ASPECTOS RELEVANTES SOBRE A PENHORA DE BENS
Autor: Fowler R. P. Cunha
I – INTRODUÇÃO
A finalidade preponderante deste trabalho se
encontra na relevância que este instituto, a penhora, que recebe como ato
material expropriatório da execução.
Podemos estudar a penhora, em sucinta análise,
como ato em que são apreendidos, materialmente, bens do devedor, isto
é, a primeira agressão que o devedor inadimplente sofre em seu
patrimônio.
A maioria doutrinária localiza a natureza
jurídica da penhora como um ato executivo, ou seja, um ato processual
cuja função primordial é a fixação da responsabilidade executória acerca
dos bens por ela englobados.
Na lição do mestre Carnelutti, a penhora “tem
por finalidade a individuação e preservação dos bens a serem
submetidos ao processo de execução” 1. Destarte, o Estado, valendo-se
do seu poder sancionatório, coage o devedor a nomear bens que
garantam a satisfação de sua dívida.
1
CARNELUTTI, Francesco. Diritto e processo, Nápoles, Morano, 1958.
2
Os bens penhorados não sofrem alteração em
sua substância, conservando suas características inerentes, não sendo
afetados, a não ser quanto à restrição que lhes é imposta, relativa a não
disposição destes.
Os bens do devedor deverão ser descritos
pormenorizadamente, apreendidos e colocados em depósito, cuidando-se
da sua conservação, tendo por suprimida a disponibilidade do devedor,
estando este sujeito à expropriação, despontando para o credor a
preferência.
Os efeitos da penhora podem ser percebidos
em relação ao devedor, onde este se priva da posse direta, quando não
for depositário fiel e, conseqüentemente, da disponibilidade dos bens
penhorados. No entanto, a inalienabilidade não é total, pois se o devedor
continuar na posse dos bens e resolver transferi-lo a terceiro ocasionará
apenas a ineficácia do ato de transferência efetuada sobre os bens
penhorados. Portanto, o terceiro sofrerá a ineficácia do ato de
transferência realizada sobre os bens penhorados sendo prejudicado, por
conta do direito de seqüela, haja vista que a transmissão dos bens, ante a
execução, será considerada ineficaz.
Tendo o terceiro a posse temporária dos bens,
obriga-se a escolher o gravame judicial, na posição de depositário,
restando-lhe como devedor efetivar a prestação judicialmente, pois caso
não o faça considera-se sem eficácia o pagamento direto feito ao devedor
ou a outra pessoa.
3
Ademais, o terceiro deve abster-se de negociar
com o devedor acerca do domínio do bem penhorado, pois se o fizer,
tendo em vista o efeito geral e erga omnes do ato de constrição, será
ineficaz a aquisição perante o processo e o gravame sobre o bem.
Araken de Assis cita e leciona com maestria
sobre o tema2: “Como diz Rendenti,3 a penhora isola bens no patrimônio
executivo, e, em conseqüência, assevera egrégiamente José Alberto dos
Reis,4 afeta-os, ou seja, destina-os à finalidade expropriativa, através do
expediente de imprimir a marca da ineficácia no poder de disposição do
executado,5 preservando, assim, o caráter instrumental do ato. Este sinal
não é um “sogello”, explica Micheli,6 mas o corolário da ineficácia dos
atos de disposição, que, de resto, se afiguram existentes, válidos e
eficazes no plano do direito material.
Sendo assim, busca-se através deste delimitar
os efeitos, o conceito e a natureza da penhora, bem como discorrer sobre
os procedimentos e aperfeiçoamento da penhora que são distribuídos em
quatro vértices: atos de documentação; apreensão e depósito; inscrição
de penhora de imóvel e atos subseqüentes.
2
ASSIS, Araken de. Manual do Processo de Execução, RT, 8ª ed. Pág.603, 2002.
RENDENTI, Enrico, Diritto processuale civile, v.3/169-170 n. 214.
4
REIS, José Alberto dos. Processo de execução, v.2/92n.25.
5
Idem, op. Cit., v. 2/98, n. 27.
6
MICHELI, Esecuzione forzata, p. 31-32. Também Ovídio A. Batista da Silva, Doutrina e prática do
arresto ou embargo, § 16,p.78.
3
4
II – BREVES RELATOS HISTÓRICOS DA PENHORA
2.1. DIREITO BABILÔNICO
No período de hegemonia babilônica já havia
disposições de caráter processual. O Código de HAMMURABI dedicou
seus parágrafos iniciais a esta matéria. Dentre vários assuntos, foram
5
tratados aspectos relativos ao penhor e direito real de garantia, mas,
sobre a penhora, não há qualquer indício7.
2.2. DIREITO ROMANO
Em Roma, ao tempo das XII Tábuas, existia
um procedimento caso incidisse ao devedor confesso ou fixado por
sentença, execução de um direito liquido e certo. Decorrido 30 dias sem
a satisfação de julgado, o credor podia conduzir o devedor à força à
presença do pretor, que mediante testemunho, lançava-lhe a mão, gesto
que autorizava o credor a encarcerá-lo, transportando-o algemado.8
Deveria o credor, em seguida, apregoá-lo em
três freiras, com o intervalo de nove dias, declarando o quanto da
condenação e, se alguém ou algum parente não saldasse a dívida em seu
favor, dava-se ao credor o direito de vender o devedor para fora da
cidade e até mesmo matá-lo.9
Essa prática foi tornando-se mais branda, até
admita a substituição da execução sobre a pessoa do devedor por seu
patrimônio.
A execução patrimonial recaia nos bens do
devedor, que eram apreendidos na presença de três testemunhas e sem
necessidade de comparecimento do adversário ou pretor.
7
AZEVEDO, Luiz Carlos de, Um estudo da penhora, Tese da faculdade de Direito do Largo São
Francisco-USP, São Paulo, impressão pela Editora Resenha Ltda., 1986, p.10.
8
REZENDE FILHO, Gabriel José Rodrigues de, Curso de direito processual civil, vol. III, 8ª ed.,
São Paulo, Saraiva, 1968, p. 171.
6
Assim, ocorrendo uma sentença condenatória,
o vencido tinha 30 dias para voluntariamente satisfazer o julgado.
“Esgotado o prazo, o credor deveria propor a actio iudicati, pela qual
pedia, com fundamento na condenação, lhe fosse entregue a pessoa do
devedor ou o seu patrimônio”.10
Essa substituição da execução de cunho
pessoal pela apreensão e praceamento dos bens do devedor, foi
denominada pignoris cappios.11
A partir daí, foram aprimorando o que hoje
chamamos de execução e a penhora passou a ser realizada em razão do
julgamento. Sendo procedida por meio de funcionário da organização
judiciária, e recaindo apenas em tantos bens quantos bastem para garantir
a execução.
Os romanos definiam as obrigações como um
vínculo jurídico, sendo que a garantia do seu cumprimento era
exclusivamente pessoal, daí decorrendo as crueldades com que os
devedores eram obrigados a satisfazer seus compromissos.
Essa postura jurídica derivava do fato de que
os bens, notadamente as terras, não eram encarados como patrimônio
pessoal, mas sim familiar. E para esse povo, os bens da gens (família
9
RODRIGUES, Maria Stella Villela Souto Lopes, ABC de processo civil, 3ª ed. São Paulo, Revista
dos Tribunais, 1989, p. 260.
10
SANTOS, Moacyr Amaral, Primeiras linhas de direito processual civil, vol. III, 3ª ed., São Paulo,
Saraiva 1979, p. 191.
7
romana) eram destinados ao culto dos deuses lares e dos mortos, e ,
portanto, sempre inalienável e indivisível.
Álvaro
Villaça
Azevedo
12
argumenta
adicionalmente que “neste período havia proibição de alienar
patrimônio da família, dados os rígidos princípios de perpetuação dos
bens dos antepassados, que se consideravam sagrados”.
A famosa e já mencionada Lei Romana das
"XII Tábuas", de 450 a.C., era vigorosamente impiedosa com os
devedores, impondo-lhes flagelos pessoais, e paradoxalmente não
permitindo que seu patrimônio fosse atingido. A propósito eis o teor da
"Tábua Terceira", que exatamente dispunha sobre os direitos de crédito:
"4. Aquele que confessa dívida
perante o magistrado ou é condenado terá
30 dias para pagar;
5. Esgotados os trinta dias e não
tendo pago, que seja agarrado e levado à
presença do magistrado;
6. Se não paga e ninguém se
apresenta como fiador, que o devedor seja
levado pelo seu credor e amarrado pelo
pescoço e pés com cadeias com peso até o
máximo de 15 libras; ou menos, se assim
quiser o credor;
7. O devedor preso viverá à sua
custa, se quiser; se não quiser, o credor
que mantém preso dar-lhe-á por dia uma
libra de pão ou mais, a seu critério;
8. se não há conciliação, que o
devedor fique preso por 60 dias, durante os
quais será conduzido em 03 dias de feira ao
comitium, onde se proclamará, em altas
vozes, o valor da dívida;
11
LAVENHAGEN, Antônio José de Souza, Processo de execução, 1ª ed. São Paulo, Atlas, 1978,
p.13.
12
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Bem de família, 2ª ed., S. Paulo, pág. 183, RT, 1984.
8
9. se são muitos os credores, é
permitido, depois do terceiro dia de feira,
dividir o corpo do devedor em tantos
pedaços quantos sejam os credores, não
importando mais ou menos; se os credores
preferirem, poderá vender o devedor a um
estrangeiro, além do Tibre."
Deste
modo,
os
romanos
inadimplentes
respondiam pessoalmente por suas dívidas, podendo ser presos, vendidos
como escravos e até mesmo mortos e esquartejados.
Contudo, já nos últimos períodos da civilização
romana, a pessoa do devedor foi lentamente substituída por seu
patrimônio, que passou a suportar a garantia das obrigações.
Anota Alcides de Mendonça Lima que:
"historicamente, a execução evoluiu dos atos contra a pessoa do
devedor para o seu patrimônio. A prisão do devedor e, até, o seu
esquartejamento cederam lugar a providências contra seus bens.
Gradativamente, à medida que as instituições processuais progrediam,
menos drásticos se tornavam os meios executivos, tanto os de coação
como os de sub-rogação".13
Essa tendência é mantida ao longo do tempo, e
chegando à França, com o Código Napoleônico, positiva-se com a
proibição de que o corpo do réu fosse objeto da execução. Surge então
novo momento histórico em que a execução limitava-se em atingir
exclusivamente o patrimônio do devedor.
9
Assim, descumprindo o devedor sua obrigação,
tornando-se, pois inadimplente, não poderia ser pessoalmente compelido
a quitá-la, sendo a única forma de sanção possível àquela que recaísse
sobre o seu patrimônio.
2.3. ORDENAÇÕES PORTUGUESAS
2.3.1. Ordenações Afonsinas - 1446-1521
Surgia aí a preocupação de resguardar alguns
bens de uso doméstico e pessoal além do direito que tinha o devedor de
escolher determinados bens à penhora.
2.3.2. Ordenações Manoelinas - 1521-1603
Nesta fase ocorre a introdução da preferência
dos credores, ou seja, a fixação da precedência de um credor sobre o
outro. Estabeleceu-se, desta forma, pelo que primeiro fizesse a penhora.14
As
Ordenações
Manuelinas
também
introduziram os embargos de terceiros.
2.3.3. Ordenações Filipinas - 1603-1867
Nessa fase permaneceu a proporcionalidade
entre o bem penhorado e a dívida. Caso não ocorresse, cabia ao
executado reclamar contra o excesso através do agravo.
13
LIMA, Alcides de Mendonça, Comentário ao Código de Processo Civil, vol.VI, pág.767, forense,
Rio, 4ª ed., 1985.
14
AZEVEDO, op. cit. p. 78.
10
Não havendo bens móveis ou raiz (prioridade),
admitir-se-ia a penhora daqueles pertences do executado e (ou) de sua
família que possuíssem em demasia, como cavalo, boi de arado,
instrumentos e sementes, desde que não fossem imprescritíveis à
atividade dos lavradores.15
2.4. DIREITO BRASILEIRO
Com a proclamação da Independência do
Brasil, continuou a vigorar toda a legislação portuguesa, enquanto não
elaboravam e promulgavam novas leis.
Durante esse período, foi disciplinado que,
quando o executado ficasse sujeito à penhora, respeitar-se-ia a seguinte
ordem de preferência: dinheiro, ouro, prata, pedras preciosas, títulos da
dívida pública, móveis e semoventes, bens de raiz ou imóveis, direitos ou
ações.
Efetuada a penhora, não se realizava outra, a
menos que fosse nula a primeira.
Já com o advento da República, passavam os
Estados-Membros da federação a aprovar seus códigos com disposições
processuais civis. Apenas em 1940 o código de processo civil, de âmbito
nacional, entrou em vigor.
15
Ibid, p. 82
11
O
código
de
processo
civil
de
1939
determinou, que deveriam ser resguardados da penhora os bens
indispensáveis ao executados e sua família, além de introduzir a
impenhorabilidade do seguro de vida.
Já no atual código de processo de 1973, que
sofrera durante os anos algumas reformas e que ainda merece ser
analisado a fim de novas modificações para a adaptação para os dias
modernos, quando um devedor não cumpre espontaneamente uma
obrigação, quer representada por um título extrajudicial, quer
reproduzida por uma sentença condenatória, pode o credor obter a
satisfação do crédito através de medidas coativas que, a seu
requerimento, são aplicadas pelo Estado no exercício do poder
jurisdicional, uma dessas formas e tema de nosso estudo, a penhora, é
traduzida pelo nosso atual Código de Processo Civil em seu artigo 659:
“Se o devedor não pagar, nem fizer
nomeação válida, o oficial de justiça
penhorar-lhe-á tantos bens quantos bastem
para o pagamento do principal, juros,
custas e honorários advocatícios”.(grifo
nosso).
Assim, o inadimplemento de uma obrigação
gera para o credor possibilidade de promover a execução coativa ou
forçada, judicialmente.
Nos dias atuais basicamente em todas as
legislações
patrimonial.
a
responsabilidade
pelas
dívidas
é
eminentemente
12
E, hoje, a medida jurídica de que se pode valer
um credor para agredir o patrimônio do devedor, com vistas a satisfazer
seu crédito, é a execução civil, assim definida por Liebman: "A execução
civil é aquela que tem por finalidade conseguir por meio do processo, e
sem o concurso da vontade do obrigado, o resultado prático a que
tendia a regra jurídica que não foi obedecida”. 16
Portanto, a responsabilidade do devedor é
eminentemente patrimonial! Aliás, essa é a lição que se extrai do art.
591, do Código de Processo Civil: "o devedor responde, para o
cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e
futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei".
Nesta esteira, o art. 646, do mesmo Código,
aponta que "a execução por quantia certa tem por objeto expropriar
bens do devedor, a fim de satisfazer o direito do credor", sendo que a
penhora é um ato neste desiderato por excelência.
.
16
LIEBMAN, Enrico Tullio. “Execução e ação executiva”, Estudos sobre o processo civil brasileiro,
S.Paulo, José Bushatsky, 1976.
13
III – CONCEITO E CONSIDERAÇÕES DA PENHORA.
A penhora, como acentua PONTES DE
MIRANDA, “não é penhor, nem arresto, nem uma das medidas
cautelares. O que nela há é expropriação da eficácia do poder de dispor
que não há no arresto”.17
LIEBMAN define que “A penhora é o ato pelo
qual o órgão judiciário submete a seu poder imediato determinados bens
17
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil, tomo
X. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 193.
