Poder Judiciário do Estado da Bahia C o m a rc a d e C a p i m G ro s s o PROCESSO: 6032 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA RÉU: BANCO BRADESCO S/A DECISÃO LIMINAR Vistos. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA , por intermédio de seu representante legal nesta Comarca, ajuizou a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR em face do BANCO BRADESCO S/A. Afirmou que o Conselho Municipal de Acompanhamento e Controle do FUNDEB – CAC/FUNDEB apresentou representação na Promotoria de Justiça da Comarca de Capim Grosso diante da negativa de atendimento de solicitação de extratos das contas bancárias da Prefeitura Municipal pela empresa ré, de modo a que fossem apuradas suspeitas de desvios de recursos públicos. Alegou que requisitou diretamente as cópias dos extratos bancários das contas bancárias da Prefeitura Municipal de Capim Grosso, formulada sob as advertências penais do art. 10 da Lei da Ação Civil Pública - LACP, obtendo resposta negativa, fora do prazo consignado, sob o fundamento de que tais dados estariam acobertados pelo sigilo bancário e que não haveria exceção ao Parquet na Lei Complementar nº 105/2001. Requereu medida liminar visando o fornecimento de informações bancárias de contas públicas municipais para si e para os Conselhos Municipais de Acompanhamento e Controle do FUNDEB/Educação, Saúde, Assistência Social ou qualquer outro constituído. No que toca à medida antecipatória requerida, na dicção do art. 273 do Código de Processo Civil - CPC, aplicado supletivamente por abono do art. 19 da Lei 7.347/85, é dado ao juiz antecipar os efeitos da tutela pretendida, quando, após exercer cognição sumária, se convencer da verossimilhança da alegação e houver fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Decorre esse instituto do princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição diante de ameaça a direito (Constituição Federal - CF, art. 5º, XXXV). A jurisdição coletiva, através da universalização do amparo institucional, permite a solução, de uma só vez, de grande número de conflitos de interesses. Com efeito, a tutela jurisdicional coletiva, ao viabilizar o acesso à justiça, serve, em último plano, como Página 1 de 5 Poder Judiciário do Estado da Bahia C o m a rc a d e C a p i m G ro s s o instrumento privilegiado de exercício coletivo da cidadania, coadunando-se com a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), a solidariedade social (CF, art. 3º) e a isonomia substancial (CF, art. 5º). O Princípio da publicidade (CF, arts. 37, caput, e 5º, XXXIII e XXIV, “b”) estabelece que os atos administrativos devem ser públicos, salvo se houver interesse público que justifique o sigilo e a proteção à vida privada e à intimada. O poder de investigação/fiscalização do Estado é dirigido a coibir atividades afrontosas à ordem jurídica e a garantia do sigilo bancário não se estende às atividades ilícitas que envolvam verbas públicas. A partir do momento em que o Ministério Público, no uso de suas atribuições constitucionais, solicita dados bancários de contas públicas está atuando em defesa do patrimônio público, absolutamente jungido ao princípio da transparência. A ordem jurídica confere explicitamente poderes de investigação ao Ministério Público - art. 129, II, VI, VIII da Carta Política, art. 8º, II, IV, e § 2º da Lei Complementar nº 75/1993, assim como art. 73, II, da Lei Complementar Estadual nº 11/96. Constituição Federal: “Art. 129. institucionais do Ministério Público: São funções ....................................................... II - zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;”. ....................................................... VI expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva; ....................................................... VIII requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;”. Lei Complementar Estadual nº 11/96: “Art. 73 - No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: ....................................................... II requisitar informações, exames, perícias e documentos a entidades privadas, para instruir procedimento ou processo em que oficie; Ademais, a recusa, o retardamento ou a omissão de dados Página 2 de 5 Poder Judiciário do Estado da Bahia C o m a rc a d e C a p i m G ro s s o técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados pelo Ministério Público, como no caso dos autos, conforme Portaria nº 13/2008, juntada às fls. 15, poderá configurar ilícito penal, conforme previsão do art. 10 da Lei nº 7.347/85. Trago à baila o tipo penal: “Art. 10. Constitui crime, punido com pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, mais multa de 10 (dez) a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, a recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados pelo Ministério Público. Nessa mesma senda, o egrégio Supremo Tribunal Federal há muito já se posicionou: “EMENTA: Mandado de Segurança. Sigilo bancário. Instituição financeira executora de política creditícia e financeira do Governo Federal. Legitimidade do Ministério Público para requisitar informações e documentos destinados a instruir procedimentos administrativos de sua competência. 2. Solicitação de informações, pelo Ministério Público Federal ao Banco do Brasil S/A, sobre concessão de empréstimos, subsidiados pelo Tesouro Nacional, com base em plano de governo, a empresas do setor sucroalcooleiro. 