Trabalho multiprofissional na área da saúde Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde José Roberto Siqueira Castro – Médico clínico - Psicanalista VISÃO HISTÓRICA O centro é o universo, o homem está inserido e é regido pelas leis da natureza. Descartes – “Penso, logo existo”. Iluminismo – “Felicidade à luz da razão” Afastamento do Homem das leis da natureza e do Cosmos Inconsciente - `Sou onde não penso` Homem – Centro Método científico - Ciência Aumento acentuado da produção do saber `Patologia do saber` Crescimento “vertical” Disciplinas “Guideline” Fronteiras rígidas Pouca porosidade Dificultando o crescimento “horizontal” • Disciplinas Modelo Científico • Predominância da verticalidade - Teoria • Pouca valorização do conhecimento horizontal - Clínica • Declínio da “clínica” • Ilusão de um ‘saber completo’ • Foco na “doença” e no procedimento e não no adoecimento • Sintoma sem sentido (É para ser extirpado, sem significação) • Visão reducionista sobre o adoecer humano • Pouco valor à subjetividade (‘Firula’) • Profissionais da saúde e pacientes – como “objetos” das ações de saúde Verticalidade • Teoria • ‘Olhar: foco é o procedimento, a doença’ • Disciplinas • Fragmentação (Saber, técnica e estrutura organizacional) • ‘Fragmento se distancia do todo’ Ideologia Política Poder Horizontalidade ‘Clínica’ ‘Cuidado’ Alteridade Olhar: foco é o sujeito, a pessoa. ‘Processo e a gestão do trabalho’ ‘Linha do cuidado’. ‘Ações interdisciplinares’. Assistência ‘Atenção’ ‘Adoecer’ Contemporaneidade Paradigma da fragmentação (Disjunção e separação) • do saber • da técnica • da estrutura organizacional História do mundo e do pensamento ocidentais Paradigma de disjunção, de separação • Espírito da matéria • Filosofia da ciência • Conhecimento particular, que vem da música e da literatura, do conhecimento que vem da pesquisa científica • Separam-se as disciplinas, as ciências e as técnicas • Separou-se o sujeito do conhecimento, do objeto do conhecimento Acolhimento Disciplinas Aumento acentuado do conhecimento de trabalho Fragmentação Aumento acentuado das divisões técnicas Ensino Formação inadequada Declínio do campo da clínica Rigidez das fronteiras Prática Diagnóstico Rótulo Alternativa Atendimento Classificação centrado na Homogeinização Predomínio da “doença” Perda da informação importância Sub - especialização do contexto “Conhecimento” sem análise Tendência a ilusão de um crítica ‘saber completo’ Guideline - Pulverização - Dispersão Organismo / Corpo Doença Doente Classificável Universal Contextualização Homogeinização da Medicina `Caso a caso` Marca das diferenças Critério/ Questionamento Propedêutica / Terapêutica Silenciamento das diferenças Corpo mapeado Singular Acentuação do `desamparo existencial` Foco é a doença, o procedimento e o medicamento Foco é a pessoa, o sujeito, com sua história, sexualidade, fantasias e o laço social. CRESCIMENTO HORIZONTAL DESVALORIZADO DECLÍNIO DA CLÍNICA LINHA DO “ CUIDADO” “CUIDADO” / ACOLHIMENTO FRÁGIL DESARTICULADA PRECÁRIO SISTEMA DE SAÚDE INEFICAZ, INEFICIENTE E ONEROSO. “O PACIENTE “FATIADO” FRAGMENTAÇÃO DISCIPLINAS CADA VEZ SE SUB-DIVIDINDO MAIS AUSÊNCIA DE ”TROCAS” ENTRE ELAS FRAGMENTAÇÃO DISTANCIAMENTO ENTRE O ‘ FRAGMENTO E O TODO´ - SABER - CLÍNICA - ORGANIZACIONAL Sintoma Do profissional Do paciente Sociológica Cultura - Envelope - Identidade - Importância - História - Contexto Vertentes Biológica Genética Psicológica Sujeito Ingredientes necessários para a discussão • Paradigma: um modelo de construção do conhecimento; uma experiência modelar. Estruturas de pensamento que de modo inconsciente comandam nosso discurso. (ex.: física de Newton x Einstein; medicina anátomo-clínica x medicina biológica); • Disciplina: campo