14
do executado, fixando sobre eles a destinação de servirem à satisfação do
direito do exeqüente. Tem, pois, natureza de ato executório”.18
O ilustre professor FREDERICO MARQUES
define-a como o ato coercitivo que dá início à expropriação de bens do
devedor.19
Segundo Marcos Cláudio Acquaviva, em uma
de suas obras, vem defina a penhora:
“Penhora de bens. Apreensão judicial de
bens do devedor, destinada a garantir o
pagamento da dívida. Os bens são retirados
da posse do executado para garantir a
execução da dívida. Se o devedor relutar
em apresentar bens à penhora, esta será
feita compulsoriamente. Mas a penhora
somente pode incidir sobre bens
penhoráveis, sendo inválida a feita sobre
aqueles impenhoráveis. Efetuada a penhora
dos bens, nos termos do competente
mandado judicial, será lavrado o auto
respectivo, nomeando-se depositário dos
bens penhorados, o qual poderá ser o
próprio executado. Se este, dolosamente,
desfizer-se de algum bem penhorado, estará
sujeito à prisão, caracterizando o seu estado
de depositário infiel. A penhora deve ser
convenientemente inscrita, para ter validade
contra terceiros”.20
Ainda, conforme De Plácido e Silva, em sua
obra de VOCABULÁRIO JURÍDICO:
18
LIEBMAN, Enrico Túlio. Processo de execução.4.ed. São Paulo: Saraiva, 1946, n. 56, p. 95.
FREDERICO MARQUES, José. Instituições de Direito Processual Civil, vol. V, 3.ed, Rio de
Janeiro: Forense, 1971, p. 98.
19
15
“PENHORA. Derivado de penhorar
(apreender ou tomar judicialmente), no
sentido jurídico significa o ato judicial,
pelo qual se apreendem ou se tomam os
bens do devedor, para que neles se cumpra
o pagamento da dívida ou da obrigação
executada.
Assim, penhor e penhora claramente se
distinguem. O penhor é a garantia dada pelo
devedor,
espontaneamente
ou
por
imposição legal. A penhora é a apreensão
de bens, dados ou não em garantia para que
por eles se cobre o credor do que lhe é
devido pelo executado.
Pela penhora, os bens são tirados do poder
ou da posse do devedor, para servirem de
garantia à execução.
A penhora é ato sempre determinado pelo
juiz, em vista da liquidez do crédito posto
em execução.
Os bens do credor podem ser penhorados
por sua designação (nomeação) ou
compulsoriamente, quando não faz, no
devido tempo a nomeação que lhe é
facultada.
Neste
caso,
a
penhora
se
diz
compulsória..E, desse modo, é efetivada
sem qualquer intervenção do devedor
executado, em tantos bens que sejam dele,
quantos os necessários para perfazerem o
valor da execução.
A penhora pode recair em quaisquer bens
do
devedor,
respeitada
a
graduação¸legalmente assentada, isto é,
deve ser promovida preferentemente nos
bens assinalados em primeiro lugar, na
ordem em que são mencionados.
Quando a penhora recai sobre bens imóveis,
deve dela ser citada a mulher do executado,
se casado.
A penhora somente se poderá efetivar em
bens penhoráveis. A penhorabilidade dos
bens é, também, determinada por lei. E,
quando impenhoráveis, a execução não os
pode atingir, sendo improfícua ou inválida a
que se fizer neles.
20
ACQUAVIVA, Marcus Cláudio, Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva, 12ª Ed. São Paulo:
Editora Jurídica Brasileira, 2004, pág. 1006.
16
Efetivada a penhora, será promovida por
oficiais de justiça, autorizados pelo
competente mandado judicial, lavrarão
estes o competente auto de penhora, no
qual, também, se designará o depositário,
em poder de quem e sob a superintendência
do juiz, ficarão os mesmos bens, até que se
ultime a execução.Pode este ser o próprio
executado.
A penhora pode ser realizada em qualquer
dia, mesmo domingo e feriado, se
autorizada pelo juiz.
A penhora deve ser convenientemente
inscrita, para que venha a valer contra
terceiros. 21
21
Silva, De Plácido e, VOCABULÁRIO JURÍDICO, 10a. Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1987,
p.343/344.
17
A
penhora,
no
entendimento
de
Humberto Theodoro Júnior:
“É, em síntese, o primeiro ato executivo e
coativo do processo de execução por
quantia certa.
Com esse ato inicial de expropriação, a
responsabilidade patrimonial, que era
genérica, até então, sofre um processo de
individualização, mediante apreensão física,
direta ou indireta, de uma parte determinada
e específica do patrimônio do devedor.
Diz, outrossim, que a penhora é um ato de
afetação porque sua imediata conseqüência,
de ordem prática e jurídica , é sujeitar os
bens por ela alcançados aos fins da
execução, colocando-os à disposição do
órgão judicial para, “à custa e mediante
sacrifício desses bens, realizar o objetivo da
execução”, que é a função pública de “dar
satisfação ao c redor”. 22
Importante ainda distinguirmos penhora de
penhor. Segundo bem conceitua Elpídio Donizetti Nunes, “penhora é ato
executivo que cria direito de preferência. Penhor é direito real de
garantia, regulado no direito material. O Constrito na execução
denomina-se bem penhorado; já o objeto do penhor denomina-se bem
apenhado”.23
Como veremos adiante, em princípio, todos os
bens de propriedade do devedor ou dos responsáveis pelo débito podem
22
THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro: Forense,
2002, 2v. p. 167/168.
23
NUNES, ELPÍDIO DONIZETTI. Curso Didático de Direito Processual Civil. 5ª Ed. Belo
Horizonte. Editora Del Rei, 2004, pág. 395
18
ser penhorados, desde que tenham valor econômico com exceção dos
bens absolutamente impenhoráveis e bens relativamente impenhoráveis.
Uma vez citado o devedor, pode, no prazo de
vinte e quatro horas, pagar o débito ou nomear bens à penhora,
observando a ordem estabelecida no artigo 655 do CPC. Havendo
pagamento, encerra-se a execução. Não havendo pagamento, e havendo a
nomeação, será dado prazo pelo Juiz ao credor manifestar se concorda ou
não com o bem nomeado. Concordando o credor, lavrar-se-á o termo de
penhora, nos termos do art. 656, § único e 657 do CPC. No caso do
credor não concordar, o juiz decidirá de plano, declarando a ineficácia da
nomeação, se verificar uma das hipóteses do art. 655 do CPC, passando
ao credor o direito de nomear bens para prosseguimento da execução.
Na hipótese do devedor não nomear bens, o
oficial de justiça, por indicação do credor ou independentemente deste,
penhorará tantos bens quanto bastem para garantir o valor da execução.
Considera-se feita a penhora, com a apreensão
e o depósito do bem.
Quando a penhora não recai sobre dinheiro, é
necessária, a denominada expropriação. Outra hipótese é quando há
adjudicação, ato pelo qual o credor recebe a transferência da propriedade
do bem penhorado, mediante alienação (art. 647, II, do CPC).
Em outra hipótese, haverá a expropriação, que
é composta de avaliação e a arrematação.
19
A avaliação está regida pelos artigos 681 a 685
do CPC, que tem por objetivo verificar se os bens penhorados satisfazem
o quantum devido.
A arrematação está regida pelo art. 686 do
CPC, que tem por objetivo converter os bens penhorados em dinheiro.
Poderá ainda o devedor utilizar-se do instituto
da remissão da execução, que é o pagamento pelo devedor ao credor dos
valores referentes ao débito, antes da arrematação (art. 651). Poderá
ainda o conjugue, o descendente ou o ascendente do devedor utilizar-se
da remissão dos bens, que é a liberação dos bens alienados ou
arrematados, depositando o preço igual ao que foram alienados ou
adjudicados (art. 787).
O pagamento ao credor se dá pela entrega do
dinheiro (direta ou indiretamente), pela adjudicação dos bens penhorados
ou pelo usufruto de bem imóvel ou de empresa.
3.1 . DA INTIMAÇÃO DA PENHORA.
O artigo 699 do Código de Processo Civil
prevê:
Art. 669 - Feita a penhora, intimar-se-á o
devedor para embargar a execução no prazo
de 10 (dez) dias.
Parágrafo único. Recaindo a penhora em
bens imóveis, será intimado também o
20
cônjuge do devedor. (Redação dada ao
artigo pela Lei nº 8.953, de 13.12.1994)
Verifica-se que o prazo para embargos a
execução é de 10 (dez) dias.
O prazo do art. 669 começa a fluir da juntada
aos autos a prova da intimação da penhora (art. 738, I), sendo que, se na
execução existirem diversos executados, o prazo inicia-se da juntada da
última intimação da penhora (art. 241, III).
A intimação poderá ser realizada pelo oficial
de justiça através de mandado, e/ou por edital, existindo decisões que se
admite por hora certa. A mais comum sem dúvida seria a por oficial de
justiça.
Importante mencionar que, caso a penhora
recaia sobre bens imóveis, necessário, a intimação do cônjuge.
Como citado acima, o Código de Processo
Civil contempla tal medida, pois, a teor do art. 669, § único, “recaindo a
penhora em bens imóveis, será intimado também o cônjuge do devedor”.
Daí, perguntamos: necessário a intimação do
companheiro (a) ? Entendemos que sim, já que a Constituição Federal de
1988, estipula que “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a
união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo
a lei facilitar sua conversão em casamento”.
21
Na norma legal faz tal previsão para garantir
sua meação sobre o imóvel do casal, sendo excluídos os casos em que
provado que ambos os conjugues foram beneficiados com o ato que
gerou a penhora.
Caso o conjugue não seja intimado, são nulos
os atos processuais que foram praticados antes da intimação da penhora.
3.2 . DA EFETIVIDADE DA PENHORA.
Instaurado o processo de execução e feita, se
necessário, a liquidação, procede-se à penhora dos bens que vão formar o
objeto da execução e que podem ser
do executado, ou,
excepcionalmente de terceiros.
A penhora tem por finalidade e consequência
dos efeitos:
1- visa individuar e apreender efetivamente os bens que se destinam aos
fins da execução, preparando assim o ato futuro de desapropriação;
2- visa também conservar os bens assim individuados na situação em
que se encontram, evitando que sejam escondidos, deteriorados ou
alienados em prejuízo da execução em curso, garantindo, por
consequência, a preferência para o exeqüente. Ambos estes efeitos
são conseguidos pela determinação e fixação da responsabilidade
executória sobre os bens apreendidos. Esta responsabilidade, que
abrange genericamente todos os bens do executado ou dos terceiros
secundariamente responsáveis, se concentra e se imprime pela
22
penhora com energia reforçada nos bens apreendidos, para não soltálos mais e levá-los tal como estão ao ato de desapropriação. A
penhora escolhe, pois, e destina definitivamente, no patrimônio do
responsável, os bens que deverão servir a satisfação do exeqüente.
3- Garantir o Juízo da execução, ou seja, garante e assegura a tutela
jurisdicional.
A penhora tem, como se vê, em parte, função
conservativa. Sua afinidade com o arresto é evidente. Diferencia-se,
todavia, dele por ser ato do processo de execução, o que não acontece
com o arresto. Por isso, a penhora tem também a função meramente
preparatória que se mencionou;tem por fundamento o título executório,
cuja execução se está processando, e não tem condições ou pressupostos
próprios, que se possam distinguir dos do processo ao qual pertence. O
arresto é, ao contrário, ato autônomo com função puramente
acautelatória e como tal é objeto de verdadeiro processo acessório; é
concedido para tutelar direito ainda incerto; tem seus próprios
pressupostos e condições, processuais e substanciais, que o juiz deve
verificar caso por caso; e cessa de pleno direito com a terminação do
processo principal (arts.807 e 808, III, do CPC).
3.3. NATUREZA JURÍDICA DA PENHORA.
São três as correntes , na doutrina, que definem
a natureza jurídica da penhora.
23
A primeira corrente; considera a penhora como
uma medida cautelar, que no entendimento de Humberto Theodoro
Júnior:
“...deve ser logo descartada, pois não é a
penhora medida que se tome como eventual
instrumento de mera segurança ou cautela
de
interesse
em
litígio,
como
especificamente ocorre com as providências
cautelares típicas, ad instar do sequestro,
do arresto e similares”.24
Com a penhora se dá o primeiro passo na
execução, de forma a transferir os bens do devedor, resguardando, sem
dúvidas, referidos bens até a expropriação.
Ainda,
no
entendimento
de
Humberto
Theodoro Júnior:
“... o fato de que a penhora tenha a função
de preservar os bens de subtrações e
deteriorações, de modo a fazer possível o
posterior desenvolvimento da expropriação,
não autoriza a considerar dita penhora
como
uma
absolutamente
providência
igual
aos
cautelar,
sequestros
(conservativos e judiciários ), os quais, por
sua vez acionam, através de um processo
24
THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro: Forense,
2002, 2v. p.168.
24
funcionalmente autônomo, uma específica
medida cautela”. 25
A penhora tem finalidade própria, determinada,
não podendo ser considerada como uma medida cautelar. Não há que se
falar em natureza mista, executiva e cautelar, devendo ser considerado
seu objetivo final, qual seja, a iniciação do procedimento expropriatório.
A segunda corrente; considera a penhora como
um ato executivo, que tem por finalidade a individualização e
preservação dos bens garantidores da execução.
No entendimento de Humberto Theodoro
Júnior, “Trata-se, em suma, do meio de que vale o Estado para fixar a
responsabilidade executiva sobre determinados bens do devedor”.26
A terceira corrente; tem posição intermediária,
tratando a penhora como ato executivo com efeitos conservativos.
Assim, verifica-se, que a penhora é ponto
muito debatido na doutrina o da natureza jurídica da penhora. Para
Carnelutti, a penhora produz apenas um “enfraquecimento do direito do
devedor” sobre os bens, que se manifesta na limitação de sua faculdade
de dispor: a alienação da coisa ainda é possível, mas não a livra da
responsabilidade, mesmo depois de entrada no patrimônio de terceiro.
Daí pouco falta ainda para admitir-se francamente que a penhora não
afeta de modo absoluto as relações de direito material existentes; não
produz nem perda nem enfraquecimento da faculdade do executado de
25
Op. Cit., pág.168.
25
dispor de seus bens, nem qualquer espécie de direito do exeqüente sobre
os bens penhorados.
A penhora é ato pelo qual o órgão judiciário
submete a seu poder imediato determinados bens do executado, fixando
sobre eles a destinação de servirem à satisfação do direito do exeqüente.
Tem, pois natureza de ato executório. Quer realizado excepcionalmente
pelo juiz em forma de despacho, quer pelo oficial de justiça, que escolhe
os bens seguindo a ordem estabelecida em lei e os declara penhorados ou
recebe as declarações do executado quando este fizer nomeação dos
bens, não muda a natureza de ato e não mudam seus efeitos.
O ato de penhora produz o efeito de modificar
a situação jurídica do bem penhorado; às vezes é acompanhado por atos
materiais que se destinam a assegurar a consecução dos efeitos do ato,
tirando o bem da disponibilidade do executado e entregando-o ao
depositário, o que serve também a manifestar exteriormente, para
garantia de terceiros, as modificações ocorridas. Este último fim atingese também pela inscrição do auto de penhora de imóveis no registro
imobiliário.