3. Alegação do Banco impetrante de não poder informar os beneficiários dos aludidos empréstimos, por estarem protegidos pelo sigilo bancário, previsto no art. 38 da Lei nº 4.595/1964, e, ainda, ao entendimento de que dirigente do Banco do Brasil S/A não é autoridade, para efeito do art. 8º, da LC nº 75/1993. 4. O poder de investigação do Estado é dirigido a coibir atividades afrontosas à ordem jurídica e a garantia do sigilo bancário não se estende às atividades ilícitas. A ordem jurídica confere explicitamente poderes amplos de investigação ao Ministério Público - art. 129, incisos VI, VIII, da Constituição Federal, e art. 8º, incisos II e IV, e § 2º, da Lei Complementar nº 75/1993. 5. Não cabe ao Banco do Brasil negar, ao Ministério Público, informações sobre nomes de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal, sob invocação do sigilo bancário, em se tratando de requisição de informações e documentos para instruir procedimento administrativo instaurado em defesa do patrimônio público. Princípio da publicidade, ut art. 37 da Constituição. 6. No caso concreto, os empréstimos concedidos eram verdadeiros financiamentos públicos, porquanto o Banco do Brasil os realizou na condição de executor da política creditícia e financeira do Governo Federal, que deliberou sobre sua concessão e ainda se comprometeu a proceder à equalização da taxa de juros, sob a forma de subvenção econômica ao setor produtivo, de acordo com a Lei nº Página 3 de 5 Poder Judiciário do Estado da Bahia C o m a rc a d e C a p i m G ro s s o 8.427/1992. 7. Mandado de segurança indeferido.” (MS 21729/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ AcórdãoMin. Néri da Silveira, j. 05/10/1995, p. 19/10/2001). No trecho do voto vencedor, proferido pelo Excelentíssimo Ministro Francisco Rezek, a quaestio restou bem elucidada: “A inovar um temperamento à regra do sigilo bancário estampada na lei de 31 de dezembro de 1964, a lei complementar do Ministério Público não arranhou de modo algum, ao que entendo, a integridade do artigo 5º da Constituição. Deu seqüência curial e necessária ao artigo 129-VI do texto maior, e o fez, admita-se ainda, de modo exemplar. O Ministério Público não age na sombra: têm a melhor forma documental suas requisições desse gênero, a que, na linguagem da norma em exame, não há de opor sob qualquer pretexto a exceção do sigilo. Para que assim não fosse, era preciso que a carta mesma entronizasse tal sigilo. Ela decididamente não o faz no caso de operações bancárias, e custo a imaginar o Ministério Púbico requisitando informações sobre o domínio - este sim resguardado pelo texto maior da estrita intimidade das pessoas ou das comunicações. (...)Nesse quadro, e com todas as homenagens aos votos até agora proferidos, o meu é no sentido de indeferir a segurança. Não vejo inconstitucionalidade alguma no § 2º do art. 8º da Lei Complementar 75, cujo texto só faz ampliar, dentro da prerrogativa legítima do legislador, o escopo da exceção já aberta ao sigilo bancário no texto da lei originalmente comum que o disciplinou nos anos 60. E o faz em nome de irrecusável interesse público, adotando um mecanismo operacional que em nada arranha direitos, ou sequer constrange a discrição com que se portam os bancos idôneos e as pessoas de bem.”. Em relação aos Conselhos Municipais, é de bom alvitre ressaltar que a parte autora promoveu a juntada das leis municipais de criação dos mesmos em diversos setores de abrangência da Administração Pública, donde se extrai as atribuições fiscalização e controle social, notadamente de acompanhamento de recursos dos fundos com os mesmos relacionados (fls. 104/140). Com efeito, o acesso amplo às contas bancárias municipais, independentemente de autorizações diversas é inerente ao funcionamento dos conselhos, inclusive porque assim foi a opção do legislador municipal, através de normatividade que, ao fim, sem análises maiores, vincula o Poder Executivo Municipal e seus prestadores de serviços bancários. Por tais linhas, entendo pela plausibilidade do direito Página 4 de 5 Poder Judiciário do Estado da Bahia C o m a rc a d e C a p i m G ro s s o alegado pelo acionante, já que o banco réu, em análise preambular, não pode opor exceção de sigilo às constas do Município aos órgãos com atribuições específicas de fiscalização, controle e acompanhamento de verbas públicas. O periculum in mora, como se pode deduzir, é manifesto. Existe, ao fim, possibilidade de riscos irreparáveis à publicidade de atos administrativos, o controle da administração pública e, eventual, coibição de malversação de verbas públicas. A atitude objurgada potencializa esses riscos. Ante o exposto, DEFIRO o provimento liminar perquirido na exordial, com preceito cominatório de obrigação de fazer, na forma do art. 12 da Lei 7.347/85 c/c o parágrafo 5º do art. 461 do Código de Processo Civil para compelir a parte ré – BANCO BRADESCO a fornecer qualquer informação bancária de contas públicas do Município de Capim Grosso requisitada pelo Ministério Público do Estado da Bahia ou Conselhos Municipais de Acompanhamento e Controle do FUNDEB/Educação, Saúde, Assistência Social ou qualquer outro constituído. Estabeleço multa fixa correspondente a R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada hipótese de descumprimento verificada, sem prejuízo de outras sanções legais aplicáveis. Cite-se a parte ré para contestar a presente ação, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de incidência dos efeitos da revelia. P.I., inclusive o Ministério Público. Capim Grosso, 03 de abril de 2009. Marcos Adriano Silva Ledo Juiz de Direito Página 5 de 5