JOAQUIM, Ana Paula Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
A INEFICÁCIA DA POLÍTICA CRIMINAL APLICADA AOS
ACOMETIDOS PELA PSICOPATIA
Ana Paula Perez Grumiché Joaquim 1
Luiz Eduardo Cleto Righetto 2
SUMÁRIO
Introdução; 1 Aspectos da Personalidade Psicopática; 2 Pressupostos para
Inimputabilidade e Semi-imputabilidade; 3 Política criminal atual: Medida de
segurança; 3.1 Internação; 3.1.1 Tratamento ambulatorial; 4 Problema legal; 5
Anexo; Considerações finais; Referência das fontes citadas.
RESUMO
É cediço que há controvérsias à respeito da política criminal aplicada aos
psicopatas, qual seja, detenção ou medida de segurança. O objeto deste artigo
científico é demonstrar a ínfima abordagem conclusiva dos doutrinadores, no que
concerne a punição e ressocialização do psicopata. O objetivo geral é conhecer os
fatores que contribuem para esse cenário e levantar informações sobre o contexto
atual do aludido instituto, introduzido pela ciência criminal forense, coadunando com
as ciências médicas, presumindo grande relevância ao panorama social. Para a
consecução do presente artigo, foi utilizado o método indutivo, através de pesquisa
doutrinária. Ao final, observou-se que diante da complexidade da temática, faz-se
imprescindível um melhor olhar para instrumentalizar nossa legislação, para
minimizar as ações criminosas de psicopatas e sua reincidência.
Palavras-chave: Psicopatia. medida de segurança. ineficácia. punibilidade.
INTRODUÇÃO
O tema da pesquisa delineará a suposta ineficácia da política criminal atual,
aplicada aos acometidos por psicopatia, considerando a necessidade de se rever na
esfera dos discursos jurídicos à medida que resultará positivamente a função
ressocializadora da sanção penal.
Na seara criminal forense e nas ciências médicas, a problemática
fundamenta-se na discordância no que tange a cura do indivíduo psicopata.
1
2
Pós-Graduada em Psicologia Organizacional na Universidade do Estado de Santa Catarina –
UDESC; Graduada em Pedagogia na Faculdade Guilherme Guimbala; Acadêmica do Curso de
Direito da Universidade do Vale do Itajaí, Campus Balneário Camboriú; [email protected].
Advogado Criminalista; Mestre em CIÊNCIA Jurídica pela UNIVALI.
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JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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No tocante, a corrente majoritária das ciências médicas aponta pela
incurabilidade, por não se tratar de uma doença propriamente e sim de um desvio de
caráter.
Nesta esteira, torna-se temerário as ciências jurídicas considerarem a
medida de segurança uma forma curativa. O campo do saber jurídico carece de
resposta nesse sentido, quando apregoam a cessação de periculosidade
ocasionando a desinternação por mera determinação legal que veda a custódia de
caráter perpétuo.
Neste sentido, é precípuo ressaltar sobre o aspecto temporal, em que o
Código Penal brasileiro, respeitando a Lei suprema, veda a prisão perpétua, no
entanto, se o agente não tem cura, a medida de segurança poderia na prática ser
caracterizada de forma perpétua, seja ela internação ou tratamento ambulatorial,
mascarando o perigo social eminente.
O que se busca com a pesquisa são subsídios que confirmem se aquele
acometido por psicopatia, suscetível a medida de segurança ou pena privativa de
liberdade é efetivamente submetido à sanção com finalidade preventiva, retributiva e
ressocializadora pela prática do ilícito.
Ainda objetivando responder o ponto nevrálgico acerca da atuação dos
operadores de Direito, de forma específica, busca-se corporizar medidas correlatas
e eficientes.
Tal análise se justifica em razão da necessidade de correta aplicação de
sanção ao agente acometido pelo então considerado transtorno de personalidade,
que podem invariavelmente causar sérios danos sociais.
1 ASPECTOS DA PERSONALIDADE PSICOPÁTICA
A capacidade volitiva bem como cognitiva do agente psicopata, pode
facilmente transgredir regras e normas sociais e morais.
Entende FIORELLI3 que:
O termo psicopatia foi cunhado inicialmente por Kraepelin em 1904
como sendo aqueles que possuem personalidade psicopática
aqueles que não se adaptam à sociedade e sentem necessidade de
3
FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana. Psicologia Jurídica. São Paulo: Atlas 2009, p. 105-106.
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ser diferentes. [...] padrão invasivo de desrespeito e violação dos
direitos dos outros, que inicia na infância ou no começo da
adolescência e continua na idade adulta.
No tocante, tem-se como definição, um transtorno de conduta com suas
características elencadas pelo checklist de pontuação do protocolo Hare (PCL-R):
-Loquacidade; charme superficial;
-superestima;
-estilo de vida parasitário; vigarice; manipulação;
-ausência de remorso ou culpa;
-insensibilidade afetivo-emocional; indiferença; falta de empatia;
-impulsividade; descontroles comportamentais;
-ausência de metas realistas a longo prazo;
-irresponsabilidade; incapacidade para aceitar responsabilidade pelos próprios atos;
-promiscuidade sexual;
-muitas relações conjugais de curta duração;
-transtornos de conduta na infância;
-delinquência juvenil;
-versatilidade criminal.
.
Diante do exposto, a corrente majoritária observa ainda que são
características intrínsecas e de difícil identificação, mesmo que por profissionais,
pois superficialmente remetem normalidade.
Para SILVA4, os “predadores sociais são inteligentes, envolventes e
sedutores, não costumam levantar a menor suspeita de quem realmente são”.
Segundo entendimento de FIORELLI5 o que obsta o tratamento é o fato de
que a intervenção terapêutica, em geral, não atinge os objetivos propostos, uma vez
que o agente não aprende com a experiência, o que se alcança é a minimização
após os 40 anos da probabilidade de reincidência criminal.