3.4. FUNÇÃO DA PENHORA
Nos termos dos artigos 664 e 665 do Código de
Processo Civil, a penhora tem a função de individualização, apreensão e
depósito dos bens do executado, ficando estes à disposição judicial,
tornando-os indisponíveis ao executado e sujeitando-os à expropriação.
26
Op.Cit., pág. 168
26
Tem o executado a faculdade de oferecer os
bens para a garantia da execução, desde que obedecidos os requisitos
legais dos artigos 655 e 656 do CPC.
Com a individualização dos bens, ocorre o ato
de apreensão pelo órgão executivo, e a entrega dos mesmos
ao
depositário, que assume encargo público, ficando responsável pela sua
guará e conservação. Com o depósito dos bens, estes ficam indisponíveis
perante o devedor e terceiros.
A penhora, desta forma, possui as funções de
individualização e apreensão efetiva dos bens destinados ao fim da
execução; a conservações dos mesmos; cria para o exeqüente,
preferência, sem prejuízo das prelações de direito material, estabelecidas
anteriormente.
3.5. EFEITOS DA PENHORA PROPRIAMENTE DITOS.
Para o Ilustre doutrinador Elpídio Donizetti
Nunes, existem efeitos processuais da penhora e os efeitos materiais:
“São efeitos processuais da penhora:
a) individualizar o bem ou bens que vão ser
destinados à satisfação do crédito (...)
b) garantir o juízo da execução (...)
c) cria preferência para o exeqüente (...)
Quanto aos efeitos materiais da penhora,
são os seguintes:
a) priva o devedor da posse direta (...)
27
b) induz a ineficácia das alienações
(...)”.27
O efeito da penhora é, pois, meramente
processual e consiste em imprimir a responsabilidade na coisa
apreendida de forma tal que a coisa continua sujeita à execução,
quaisquer que sejam os atos realizados pelo executado a seu respeito: em
outras palavras a alienação total ou parcial do bem (ou a constituição do
direito de garantia sobre o mesmo) não pode ser oposta ao exeqüente e
não pode impedir o prosseguimento da execução, permanecendo a
sujeição daquele bem ao poder executório do órgão público, qualquer
que seja o direito adquirido por terceiro sobre o mesmo.
A penhora impõe, pois sobre a coisa um
vínculo de caráter processual que sem, afetar os direitos do executado,
sujeita a mesma ao poder sancionatório do Estado para servir a satisfação
do exeqüente; vínculo que permanece invariado quaisquer que sejam as
modificações que possam ocorrer na condição: jurídica da coisa. O
direito do executado sobre ela coexiste, intacto em sua essência, com o
vínculo público processual que o ato de penhora impôs sobre a mesma,
qualquer forma de exercício daquele direito é permitido, enquanto
praticamente possível, mas não altera este vínculo.
Se a execução por qualquer motivo for
desfeita, o terceiro que adquiriu eventualmente algum direito sobre os
bens penhorados poderá pretender satisfazê-lo, mas, enquanto a
27
Op. Cit., pág. 399.
28
execução continuar, nada poderá fazer que prejudique o exeqüente ou
outros credores concorrentes.
Esta também é a significação da penhora
também no direito brasileiro. É verdade que as disposições legais nele
existentes; tornam inoponíveis os atos de alienação feitos em fraude de
execução; vinculando os bens do executado de modo muito semelhante
ao que decorre da penhora, e isso já muito antes de esta ser praticada.
IV – GRADAÇÃO LEGAL DA NOMEAÇÃO DE BENS À
PENHORA
A penhora poderá fazer-se onde quer que se
achem os bens; os oficiais encarregados da diligência deverão ir ao lugar
e fazer com que recaia a penhora em tantos bens quantos bastem para
29
assegurar a execução, inclusive as custas, dando preferência aos bens
livres e observando a gradação estabelecida em lei.
O Código de Processo Civil vigente adota a
execução por graus ou por ordem, onde o credor deve a seguir a ordem
legal estabelecida pelo artigo 655 abaixo transcrito:
“Art. 655. Incumbe ao devedor, ao fazer a
nomeação de bens, observar a seguinte
ordem:
I – dinheiro;
II – pedras e metais preciosos;
III – títulos da dívida pública da
União ou dos Estados;
IV – títulos de crédito, que
tenham cotação em bolsa;
V – móveis;
VI – veículos;
VII – semoventes;
VIII – imóveis;
IX – navios e aeronaves;
X – direitos e ações.
§
1.º
Incumbe
também
ao
devedor:
I – quanto aos bens imóveis,
indicar-lhes
aceitá-los
as
e
transações
mencionar
aquisitivas,
as
divisas
e
confrontações;
II
–
quanto
aos
móveis,
particularizar-lhes o estado e o lugar em
que se encontram;
30
III – quanto aos semoventes,
especificá-los, indicando o número de
cabeças e o imóvel em que se acham;
IV
identificar
–
o
quanto
devedor
aos
créditos,
e
aceitá-lo,
descrevendo a origem da dívida, o título
que a representa e a data do vencimento;
V – atribuir valor aos bens
nomeados à penhora.
§ 2.º Na execução de crédito
pignoratício, anticrético ou hipotecário, a
penhora, independentemente de nomeação,
recairá sobre a coisa dada em garantia”.
A gradação é estabelecida para facilitar o
melhor andamento da execução, dando preferência aos bens que se
podem mais facilmente alienar, e com melhores resultados. Confira-se o
entendimento jurisprudencial:
“Bens com expressão econômica. O ato
constritivo há de recair em bens com
expressão econômica que possam cumprir
os objetivos do processo executório, quais
sejam a conversão em dinheiro pela hasta
pública
e
o
pagamento
ao
credor.
Indispensável demonstrasse a executada
pudessem
tais
bens
ser
passíveis
de
conversão em moeda nacional em montante
suficiente para garantir e, ao final, satisfazer
a execução. (2.º TACivSP, 2.ª Câm., Ag
31
643989, rel. Juiz Norival Oliva, v.u., j.
31.7.2000) ”28.
“Bens em quantidade bastante para garantir
a
execução.
apreensão
dinheiro,
A
penhora
judicial
de
direitos,
consiste
bens,
entre
outros
na
valores,
bens,
pertencentes ao devedor e executado em
quantidade
bastante
para
garantir
a
execução. Por isso deve atrelar-se às regras
de procedibilidade com a observância da
conveniência e da utilidade dos bens
penhorados para atender à pretensão do
credor (2.º TACivSP, 10.ª Câm., Ag
738769-0/9, rel. Juiz Irineu Pedrotti, v.u., j.
8.5.2002)”29.
A escala atende, em ordem decrescente, a mais
fácil satisfação do exeqüente e do executado, para que se conclua, o mais
depressa possível, a execução. No entanto, a jurisprudência tem-se
inclinado no sentido de que “a gradação legal estabelecida para
efetivação da penhora não tem caráter rígido, podendo, pois, ser alterada
por força de circunstâncias e atendidas as peculiaridades de cada caso
concreto”.30
A penhora deverá consistir na apreensão e
depósito dos bens. O auto de penhora conterá a indicação do tempo e do
28
NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003, p.1020.
29
Ob.Cit., p. 1020.
30
STJ, ac. de 07.05.90, 2ª T, no RMS n.º 47-SP, Rel Min. Carlos M. Veloso, in Lex – JSTJ, 14/103.
32
lugar em que foi feita, os nomes das partes e a descrição dos bens
penhorados. Realizada a diligência, será intimado o executado (e sua
mulher, se forem penhorados bens imóveis), para que tenha legalmente
ciência do ocorrido e possa aceitá-la no prazo previsto. Esta intimação é
necessária, qualquer que seja a forma com que se procedeu à penhora,
inclusive a nomeação de bens, uma vez que “o executado tem direito
líquido e certo em que seja respeitada a preferência específica dos bens
que devem ser penhorados ou arrestados”.31
A penhora há de ser feita de preferência em
dinheiro, pedras e metais preciosos, porque são bens transeuntes,
excetuados os anéis nupciais; mas temos de atender a que o dinheiro está
em primeiro lugar. Se a dívida é em moeda estrangeira e o devedor a
tem, cabe-lhe nomear tal moeda. Se for em moeda nacional, só se há de
nomear moeda estrangeira se o que o devedor tem em moeda nacional
não basta. Se a dívida é numa espécie de moeda e a que o devedor tem
não basta, então, o restante, é que pode ser nomeado em outra moeda.
Com relação às pedras e metais preciosos, se o
devedor irá nomeá-las, a escolha lhe cabe. Se o direito de nomeação
passou ao credor, ele é que indica as pedras e os metais preciosos. O que
importa é que o credor, se está com o direito de nomear, não escolha o
que excede o crédito, podendo escolher o que baste à execução:
“Bens suficientes à satisfação do crédito. É
pressuposto de eficácia da nomeação à
penhora que o bem indicado seja suficiente à
31
RT 683/106.
33
satisfação
do
crédito.
Faltando
esse
pressuposto, o credor não é obrigado a
aceitá-lo (2.º TACivSP, 10.ª Câm., Ag
654109-0/0, rel. Juiz Nestor Duarte, v.u., j.
20.9.2000)”32.
Os títulos da dívida pública e os papéis de
crédito que tenham cotação na bolsa, além da circulabilidade, apresentam
elementos de imediato conhecimento dos seus valores, que os põem à
frente de quaisquer outros títulos de crédito:
“Título da dívida pública. Ineficácia da
nomeação. É ineficaz a nomeação à penhora
de títulos que não têm cotação no mercado,
sendo, portanto, inegociáveis (2.º TACivSP,
10.ª Câm., Ag 666541-0/0, rel. Juiz Gomes
Varjão, v.u., j. 7.2.2001)”33.
Por fim, o artigo 656 do Código de Processo
Civil acrescenta à questão da gradação legal algumas restrições, que
podem invalidar a nomeação de bens à penhora feita pelo devedor.
Assim, ocorrerá a ineficácia da nomeação, quando:
“(...) I – se não obedecer à ordem
legal;
II – se não versar sobre os bens
designados em lei, contrato ou ato judicial
para o pagamento;
32
NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003, p.1020
34
III – se, havendo bens no foro da
execução, outros hajam sido nomeados;
IV – se o devedor, tendo bens
livres e desembargados, nomear outros que
não o sejam;
V – se os bens nomeados forem
insuficientes para garantir a execução;
VI – se o devedor não indicar o
valor dos bens, ou omitir qualquer das
indicações a que se referem os incisos I a
IV, do § 1º, do art. 655.”
Todas essas restrições elencadas no artigo 656
do CPC, no entanto, atuam somente no pressuposto da existência de
outros bens do devedor que possam escapar de seu alcance. Assim, se,
por exemplo, o devedor só possuir bens fora da comarca ou só onerados,
a nomeação que incidir sobre eles será plenamente eficaz e,
naturalmente, não poderá ser rejeitada pelo credor.
V – DA IMPENHORABILIDADE E RELATIVIDADE DA
PENHORA DE BENS.
Como já dissemos, de regra, todos os bens
podem ser penhorados.
33
Ob. Cit., p. 1021.
35
Porém, a norma legal determina que alguns
bens são absolutamente impenhoráveis, que não podem, em hipótese
alguma, serem penhorados e outros relativamente impenhoráveis,
hipótese que podem ser penhorados, no caso em que inexistam outros
bens passíveis de constrição.
Segundo o art. 649 do CPC:
“Art.
649
-
São
absolutamente
impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por
ato voluntário, não sujeitos à execução;
II - as provisões de alimento e de
combustível, necessárias à manutenção do
devedor e de sua família durante 1 (um)
mês;
III - o anel nupcial e os retratos de família;
IV - os vencimentos dos magistrados, dos
professores e dos funcionários públicos, o
soldo e os salários, salvo para pagamento
de prestação alimentícia;
Vide Jurisprudência Selecionada
V - os equipamentos dos militares;
VI - os livros, as máquinas, os utensílios e
os instrumentos, necessários ou úteis ao
exercício de qualquer profissão;
Vide Jurisprudência Selecionada
VII - as pensões, as tenças ou os montepios,
percebidos dos cofres públicos, ou de
institutos de previdência, bem como os
provenientes de liberalidade de terceiro,
36
quando destinados ao sustento do devedor
ou da sua família;
VIII - os materiais necessários para obras
em andamento, salvo se estas forem
penhoradas;
IX - o seguro de vida;
X - o imóvel rural, até um módulo, desde
que este seja o único de que disponha o
devedor, ressalvada a hipoteca para fins de
financiamento
acrescentado
agropecuário.
pela
Lei
nº
(Inciso
7.513,
de
09.07.1986)”.
Na forma da Lei n.° 8009/90 também o imóvel
residencial destinado à família, conhecido como “bem de família”, desde
que nela resida, é absolutamente impenhorável, salvo por dívida de
IPTU, conforme previsto em Lei.
O artigo 655, elenca os bens relativamente
impenhoráveis:
“Art. 650 - Podem ser penhorados, à falta
de outros bens:
I - os frutos e os rendimentos dos bens
inalienáveis,
salvo
se
destinados
a
alimentos de incapazes, bem como de
mulher viúva, solteira, desquitada, ou de
pessoas idosas;
II - as imagens e os objetos do culto
religioso, sendo de grande valor.”.
37
Percebe-se que a norma legal é bem clara, não
havendo maiores divergências neste aspecto.
VI – OBJETO DA PENHORA.
Constitui objeto da penhora, bens legalmente
penhoráveis do patrimônio do devedor, haja vista que serão sobre eles
que incidirão e responderão a responsabilidade executória.
38
O objeto da penhora é amplo, posto que, exceto
os bens impenhoráveis, em regra, como já mencionado, todos os demais
são penhoráveis (art. 591, CPC).
6.1. DA PENHORA DO CAPITAL DE GIRO DA EMPRESA.
A penhora do capital de giro de uma empresa,
traz à discussão, um dos importantes temas do ordenamento jurídico.
È uma medida drástica, para possibilitar o
andamento da execução e possível entrega da prestação jurisdicional.
Em decorrência da difícil situação que assola o
país, onde os empresários a cada dia são surpreendidos por impostos e
mais impostos, tornando a sobrevivência da empresa impossível,
culminando em pedido de falência; a penhora de capital de giro vai
significar a morte certa desta.
A penhora do capital de giro de uma empresa;
culmina no atraso do pagamento de salários, que na esfera social, é o
mais grave. Na esfera comercial, impossibilita que a empresa adquira os
produtos mínimos e indispensáveis para a continuidade do negócio.
O art. 620 do CPC prevê que a execução deva
ser promovida pelo modo menos gravoso ao Executado; pedimos vênia
para transcrever:
39
“Quando por vários meios o credor puder
promover a execução, o juiz mandará que
se faça pelo modo menos gravoso para o
devedor”.
A penhora de capital de giro da empresa, a teor
do artigo 620 do CPC, é uma afronta ao citado dispositivo legal.
Deve a Justiça verificar cada caso, tanto
juridicamente, como sócio-economicamente, de forma a evitar maiores
transtornos, não só processuais como sociais, de forma a evitar a ruína
do empresário e conseqüentemente dos empregados, dele dependentes.
A penhora do capital de giro da Agravante,
equipara-se à penhora de “bem de família”.
