Centro Colaborador para a Qualidade do Cuidado e a Segurança do Paciente Cultura de segurança do paciente em hospitais “ Medicine used to be simple, ineffective and relatively safe. Now, it is complex, effective, but potentially dangerous”. (Sir Cyrril Chantler) Um a cada dez pacientes que recebem cuidados assistenciais hospitalares sofre danos ou lesões decorrentes dos mesmos EVENTOS ADVERSOS (Jha et al., 2010) Principais eventos adversos evitáveis: →Infecções associadas aos cuidados de saúde → Complicações cirúrgicas e/ou anestésicas → Danos decorrentes do atraso ou falha no diagnóstico/tratamento →Úlcera por pressão → Danos por complicações de punção venosa → Danos devido a quedas →Danos devido ao uso de medicamentos Mendes et al., 2013 Cultura de segurança do paciente O desenvolvimento de uma cultura de segurança como elemento central para a melhoria da segurança do paciente no contexto hospitalar Kohn et al., 1999 A cultura influencia a motivação de se engajar em comportamentos seguros e na extensão na qual essa motivação se traduz na prática diária Weaver et al., 2013 Cultura de Segurança Produto de valores, atitudes, percepções e competências individuais e grupais que determinam o compromisso e o estilo da instituição. Organizações com uma cultura de segurança positiva são caracterizadas por boa comunicação entre os profissionais, confiança mútua e percepções comuns sobre a importância de segurança e eficiência de ações preventivas Comitê Internacional de Segurança Nuclear - INSAG, 1988 Crenças predominantes nas organizações de saúde que afetam a segurança da prática clínica (WHO, 2008) Tendência à responsabilização dos profissionais da linha de frente, negligenciando as deficiências presentes nos sistemas de saúde Incidentes quando são reconhecidos pelos médicos durante a prática clínica são considerados por eles “inevitáveis” [normalization of deviance] Crença em que os profissionais de saúde foram perfeitamente treinados (longa e árdua formação = fazer corretamente) O cuidado clínico é tipicamente organizado de forma hierárquica, onde a comunicação sobre segurança é suprimida Pouca ênfase no aprendizado organizacional Promoção da cultura de segurança nas organizações de saúde Técnicas de segurança adotadas em organizações de alta confiabilidade(OAC) ex: energia nuclear, aviação, óleo e gás FOCO PRIMÁRIO NO SISTEMA ao invés de NOS INDIVÍDUOS Kohn et al., 1999 Cultura de segurança prevalente nas OAC e a cultura dominante nas organizações de saúde ORGANIZAÇÕES DE ALTA CONFIABILIDADE Crença em que algo pode sair errado Foco sobre a confiabilidade do sistema Humildade para buscar entender e aprender o que não se conhece Comportamento que valoriza o trabalho em equipe ORGANIZAÇÕES DE SAÚDE Crença em que tudo vai dar certo Foco sobre a eficiência do sistema Crença em que se sabe tudo o que se precisa saber Presença de elevados gradientes de hierarquia entre os profissionais Chassin & Loeb (2011) Promoção da cultura de segurança nas organizações de saúde Promover consciência coletiva com o comprometimento com a segurança em todos os níveis Reconhecer a natureza de alto risco das atividades realizadas e a determinação em atingir consistentemente operações seguras Promover um ambiente livre de culpa e encorajar a cooperação entre cargos e profissões com redução dos gradientes de hierarquia O comprometimento pela gestão com a utilização de recursos voltados à melhoria da segurança Avaliação da Cultura de Segurança nas Organizações de Saúde FERRAMENTA DE GESTÃO Identificar áreas/unidades cujas características da cultura necessitam melhorias Avaliar a efetividade de ações implementadas para melhoria da segurança ao longo do tempo (estudos antes – após intervenções) Permite comparar dados internos e externos à organização Priorizar esforços de fortalecimento da cultura Tese de Doutorado em Saúde Pública - Justificativa Teve como objetivo central a validação do questionário Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC), instrumento de avaliação da cultura de segurança entre profissionais de hospitais, para que o mesmo fosse preciso na