Nesse diapasão, impende destacar o entendimento de MARANHÃO6 no
sentido de que os defeitos de caráter, compreendem um comportamento agressivo
perante a sociedade, decorrente de ambientes vividos de forma deficitária,
absorvendo características adversas às normas sociais, gerando má formação.
Ainda, outros que já nascem com este “defeito” impediente de aproveitamento de
experiências vividas, ambos podendo ser irreversíveis.
4
SILVA, Ana Beatriz B. Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado. p. 19.
5
FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana. Psicologia Jurídica. p. 107.
6
MARANHÃO, Odon Ramos. Psicologia do Crime. São Paulo: Malheiros Editores 2008, p. 78-79.
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JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
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Ainda nesta esteira, observa-se que a criminalidade não constitui um padrão,
sua má conduta reiterada que reflete em comportamentos profissionais e pessoais
injustificados, pode apenas indicar a presença do transtorno.
Faz-se mister trazer à colação o entendimento da eminente SILVA7, ao
asseverar que:
É importante ressaltar que o termo psicopata pode dar a falsa
impressão de que se trata de indivíduos loucos ou doentes mentais.
A palavra psicopata literalmente significa doença da mente (do
grego, psyche = mente; e pathos = doença). No entanto, em termos
médico-psiquiátricos, a psicopatia não se encaixa na visão tradicional
das doenças mentais. Esses indivíduos não são considerados
loucos, nem apresentam qualquer tipo de desorientação. Também
não sofrem de delírios ou alucinações (como a esquizofrenia) e
tampouco apresentam intenso sofrimento mental (como a depressão
ou o pânico, por exemplo). Ao contrário disso, seus atos criminosos
não provêm de mentes adoecidas, mas sim de um raciocínio frio e
calculista combinado com uma total incapacidade de tratar as outras
pessoas como seres humanos pensantes e com sentimentos.
Corroborando com os aludidos aspectos, o que se depreende é que torna-se
possível reduzir os danos com tratamento adequado, no entanto, não há de se falar
em cura, conforme reafirma SILVA8: “a psicopatia não tem cura, é um transtorno da
personalidade e não uma fase de alterações comportamentais momentâneas.”.
Nesse raciocínio, surge a problemática na esfera criminal, sobre a medida
sancionadora aplicável, posto que as ciências jurídicas tratam o tema afim de
recuperação.
Sobre esse aspecto, MIRABETE e FABBRINI9 prelecionam que:
A medida de segurança não deixa de ser uma sanção penal e,
embora mantenha semelhança com a pena, diminuindo um bem
jurídico, visa precipuamente à prevenção, no sentido de preservar a
sociedade da ação de delinquentes temíveis e de recuperá-los com
tratamento curativo. (grifo nosso)
7
SILVA, Ana Beatriz B. Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado. p.40.
8
SILVA, Ana Beatriz B. Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado. p.198
9
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. Volume I. 28ª. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 353.
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No tocante, iniciam-se acalorados debates sobre a sanção atual aplicável,
bem como, sobre o retorno ao convívio social por aquele com personalidade
psicopática, diante de sua periculosidade.
Acerca da periculosidade, colhe-se os comentários de JESUS10 de que a
“periculosidade é a potência, a capacidade, a aptidão ou a idoneidade que um
homem tem para converter-se em causa de ações danosas”. No que concerne os
fatores da periculosidade, aponta que há elementos internos e externos de ordem
moral, cultural e física, que atuam sobre o indivíduo que o transformam nesse ser
com probabilidade de delinquir.
2 PRESSUPOSTOS PARA INIMPUTABILIDADE E SEMI-IMPUTABILIDADE
Em linhas gerais, a imputabilidade penal reporta as condições atribuídas ao
agente, capacitando-o juridicamente pela prática do fato punível. Opondo-se a ela,
entende-se a inimputabilidade como sendo a incapacidade do agente para estimar o
caráter ilícito do fato. Ainda, intermediando estes institutos tem-se a semiimputabilidade, onde há uma diminuição da reprovabilidade e consequentemente do
grau de culpabilidade. Destarte, será feita uma análise pormenorizada de cada uma
desses institutos.
A legislação penal brasileira estabelece no artigo 26, caput, do Código Penal11:
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou
desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da
ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Neste sentido, denota-se que o agente que pratica ato típico e ilícito,
somente será considerado inimputável, se ao momento da ação ou omissão do
delito, em razão da enfermidade, não possuía capacidade de compreender a
ilicitude.
A corroborar o exposto acima, insta transcrever o entendimento de
MIRABETE e FABBRINI12 que prelecionam:
10
JESUS, Damásio E. Direito Penal. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 475.
11
República Federativa do Brasil, Lei nº 2.848, de 07/12/1940. Dispõe sobre o Código Penal
brasileiro.
12
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. MANUAL de Direito Penal. p. 197.
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Trata-se da primeira hipótese de causa de exclusão da
imputabilidade. Menciona a lei a doença mental. Embora vaga e sem
maior rigor científico, a expressão abrange todas as moléstias que
causam alterações mórbidas à saúde mental. Entre elas, há as
chamadas psicoses funcionais: a esquizofrenia (sobretudo a de
forma paranóide, em que são comuns os impulsos em que o sujeito
agride e mata por ser portador de mentalidade selvagem e primitiva,
sujeita a explosão de fúria, mas que não escolhem nenhuma classe
de delitos e cometem mesmo os que demandam meditação e
refinamento da execução). A psicose maníaco-depressiva (em que
existe uma desorganização da sociabilidade e, eventualmente, da
personalidade, provocando isolamento e condutas antissociais) [...]