A Execução é direito do credor, para que se
satisfaça a obrigação assumida pelo devedor, porém, este não pode ser
sacrificado, principalmente quando houver outros meios viáveis para a
satisfação do crédito do Exeqüente.
O indivíduo que sofre uma execução encontrase geralmente com o seu patrimônio abalado, não podendo, o processo
de execução agravar a sua situação financeira.
Desta forma, em havendo vários meios para
que se processe a execução; esta será efetuada pelo meio menos gravoso
ao Exeqüente, nos termos do art. 620 do CPC.
40
A não observância do preceito invocado
acarretará sanções ao credor, respondendo pela onerosidade das custas
processuais que der causa.
Na execução, o que se pretende é a satisfação
do crédito do Exeqüente, porém, sem deixar de se observar a forma de
execução, que deverá ser processada com o menor sacrifício possível do
executado.
Esse é o Entendimento do Professor Humberto
Theodoro Júnior:
“A IMPOSSIBILIDADE DA PENHORA
DO CAPITAL DE GIRO.
HUMBERTO THEODORO JÚNIOR
Professor Titular da Faculdade de Direito
da UFMG. Desembargador aposentado do
TJ-MG. Doutor em Direito. Advogado
SUMÁRIO: 1. A execução forçada e o
princípio da economia. 2. A origem e
justificativa da regra contida no art. 620 do
CPC. 3. A aplicação do art. 620 do CPC à
penhora. 4. A gradação da penhora no caso
de execução. 5. A impossibilidade da
penhora do capital de giro.
1. A EXECUÇÃO FORÇADA E O
PRINCÍPIO DA ECONOMIA
Conforme já ressaltamos em sede de
doutrina, "o ordenamento jurídico compõese de uma verdadeira coleção de regras dos
mais variados matizes. Mas quando se
encara um subconjunto dessas normas,
destinado a regular um grupo orgânico de
fatos conexos, descobrem-se certos
pressupostos que inspiraram o legislador a
seguir um rumo geral. Encontram-se, dessa
maneira,
certas
nos
textos,
mas
41
inquestionavelmente presentes no conjunto
harmônico das disposições. Esse norte
visado pelo legislador representa os
princípios informativos, cuja inteligência é
de inquestionável importância para a
compreensão do sistema e, principalmente,
para interpretação do sentido particular de
cada norma, que haverá de ser buscado
sempre de forma a harmonizá-lo com os
vetores correspondentes à inspiração maior
e final do instituto jurídico-normativo"
(Humberto Theodoro Júnior, Curso de
Direito Processual Civil, 19ª ed., Rio de
Janeiro, Forense, 1997, vol. II, nº 633, p.
11).
No estudo da moderna disciplina do
processo de execução, costuma-se detectar
a presença de vários princípios, todos com
nítida influência sobre o Código de
Processo Civil. Dentre eles, aponta-se como
presente no ordenamento jurídico brasileiro
o denominado "princípio da economia",
assim enunciado:
"Toda execução deve ser econômica, isto é,
deve realizar-se da forma que, satisfazendo
o direito do credor, seja a menos prejudicial
possível ao devedor" (Cláudio Viana de
Lima, Processo de Execução, Rio de
Janeiro, Ed. Forense, 1973, nº 5, p. 25;
Humberto Theodoro Júnior, ob. cit., nº 637,
p. 13).
No texto do Código, o princípio em análise
encontra-se traduzido no teor do art. 620, in
verbis:
"Quando por vários meios o credor puder
promover a execução, o juiz mandará que
se faça pelo modo menos gravoso para o
devedor".
Conjuga-se tal princípio com outros, como
o da "utilidade", o da "limitação" e o da
"dignidade humana", de modo que toda
execução tem por finalidade apenas a
satisfação do direito do credor, não devendo
atingir senão uma parcela do patrimônio do
devedor, ou seja, apenas o indispensável
para a realização do crédito exeqüendo. Só
se admite, outrossim, a execução que seja
"útil ao credor", não sendo tolerável o seu
emprego para "simples castigo ou sacrifício
42
do devedor". E, ainda, não se tolera que o
direito de executar possa ser manejado de
tal maneira a levar o executado "a uma
situação incompatível com a dignidade
humana" (Lopes da Costa, Direito
Processual Civil Brasileiro, 2ª ed., Rio de
Janeiro, Ed. Forense, 1959, nºs 49, 50 e 53,
pp. 53, 54 e 55).
2. A ORIGEM E JUSTIFICATIVA DA
REGRA CONTIDA NO ART. 620 DO
CPC
Anota Alcides de Mendonça Lima que,
"historicamente, a execução evoluiu dos
atos contra a pessoa do devedor para o seu
patrimônio. A prisão do devedor e, até, o
seu esquartejamento cederam lugar a
providências
contra
seus
bens.
Gradativamente, à medida que as
instituições processuais progrediam, menos
drásticos se tornavam os meios executivos,
tanto os de coação como os de sub-rogação"
(Comentários ao Código de Processo Civil,
6ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1990,
vol. VI, nº 1.500, p. 601).
Explica o mesmo processualista que,
modernamente, "ainda que a execução seja
realizada como resultado do exercício de
um direito do credor, para satisfazer à
obrigação assumida pelo devedor, nem por
isso o sujeito passivo deve ser inutilmente
sacrificado, quando, por outro modo que
não o usado pelo sujeito ativo, seja atingido
o mesmo objetivo quanto à solvência da
prestação. O interesse social e a finalidade
ética do processo exigem, sem dúvida, que
a dívida (em acepção ampla) seja
totalmente adimplida. Mas nem assim o
credor tem o direito de agravar a situação
do devedor, no curso da execução,
escolhendo meio mais oneroso do que outro
que possa alcançar o mesmo alvo, quer por
ignorância como, geralmente, por má-fé,
com a intenção preconcebida de lesar o
devedor" (ob. cit., nº 1.500, pp. 601-602).
Esse dado ético e social do princípio
instalado no art. 620 do CPC é muito bem
destacado por Amílcar de Castro, in verbis:
43
"E se a finalidade do processo executivo é
esta de obter o Poder Judiciário, à custa do
executado, o bem devido ao exeqüente, é
intuitivo que, quando por vários meios
executivos puder executar a sentença, isto é,
quando por vários modos puder conseguir
para o exeqüente o bem que lhe for devido,
o juiz deve mandar que a execução se faça
pelo menos dispendioso. Todos os meios
executivos são onerosos para o executado,
mas não seria justo e seria inútil que se
preferisse um meio mais custoso, quando
por outro menos pesado pudesse o
exeqüente conseguir o mesmo resultado
prático. É um elevado principio de justiça e
eqüidade, informativo do processo das
execuções, este que o Estado deve, quanto
possível, reintegrar o direito do exeqüente
com o mínimo de despesa, de incômodo e
de sacrifício do executado. Jus est ars boni
et aequi, isto é, a sistematização do que é
conveniente e útil" (Comentários ao Código
de Processo Civil, São Paulo, Ed. RT, 1974,
vol. VIII, nº 213, p. 150).
Assim, conclui Ernane Fidelis dos Santos
que "é princípio do processo executório que
a execução se faça sempre pelo modo
menos gravoso ao devedor (art. 620)". Por
isso, deve ser sempre aplicado, "quando,
sem prejuízo material e processual do
credor, a execução puder atingir seus fins"
(Manual de Direito Processual Civil, 3ª ed.,
São Paulo, Saraiva, 1993, vol. II, nº 1.124,
p. 88).
É bom lembrar que a regra em apreciação
não é novidade em nosso processo civil. Já
estava presente no art. 903 do antigo
Código de 1939, quando era interpretada
como fundada no princípio do favor
debitoris, segundo o qual se concedia ao
sujeito passivo um benefício especial "para
evitar o agravamento que, normalmente, a
execução já lhe causa" (Mendonça Lima,
ob. cit., nº 1.501, p. 602).
Comentando o velho diploma processual,
José Frederico Marques considerava o
44
benefício legal como inspirado "em elevado
princípio
de
justiça
e
eqüidade"
(Instituições de Direito Processual Civil,
Rio de Janeiro, 1960, vol. V, nº 1.143, p.
139), tal como também o fazia Amilcar de
Castro (Comentários ao Código de Processo
Civil, Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1941,
vol. X, p. 104).
De outro lado, o tom do enunciado do art.
620 do vigente CPC – "o juiz mandará" –
não deixa dúvida sobre tratar-se de norma
cogente, e não de simples faculdade
judicial. Dessa maneira, "se o credor
infringir qualquer dos dispositivos que
garantem ao devedor uma execução mais
suave ou se o devedor usar da prerrogativa
assegurada em seu benefício, o juiz, na
primeira hipótese, não deverá permitir a
iniciativa, mandando "que se faça pelo
modo menos gravoso para o devedor"; e na
segunda, autorizar o pedido do devedor. O
dispositivo confere poderes amplos ao juiz,
que deverá agir de ofício (não é poderá
mandar e sim mandará). Claro está que,
podendo o mais (agir por iniciativa
própria), o juiz poderá o menos, isto é,
indeferir postulações do credor, se entender
que a sua efetivação seja gravosa para o
devedor. O poder de indeferir está implícito
na atividade em defesa do devedor, ainda
que o Código não o diga, como igualmente
o anterior não mencionava" (Mendonça
Lima, ob. cit., nº 1.509, p. 604).
Segundo a experiência de vida, quem sofre
uma execução já se encontra, de ordinário,
em dificuldades na gestão de seu
patrimônio; por isso, não quer a lei que o
processo executivo seja motivo de
agravamento desnecessário do quadro de
adversidades por que passa o devedor.
"Forçá-lo, então, a cumprir suas obrigações,
ou a saldar o débito, não significa penalizálo" – adverte Sahione Fadel (Código de
Processo Civil Comentado, Rio de Janeiro,
Ed. Kofino, 1974, t. III, p. 302). Daí a regra
codificada de que:
45
"Se houver vários meios através dos quais a
execução possa ser promovida, deverá (não
poderá, porque é dever e não faculdade) o
juiz determinar que se faça pelo modo
menos gravoso para o devedor" (ob. cit., p.
303).
O fundamento da norma traduzida no art.
620 do Código de Processo Civil, como
ensina o comentarista invocado, "é de
ordem pública, de forma que a não
observância acarreta sanções para o credor,
que responderá pelas custas da onerosidade
a que deu causa". Por isso mesmo, conclui,
com inteiro acerto, que:
"Embora compita ao credor escolher o meio
para a execução (art. 615, I), pode o
executado, demonstrando as conveniências
de, por outro modo, satisfazer a obrigação,
pleitear do juiz que a execução se processe
de acordo com a preservação de seus
interesses, no que isso respeita com os ônus
que decorrem da actio judicati.
O importante é, em todos os casos, que,
qualquer que seja o meio empregado, haja a
obtenção do fim pretendido pelo exeqüente,
que é a sua reparação, e o menor sacrifício
possível para o executado" – grifamos –
(Fadel, ob. e loc. cits.).
Em suma: o processamento da execução
pelo meio menos gravoso, no ordenamento
jurídico brasileiro, não entra no campo das
faculdades do juiz. Diante do caráter
imperativo da regra contida no art. 620,
cabe ao devedor o "direito de pretender que
seja o processo conduzido nesse sentido",
isto é, no sentido da menor onerosidade
possível para o executado (José Frederico
Marques, Manual de Direito Processual
Civil, São Paulo, Ed. Saraiva, 1976, vol. IV,
nº 801, p. 87).
Em se tratando, pois, de um direito
subjetivo do executado, conclui Pontes de
Miranda que:
46
"Na aplicação do art. 620, o juiz não tem
arbítrio, mas sim dever de escolher o modo
menos
gravoso
para
o
devedor"
(Comentários ao Código de Processo Civil,
Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1976, t. X, p.
43).
O credor, por sua vez, não tem escolha
entre o meio mais gravoso e o menos
gravoso para o devedor. Somente pode,
validamente, pleitear aquele meio, entre os
vários possíveis, que onere menos o
executado. Os outros tornam-se ilegais. E,
"se a escolha foi contra a lei..., tem o juiz de
indeferir o pedido" (Pontes de Miranda, ob.
e loc. cits.).
3. A APLICAÇÃO DO ART. 620
DO CPC À PENHORA
Principalmente na execução por quantia
certa é de fazer-se aplicar a norma do art.
620 do CPC, tornando-se, então, fácil
compreender o espírito tutelar do legislador
processual,
sempre
preocupado
em
resguardar o devedor de vexames e
sacrifícios desnecessários. Essa orientação,
v.g., pode ser entrevista quando a lei
estabelece a impenhorabilidade de certos
bens, quando se veda a penhora inútil ou
excessiva, quando se concede ao devedor o
direito de escolher os bens a penhorar etc.
(Cf. Humberto Theodoro Júnior, ob. cit., nº
776, p. 148).
Os diversos exemplos de casos sujeitos à
regra do art. 620 arrolados por Pontes de
Miranda são quase todos relacionados com
a penhora, no tocante, à escolha do bem,
sua
utilidade
ou
inutilidade,
sua
substituição, sua redução etc. (ob. cit., p.
41).
Também para Frederico Marques é,
principalmente, no procedimento da
penhora, que se localiza a oportunidade
para exercitar "o direito subjetivo do
devedor" à execução pelo "modo menos
gravoso". Dos dez exemplos arrolados pelo
47
autor, sete são relacionados com a execução
por
quantia
certa,
envolvendo,
principalmente, os bens penhorados. Dessa
maneira, conclui que, no exercício do
direito emanado do art. 620 do CPC, "de
modo geral, o devedor, acompanhando
como parte, o desenrolar da execução,
direito tem de impugnar atos de apreensão,
ou atos expropriatórios que sejam
supérfluos, prescindíveis, ou que lhe
causem prejuízo indevido" (ob. cit., nº 801,
p. 88).
4. A GRADAÇÃO DA PENHORA
NO CASO DE EXECUÇÃO
CONTRA EMPRESA
Para que o executado faça a escolha do bem
que deseja sofra a penhora, o Código lhe
traça, no art. 655, uma escala de
preferência, com dez itens, que começa pelo
dinheiro e vai terminar nos direitos e ações.
Em princípio, a observância da gradação
legal é condição de validade da nomeação.
Mas, justamente, para harmonizar o art. 655
com a regra cogente do art. 620, ou seja,
com a necessidade de realizar a execução
pelo modo menos gravoso para o devedor,
doutrina e jurisprudência têm entendido que
"a gradação legal estabelecida para
efetivação da penhora não tem caráter
rígido, podendo, pois, ser alterada por força
de
circunstâncias
e
atendidas
as
peculiaridades de cada caso concreto, bem
como o interesse das partes litigantes"
(Humberto Theodoro Júnior, Curso, cit., nº
819, p. 202; TJ-MG, MS 1.252, Jur. Min.,
44/60; STJ, RMS nº 47-SP, Lex JSTJ,
14/103; TA-RS, AI nº 16.993, RF 266/241,
e AI nº 191047091, RTJE, 93/126; TJ-BA,
ac. 3.3.83, in Alexandre de Paula, O
Processo Civil à Luz da Jurisprudência, Rio
de Janeiro, Ed. Forense, 1990, vol. XVI, nº
32.254, p. 347).