avaliação da cultura de segurança no contexto hospitalar brasileiro. A cultura de segurança do paciente é um tema relativamente pouco estudado no Brasil e o aprimoramento desse instrumento soma possibilidades à melhoria da qualidade do cuidado de saúde prestado aos pacientes no contexto brasileiro das organizações hospitalares. Tese de Doutorado em Saúde Pública - Justificativa O Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC) (Sorra e Nieva, 2004) foi traduzido para o português e adaptado para uso no Brasil (Reis et al. 2012; Reis, 2013). O instrumento foi aplicado para captar a percepção dos profissionais de um hospital com relação às dimensões da cultura de segurança do paciente. Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC) Dimensões da Cultura de Segurança (escalas de múltiplos itens) Nível da unidade – 7 dimensões Expectativas do supervisor/chefe e ações promotoras da segurança (4 itens) Aprendizado organizacional – melhoria contínua (3 itens) Trabalho em equipe dentro das unidades (4 itens) Abertura da comunicação (3 itens) Retorno da informação e comunicação sobre os erros (3 itens) Respostas não punitivas aos erros (3 itens) Adequação de pessoal (4 itens) Nível hospitalar – 3 dimensões Apoio da gestão hospitalar para segurança do paciente (3 itens) Trabalho em equipe entre as unidades hospitalares (4 itens) Passagens de plantão/turno e transferências (4 itens) Dimensões da Cultura de Segurança (escalas de múltiplos itens) Dimensões de resultado- 2 dimensões Percepção geral da segurança (4 itens) Frequência de notificação de eventos (3 itens) Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC) Amplo uso desse instrumento em diversos países do mundo, em diversos estágios de desenvolvimento Bélgica (Hellings et al., 2007) Inglaterra (Waterson et al., 2010) Noruega (Olsen, 2008) Líbano (El-Jardali et al., 2010) Holanda (Smits et al., 2008) Suíça (Pfeiffer & Manser., 2010) EUA (Blegen et al., 2009) Escócia (Sarac et al., 2011) Tailândia (Chen & Li, 2010) Japão (Ito et al., 2011) Turquia (Bodur & Filiz, 2010) Irã (Moghri et al., 2012) Tese de Doutorado - Metodologia Foi realizada uma investigação empírica quantitativa, observacional, com desenho do tipo seccional DADOS PARCIAIS Hospital X - geral de cuidados agudos, de grande porte, filantrópico, conveniado ao SUS, situado no Estado de Minas Gerais; 173 leitos para internação e oferta programas de Ensino Tese de Doutorado - Metodologia População, amostra e período do estudo Profissionais com contato direto ou interação direta com o paciente internado ou aqueles cujas funções desempenhadas afetavam diretamente o cuidado ao paciente internado (líderes, supervisores, administradores...) CRITÉRIOS DE INCLUSÃO: possuir carga horária semanal pelo menos de 20 horas estar presente em um dos turnos de trabalho no período da coleta de dados PERÍODO DE COLETA: Março e Abril /2012 Tese de Doutorado - Metodologia Avaliação da Cultura de Segurança do Paciente % de respostas positivas da dimensão X = [nº de respostas positivas aos itens da dimensão X/ nºtotal de repostas válidas aos itens da dimensão X (positivas, neutras e negativas, excluindo-se os dados ausentes)] x 100 Áreas frágeis da segurança do paciente Dimensões com % de respostas positivas inferior a 50% Áreas fortalecidas da segurança do paciente Dimensões com % de respostas positivas igual ou maior que a 75% (Sorra e Nieva, 2004) Tese de Doutorado - Metodologia Avaliação da Cultura de Segurança do Paciente % de respostas positivas do item da dimensão X = [nº de respostas positivas ao itens da dimensão X/ nºtotal de repostas válidas ao item da dimensão X (positivas, neutras e negativas, excluindo-se os dados ausentes)] x 100 Áreas frágeis da segurança do paciente Itens com % de respostas positivas inferior a 50% Áreas fortalecidas da segurança do paciente Itens com % de respostas positivas igual ou maior que a 75% (Sorra e Nieva, 2004) Tese de Doutorado - Resultados Distribuídos → 261 questionários Retorno → 149 questionários 2 questionários não apresentaram pelo menos uma seção preenchida por completo 1 questionário apresentou