Oportuna à colocação sobre a imprecisão terminológica de doença mental, a
dubiedade torna-se ínsita na legislação. Ainda, merece destaque, que nossa
legislação pátria precisa acompanhar os avanços da criminologia e caminhar com
consciência universalista as demais ciências, não refutando o que as ciências
médicas desvelam acerca da complexidade do tema.
Ainda por este prisma, em entrevista concedida à revista Época, a psiquiatra
SILVA13 assevera de modo esclarecedor que:
[...] o psicopata não é um doente mental da forma como nós o
entendemos. O doente mental é o psicótico, que sofre com delírios,
alucinações e não tem ciência do que faz. Vive uma realidade
paralela. Se matar, terá atenuantes. O psicopata sabe exatamente o
que está fazendo. Ele tem um transtorno de personalidade. É um
estado de ser no qual existe um excesso de razão e ausência de
emoção. Ele sabe o que faz, com quem e por quê. Mas não tem
empatia, a capacidade de se pôr no lugar do outro.
Neste ínterim, a psicopatia pode sofrer uma variação de entendimento como
sendo uma doença mental ou moral, bem como, um transtorno de personalidade,
sendo esta última uma teoria modernamente e majoritariamente aceita.
Ainda sobre os critérios legais que determinam pela inimputabilidade,
isentando o agente de pena em razão da inexistência de culpabilidade, MIRABETE e
FABBRINI14 tecem comentários à respeito, seguindo três diferentes sistemas:
biológico, psicológico e biopsicológico.
13
SILVA, Ana Beatriz B. Psicopatas não sentem compaixão. Revista Época. Disponível em:
http://revistaepoca.globo.com/REVISTA/epoca/0,,emi15657-15295,00ana+beatriz+barbosa+silva+psicopatas+nao+sentem+compaixao.html. Acesso em: 04 janeiro 2013.
14
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. MANUAL de Direito Penal. p. 196.
63
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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No tocante ao sistema biológico, quando há uma anomalia psíquica, tem-se
em regra a inimputabilidade, neste caso, não se discute se foi em razão a
enfermidade que o agente praticou o ilícito, inexistindo inteligência e vontade.
Entendimento este, considerado falho pelo doutrinador, pois deixa impune aquele
que apesar de doente mental, possui capacidade de determinação, ou seja, ciência
de inconveniência, imoralidade ou ilicitude de conduta.
Quanto ao segundo sistema, o psicológico, examina-se as condições
psíquicas do agente ao momento do fato, de forma que afasta o cuidado em relação
à existência ou não de doença mental. A esse propósito, entende o doutrinador que
é difícil sua constatação.
Como terceiro critério, tem-se o sistema biopsicológico, ora utilizado pela lei
brasileira em seu artigo 26, supracitado que combina ambas as teorias. A
combinação dos dois elementos, resulta no fato de que, constatado que o agente
não é possuidor de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou
retardado, exclui-se a inimputabilidade. No entanto, se certificado sua incapacidade
de entender o ilícito, será considerado inimputável.
Nesse passo, ainda é de todo oportuno trazer o entendimento de MIRABETE
e FABBRINI15:
Há que ser feita uma aferição no aspecto intelectivo e volitivo. Nos
termos da lei, só é inimputável aquele que ao tempo da conduta, era
inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato: o agente
pode entender o fato, mas não o caráter ilícito de sua conduta e,
nessa hipótese, é inimputável. Pode o sujeito, porém, apesar de um
desses estados mórbidos, ser capaz do entendimento ético,
devendo-se nessa hipótese, verificar o aspecto volitivo, de
autodeterminação, que pode não existir. É o que ocorre com alguma
frequência em indivíduos portadores de certas psiconeuroses, os
quais agem com plena consciência do que fazem, mas não
conseguem ter o domínio de seus atos.
Neste
sentido,
elenca
portadores
acometidos
por
tal
estado
de
compulsividade, como os cleptomaníacos que furtam, os piromaníacos que
incendeiam, os dipsomaníacos com impulsividade em relação ao álcool, entre
outros.
Com relação à prova de imputabilidade, GRECO16 preleciona que:
15
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. p. 198.
64
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No âmbito do Direito Penal, a perícia psiquiátrica tem por objetivo
estabelecer diagnóstico e auxiliar o juiz a estabelecer a culpabilidade.
Dessa maneira, mostra-se a impossibilidade de atribuir culpabilidade
para um indivíduo portador de transtorno mental que comete algum
ilícito, após diagnosticada a sua insanidade psíquica por meio de
perícia. Nesse contexto, existe o reconhecimento de que essa
pessoa apresenta incapacidade de entender o caráter ilícito do fato
ou de determinar-se conforme este entendimento, não podendo ser
estereotipado como criminoso.
Deste modo, torna-se extremamente importante a minuciosa avaliação do
indiciado por intermédio de perito, apurando e revelando suas características antisociais ou psicopáticas, a fim de prover ao juízo esclarecimentos que fundamentem
a decisão.
No tocante a culpabilidade diminuída, prevê o artigo 26, parágrafo único do
Código Penal17:
A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em
virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento
mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento.
Deste modo, há uma mitigação no que tange a imputabilidade, onde a
capacidade assimilativa é considerada reduzida diante do ilícito, para tanto, a
doutrina trata como semi-imputabilidade.