No mesmo rumo, aduz a doutrina de
Vicente Greco Filho que a ordem de
nomeação de bens à penhora não é absoluta,
pois, mesmo quando infringida pelo
devedor, o credor para discordar da escolha
48
e, assim, obter a decretação de sua
ineficácia, terá de demonstrar "que a
violação da ordem legal" causou algum
prejuízo ou veio a "dificultar em especial a
execução". É que, "se o credor não tiver
prejuízo com a nomeação, é preciso,
também, atender-se à comodidade do
devedor, segundo o princípio já várias
vezes repetido de que a execução, quando
possível, deve ser feita da maneira menos
onerosa para este último" (Direito
Processual Civil Brasileiro, 11ª ed., São
Paulo, Ed. Saraiva, 1996, vol. III, nº 12, p.
74. No mesmo sentido: Luiz Carlos de
Azevedo, Da Penhora, São Paulo, Ed.
Resenha Tributária, 1994, p. 189; Antônio
Carlos Costa e Silva, Tratado do Processo
de Execução, 2ª ed., Rio de Janeiro, Aide,
Ed., 1986, vol. II, nº 107.2, p. 850).
O STJ já teve oportunidade de proclamar
expressamente que o preceito sobre
gradação dos bens sujeitos à penhora é
"norma que há de ser interpretada em
consonância com o princípio geral que se
acha consagrado no art. 620 do CPC" (STJ,
RMS nº 28-SP, 2ª T., Rel. Min. Ilmar
Galvão, DJU 25.6.90).
Com base, justamente, nessa prevalência do
princípio da menor onerosidade sobre o da
gradação legal da penhora, o 2º TA Civ. de
São Paulo recusou fosse penhorada uma
"percentagem da receita do estabelecimento
comercial", ao argumento de que:
"Na efetivação da penhora incumbe ao
magistrado aferir as circunstâncias de cada
caso concreto, e decidir com cautela e
reflexão, mormente porque as normas
instrumentais não possuem caráter absoluto,
a ponto de afetarem a sobrevivência de uma
firma ou o normal desenvolvimento
produtivo do patrimônio do devedor" (AI nº
438.283, 1ª Câm., Rel. Juiz Renato
Sartorelli, ac. 18.9.95, in JUIS-Saraiva, nº
5, 3º trimestre/96).
49
Assim, embora o dinheiro ocupe o primeiro
lugar na escala de preferências para a
penhora, não se tolera sua constrição
quando esteja ele representando o capital de
giro da empresa devedora e disponha essa
de outros bens livres capazes de assegurar o
juízo, adequadamente.
A explicação está em que a empresa não é
uma figura estática de um simples
patrimônio. É um organismo vivo, cuja
preservação interessa a toda a sociedade e
não apenas a seus associados, pela
reconhecida função social que desempenha
na circulação da riqueza e na produção de
bens e serviços úteis e necessários à vida
comunitária.
Como todo ser vivo, a empresa constitui-se
de um complexo organismo que precisa ser
convenientemente alimentado. Os animais e
as plantas captam, no ar e nos alimentos
naturais, os nutrientes que se incorporam à
circulação sangüínea e à seiva e, assim,
conseguem manter em funcionamento todos
os seus órgãos vitais. Fenômeno igual
passa-se com a empresa, que só consegue
sobreviver se for convenientemente nutrida
do indispensável capital de giro. É com ele
que forma seus estoques de matérias primas
e o numerário de custeio da mão de obra (J.
Petrelli Gastaldi, Elementos de Economia
Política, 15ª ed., São Paulo, Ed. Saraiva,
1992, nº 62, p. 128). Sem ele não funciona
o organismo da empresa e sua degeneração
é imediata e inevitável.
Privar, então, uma empresa de seu capital
de giro equivale a suprimir-lhe o elemento
que lhe assegura a vida. É o mesmo que
condená-la à inanição e, conseqüentemente,
à morte.
Por isso, a jurisprudência repele a
possibilidade de a penhora de dinheiro ser
utilizada para atingir o faturamento
periódico da empresa devedora. Embora
lícita, em princípio, a penhora de dinheiro,
in casu, não se pode admiti-la "porquanto
não tem o juízo meios de aquilatar os
50
efeitos da penhora pretendida sobre o fluxo
financeiro da executada" (STJ, 2ª T., R.esp.
36.870-7-SP, Rel. Min. Hélio Mosimann,
ac. 15.9.93, RSTJ, 56/339).
Para que o faturamento da empresa fosse
alcançado pela penhora, teria esta, segundo
o acórdão do STJ, de incidir sobre toda a
empresa, para, aí sim, submetê-la a um
administrador judicial, que organizaria um
plano de administração, no qual se
estabeleceria o esquema de pagamento
compatível com a gestão empresarial em
globo, tudo conforme disciplinam os arts.
719, 720 e 728, do CPC (RSTJ, 56/340).
Penhorar singelamente o faturamento
periódico da empresa é medida inaceitável,
porque, como decidiu o Tribunal de Justiça
de São Paulo, "implicaria ostensiva
restrição ao exercício das atividades
comerciais da executada, podendo inclusive
conduzi-la ao estado de insolvência" (AI nº
170.751-2, Rel. Des. Telles Correa, ac.
18.3.91, JUIS-Saraiva, 5).
Segundo decidiu o Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro, "não há como confundir a
penhora em dinheiro com a penhora na féria
diária de um estabelecimento comercial.
Esta tem desatinação certa: atender às
necessidades
da
firma
e
outras,
possivelmente preferenciais ao crédito em
execução". Sendo impossível conhecer-se,
de plano, o líquido de uma receita, sua
penhora torna-se "injusta, ilegal e abusiva"
(TJ-GB, Rec. 7.655, Rel. Des. Elmano
Cruz, ac. 8.11.72, RT, 451/240).
Enfim, é amplamente majoritária, na
jurisprudência, a tese de que não se pode
penhorar o faturamento periódico de uma
empresa porque, sem assumir sua completa
administração,
a
medida
isolada
"compromete o capital de giro", atingindo,
por isso, o próprio estabelecimento (STJ, 1ª
T., R. esp. 37.027-2-SP, Rel. Min. Milton
Luiz Pereira, DJU, 5.12.94).
51
Assim, na mesma linha, tem decidido o 2º
TA Civ. de São Paulo que não se pode
penhorar o faturamento de uma empresa
porque sua receita periódica "não é
equiparável a lucro" e, por conseguinte, sua
constrição, para satisfazer o crédito do
exeqüente, importa sacrifício do "capital de
giro da devedora, com sua compulsória
descapitalização" (AI nº 430.952, 7ª Câm.,
Rel. Juiz Demóstenes Braga, ac. 4.4.95; e
AI nº 455.042, 6ª Câm., Rel. Juiz Lagrasta
Neto, ac. 28.2.96, JUIS-Saraiva, nº5, 3º
trimestre/96).
Diversa não é a posição da doutrina, acerca
da impenhorabilidade da receita, como bem
separado do patrimônio de uma empresa. A
propósito, preleciona Sérgio Sahione Fadel:
"A gradação legal começa pelo dinheiro,
que não pode ser confundido com o produto
da retribuição do trabalho, ou a
remuneração lato sensu, mas apenas
reservas em dinheiro, que o executado
possua.
Também a receita ou a féria diária da
sociedade comercial ou industrial não deve
ser suscetível de penhora...
A penhora pode recair em dinheiro, mas
não na féria diária que é capital de giro"
(ob. cit., IV, pp. 21-22).
Idêntico é o ensinamento de Arnaldo
Marmitt:
"A realização da penhora de bens não deve
afastar-se
de
certas
regras
de
procedibilidade. Além dos critérios legais,
impende sejam também observados os
critérios de conveniência e de utilidade,
sempre com o intuito de atingir os melhores
patamares de justiça.
Considera-se penhora por excelência aquela
que recai em dinheiro, que dispensa futura
avaliação e alienação judicial. No entanto,
embora viável e excelente a constrição em
numerário, não se tem aceito penhora feita
em féria diária de estabelecimento
52
comercial. Essa féria é reputada capital de
giro,
necessário
para
atender
às
necessidades da firma, ordinariamente
preferenciais em relação ao crédito em
execução" (A penhora, 2ª ed., Rio de
Janeiro, Aide Ed., p. 450).
Em suma: doutrina e jurisprudência estão
acordes em que não se deve penhorar o
capital de giro porque a tanto eqüivale
penhorar a própria empresa e porque não se
tolera
venha
a
execução,
desnecessariamente, atingir a estrutura de
sustentação da empresa. Ou seja,
"considerando que o estabelecimento ou
fundo de comércio é o instrumento da
atividade empresarial, não deve ser
penhorado se o devedor possuir outros bens
necessários para garantir a execução, pois,
na prática, sua penhora pode conduzir a
empresa à falência" (Antônio Nicácio, A
Nova Lei de Execução Fiscal, São Paulo,
Ed. Ltr, pp. 240-241).
5. A IMPOSSIBILIDADE DA
PENHORA DO CAPITAL DE GIRO
Quando se tem uma coisa complexa, isto é,
formada pela integração de vários
elementos, sendo impossível a eliminação
de qualquer um deles, sob pena de perda de
substância, diz-se que cada um desses
elementos configura parte integrante da
coisa.
A parte integrante é mais do que o
acessório, já que este pode, às vezes, ser
destacado da coisa principal, sem que esta
perca sua substância, tal como se dá com os
frutos e rendimentos. Com relação à coisa
composta, as partes que a integram não
podem ser destacadas, porque isto
desconfiguraria a própria coisa. Caio Mário
da Silva Pereira ensina, nessa ordem de
idéias, que "as partes integrantes de uma
coisa composta são aquelas que se acham
em conexão corporal com ela, erigindo-se
em complemento da própria coisa,
participando de sua natureza" e que por isso
53
devem seguir a sorte desta (Instituição de
Direito Civil, 18ª ed., Rio de Janeiro, Ed.
Forense, 1996, vol. I, nº 75, . 275).
Vicente Ráo observa que as partes
integrantes são as "que por sua natural
conexão com a coisa principal com esta
formam um só todo e são desprovidas de
existência material própria", e, ainda, as que
"a coisa principal por tal modo estão unidas
que,
dela
separadas,
esta
ficaria
incompleta". Entre elas, o civilista inclui
"certas partes de um organismo vivo, ou as
coisas artificiais como os edifícios em
relação ao solo" (O Direito e a Vida dos
Direitos, São Paulo, Max Limonad, 1960,
vol. II, nº 195; Silvio Rodrigues, Direito
Civil, 25ª ed., São Paulo, Ed. Saraiva, 1995,
vol. I, p. 133, na nota nº 99).
Porque não se pode tratar, juridicamente, a
parte integrante como objeto de direito
distinto da coisa complexa, o art. 649, nº
VIII, do CPC considera absolutamente
impenhoráveis "os materiais necessários
para obras em andamento". Somente
poderão ser constritos se a construção
(coisa complexa) for integralmente
penhorada.
Esse mesmo raciocínio prevalece para o
capital de giro no caso da empresa
mercantil. Sem este, aquela perde parte
substancial
de
sua
complexidade
econômica. Logo, para não ser a empresa
desnaturada ou destruída, o gravame não
pode restringir-se àquela parte integrante do
ente complexo que é a empresa
economicamente estruturada. Ou o gravame
atinge o todo, ou o capital de giro fica
imune à penhora, de forma isolada.
Pensar-se em penhora apenas do capital de
giro seria o mesmo que admitir-se a
penhora da casa (parte integrante do terreno
edificado) ou do motor ou dos pneus do
veículo (partes integrantes do automóvel).
É uma imposição natural e lógica: a parte
integrante devendo seguir sempre o destino
54
da coisa complexa, não poderá ser atingida
por penhora separadamente.
Sendo, outrossim, o capital de giro parte
essencial da empresa econômica, que, por
isso mesmo não pode ser tratado, para
efeito de penhora, como uma unidade
autônoma dentro do patrimônio da entidade
executada, resta conceituar o que se
entende, tecnicamente, por semelhante parte
integrante.
Em termos de administração financeira, o
capital de giro consiste no ativo corrente da
empresa, que tem como componentes os
títulos "caixa", "títulos negociáveis",
"valores a receber" e "estoques"
(Enciclopédia Saraiva de Direito, verbete
"Capital de giro", vol. 13, p. 94). O líquido
dessas contas forma, para a ciência contábil,
o capital de giro da empresa.
No ensinamento de Richard T. Cherry, "o
conceito de capital de giro como ativo
corrente visa diretamente ao ciclo
recorrente da caixa ao estoque, do estoque
às contas a receber e de volta à caixa. Na
seqüência convencional do fluxo, os
recursos financeiros aparecem primeiro
como caixa disponível. A caixa é usada
para adquirir estoque, o qual é processado e
colocado à venda; à medida que o estoque é
vendido, os recursos financeiros fluem para
contas a receber, para manter o crédito dos
clientes, e finalmente volta para a caixa,
conforme as contas são cobradas"
(Introdução à Administração Financeira,
São Paulo, Atlas, 1975, apud Enciclopédia
Saraiva de Direito, verbete cit., p. 95).
Semelhante é a lição de Dávio A. Prado
Zarzana, para quem "o capital de giro é o
elemento integrante do patrimônio da
empresa ou entidade correspondente, em
valor, a parcela do capital aplicada no Ativo
Circulante. Tal seria o Capital de Giro
Global que está ‘girando’, seguindo o fluxo
(disponibilidades - produção - estoques contas a receber- disponibilidades)"
55
(Enciclopédia Saraiva do Direito, vol. 13,
verbete "Capital de giro tributário" p. 96).
Inviável, destarte, se revela a penhora de
"contas a receber" dentro do ativo
circulante de uma empresa. Ditas contas são
partes integrantes do capital de giro, do qual
a entidade não pode ser privada, sem sofrer
profundo abalo no fluxo da circulação
econômica que a mantém ativa.
Atingi-la nesse ponto vital importa
decretar-lhe a imediata paralisia. Se não
contar com os créditos a receber, como a
empresa custeará o funcionamento de suas
atividades?
Como
resgatará
os
compromissos trabalhistas e tributários?
Como alimentará de matéria prima sua
linha de produção? A insolvência e a
quebra serão o seu fim imediato e
irremediável.
É bom de ver que o estrangulamento e a
extinção das empresas não são o desiderato
da sociedade contemporânea nem, muito
menos, o objetivo o processo de execução,
cujo desenvolvimento, ao contrário, a lei
manda
subordinar-se
ao
princípio
fundamental da menor onerosidade possível
para o executado (CPC, art. 620).
Mesmo quando, em casos extremos, se
chega a admitir a penhora e o usufruto
judicial de toda a empresa, não permite a lei
processual, que o credor, ou o juízo, se
apodere sumariamente de todo o seu
faturamento ou de todo o seu capital de
giro. Muito pelo contrário, o que impõe o
Código é o estabelecimento de um plano de
administração e de um esquema de
pagamento, dentro das disponibilidades das
receitas e do fluxo econômico da empresa
(CPC, arts. 677, 678 e 716 a 720).
Sem, portanto, o gravame por inteiro da
empresa, impenhorável se mostra o capital
de giro, quer como disponibilidade de
56
caixa, quer como título ou créditos a
receber da clientela.34
Deixa claro que, embora o dinheiro venha em
primeiro lugar na ordem das penhoras, quando este for capital de giro de
uma empresa, obviamente, a sua penhora trará à mesma, sérios riscos
econômicos, motivo pelo qual, a ordem estabelecida no artigo 655 do
CPC pode ser alterada, de forma a possibilitar a manutenção de uma
empresa, esta, sempre de interesse à sociedade.