a mesma opção de resposta ao longo de uma seção que continha itens reversos os três foram excluídos Os 146 questionários válidos corresponderam a um percentual de resposta de 56%. Tese de Doutorado - Resultados Perfil dos participantes o sexo feminino predominou (76%) e a maior parte dos participantes afirmou ter contato direto com o paciente (84,2%) Com relação à categoria profissional, aquelas ligadas à Enfermagem (técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e enfermeiros) constituíram a maior parte de profissionais que preencheram o questionário, totalizando 98 (67,1%) 101 (69,2%) concluíram o nível médio 30 (10,5%) concluíram o nível superior, e 10 (6,8%) afirmaram ter grau de instrução inferior ao nível médio de ensino Tese de Doutorado - Resultados Avaliação da cultura de segurança Apenas uma dimensão foi classificada como área fortalecida da cultura de segurança entre os profissionais do Hospital X “APRENDIZADO ORGANIZACIONAL – MELHORIA CONTÍNUA” As dimensões da cultura de segurança cujos percentuais de respostas positivas foram mais elevados compreenderam a: “aprendizado organizacional e melhoria contínua” 75%)“expectativas e ações de promoção de segurança dos supervisores/gerentes” (70%), “apoio da gestão para a segurança do paciente”(67%) Tese de Doutorado - Resultados Distribuição percentual de respostas aos itens da dimensão “aprendizado organizacional - melhoria contínua” (75%), Hospital X, 2012 Positiva Neutra Negativa a A6. Estamos ativamente fazendo coisas para melhorar a segurança do paciente. 86% 6% 8% a A9. Erros têm levado a mudanças positivas por aqui. 14% 19% 67% a A13. Após implementarmos mudanças para melhorar a segurança do paciente, avaliamos a efetividade. 72% 19% 9% Tese de Doutorado - Resultados Avaliação da cultura de segurança Três dimensões do nível da unidade/setor apresentaram percentual de respostas positivas baixo, caracterizando áreas frágeis da cultura de segurança as quais merecem atenção: “adequação de pessoal” (43%) “abertura da comunicação” (47%) “respostas não punitivas aos erros” (19%) Tese de Doutorado - Resultados Distribuição percentual de respostas aos itens da dimensão “adequação de pessoal” (43%), Hospital X, 2012 Positiva A2. Temos profissionais suficientes para dar conta da carga de trabalho. A5R. Nesta unidade, os profissionais trabalham mais horas do que seria o melhor para o cuidado do paciente. Neutra Negativa a 31% 15% 53% a 37% A7R. Utilizamos mais profissionais temporários/terceirizados do que seria desejável para o cuidado do paciente. 24% 39% a 65% 17% 17% a A14R. Nós trabalhamos em “situação de crise”, tentando fazer muito e muito rápido. 38% 25% 38% Tese de Doutorado - Resultados Distribuição percentual de respostas aos itens da dimensão “abertura da comunicação” (47%), Hospital X, 2012 Positiva Neutra C2. Os profissionais têm liberdade para dizer ao ver algo que pode afetar negativamente o cuidado com o paciente. Negativa a 66% 19% 15% a C4. Os profissionais sentem-se à vontade para questionar as decisões ou ações dos seus superiores. C6R. Os profissionais têm receio de perguntar, quando algo parece não estar certo. 34% 35% 31% a 72% 19% 9% Tese de Doutorado - Resultados Distribuição percentual de respostas aos itens da dimensão “respostas não punitivas aos erros” (19%), Hospital X, 2012 Positiva Neutra A8R. Os profissionais consideram que seus erros podem ser usados contra eles. Negativa a 66% 19% 15% a A12R. Quando um evento é notificado, parece que o foco recai sobre a pessoa e não sobre o problema. A16R. Os profissionais se preocupam que seus erros sejam registrados em suas fichas funcionais. 