Em
entrevista
à
revista
Veja,
HARE18,
psicólogo
canadense,
responsável por identificar os critérios universalmente aceitos para diagnosticar os
portadores desse aludido transtorno de personalidade, responde ao questionamento:
No Brasil, os psicopatas costumam ser considerados semiimputáveis pela Justiça. Os magistrados entendem que eles até
podem ter consciência do caráter ilícito do que cometeram, mas não
conseguem evitar a conduta que os levou a praticar o crime. Assim,
se condenados, vão para a cadeia, mas têm a pena diminuída. O
senhor acha que, do ponto de vista jurídico, os psicopatas são
totalmente responsáveis por seus atos? Eu diria que a resposta é
sim. Mas há divergências a respeito e existem muitas investigações
16
GRECO, Rogério. (Org.). Medicina Legal à Luz do Direito Processual Penal. 10. ed. Niterói:
Impetus, 2011. p. 150.
17
República Federativa do Brasil, Lei nº 2.848, de 07/12/1940. Dispõe sobre o Código Penal
brasileiro.
18
HARE, Robert. Psicopatas no divã. Veja, São Paulo, ed. 2106, ano 42, n. 13, 01 Abril 2009. p. 21.
Entrevista concedida a DINIZ, Laura.
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em andamento para determinar até que ponto vai a responsabilidade
deles em certas situações. Uma corrente de pensamento afirma que
o psicopata não entende as consequências de seus atos. O
argumento é que, quando tomamos uma decisão, fazemos
ponderações intelectuais e emocionais para decidir. O psicopata
decide apenas intelectualmente, porque não experimenta as
emoções morais. A outra corrente diz que, da perspectiva jurídica,
ele entende e sabe que a sociedade considera errada aquela
conduta, mas decide fazer mesmo assim. Então, como ele faz uma
escolha, deve ser responsabilizado pelos crimes que porventura
venha a cometer. Não há dados empíricos que deem apoio a um
lado ou a outro. Ainda é uma questão de opinião. Acredito que esse
ponto será motivo de discussão pelos próximos cinco ou dez anos,
tanto por parte dos especialistas em distúrbios mentais quanto pelos
profissionais de Justiça.
Nesse diapasão, impende destacar o entendimento de MIRABETE e
FABBRINI19 que aduzem:
Embora
se
fale,
no
caso,
de
semi-imputabilidade,
semirresponsabilidade ou responsabilidade diminuída, as expressões
são passíveis de críticas. Na verdade, o agente é imputável e
responsável por ter alguma consciência da ilicitude da conduta, mas
é reduzida a sanção por ter agido com culpabilidade diminuída em
consequência de suas condições pessoais. O agente é imputável,
mas para alcançar o grau de conhecimento e de autodeterminação é
lhe necessário maior esforço. Se sucumbe ao estímulo criminal, deve
ter-se em conta que sua capacidade de resistência diante dos
impulsos passionais é, nele, menor que em sujeito normal, e esse
defeito origina uma diminuição da reprovabilidade e, portanto, do
grau de culpabilidade. [...] Os psicopatas, por exemplo, são enfermos
mentais, com capacidade parcial de entender o caráter ilícito do fato.
Com o desiderato de conferir melhor aplicabilidade do jus puniendi,
hodiernamente, a corrente majoritária entende que considerar o agente psicopata
como sendo possuidor de responsabilidade diminuída, consiste na melhor forma de
retribuir e prevenir, cabendo ao juiz decidir pela aplicação da pena reduzida ou
substituí-la por medida de segurança.
3 POLÍTICA CRIMINAL ATUAL: MEDIDA DE SEGURANÇA
19
RIBEIRO, Bruno de Morais, in MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito
Penal. p. 199.
66
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Para proteger a sociedade de condutas transgressoras que ocasionem lesão
a um direito, bem como diminuição de bem jurídico alheio, o legislador trouxe a
sanção penal como um gênero, do qual deriva as penas ou medida de segurança,
ambos com caráter inafastável imposto pelo Estado.
MARCÃO20 fundamenta com as palavras de BRUNO DE MORAIS RIBEIRO,
que a origem da medida de segurança é remota, considerando que entre os
romanos, no período clássico, consideravam penalmente incapazes os menores de
sete anos de idade e quanto aos loucos, eram encarcerados somente se não
pudessem ser controlados pelos familiares. Outrossim, o Direito Canônico também
admitia que os loucos como penalmente incapazes.
O Código Penal de 1940 adotava o sistema duplo binário, ou seja, a medida
de segurança podia ser aplicada simultaneamente a pena, devido à periculosidade
do agente. Hodiernamente, adota-se o sistema vicariante ou unitário, ensejando em
aplicação de pena ou medida de segurança, conforme inteligência dos artigos 97 e
98 da lei supracitada, possuindo caráter preventivo e assistencial, conforme
entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência.
A corroborar o exposto acima, insta transcrever o entendimento de
MIRABETE e FABBRINI21:
Embora de forma implícita, permanecem os pressupostos para a
aplicação das medidas de segurança: a prática de fato previsto como
crime e a periculosidade do agente. É o que se deduz dos artigos 97
e 98 do CP. Não basta a periculosidade, presumida pela
inimputabilidade, ou reconhecida pelo juiz em casos de semiimputabilidade. Necessário e imprescindível que, na condição de
sujeito ativo, tenha a pessoa cometido um fato típico punível.
Deste modo, a periculosidade insta conferir a possibilidade de que o agente
volte a delinquir. Apesar do texto legal não demonstrar a referida terminologia, o
reconhece em seus artigos 77 inciso II e 83, que negam a possibilidade de
suspensão condicional da pena e livramento condicional da pena, vinculando ao
comportamento social e sua personalidade.
20
MARCÃO, Renato Flávio. Curso de Execução Penal. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 261.
21
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. p. 354.
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A lei impõe a aplicação obrigatória de medida de segurança aos
inimputáveis que comentem o ilícito, enquanto que para os semi-imputáveis é
facultado ao juiz substituir a pena pela medida de segurança.
Diante do exposto, é de todo oportuno trazer o entendimento de MARCÃO22,
que complementa afirmando que, “em se tratando de medida de segurança, deve
prevalecer sempre como guia para a definição da terapêutica a ser executada, a
conclusão pericial e não a natureza da pena”.