6.2. EXECUÇÃO DE BENS DOS SÓCIOS E DESCONSIDERAÇÃO
DA PERSONALIDADE JURÍDICA.
Entende-se por pessoa jurídica:
“PESSOA
Unidade
JURÍDICA.
de
pessoas
Direito
naturais
Civil.
ou
de
patrimônios, que visa a consecução de
certos fins, reconhecida pela ordem jurídica
como sujeito de direitos e obrigações”.35
Preceitua o artigo 596 do Código de Processo
Civil:
“Os bens particulares dos sócios não
respondem pelas dívidas da sociedade
34
Matéria editada na Revista Forense, sob o título “ A IMPOSSIBILIDADE DA PENHORA DO
CAPITAL DE GIRO”, extraída via Internet, www.editoraforense.com.br, em 05/05/2004.
35
DINIZ, Maria Helena, Dicionário Jurídico, São Paulo: Saraiva, 1998, 3º vol. P. 588.
57
senão nos casos previstos em lei; o sócio,
demandado pelo pagamento da dívida, tem
direito
a
exigir
que
sejam
primeiro
excutidos os bens da sociedade.
§ 1º Cumpre ao sócio, que alegar o benefício deste
artigo, nomear bens da sociedade, sitos na mesma
comarca, livres e desembaraçados, quanto bastem
para pagar o débito.
§ 2º Aplica-se aos casos deste artigo o disposto no
parágrafo único do artigo anterior.
Preceitua o artigo 350 do Código Comercial:
“Os bens particulares dos sócios não podem
ser executados por dívidas da sociedade,
senão depois de executados todos os bens
sociais”.
As pessoas jurídicas adquirem autonomia
patrimonial, e seus bens não se confundem com os bens particulares dos
sócios, nos termos dos artigos: 350 do Código Comercial e 596 do
Código de Processo Civil.
Somente será admitida a penhora dos bens
particulares dos sócios para garantia das obrigações da pessoa jurídica,
se ficar devidamente comprovado que estes se utilizaram a mesma para
fins de fraude e ilícitos.
Assim, somente se admite a desconsideração
da personalidade jurídica da empresa, se este não mais tiver condições de
58
honrar os seus compromissos, ou seja, não tiver condições de
solvabilidade.
O Código de Defesa do Consumidor, em seu
artigo 28, preceitua:
"O
juiz
poderá
desconsiderar
a
personalidade jurídica da sociedade quando,
em detrimento do consumidor, houver
abuso de direito, excesso de poder, infração
da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos
estatutos
ou
contrato
social.
A
desconsideração também será efetivada
quando houver falência, estado de
insolvência, encerramento ou inatividade da
pessoa jurídica provocados por má
administração". (g.n.)
A Lei n. 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que
dispõe sobre sanções penais e administrativas derivadas de condutas e
atividades lesivas ao meio ambiente, por sua vez, insere, no seu bojo, a
disregard doctrine, dispondo o art. 4º que:
"Poderá ser desconsiderada a pessoa
jurídica sempre que sua personalidade for
obstáculo ao ressarcimento de prejuízos
causados à qualidade do meio ambiente".
Entende Eduardo Viana Pinto:
“A desconsideração da personalidade
jurídica é uma medida excepcional, que não
pode se concedida indiscriminadamente.
Assim, porque não localizados bens da
sociedade, parte-se pura e simplesmente
para no pólo passivo da demanda intentada
contra o ente coletivo, as pessoas dos
59
sócios, dos gerentes ou administradores,
sem que haja comprovação alguma de que
estes agiram com dolo. Astúcia, malícia,
abuso de direito, ou que a sociedade foi
usada como biombo, para prejudicar
terceiros, constituindo-se em uma solução
por demais simplista e inaceitável. Nem
mesmo existe prova alguma de que tais
sócios foram gestores, gerentes ou
administradores
da
sociedade
desconsiderada, ou que tiveram qualquer
envolvimento ou participação em eventuais
atos faltosos ou impróprios. Ou, ainda, que
foram responsáveis pela falência, estado de
insolvência, concordata ou cessação de
atividade provocados por má gestão.
A fraude não se presume. Incumbe ao
pleiteante a sua cabal demonstração, de
maneira séria e responsável.
Percalços econômicos- financeiros da
empresa – tão comuns na atualidade – não
se constituem por si só em comportamento
ilícito ou mesmo em desvio de finalidade da
entidade societária. E mesmo a quebra ou,
ainda, o encerramento ou inatividade do
ente social não importa dizer que tais atos
se consumaram por procedimento lesivo ou
de má gestão de seus agentes
administradores.
...
Só a prova provada, de forma irrefutável,
comprovada à evidência, inconteste da
prática de fraude ou abuso de direito,
autoriza
a
aplicação,
em
caráter
excepcional, da desconsideração da
personalidade
jurídica.
Indícios,
presunções, dúvidas, suspeitas, interesses
econômicos momentâneos e menos graves
não bastam, como é curial.
Demonstrado apenas o pressuposto, o
prejuízo, e incomprovada a existência de
um ou mais requisitos para autorizar essa
medida extrema (art. 28, CDC), desacolhida
resulta a desconsideração. Inexiste, in casu,
o nexo de causalidade, indispensável
vínculo entre o prejuízo (pressuposto) e a
ação fraudatória ou abusiva imputada ao
60
sócio-gerente ou administrador(requisitos)”.
(Desconsideração da personalidade Jurídica
no novo Código Civil, ED. Síntese, 1ª ed.,
2003, p. 21/23).36
Para que se verifique a desconsideração da
personalidade jurídica da empresa, necessário se faz prova cabal do
desvio da finalidade da empresa, com o proveito ilícito se seus quotistas.
A desconsideração da personalidade jurídica,
fere de morte os seguintes artigos: Artigo 6º da LICC, que garante o
respeito à coisa julgada; Artigo 265 do Código Civil Brasileiro, por não
se caracterizar caso de solidariedade, pois ela não se presume, resulta da
lei ou da vontade das partes; Artigo 47 do CPC., por desatender os
requisitos do litisconsórcio necessário; Artigo 77, III do CPC., pois,
entendendo-se haver solidariedade, deveriam os mesmos ter sido
chamados ao processo para responderem solidariamente; Artigo 128 do
CPC., quanto aos limites da decisão do juiz, pois deve o juiz decidir a
lide nos limites em que foi proposta a ação, e não suscitar questões que
exigem a iniciativa da parte; Artigos 460 e 468 do CPC, quanto aos
limites da sentença e da coisa julgada; Artigos 471 e 472 do CPC, pois
nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à
mesma lide, e que a sentença faz coisa julgada às partes; Artigo 568, I
do CPC., de que são sujeitos na execução, o devedor, reconhecido como
tal no título executivo; Artigos 580 e 583 do CPC, porque a execução
foi determinada contra pessoas físicas e jurídicas, sem qualquer título
executivos contra as mesmas; Artigo 610 do CPC, por ser defeso, na
liquidação, discutir de novo a lide.
36
PINTO, Eduardo Viana, Desconsideração da personalidade Jurídica no novo Código Civil, ED.
Síntese, 1ª ed., 2003, p. 21/23
61
6.3. DA PENHORA DE NAVIOS E AERONAVES.
Estipula o artigo 679 do CPC:
“A penhora sobre navio ou aeronave não
obsta a que continue navegando ou
operando até a alienação; mas o juiz, ao
conceder a autorização para navegar ou
operar, não permitirá que saia do porto ou
aeroporto antes que o devedor faça o seguro
usual contra riscos”
José Carlos Baptista Pueli, bem explica
referido artigo, dispensando maiores comentários:
“I- Penhora de navios e/ou aeronaves:
Aqui, em nome da utilidade pública que os
serviços de transporte têm, a lei estipula
que a penhora de navio ou aeronave não
impede que tais bens continuem em
atividade.
A
continuidade,
autorização
contudo,
para
somente
tal
será
deferida pelo juiz depois que o executado
e/ou responsável comprove nos autos a
realização do seguro contra os riscos
37
inerentes à atividade do bem”.
6.4. DA PENHORA DE CRÉDITOS.
37
MARCATO, Antonio Carlos, PUELI, José Carlos Baptista, Código de Processo Civil
Interpretado, São Paulo: Ed. Atlas, 2004, pág. 1941.
62
A autorização da penhora de créditos está
prevista nos artigos 671 e 672 do CPC.
No caso do artigo 671, a penhora recairá sobre
o direito, ou, melhor dizendo, crédito que o executado tem perante um
terceiro.
Para tanto, basta intimar primeiramente o
terceiro, para que não pague diretamente para o executado, e após, deve
ser intimado o executado para que este não venha a fazer a cessão de seu
crédito.
No que se refere ao artigo 672, a penhora dos
títulos e cártulas se realiza pela apreensão do documento, que será
depositado consoante o art. 666, I, CPC.
Pode-se concluir que o terceiro, devedor do
executado, é uma espécie de depositário do valor do crédito, já que
apenas se exonerará de sua dívida depositando em juízo o valor
correspondente, podendo caracterizar fraude à execução, se assim não o
fizer.
6.5. PENHORA NO ROSTO DOS AUTOS.
Neste caso, a penhora recairá sobre direitos
postulados pelo executado em outra demanda judicial.
63
A penhora no rosto dos autos pode ser
entendida como penhora propriamente dita, devendo haver intimação do
executado para que possa embargá-la, querendo, no prazo legal.
A eficácia da penhora inicia com a averbação
no rosto dos autos e se efetiva quando o oficial de justiça, com o
mandado executivo, dirige-se ao cartório e intima o escrivão ou chefe de
secretaria e menciona todas as circunstâncias constantes no mandado,
para que o mesmo, na folha de rosto dos autos, transcreve a penhora.
No tocante ao procedimento, vejamos o
entendimento do doutrinador Humberto Theodoro Júnior:
“Quando a penhora alcançar direito objeto
de ação em curso, proposta pelo devedor
contra terceiro, ou cota de herança em
inventário, o oficial de justiça, depois de
lavrado o auto de penhora, intimará o
escrivão do feito para que este averbe a
constrição na capa dos autos, a fim de se
tornar
efetiva,
sobre
oportunamente,
forem
os
bens
adjudicados
que,
ou
vierem a caber ao devedor”.38
6.6 PENHORA SOBRE CRÉDITOS PARCELADOS OU RENDAS
PERIÓDICAS
38
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 2 vol, 31. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2001, p 192.
64
A penhora pode recair sobre créditos vincendos
exigíveis em prestações ou sujeito a juros periódicos. Quando isto
ocorre, o terceiro fica obrigado a depositar em juízo os juros, rendas ou
prestações à medida que se vencerem. O exeqüente, após cada depósito,
poderá levantar as importâncias respectivas, abatendo-as parceladamente
de seu crédito, conforme as regras da imputação em pagamento previstas
nos artigos 991 a 994 do CC.
No entanto, nos alerta Humberto Theodoro
Júnior que:
“não tolera a jurisprudência, porém, a
penhora sobre a féria diária de um
estabelecimento comercial, por afetar o
capital de giro de empresa. Deve-se, no
caso, penhorar não a renda, mas o próprio
estabelecimento,
segundo
as
regras
especiais do art. 677”.39
Assim,
quando
a
penhora
recair
em
estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em
semoventes, plantações ou edifício em construção, o depositário será um
administrador nomeado pelo juiz.
A este administrador incumbe organizar o
plano de administração, no prazo de dez dias após a investidura na
função. Sobre tal plano serão ouvidas as partes da execução, cabendo ao
juiz decidir sobre as dúvidas e divergências suscitadas.
39
Ob. Cit, p. 192
65
Podem as partes, outrossim, ajustar entre si a
forma de administração, escolhendo depositário de sua confiança.
O sistema depositário-administrador visa a
impedir a ruína total e a paralisação da empresa, evitando prejuízos
desnecessários e resguardando o interesse coletivo de preservar quanto
possível as fontes de produção e comércio e de manter a regularidade do
abastecimento.
6.7. PENHORA ON-LINE.
A penhora on-line, foi a forma encontrada, e
está sendo muito utilizada na área trabalhista, através do convênio
firmado entre o Banco Central do Brasil e os Tribunais Superiores do
Brasil (STJ e TST), em que há a possibilidade, dos juízes, por meio de
sistema de software e via Internet, bloquear, penhorar e remover, o
numerário existente em contas bancárias de devedores,
que estejam
sendo executados.
A Justiça do Trabalho justifica o bloqueio de
numerário existente em conta bancárias dos devedores, por entenderem
que o crédito trabalhista tem natureza alimentar; justifica ainda, que o
“dinheiro”, se encontra em primeiro lugar na gradação legal das
penhoras, bem como a rápida solução do litígio.
66
Essa penhora, porém,
acarreta à empresa,
sérios problemas de ordem financeira, pois estamos penhorando,
justamente o “capital de giro” da mesma.
Recaindo a penhora sobre numerário existente
em conta corrente, como conseqüência lógica, terá a empresa, afetada
sua atividade industrial, o pagamento dos salários, o comprometido o
fornecimento de benefícios (alimentação, transporte, etc.) a seus
empregados.
A falsa justificativa da penhora on-line, para
pagamento ao hipossuficiente; os empregados ativos da empresa, de
igual forma, dependem dos salários para sua manutenção, que também é
crédito alimentar, muito mais efetivo do que os créditos trabalhistas, que
muitas vezes, não expressam a realidade; pois, apesar do esforço
concentrado de um Juiz, quando da prolação de uma sentença, dar a cada
um o que é seu, muitas são as testemunhas forjadas, onde encontram na
Reclamação trabalhista, apenas uma forma de angariar “algo a mais”,
neste ou naquele contrato de trabalho.
O que se verifica, é a satisfação de um crédito
em detrimento de muitos.
Além
da
possibilidade
de
criar
sérios
transtornos a uma empresa, a penhora on-line fere, de forma clara,
garantias constitucionais, artigo 5º, incisos
X, XII, LIV, LV da
Constituição Federal, bem como o artigo 620 do CPC.
67
Preceitua o artigo 5º, incisos XI e XII da
Constituição federal:
“X – são invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo
dano material ou moral decorrente de sua
violação;
...
XII – é inviolável o sigilo da
correspondência e das comunicações
telegráficas, de dados e das comunicações
telefônicas, salvo, no último caso, por
ordem judicial, nas hipóteses e na forma
que a lei estabelecer para fins de
investigação
criminal
ou
instrução
processual penal.”
Diz o art. 5º, LIV e LV,
da Constituição
Federal:
“LIV - Ninguém será privado da liberdade
ou de seus bens sem o devido processo
legal:
Por devido processo legal
deve ser
entendido aquele em que todas as
formalidades são observadas, em que a
autoridade competente houve o réu e lhe
permite a ampla defesa, incluindo-se o
contraditório e a produção de todo tipo de
prova. Sem processo e sem sentença,
ninguém será privado da liberdade.
LV – aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa,
com os meios e recursos a ela inerentes;”.
68
Ampla defesa no entendimento de Celso
Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins:
“Por ampla defesa deve-se entender o
asseguramento que é feito ao réu de
condições que lhe possibilitem trazer para o
processo todos os elementos tendentes a
esclarecer a verdade. É por isso que ela
assume múltiplas direções, ora se traduzirá
na inquirição de testemunhas, ora na
designação de um defensor dativo, não
importando,
assim,
as
diversas
modalidades, em um primeiro momento.