34% 35% 31% a 16% 28% 56% Tese de Doutorado - Discussão ADEQUAÇÃO DE PESSOAL (43%) → Carga excessiva de trabalho → Insuficiência de profissionais 38% discordaram trabalhar em “situação de crise” tentando fazer muito e muito rápido Deficiências na adequação de pessoal ocorrência de incidentes de segurança (Sorra & Nieva, 2004; Kho et al., 2005; Hellings et al., 2007) Tese de Doutorado – Considerações finais A cultura de segurança do paciente no Hospital X se apresenta como uma cultura punitiva frente a ocorrência de erros desencoraja o reconhecimento e o relato do erro pelos profissionais negligencia informações valiosas impossibilita a análise das situações e condições que contribuíram para a ocorrência do erro impede que o erro volte a acontecer Cultura de segurança do paciente Redução da mortalidade (Estabrooks et al., 2002; Sexton, 2002) Redução de eventos adversos( Singer et al., 2009; Mardon et al., 2010) Comportamento clínico de relato de incidentes de segurança (Braithwaite et al., 2010) O National Quality Forum (Estados Unidos) recomenda a avaliação sistemática da cultura de segurança, feedback aos profissionais de saúde e aplicação de intervenções visando à sua melhoria (Safe practices for better healthcare: a consensus report – 2010) Fortalecimento da cultura de segurança em hospitais LIDERANÇA o compromisso das lideranças como componente fundamental para difundir a ideia da necessidade de mudança de comportamento e de cultura; esse compromisso requer incorporar os princípios da alta confiabilidade nas declarações da visão e missão da organização, estabelecendo metas mensuráveis para monitorar a sua realização Fortalecimento da cultura de segurança em hospitais TRABALHO EM EQUIPE O trabalho em equipe efetivo é necessário para a segurança do cuidado. Os briefings e debriefings (reuniões pré e pós-realização de uma atividade) e outras ferramentas de trabalho em equipe ajudam a estruturar a comunicação e aumentam a previsibilidade. A cultura de segurança deve envolver três imperativos que se sustentam mutuamente: a confiança, a notificação e a busca contínua por melhoria. Fortalecimento da cultura de segurança em hospitais Adoção de ferramentas robustas A adoção de ferramentas robustas de processo das quais são exemplo a Lean seis sigma, a análise da causa raiz, e outras que permitem uma abordagem sistemática que envolve a forma confiável de medir a magnitude do problema, identificar suas causas e mensurar a importância de cada causa; encontrar soluções para as causas mais importantes; comprovar a efetividade dessas soluções e implantar programas que assegurem a melhoria contínua ao longo do tempo. Reis CT. A cultura de segurança do paciente: validação de um instrumento de mensuração para o contexto hospitalar brasileiro [Tese de Doutorado]. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz; 2013. Reis CT, Laguardia J, Martins M. Adaptação transcultural da versão brasileira do Hospital Survey on Patient Safety Culture: etapa inicial. Cad. Saúde Pública 2012; (28)11:21992210. Versão em português adaptada e validada da Pesquisa sobre cultura de segurança do paciente (HSOPSC) http://proqualis.net/cultura-de-segurança Obrigada! [email protected] Referências Chassin MR, Loeb JM. The ongoing quality improvement journey: next stop, high reliability. Health Aff 2011; 30(4):559-568. Jha AK, Prasopa-Paizier N, Larizgoitia I, Bates DW. Patient safety research: an overview of the global evidence. Qual Saf Health Care 2010; 19:42-7. Kohn LT, Corrigan JM, Donaldson, MC eds. Committee on Quality in Health Care; Institute of Medicine. To err is human. Building a safer health system. Washington: National Academy Press, 1999. Mendes W, Pavão ALB, Martins M, Moura MLO, Travassos C. Características de eventos adversos evitáveis em hospitais do Rio de Janeiro. Rev Assoc Med Bras, 2013 no prelo. Reis CT. A cultura de segurança do paciente: validação de um instrumento de mensuração para o contexto hospitalar brasileiro [Tese de Doutorado]. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz; 2013. Reis CT, Laguardia J, Martins M. Adaptação transcultural da versão brasileira do Hospital Survey on Patient Safety Culture: etapa inicial. Cad. Saúde Pública 2012; (28)11:2199-2210. Sorra JS, Nieva VF. Hospital Survey on Patient Safety Culture (Prepared by Westat, under Contract No. 290-96-0004). AHRQ Publication No. 04-0041. Rockville, MD. September 2004. Weaver SJ, Lubomski LH, Wilson RF, Pfoh ER, Martinez KA, Dy SM. Promoting a culture of safety as a patient safety strategy. 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