Também por este prisma, CAPEZ23 preleciona que a medida de segurança é
“sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja finalidade é
exclusivamente preventiva no sentido de evitar que o autor de uma infração penal,
que tenha demonstrado periculosidade volte a delinquir”
Neste sentido, a medida de segurança se justifica e fundamenta no juízo de
periculosidade do agente.
3.1.1 Internação
A internação em Hospital de Custódia é destinada ao autor que tiver
cometido fato punível com pena de reclusão.
A esse propósito, faz-se mister trazer à colação, o entendimento de
MIRABETE e FABBRINI24 que “trata-se de medida detentiva para tratamento
psiquiátrico, ou à falta, em outro estabelecimento adequado.”
Segundo MARCÃO25, de forma crítica, expõe que no plano prático há
grandes dificuldades em aplicar esta medida, posto que a ausência de vagas é
quase absoluta. Tece ainda comentários referente à inexistência de estrutura, bem
como, sobre o descaso Estatal, e que por vezes a internação é substituída por
cárcere comum, para aguardar vaga em hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico, refere-se à situação como sendo caótica, gerando constrangimento
ilegal.
22
MARCÃO,Renato Flávio. Curso de Execução Penal. p. 265.
23
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. v. 1. São Paulo: Editora: Saraiva, 2004, p.
400.
24
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. p. 358.
25
MARCÃO, Renato Flávio. Curso de Execução Penal. p. 266.
68
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Neste sentido, colhe-se da Jurisprudência do Tribunal de Minas Gerais26:
EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. PACIENTE
SUBMETIDO A MEDIDA DE SEGURANÇA DE INTERNAÇÃO.
PERMANÊNCIA EM PRESÍDIO COMUM. ALEGADA FALTA DE
VAGAS EM HOSPITAL PSIQUIÁTRICO. CONSTRANGIMENTO
ILEGAL. OCORRÊNCIA. 2. ORDEM CONCEDIDA, EM PARTE.
(HC 81.959/MG, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, 6ª
T, DJ 25.02.2008)
No tocante, por não haver estabelecimento adequado, STF também já
decidiu pela possibilidade de internação em hospital particular, desde que garantida
a custódia da pessoa submetida à internação, isto porque o estabelecimento comum
pode ser nocivo ao seu tratamento.
Por outro norte, este instituto necessita para instrumentalizar o processo a
sujeição obrigatória aos exames psiquiátricos, criminológicos e de personalidade,
conforme dispõem os artigos 100 e 174 da Lei de Execução Penal27:
Art. 100 - O exame psiquiátrico e os demais exames necessários ao
tratamento são obrigatórios para todos os internados.
Art. 174 - Aplicar-se-á, na execução da medida de segurança,
naquilo que couber, o disposto nos arts. 8º e 9º desta Lei, qual
sejam: Art. 8º - O condenado ao cumprimento de pena privativa de
liberdade, em regime fechado, será submetido a exame criminológico
para a obtenção dos elementos necessários a uma adequada
classificação e com vistas à individualização da execução.
Art. 9º - A Comissão, no exame para a obtenção de dados
reveladores da personalidade, observando a ética profissional e
tendo sempre presentes peças ou informações do processo, poderá:
I - entrevistar pessoas;
II - requisitar, de repartições ou estabelecimentos privados, dados e
informações a respeito do condenado;
III - realizar outras diligências e exames necessários.
Por força da Lei 12.403/2011, o Código de Processo Penal possibilita a
internação
provisória
do
agente,
desde
que
reconhecida
por
perícia
a
inimputabilidade ou semi-imputabilidade, através de medida cautelar, para crimes
praticados com violência ou grave ameaça, se observado o iminente risco de novas
práticas criminosas.
26
HC 81.959/MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T, DJ 25.02.2008. Acesso em 25
fevereiro
2013.
Disponível
em:
http://www.jusbrasil.com.br/filedown/dev6/files/JUS2/STJ/IT/HC_211750_SP_ 1326946087193.pdf.
27
BRASIL. Lei de execução Penal. Lei 7.210 de 11 de julho de 1984.
69
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
No tocante, a medida pode ser aplicada àqueles acometidos por
personalidade psicopática, por serem considerados semi-imputáveis.
Deste modo, uma vez comprovado por exames periciais, deverá o juiz
reduzir a pena de um a dois terços ou ainda substituir a pena por internação quando
o sujeito necessitar de um tratamento especial, como uma forma de prevenção.
3.1.2 Tratamento ambulatorial
Outra espécie de medida de segurança prevista após a reforma penal é o
tratamento ambulatorial, também conhecida como medida de segurança restritiva,
com sujeição aos inimputáveis condenados com a detenção, e aos semi-imputáveis
que se enquadrem no artigo 26, parágrafo único, do Código Penal, e que necessitem
de tratamento curativo especial.
Para MIRABETE e FABBRINI28, por palavras de ZAFFARONI destaca:
É sabido que, na moderna terapêutica psiquiátrica, a internação
ocupa lugar cada vez mais reduzido. Existe uma série de análises
que tendem para sua abolição, enquanto se fomenta o tratamento
ambulatorial.
Deste modo, pertinente ressaltar que ao prever a medida de segurança não
detentiva, o legislador contemplou no artigo 101 da Lei de Execução Penal a
modalidade terapêutica, exigindo ao sentenciado o comparecimento ao hospital de
custódia e tratamento psiquiátrico nos dias estabelecidos, autorizando inclusive que
a assistência possa ser feita em outro local adequado, ou ainda, contratar médico de
confiança pessoal.
A submissão ao tratamento ambulatorial pode ser convertida em internação
caso a conduta do sentenciado revele essa providência.