Por ora basta salientar o direito em pauta
como um instrumento assegurador de que o
processo não se converterá em uma luta
desigual em que ao autor cabe a escolha do
momento e das armas para travá-la e ao réu
só cabe timidamente esboçar negativas.
Não, forçoso se faz que ao acusado se
possibilite a colocação da questão posta em
debate sob um prisma conveniente à
evidenciação da sua versão”. 40
No entendimento de J. Cretella Jr., ampla
defesa e contraditório, define-se:
“A regra da “ampla defesa” abrange a regra
do “contraditório”, completando-se os
princípios que as informam e que se
resumem no postulado da liberdade integral
do homem diante da prepotência do Estado.
Não se confunde o instituto do
“contraditório”, peculiar ao processo
judicial penal, com o instituto da
“contestação”, típico do processo judicial
civil. O “contraditório” é típico dos
40
BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra, Comentários à Constituição do Brasil, São
Paulo, SARAIVA, 2º volume, p.266.
69
processos em que a relação processual é “
biface”; de uma lado, o Estado, acusando;
de outro lado, o particular sofrendo o
impacto da acusação e defendendo-se. O
objetivo do processo penal é a busca da
verdade real, histórica, ao passo que o fim
do processo civil é a captação da verdade
formal, jurídica, convencional. A regra
imposta ao juiz , no processo civil, é a de
que não proceda de ofício, nem ultra petita
partium, ao passo que a regra imposta ao
juiz do crime é que intervenha no processo,
em nome do Estado, que tem interesse em
apurar a verdade real, condenando,
absolvendo ou aplicando medida de
segurança. Diferentemente do juízo civil,
no qual o processo se desenvolve mediante
provocação das partes interessadas, autor e
réu, litigantes, o processo penal, quer da
causa, quer da acusação, encontra a forçamotriz na verdade real, no fato, no crime,
anterior às pessoas que, como “partes”,
figuram no processo”.41 CRETELLA
JÚNIOR,
J.,
I
Comentários
à
Constituição do Brasil, Rio de Janeiro:
Forense Universitária, I, 1992, p.533/534.
Para Nelson Nery Júnior:
“...o princípio de contraditório, além de
fundamentalmente
constituir-se
em
manifestação do princípio do estado de
direito, tem íntima ligação com o da
igualdade das partes e do direito de ação,
pois o texto constitucional, ao garantir aos
litigantes o contraditório e a ampla defesa,
que significar que tanto o direito de ação,
quanto o direito de defesa são manifestação
do princípio do contraditório.” 42
41
CRETELLA JÚNIOR, J., I Comentários à Constituição do Brasil, Rio de
Janeiro: Forense Universitária, I, 1992, p.533/534.
42
NERY JÚNIOR, Nelson, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais,1997, 4a. ed., Ed. RT, p.125.
70
Desta forma, está claramente demonstrado que
a penhora on-line, viola os referidos dispositivos constitucionais.
A gradação legal estampada no artigo 655 do
CPC deve ser obedecida, desde que não prejudique o funcionamento da
empresa, como no caso dos autos. Desde que garantida a execução, para
que a Embargante possa exercer o seu direito de defesa, não se justifica a
penhora ON-LINE.
Pedimos vênia para transcrever o artigo, sob o
título: “ A penhora on-line merece uma reflexão”:
“A penhora on line merece uma reflexão
Antonio Carlos Magalhães Leite
especialista em Direito do Trabalho e
sócio do Escritório Leite, Tosto e Barros
Advogados
A enorme demanda pelos serviços
judiciários no País nem de longe tem sido
acompanhada
pelos
necessários
investimentos na sua estrutura.
A atenção dispensada pelo governo no que
diz respeito aos reajustes dos vencimentos
dos servidores da Justiça bem espelha a
tentativa de sucateamento do Poder
Judiciário, que conta com número reduzido
- quer de Juizes, quer de servidores dificultando o exercício da nobre missão
conferida pela Constituição Federal.
Todavia, em vez de se atacar o problema
na sua origem, ficamos todos a mercê de
soluções que, apesar da boa intenção de
garantir o cumprimento da sentença
num prazo menor, podem acabar
71
gerando outros problemas piores que a
simples demora.
Exemplo ilustrativo dessa situação é o
mecanismo da penhora on line. Por meio de
convênio firmado entre a Justiça
Trabalhista e o Banco Central, os Tribunais
Regionais ganharam o poder inédito e
assustador de rastrear as contas bancárias
das empresas e dos sócios, visando
promover o bloqueio de seus saldos, a
pretexto de forçar o pagamento de alegadas
dívidas trabalhistas.
Os defensores dessa fórmula a justificam
como um atalho destinado a dar celeridade
às execuções. Disso não se duvida. A
questão é saber se o que se está fazendo
com rapidez é justiça ou injustiça,
considerando que, mesmo nessa fase, é
comum descobrir-se que houve erro de
contas, por exemplo.
Esse é um aspecto, aliás, que tem
invalidado inúmeras das pretensas fórmulas
mágicas cogitadas para a melhoria do
funcionamento dos mecanismos judiciais
do país.
Afinal, é fundamental apurar se o cidadão
quer apenas um Judiciário veloz ou se, além
de rapidez, ele quer também uma Justiça
melhor.
Fosse a celeridade o único objetivo a ser
atingido,
muitas
outras
medidas
poderiam ser adotadas. Resta saber se
elas representarão solução ou mais
problemas.
Um exemplo é a campanha que existe
contra as possibilidades de recurso. Proibir
a parte inconformada de recorrer também
reduz o prazo e o trajeto do processo. É de
se ver, entretanto, se o princípio
constitucional da ampla defesa estará
assegurado, caso essa "solução" seja
adotada.
72
O ordenamento jurídico brasileiro
assenta-se sobre a premissa de que a
constrição judicial deve ser efetuada na
forma menos onerosa ao devedor. Esse
princípio foi consolidado para que se
preserve o interesse social e coletivo
sobre o interesse individual. Não
podemos voltar aos tempos medievais
onde a execução da dívida era impiedosa
contra o devedor.
A penhora, levada a efeito sobre a conta
bancária da empresa e, muitas das vezes,
a de seus sócios, prejudica interesses
imediatos
de
empregados
ativos,
fornecedores etc, e não só do credor. Até
porque, em muitas das vezes, o simples fato
de uma empresa possuir valores
depositados em bancos, não significa
necessariamente que este numerário esteja à
disposição da Justiça para penhora.
Saliente-se que uma empresa sobrevive
enquanto realizar os fins constantes no
seu objeto social. E para a consecução
desses fins, é necessária a movimentação
de numerários. Desta sorte, os valores
depositados em bancos são, na maioria
das vezes, destinados a pagamentos de
obrigações decorrentes das atividades
normais das empresas, tais como os
próprios salários dos demais empregados
e a satisfação de outras dívidas de
natureza trabalhista, previdenciária,
fiscais etc.
A simples penhora cega de numerários,
como vem ocorrendo, faz com que muitas
empresas não consigam honrar com
outros
compromissos
assumidos,
importando até mesmo em emissão de
cheques sem provisão de fundos.
É certo que uma medida que faz valer a
autoridade da coisa julgada mereça elogios.
Contudo, não se pode, em nome da
satisfação de um crédito individual, colocar
toda a sociedade em apuros.
73
De outra parte, a empresa, enquanto
executada, deverá ter bens suficientes
que possam satisfazer o crédito discutido.
Logo, não se justifica a necessidade de
penhora em conta corrente.
Tenha-se em vista que a apuração do valor
da penhora é fruto do despacho que julga a
fase de liquidação de sentença, decisão esta
somente impugnável depois da penhora.
Desta forma, se entendermos razoável a
penhora de depósitos bancários a empresa
deverá primeiro imobilizar valores (até
superiores ao débito), para depois poder
discutir a dívida.
Por tais motivos, não é demais lembrar o
contido no artigo 620 do Código de
Processo Civil: "quando por vários meios
o credor puder promover a execução, o
juiz mandará que se faça pelo modo
menos gravoso para o devedor". Esse
"favor", a despeito da dicção legal,
refere-se a vários modos de promover
"atos executivos" dentro da execução
própria, e não "vários modos de
promovê-la". Embora a execução deva ser
realizada como resultado do exercício de
um direito do credor, nem por isso o sujeito
passivo deve ser inutilmente sacrificado,
quando, por outro modo que não o usado
pelo sujeito ativo, seja atingido o mesmo
objetivo quanto à solvência da prestação.
Demais disso, mesmo que não seja
observada a ordem legal do artigo 655,
do CPC, o ordenamento não tem caráter
absoluto, mas relativo e deve atender ao
objetivo de garantir o êxito da execução,
sem prejudicar desnecessariamente o
devedor e toda a atividade empresarial.
A penhora sobre crédito em conta corrente,
poderá afetar o desempenho da empresa,
inclusive sua imagem, quando há outros
bens suscetíveis de constrição judicial,
caracterizando-se violência contra o
devedor e abuso de autoridade. A gradação
74
legal estabelecida para efetivação da
penhora não tem caráter rígido, podendo,
pois, ser alterada por força de
circunstâncias e atendidas as peculiaridades
de cada caso concreto, bem como o
interesse das partes litigantes.
Apesar de uma medida eficiente e ágil, o
sistema aplicado às execuções dos débitos
trabalhistas, nos termos que se encontra o
convênio entre o Tribunal Superior do
Trabalho e o Banco Central, coloca as
empresas e os seus sócios à mercê da
penhora de um mesmo crédito em múltiplas
contas. Portanto, é constatação cristalina
que a medida é temerária, ante o risco de
bloqueio de quantia imprescindível para a
empresa manter seu negócio em atividade,
mormente colocando em risco o pagamento
dos salários de empregados ativos.
O bloqueio de valores de empresa que
tenha em sua conta corrente tão somente
o valor exato para pagamento dos
salários de seus empregados ativos
causaria transtornos imensuráveis para
os demais trabalhadores. Eles também, a
exemplo do eventual credor, têm
compromissos
inadiáveis,
como
o
pagamento de aluguel, mensalidade escolar,
mantimentos e todas as despesas para a
sobrevivência de suas famílias.
O impacto na imagem da empresa, junto ao
sistema bancário e a todos que tiverem
conhecimento da "punição" é outro fator a
ser considerado. Eventuais dificuldades
vividas serão agravadas e ampliadas
podendo contribuir até mesmo para o
encerramento de suas atividades. A quem
poderia interessar essa perspectiva? Ou,
ainda, no caso de penhora para resgate de
valores que, em seguida, se mostre
indevido, como fará o credor para recuperar
o que lhe pertence? Abrirá um novo
processo? A quem responsabilizará pelo
dano verificado?
75
A penhora on line, ao que se percebe,
atende, eventualmente, a necessidade da
máquina judiciária, mas não a dos
trabalhadores, pois está levando as
empresas a dificuldades maiores,
colocando em risco o próprio emprego
que é o maior bem do trabalhador. "Ora,
dúvida não há de que o bloqueio on-line de
saldos bancários e aplicações financeiras
dos executados por dívidas trabalhistas
perpetram grave lesão à ordem jurídica,
ante a multiplicidade de pessoas físicas e
jurídicas,
inclusive
dos
sócios
e
responsáveis, abrangíveis na acepção de
devedores de ações da Justiça do Trabalho"
(texto extraído da ADIn – 3203, proposta
por
Confederação
Nacional
dos
Transportes, no Supremo Tribunal Federal,
de 14/05/2004).
O aperfeiçoamento da Justiça deve ter por
matriz a consolidação dos valores que dão
forma e personalidade ao Direito. Recorrer
a antivalores como atalho para a
consecução do que é justo eqüivale a
colocar um edifício inteiro sob risco, a
pretexto de consertar uma porta ou uma
janela.” (g.n.) 43
Conclui-se que em nome do hipossuficiente e
da celeridade processual, o artigo 620 do CPC, de que a execução deve
se proceder de forma menos gravosa ao executado, deixa de existir no
judiciário, com a violação dos princípios constitucionais.
É injustificável a rapidez em nome da injustiça,
quando há
a
possibilidade de reforma da sentença, em fase de
liquidação de sentença.
43
Matéria editada na Revista Forense, sob o título “A PENHORA ON LINE MERECE UMA
REFLEXÃO”,
extraída
via
Internet,
Disponível
<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5751>. Acesso em: 23 nov. 2004.
em:
76
A penhora on-line acarreta prejuízo não só à
executada, como também a sociedade que direta e indiretamente está
interligada a empresa que se executa.
Não se pode admitir um avanço falho da Justiça
em detrimento do devido processo legal, da ampla defesa, do sigilo de
dados e da privacidade.
6.8. Da impenhorabilidade do bem de família.
A impenhorabilidade do bem de família é
assegurado através da Constituição Federal, que estipula que:
"a família, base da sociedade, tem
especial proteção do estado"
"a casa é asilo inviolável do indivíduo..."
( constituição federal arts. 226 e 5° XI )
O patrimônio familiar, desde que se tem notícia
nos primórdios da República Romana, figura como bem protegido,
resguardado, por ser considerado como patrimônio sagrado já que era
herdade de antepassados. Porém, àquela época inexistia a figura hoje
conhecida como bem de família.
Contudo, este instituto fora mais recentemente
criado nos Estados Unidos da América, no estado do Texas, por
conseqüência da grave crise que atingirá aquele país no ínicio do século
XIX(crise entre os anos de 1837 e 1839, iniciando-se, dentre outros
fatores com a falência do grande banco de Nova Iorque). O estado
77
texanos até então independente, com a finalidade de reaquecer a
economia, e visando encorajar os empresário locais, promulga a 1ª lei
que tora impenhorável a pequena propriedade agrícola familiar, assim
como seus instrumentos de trabalho, protegendo assim a família dos
pequenos agricultores de qualquer eventual dificuldade econômica22 23.
Ponderamos, já dentro do sistema legislativo
nacional, que outra forte influência exercida no processo de inserção do
bem de família foi a crescente necessidade social de regulamentação da
proteção constitucional à família (art. 226, CF) e o respeito à dignidade
da pessoa humana (art. 1º, III, CF) – um dos princípios norteadores do
direito moderno.
Nos dias atuais, inúmeras discussões em torno
da possibilidade de renúncia à regra da impenhorabilidade do bem de
família, principalmente pelo fato de que alguns devedores oferecem o
bem de família em garantia de dívidas, no processo executório, seja no
ato da penhora, seja em transação homologada em juízo, com o intuito de
não dar quitação a dividas com credor.
E infelizmente em nossa humilde opinião,
alguns tribunais pátrios defendem a tese de que, uma vez renunciado o
direito outorgado pela Lei 8009/90, perde o devedor a possibilidade de
ANDRADE, Danilo Ferreira. O fiador e o seu bem de família em face da Lei do
Inquilinato . Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 65, mai. 2003. Disponível em:
<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4055>. Acesso em:
06 dez.
2004.
² Pablo Stolze Gagliano & Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, Parte Geral, ed.
22
Saraiva, 2ª edição, p. 283.
78
argüir este diploma legal em sua defesa, sendo plenamente eficaz a
expropriação do bem de família.
Em que pesem as mais respeitáveis opiniões
nesse sentido, entendemos não ser possível à renúncia ao direito de
impenhorabilidade do bem de família, por se tratar de norma de ordem
pública e, portanto, por afigurar-se, na hipótese, a indisponibilidade do
direito.