do conhecimento (área de saber), pode ter mais de um paradigma; • Profissão: um campo de trabalho (agir, fazer), pode ter mais de um paradigma, fundamentado em várias disciplinas (ex.: alopatia, homeopatia, acupuntura); • Técnica, especialização e divisão do trabalho • Interdisciplinaridade: relação dinâmica entre campos do saber (por um mesmo profissional, por vários profissionais, ex.: construção de um caso clínico); • Trabalho multiprofissional: trabalho de vários profissionais, pode não haver interdisciplinaridade. • Fragmentação: método científico – Subdivisão progressiva do objeto de estudo Ingredientes necessários para a discussão • Pensamento complexo x especialização (fragmentação do conhecimento) • A ciência atual vive um impasse? Um momento de incerteza? • Ciências humanas Profissões intervenções (atos) sobre o ser humano, ação especializada, fragmentada, focal? • Interdisciplinaridade e pensamento complexo Tendência ao impasse • A Interdisciplinaridade é possível se o conhecimento está constituído a partir de paradigmas? • Os quatro pilares da certeza – – – – A A A A ordem separabilidade redução lógica indutiva – dedutiva - identitária OS PILARES DA CERTEZA: CONTRAPONTO • A ordem mestra/ desordem (o universal/ singular) • A divisibilidade / inseparabilidade (análise concreta; sujeito/ objeto) • O reducionismo científico: só é válido o que é científico(?), só é científico o mensurável • A lógica identificada com a razão • O concreto, mensurável / virtual COMO OPERAR EM UM UNIVERSO • a ordem não é absoluta, assim, a desordem, o contingente e o singular predominam sobre a ordem, • a separabilidade é limitada, ou impossível: as partes são conhecidas a partir de princípios diferentes (ou não), quando somadas não permitem compreender, nem constituir o todo, também objeto e sujeito não são inteiramente separáveis, • a lógica comporta buracos, • os fenômenos não podem ser reduzidos, mas exigem resposta em sua complexidade (modificado Edgar Morin, 2000) • O trabalho em equipe não se resume no ajuntamento de colegas de diversas categorias profissionais Alguns dos problemas que se colocam para os profissionais que atuam na área da saúde • Especialização crescente • Multiplicação de profissões que atuam simultaneamente em um mesmo paciente • Tecnologias cada vez mais especializadas e complexas, de domínio restrito e de custo elevado • Protocolos e separação de lugares: cada macaco em seu galho Valor Saber Universidade Produção científica (saber) Pesquisa Paciente como objeto Esvaziamento da clínica Consumo saúde Capital Rede Assistência Produção quantitativa Pago pela quantidade de atendimentos Paciente e profissional como objetos – - e o sujeito? - e a clínica? Qualidade da assistência depende da clínica – depende do sujeito estar presente (profissional e paciente) fazendo parte do processo. Paciente: sujeito // objeto • O sujeito só entra em cena se a ele for dada a palavra. Sem palavra e sem escuta não há sujeito • Escutar é possível ao médico ou outro profissional, mas todos deveriam escutar um pouco (uma janela para escutar) Paciente Objeto ou Sujeito? O “não saber” do profissional Outros saberes UMA SAÍDA PARA A CLÍNICA? A CONSTRUÇÃO DO CASO CLÍNICO • CASO ≡ SINGULAR • CLÍNICA (KLINÉ) ≡ LEITO • Um ensino e uma prática não teóricos • Aprende-se com cada paciente • O aprendizado se dá nas relações • Algo inesperado e que surpreende: há a presença do sujeito e, portanto uma ética • O homem, mesmo doente, não é um animal pavloviano, domesticável Construção do caso clínico Multidisciplinar Interdisciplinar QUAL O PONTO DE PARTIDA? “UM NÃO SABER” – Objetivos comuns? – Um mesmo paradigma? – Paradigmas próximos ou distantes? ALGO QUE ENLACE Quais as diretrizes necessárias para