Importante observação feita ainda por MIRABETE e FABBRINI29:
Não se pode desconhecer que o inimputável que praticou um delito
de lesões corporais leves, punido com detenção, pode facilmente
executar um homicídio, e que o semi-imputável que praticou o crime
de ato obsceno eventualmente poderá cometer estupro. A
substituição prevista em lei, portanto, deve ser aplicada pelo juiz com
28
ZAFFARONI, Eugênio Raúl, in MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito
Penal. p. 359
29
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. p. 360.
70
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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2236-5044
extrema cautela, mesmo porque todas as doenças e perturbações
mentais podem ser ao menos reduzidas em sua intensidade por um
tratamento curativo.
Resta claro a intenção da doutrina, em reforçar a complexidade da
periculosidade e a incerteza quanto a recuperação do autor do fato, posto que há
fatores potencialmente causadores de insegurança para a sociedade.
4 PROBLEMA LEGAL
A indeterminação do prazo para cumprimento da medida de segurança é
alvo de muitos debates, pois há fixação apenas para o prazo mínimo, perdurando
até que se realize perícia que confirme a cessação da periculosidade.
No tocante a cessação de periculosidade, MARCÃO30 preleciona que:
Trata-se de procedimento a ser adotado ex officio, devendo
proceder-se à oitiva do Ministério Público e da Defesa previamente à
decisão judicial, facultando a apresentação de quesitos para análise
e resposta por parte dos peritos.
Ainda, de forma crítica destaca:
[...] a realidade prática destoa por completo da finalidade da lei, e a
regra é que o submetido à medida de segurança, seja ela de que
natureza for, não recebe o tratamento apropriado à sua recuperação
mental, de maneira que a cessação, quando ocorre, advém mais de
um acaso ou de condições particulares do agente do que do
tratamento propriamente dispensado. Não é por outra razão que o
item 158 da Exposição dos Motivos da Lei de Execução Penal assim
dispõe: A pesquisa sobre condição dos internados ou dos
submetidos a tratamento ambulatorial deve ser estimulada com rigor
científico e desvelo humano. O problema assume contornos
dramáticos em relação aos internados que não raro ultrapassam os
limites razoáveis de durabilidade, consumando, em alguns casos, a
perpétua privação de liberdade.
O que se discute, é se em razão das características apresentadas, se a
medida de segurança atinge seu fim precípuo. Ora, se as ciências médicas afirmam
a inviabilidade de cura aos psicopatas, isso enseja em cárcere eterno, violando a
garantia constitucional que veda o caráter perpétuo. Por outro norte, sua liberdade
30
MARCÃO, Renato Flávio. Curso de Execução Penal. p. 268-269.
71
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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2236-5044
coloca em risco a proteção social, posto que sua periculosidade permanece, mesmo
após o cumprimento da medida.
DIAS31, Coordenador do Grupo de Trabalho para o Estudo das Políticas
Referentes à Psiquiatria Forense, aponta a real situação das entidades responsáveis
pelo tratamento curativo dos pacientes, ora submetidos à internação ou tratamento
ambulatorial. Afirma em seu relatório que:
É confuso e multifacetado, não se conhecendo nem mesmo o
número de equipamentos de saúde, denominados Hospitais de
Custódia e Tratamento. Também não existe um eixo central que
norteie o tratamento das pessoas atendidas. Esse fato é corroborado
pela recente preocupação do Conselho Nacional de Justiça, que
através de seu programa de mutirões carcerários pretende mapear
os seus estabelecimentos.
Evidencia
uma
situação
caótica
e
deficitária,
não
atendendo
as
necessidades básicas do paciente, no que diz respeito à estrutura arquitetônica e
recursos humanos.
Aponta que os peritos que realizam o exame de verificação de cessação de
periculosidade encontram-se sobrecarregados, fazendo com que o paciente aguarde
por até cinco anos pelo agendamento do exame desta natureza, mesmo que já
tenha sua periculosidade cessada, quando poderia continuar seu atendimento em
regime ambulatorial.
Assinala ainda que por falta de opção social, acabam permanecendo
abrigados mesmo após serem liberados pelo exame de verificação de Cessação de
Periculosidade, superlotando a instituição. Isso caracteriza ilegalidade, podendo
caracterizar cárcere privado.
Oportuna a afirmação que atualmente o conceito de periculosidade do
doente mental foi substituído pela avaliação de risco de reincidência criminal. Isso
decorre das características do psicopata e a constatação da necessidade em caráter
emergencial de medida eficaz e individualizada.
No que importa a ineficácia da política criminal aplicada aos acometidos pela
psicopatia, muito embora a doutrina majoritária entenda que a melhor forma de
cumprimento de sentença é a medida de segurança, cabe ressaltar os diversos
comentários críticos acerca do tema.
31
DIAS, João Carlos. (Org.). Hospitais de Custódia no Brasil: avaliação e propostas. ABP. p. 1-9
72
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
O clamor público diante de crimes bárbaros, exige rigorosidade na aplicação
da pena, mas há uma série de deficiências da estrutura, um despreparo do Estado e
ausência de norma específica para o aludido tema.
SZKLARZ32, em seu texto produzido à revista Super Interessante, faz
apontamentos acerca do tema. No tocante, afirma que a justiça brasileira pode
admitir o psicopata como imputável, ou seja, com plena consciência de seus atos,
punindo-o como um criminoso comum, ou ainda como semi-imputável, considerando
que não consegue exercer controle sobre seus atos, neste caso, aplicando a
redução da pena ou enviando-o a um Hospital de custódia para o devido tratamento.
O que ocorre, segundo seu relato, os operadores de direito evitam a semiimputabilidade devido à redução de pena, ou ainda, que os hospitais de custódia são
locais destinados aos criminosos diagnosticados com doença tratável, o que não se
aplica a psicopatia.