Desta feita, defendemos a nulidade do ato pelo
qual o devedor oferece o bem imóvel destinado à residência permanente
da família em garantia de uma dívida, no momento da penhora ou em
qualquer ato que implique transação.
Pensamos assim, porque o ato não encontra
respaldado pela legislação pátria, se apresentando com objeto ilícito, o
que, possivelmente, acarretará sua nulidade absoluta.
Os mais brilhantes doutrinadores nacionais
desse tema ensinam e discorrem de maneira a embasar a tese a qual nos
filiamos traremos, a seguir, suas opiniões assim como dos e tribunais
brasileiros.
O Festejado doutrinador César Fiúza acredita
que devem ser quatro os requisitos para que um ato jurídico seja válido,
quais seja, o sujeito deve ser capaz, o objeto possível, o motivo lícito e a
79
forma deve ser prescrita ou não defesa em lei. Nessa discussão, objeto
possível seria aquele realizável tanto material quanto juridicamente.24
Para Caio Mário da Silva Pereira, a validade do
ato, além de outras hipóteses, reclama condição objetiva válida, ou seja,
"o objeto há de ser lícito. Se é fundamental na sua caracterização a
conformidade com o ordenamento da lei, a liceidade do objeto ostenta-se
como elemento substancial, essencial à sua validade e confina com a
possibilidade jurídica, já que são correlatas as idéias que se expõem ao
dizer do ato que é possível frente à lei, ou que é lícito." 25
Assim sendo, subsume-se a renúncia à regra da
impenhorabilidade do bem de família à hipótese de impossibilidade
jurídica/ilicitude do objeto, tendo em vista que o objeto de transação
judicial foi bem imóvel destinado à habitação residencial.
Assim, determina a Lei 8009/90, em seu artigo
1º, "o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é
impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil,
comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos
cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele
residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.".
FIÚZA, César. Novo Direito Civil. Belo Horizonte: 7ª Edição. Del Rey,
2003, p.163.
25
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de
Janeiro: 19ª Edição.Vol I. Ed. Forense, 1998, p.310.
24
80
Considera-se,
para
tanto,
como
imóvel
residencial, aquele que seja a única propriedade utilizada pelo casal ou
pela entidade familiar para moradia permanente (artigo 5º, Lei 8009/90).
Têm-se, pois, que as exceções à regra da
impenhorabilidade, contidas no estatuto legal acima, tratam-se de
hipóteses taxativamente descritas no artigo 3º e seus incisos, e uma vez
que a dívida não se imiscua nestas hipóteses não será lícita a
expropriação do bem de família.
Vale esclarecer, então, que o ato ou negócio
que não preencha os requisitos de validade, trazidos pelo ordenamento
jurídico,
acha-se
conseqüentemente,
eivado
o
de
defeito
comprometimento
grave,
de
o
sua
que
acarreta,
eficácia
e
reconhecimento. Trata-se, pois, o negócio contaminado de grave defeito,
de negócio jurídico absolutamente nulo.
O Artigo 166 do Novel Código Civil é
expresso ao determinar que:
"É nulo o negócio jurídico quando:
II – for ilícito, impossível ou
indeterminável o seu objeto;
VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou
proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.".
Na Lei 8009/90, nota-se que é expressamente
vedada a penhora de bem de família, conseqüentemente, o negócio
jurídico, em debate, viola expressa disposição legal, subsumindo-se a
hipótese do inciso II do artigo supra citado, visto que teve como
81
fundamento objeto ilícito, ou seja, contrário à lei, e, ainda, o inciso VII,
já que há expressa proibição da prática da penhora do bem de família.
Pela óptica de Caio Mário da Silva Pereira, "se
o negócio for ilícito, descamba para o terreno daqueles fatos humanos
insuscetíveis de criar direitos para o agente, sujeitando-o, porém,
conforme a profundidade do ilícito, a ver apenas desfeito o negócio, ou
ainda a reparar o dano que venha a atingir a esfera jurídica alheia. Quer
isto dizer que a iliceidade do objeto ora conduz à invalidade do negócio,
ora vai além, e impõe ao agente uma penalidade maior”26
Portanto, sabe-se, que é nulo o ato jurídico,
quando em razão do defeito grave que o atinge, não pode produzir o
efeito almejado. A nulidade se apresenta, como sanção para a ofensa à
predeterminação legal.
A nulidade, neste caso, será insuprível pelo
juiz, seja de ofício, seja a requerimento do interessado, não poderá,
também, ser o ato ratificado, posto que jamais convalescerá.
Segundo os artigos 168, parágrafo único, e 169
do Código Civil, respectivamente, que:
Art. 168, parágrafo único: "As nulidades
devem ser pronunciadas pelo juiz, quando
conhecer do negócio jurídico ou dos seus
efeitos e as encontrar provadas, não lhe
sendo permitido supri-las, ainda que a
requerimento das partes."
26
Op. Cit., p.311.
82
Art. 169: "O negócio jurídico nulo não é
suscetível de confirmação, nem convalesce
pelo decurso do tempo."
Seguindo a mesma linha de raciocínio, cumprenos analisar os efeitos da declaração de nulidade do negócio jurídico.
Para Rodolfo Pamplona Filho, "por ser tratar de sentença proferida no
bojo de ação declaratória de nulidade, salvo norma especial em sentido
contrário, os seus efeitos retroagem até a data de realização do ato,
invalidando-o ab initio (efeitos ex tunc). Declarado nulo o ato, as partes
restituir-se-ão ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo
possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente." 27
De acordo com a norma contida no artigo 182
do Código Civil:
"Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão
as partes ao estado em que antes dele se
achavam, e, não sendo possível restituí-las,
serão indenizadas com o equivalente."
Ainda segundo Pamplona, "o bem de família é
impenhorável, sendo excluído da execução por dívidas posteriores à sua
instituição, ressalvadas as que provierem de tributos ou despesas
condominiais relativas ao mesmo prédio." 28
Em nosso socorro aproveita-se a lição de
Theotônio Negrão:
27
PLAMPLONA FILHO, Rodolfo et al. Novo Curso de Direito Civil. São Paulo: 4ª Edição.Vol I. Ed.
Saraiva, 2003, p.404
28
Op. Cit., p.285.
83
"A alegação de que determinado bem é
absolutamente impenhorável pode ser feita
a todo tempo, mediante simples petição e
independentemente de apresentação de
embargos à execução, mas o devedor
29
responde pelas custas de retardamento."
No sentido de que o bem de família não poderá
ser objeto de penhora e nem ao menos de transação, por se tratar de
matéria regida por norma de caráter público e, por isso, insuscetível de
disposição, João Roberto Parizzato estatui que:
"A penhora realizada sobre um bem de
família é um ato ineficaz, por sua flagrante
nulidade. Não pode o bem em questão ser
oferecido à penhora pelo devedor. Trata-se
de regra de caráter público, insuscetível,
pois, de ser alterada pela pessoa que tenha
instituído tal benefício"30
Com essa linha de raciocínio, faz-se valer
acrescentar a lição do mestre Pontes de Miranda:
"Os bens inalienáveis não podem ser
penhorados, porque toda penhora implica
tomada de eficácia do poder de dispor
(abusus), e o devedor, dono desses bens não
o tem." 31
Na opinião de César Fiúza:
29
THEOTÔNIO NEGRÃO, Código de Processo Civil, 26ª Ed., p.490.
PARIZZATO, João Roberto. Da Penhora e da Impenhorabilidade de
Bens. Ed. de Direito, p. 20.
31
MIRANDA, Pontes, Comentários ao CPC, Tomo XIII, Forense, 1973,
p.284.
30
84
"O objetivo do legislador foi o de garantir a
cada indivíduo, quando nada, um teto onde
morar mesmo que em detrimento dos
credores. Em outras palavras, ninguém tem
o direito de ‘jogar quem quer que seja na
rua’ para satisfazer um crédito. Por isso o
imóvel
residencial
foi
considerado
impenhorável. Trata-se, aqui, do princípio
da dignidade da pessoa humana. O valor
‘personalidade’ tem preeminência neste
caso, devendo prevalecer em face de um
direito de crédito inadimplido." 32
Cumpre ressaltar a importância que o Princípio
da Dignidade da Pessoa Humana assume no ordenamento jurídico, e com
fincas à proteção da Pessoa Humana, a Carta Magna dispõe que:
“Artigo 1º: "A República Federativa do
Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de
Direito e tem como fundamentos:
III – a dignidade da pessoa humana;"
Artigo 5º, caput: "Todos são iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País, a
inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade privada (...)"
Na emérita lição da ilustre professora Maria de
Fátima Freire de Sá, "não podemos olvidar, portanto, que valores como
liberdade, igualdade e dignidade foram erigidos à categoria de princípios
32
Op. Cit., p.155.
85
constitucionais e referidos princípios incorporam as exigências de
justiça, salvaguardando valores fundamentais." 33
Resta-nos concluir, portanto, que o processo de
execução não deve servir como instrumento de flagelo do devedor, posto
que lhe devem ser assegurados os direitos básicos outorgados por lei,
como o direito a ter moradia e, principalmente, o direito a ter uma vida
digna, o que se restabelecerá, no caso presente, desconstituindo-se o ato
pelo qual foi transacionado um bem de família, na medida em que se
afigura direito indisponível, insuscetível de renúncia por parte de seu
titular.
6.9 EMPRESAS CONCESSIONÁRIAS OU PERMISSIONÁRIAS DE
SERVIÇO PÚBLICO
Se a executada for empresa que exerça serviço
público, sob regime de concessão ou permissão, a penhora, conforme a
extensão do crédito, poderá atingir a renda, determinados bens, ou todo o
patrimônio da devedora. Mas o depositário ou administrador será
escolhido, de preferência, entre seus diretores.
A penhora não deve prejudicar o serviço
público delegado. O depositário apresentará, portanto, a forma de
administração e o esquema de pagamento do credor, nos casos de
penhora sobre renda ou determinados bens. Se versar sobre toda a
SÁ, Maria de Fátima Freire.A Dignidade do Ser Humano e Os Direitos
de Personalidade: Uma Perspectiva Civil-Constitucional. In: Biodireito.
Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.92.
33
86
empresa, a execução prosseguirá até final arrematação ou adjudicação,
sendo, porém, obrigatória a ouvida do poder público concedente, antes
do praceamento.
6.10 MULTIPLICIDADE DE PENHORA SOBRE OS MESMOS BENS
No sistema do Código revogado a incidência de
mais de uma penhora sobre os mesmos bens resolvia as execuções em
concurso de credores.
No entanto, para o novo Código só há concurso
universal mediante provocação específica; e a penhora cria para o credor
exeqüente um direito de preferência que não é afetado pela
superveniência de outras penhoras de terceiros.
Mas, como o bem penhorado é objeto da ação
de execução e sendo ele comum a mais de um processo executivo, é
forçoso reconhecer conexão entre as várias ações em que a penhora
atinja os mesmos bens do devedor comum.
Assim, sempre que houver sujeição dos
mesmos bens a várias penhoras, poderá o juiz de competência preventa
ordenar a reunião das ações propostas em separado, a fim de que sejam
ultimadas simultaneamente.
87
VII - DOS INCIDENTES DA PENHORA.
Para que a penhora seja válida, deve-se
respeitar os requisitos e formalidades estipuladas pela norma legal; haver
prova cabal da existência do crédito e recair a penhora sobre bens
penhoráveis e de propriedade do devedor. Se assim não o fizer e não
preencher os requisitos dos artigos 592 e 594 do CPC vigente, a
constrição dos bens se revela ilegal.
No caso de penhora de bens impenhoráveis ou
desrespeitar os requisitos e formalidades estipuladas pela norma legal,
poderá ser alegada por simples petição ou embargos à execução. Caso a
penhora recaia sobre bens de pessoa estranha e não responsável pela
execução, deverá opor embargos de terceiro, nos termos do art. 1046 do
CPC.
Outro aspecto importante é que, efetivada a
penhora, não mais poderá o credor substituir a penhora por outro bem,
exceto no caso da primeira penhora ou ser nula; insuficiente; já estar
penhorado o mesmo bem em outros processos (Princípio da
disponibilidade, art. 569, caput, CPC), ou ainda substituir a penhora por
dinheiro (art. 668 do CPC). Nesta última hipótese, no caso de
indeferimento do pedido pelo devedor ou responsável, conforme
88
preceitua a norma legal, caberá Agravo de Instrumento, por se tratar de
mero despacho interlocutório.
Ainda, outro incidente importante é quando
caracteriza excesso da penhora, ou seja, o bem penhorado é muito
superior ao do crédito, que poderá ser alegado através de embargos (art.
741, V e 743, I, CPC).
No caso de arrematação do bem penhorado,
assinado o auto pelo Juiz, pelo escrivão, pelo arrematante, pelo porteiro
ou leiloeiro, a arrematação será considerada perfeita, acabada e
irretratável, exceto as hipóteses previstas no parágrafo único do art. 694
do CPC:
“Parágrafo único. Poderá, no entanto,
desfazer-se:
I - por vício de nulidade;
II - se não for pago o preço ou se não for
prestada a caução;
III - quando o arrematante provar, nos 3
(três) dias seguintes, a existência de ônus
real não mencionado no edital;
IV - nos casos previstos neste Código
(artigos 698 e 699).”
Nesta hipótese, a invalidação poderá ser
requerida por embargos à arrematação (art. 746), embargos de terceiro
(art. 1.048) e ação anulatória (art. 486).
89
VIII – CONCLUSÃO.
No presente estudo, percebemos que o
processo de execução, qual seja o título ou a espécie, é totalmente
favorável ao devedor.
Na regra processual de que a execução deve ser
menos gravosa ao devedor, não conseguimos vislumbrar qual seria a
exata intenção do legislador, já que na verdade a execução deveria ser
menos gravosa ao credor, não ao devedor.
Se não bastasse, a norma legal protege bens do
devedor, àqueles impenhoráveis, conforme mencionamos, dificultando
ainda mais a prestação jurisdicional e não atendendo ao princípio da
efetividade.
90
Desta
forma,
nem
todos
os
bens
são
penhoráveis, sendo certo de que alguns bens são injustamente
impenhoráveis.
Muitas vezes percebemos que o processo de
execução é mais árduo que o próprio processo de conhecimento, já que
não são poucos os meios procrastinatórios que o devedor pode usar, ante
o exagerado número de recursos, nesta fase processual, previstos em Lei.
Porém, se há na Legislação pátria direitos
fundamentais a serem respeitados, devemos alcançar com o Judiciário o
equilíbrio e a ponderação, e impor a alguém que faça algo diferente do
previsto em Lei, ameaçando-lhe de causar mal maior, é atitude
incompatível com o sistema democrático, indigna da nossa tradição de
vanguarda no mundo do Direito e que, certamente, no momento
oportuno, será rechaçada pelo próprio Poder Judiciário.
Não devemos abrir mão do uso de todos os
recursos previstos na CF/88 e na legislação ordinária que tenham por
escopo coibir arbitrariedades, evitar violação a direitos e inibir abusos de
quem quer que seja, tanto do credor, como do devedor.
Porém, podemos concluir que o mais justo
seria que todos os bens do devedor fossem penhoráveis, pois beneficiaria
o credor, atendendo ao princípio da efetividade processual.
91
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