nortear uma prática clínica feita ‘por muitos’ ? • Modelo de experiência clínica onde se aproximam e dialogam diferentes disciplinas e saberes; • Sintomas são significantes que adquirem significado apenas quando relacionados com significantes do caso; • Os casos clínicos muitas vezes não são transparentes nem tão pouco fornecem uma lógica evidente: enigmático, implicando dificuldade para sua resolução; • Presença do ‘desconforto’, propicia à equipe um trabalho, exigindo implicação e compromisso dos membros; Quais as diretrizes necessárias para nortear uma prática clínica feita ‘por muitos’ ? • A equipe não existe antes da constituição desse trabalho; • Independentemente do profissional – médico, enfermeira, fisioterapeuta, psicólogo ou outro – a primeira avaliação é feita pelo próprio paciente; • O saber do paciente sobre seu corpo, seu sintoma e sua doença pode e deve contribuir para a construção do caso clínico; • Trabalho em equipe pressupõe ‘renúncia narcísica’ – posição de ignorância - dos profissionais que a compõem; • Os saberes em jogo não devem ter a pretensão de serem completos ou onipotentes, nem complementares no sentido de um saber total; • A especificidade técnica, habilidade e as diferentes visões dos membros da equipe devem ser individualmente potencializados Quais as diretrizes necessárias para nortear uma prática clínica feita ‘por muitos’? • Equipe: importante a preservação de um ‘não saber’, permitindo a presença da ‘indisciplina’, de uma verdade não totalizadora sobre o caso, permitindo que as construções possam ser repensandas e renovadas. • O saber construído a partir do caso não é da ordem de uma teoria universal, totalizadora ou normativa. • Referencial teórico de cada profissional e a experiência clínica num vai e vem é que possibilita a invenção de um saber novo em relação à estrutura oferecida. Prática Interdisciplinar: ainda um desafio! • Apenas situações pontuais • Riscos – `Des - assistência` • Sua prática se concretiza nas discussões de casos clínicos • Aproximação das disciplinas • Condição essencial é a clareza da especificidade – arcabouço teórico técnico - das disciplinas e das categorias profissionais • Ausência de hegemonia de um saber ou de uma vertente. Exemplo: `Biopoder` • O aprendizado se dá na convivência • Desafio da construção de um saber e uma prática comunitária, onde haja integralidade das ações no sistema de saúde Pensamento complexo • Ruptura do ensino, que permita juntar ao mesmo tempo que separa. • Presença de um terceiro - Simultaneidade • Salvaguardar a liberdade: sentimento de comunidade e solidariedade, no interior de cada membro, dando a realidade de existência numa sociedade complexa. • Ética da compreensão - Alteridade • Ética da tolerância: - Voltaire: ‘suas idéias são odiosas, mas morrerei pelo direito que você tem de exprimi-las; - Instituição democrática: sistema que permite e encoraja o conflito de idéias e de argumentação, com respeito às minorias; - Pascal: ‘o contrário da verdade não é um erro, mas uma verdade contrária’ Hospital das Clínicas - Hospital Universitário Assistência - Ensino - Gestão • GIDS – Grupo Interdisciplinaridade na Área da saúde - • RICLIM – Reuniões Interprofissionais da Unidade Funcional Clínica Médica • Unidades Funcionais (Modelo de Gestão) Teoria e prática sobre a Interdisciplinaridade e Complexidade. www.hc.ufmg.br/gids 122 encontros Discussão de casos clínicos onde a `clínica é feita por muitos` 104 encontros registrados Ensino X Clínica X Gestão • Sessões clínicas – 113 encontros • Parcerias: NIAB – Núcleo de investigação em anorexia - bulimia IEAT – Instituto de Estudos Avançados em Transdisciplinaridade da Reitoria NEPPCOM – Núcleo de estudos e pesquisa em pensamento complexo.