Neste sentido, o psicopata fica inserido em prisões comuns, articulando e
prejudicando a reabilitação dos demais. Ainda, tem poder de simular, manipular e
convencer, tornando-se um “preso modelo”, conseguindo facilmente a progressão de
regime.
Enfaticamente, esclarece:
A semi-imputabilidade é uma baita encrenca no Brasil, onde não
existe prisão especial para psicopatas (como é o caso do Canadá).
Colocá-los em presídios comuns prejudica a reabilitação dos outros
presos - 80% da população carcerária. E misturá-los com loucos em
hospitais não faz sentido - a não ser que tenha também uma doença
mental tratável. Portanto, para especialistas, o ideal seria julgar os
psicopatas como semi-imputáveis e prendê-los em cadeias
especiais. Lá, seriam acompanhados por profissionais especializados
que determinariam sua possibilidade de sair e voltar à sociedade.
Assim, na pretensão de tecer seus comentários, diante do exposto, tem-se
que o tempo que o psicopata estiver submetido à detenção ou tratamento, não será
eficaz para que possa retomar seu convívio social.
O tratamento psicopedagógico em local especial, atribuindo tarefas e
responsabilidades seria um caminho, no entanto, se a liberdade está vinculada a
32
SZKLARZ,
Eduardo.
O
psicopata
na
justiça
brasileira.
Disponível
em:
http://super.abril.com.br/cotidiano/psicopata-justica-brasileira-620213.shtml. Acesso em: 09 março
2013.
73
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
cessação de periculosidade, a “prisão” se tornaria perpétua, conforme dito
anteriormente, posto que o desvio de caráter não tem cura. Celeuma que não se
exaure, não havendo posicionamento dominante à respeito, pois esta aplicação
seria contrária a Constituição, por outro norte, é dever do Estado tutelar a segurança
pública.
Depreende-se do §1º do artigo 97 do Código Penal Brasileiro33:
A internação, ou tratamento ambulatorial, será por tempo
indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante
perícia médica, a cessação da periculosidade. O prazo mínimo será
de 1 (um) a 3 (três) anos.
O teor deste artigo é aplicabilidade do prazo mínimo de duração da medida
de segurança estabelecendo em um à três anos, mantendo em aberto o prazo
máximo, o que oportuniza entendimento de que a medida de segurança pode ter
caráter perpétuo.
A esse propósito, faz-se mister trazer à colação o entendimento do Tribunal
de Justiça de São Paulo:
O prazo máximo de 30 anos para o cumprimento da pena prevista
constitucionalmente não se aplica a medida de segurança, pois a
internação pode prolongar-se indefinidamente se não constatada a
cessação da periculosidade do agente. (RT 763/553)
Deste modo, fica evidentemente caracterizado que a norma considera
indeterminado o tempo de duração da medida de segurança, ratificando sua
perpetuidade, contrariando a Constituição Federal.
Com efeito, em análise rigorosa, INNES34 um cientista que escreveu vários
artigos sobre ciência forense, destaca sobre o tema:
Infelizmente, os métodos atuais de tratamento psicológico de
delinquentes nas instituições não parecem eficazes. Já houve muitos
casos em que criminosos violentos – Edmund Kemper e Henry Lee
Lucas são exemplos – foram declarados “curados”, mas, depois de
soltos, reiniciaram e até aceleraram o ritmo dos crimes. [...]
Sociólogos dizem que o desenvolvimento precoce de tendências
psicopáticas nas crianças pode ser detectado e notificado, e que eles
33
República Federativa do Brasil, Lei nº 2.848, de 07/12/1940. Dispõe sobre o Código Penal
brasileiro.
34
INNES, Brian. Perfil de uma mente criminosa: a psicologia solucionando crimes na vida real . 1ª
ed. São Paulo: Escala, 2009.
74
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
poderiam obter autorização oficial para aplicar tratamentos
comportamentais. No entanto, isso exigiria um programa muito
grande e extremamente dispendioso par o qual não existe
financiamento [...].
Destarte, o retorno ao convívio social é uma incógnita. Se por um lado, ao
cumprir pena, será solto, independente de constituir uma ameaça social, por outro,
não poderá ser mantido internado eternamente aguardando uma cessação de
periculosidade que poderá não ocorrer.
Nesse passo, é de todo oportuno trazer à baila o entendimento de COSTA35:
A solução para o problema estaria na criação de prisões
especificamente destinadas a psicopatas, onde estes ficariam
isolados dos presos comuns, de maneira que não poderiam controlálos. Esta prisão deveria receber uma atenção especial do governo,
contando sempre com equipe médica e psicológica para
acompanhamento permanente, caso contrário o que seria a
resolução do problema, acabaria sendo verdadeira bomba prestes a
estourar. Na impossibilidade de prisões específica para os dissociais,
[...] o compartilhamento de instituições prisionais com presos comuns
também surtiria efeitos, se psicopatas e presos comuns não fossem
colocados em contato, a partir de uma escala de horários
diferenciada, e de selas equidistantes.
Por este prisma, tem-se uma remota possibilidade de amparo jurídico com
incisiva atividade estatal através de uma profunda reforma institucional. Isso oneraria
os cofres públicos, no entanto poderia ser uma alternativa eficaz.
35
COSTA, Chirstian. Curso de Psicologia Criminal. Belém: Planeja RH, 2008. Disponível em:
<http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5321>.
Acesso em: 16 maio 2013.
