas ações eleitorais impõe uma proibição de que sejam adiantados os efeitos delas, mediante antecipação de tutela. 53 BIBLIOGRAFIA BATISTA, Ovídio Araújo da Silva. Curso de Processo Civil. v.1. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001 BERMUDES, Sérgio. Inovações do CPC. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições preliminares de direito processual civil. v. 2. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. 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