75
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
ANEXO
Censo36 dos Estabelecimentos de Custódia e Tratamento Psiquiátrico,
retrato da população no ano de 2011:
3.000
2.839
2.500
2.000
1.500
1033
1.000
741
500
117
0
População em MS
Internação
Temporária
Internados
indevidamente
Em MS por
conversão de pena
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Direito Penal caracteriza-se por tutelar os valores ético-sociais, visando
com suas sanções prevenir, retribuir o mal causado e ressocializar. Deste modo, se
o agente é acometido por psicopatia, possuindo estilo de vida parasitário, incapaz de
sentir remorso ou culpa, implica em fragilidade aos objetivos propostos, pois se trata
de agente de alta periculosidade, necessitando de política criminal específica.
O entendimento da doutrina majoritária é no sentido de que aquele
acometido por psicopatia, deverá ser considerado como semi-imputável, cabendo ao
juiz fixar a pena base, sempre obedecendo aos critérios do artigo 59 do Código
36
DINIZ, Débora. A custódia e o tratamento psiquiátrico no Brasil: censo 2011. Brasília, DF:
Letras Livres UNB, 2013.
76
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Penal, no entanto, a legislação atual não contempla mais a psicopatia, um
retrocesso jurídico injustificável.
Destarte, o modelo de política criminal atual aplicada aos psicopatas, sob o
cunho de tratamento, admitindo-o como semi-imputável, demonstra sua ineficácia
absoluta, uma vez que são considerados incuráveis, por não se tratar de uma
doença e sim um desvio de caráter.
Depreende-se acerca do tema, que os motivos internalizados pelos
psicopatas ante o cometimento de crimes, que expressam seu caráter, pouco são
compreendidos e a solução dada pelo ordenamento penal para esses indivíduos não
cumprem seu fim precípuo.
As repercussões sociais negativas e a pressão da opinião pública leiga
diante da legislação pátria contribuem para o errôneo entendimento de qual a
medida apropriada e eficaz, considerando que o clamor é pela pior condenação.
Tem-se a fragilidade acerca do tema psicopatia no ordenamento jurídico, um
verdadeiro descaso estatal diante da periculosidade constatada.
Quando a medida detentiva resulta em internação, tem-se o cenário dos
Hospitais de Custódia demonstrando diversas irregularidades, ausência de vagas,
problemas estruturais, um contingente internado superando 30 anos, contrariando a
pena máxima admitida pela norma jurídica brasileira.
Por outro norte, a sociedade precisa estar sob a proteção estatal contra os
psicopatas, deste modo, mesmo contrariando a Constituição Federal, cabe um
repensar legislativo para que se alcance o desiderato, posto que a cessação de
periculosidade não ocorra independente do risco que possa estar acarretando à
sociedade.
Quanto ao encarceramento do psicopata junto aos demais “criminosos
comuns”, também apresenta-se ineficaz, pois aumentam as chances de que haja
prejuízo a reabilitação destes últimos, face a articulação e manipulação do
psicopata.
Conclui-se, a necessidade de regulamentação própria e nova medida,
equacionando os problemas que envolvem a celeuma, fomentando estratégias para
melhor
aplicabilidade
da
política
criminal
aos
psicopatas,
através
de
acompanhamento médico, permanecendo em celas especiais e isoladas, algo que
77
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
parece surreal em termos econômicos, mas eficaz em países como Canadá, isso
enquanto o problema for insolúvel.
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
BRASIL. Lei de execução Penal. Lei 7.210 de 11 de julho de 1984.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. v. 1. São Paulo: Editora:
Saraiva, 2004.
COSTA, Chirstian. Curso de Psicologia Criminal. Belém: Planeja RH, 2008.
Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?
n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5321> . Acesso em: 16 maio 2013.
DIAS, João Carlos. (Org.). Hospitais de Custódia no Brasil: avaliação e propostas.
ABP.
DINIZ, Débora. A custódia e o tratamento psiquiátrico no Brasil: censo 2011.
Brasília, DF.: Letras Livres UNB, 2013.
FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana. Psicologia Jurídica. São Paulo: Atlas
2009.
GRECO, Rogério. (Org.). Medicina Legal à Luz do Direito Processual Penal. 10.
ed. Niterói: Impetus, 2011.
HARE, Robert. Psicopatas no divã. Veja, São Paulo, ed. 2106, ano 42, n. 13, 01
Abril 2009. p. 21. Entrevista concedida a DINIZ, Laura.
HC 81.959/MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T, DJ 25.02.2008.
Acesso em 25 fevereiro 2013. Disponível em:
http://www.jusbrasil.com.br/filedown/dev6/files/JUS2/STJ/IT/HC_211750_SP_
1326946087193.pdf.
INNES, Brian. Perfil de uma mente criminosa: a psicologia solucionando crimes na
vida real . 1ª ed. São Paulo: Escala, 2009.
JESUS, Damásio E. Direito Penal. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995.
MARANHÃO, Odon Ramos. Psicologia do Crime. São Paulo: Malheiros Editores
2008.
MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. Volume
I. 28ª. ed. São Paulo: Atlas, 2012.
78
JOAQUIM, Ana Paulo Perez Grumiché; RIGHETTO, Luiz Eduardo Cleto. A ineficácia da política criminal aplicada
aos acometidos de psicopatia. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 58-79, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
MARCÃO,Renato Flávio. Curso de Execução Penal. 7 ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
República Federativa do Brasil, Lei nº 2.848, de 07/12/1940. Dispõe sobre o Código
Penal brasileiro.
SILVA, Ana Beatriz B. Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado. Rio de Janeiro:
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Disponível em: http://revistaepoca.globo.com/REVISTA/epoca/0,,emi15657-15295,00ana+beatriz+barbosa+silva+psicopatas+nao+sentem+compaixao.html. Acesso em:
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SZKLARZ, Eduardo. O psicopata na justiça brasileira. Disponível em:
http://super.abril.com.br/cotidiano/psicopata-justica-brasileira-620213.shtml. Acesso
em: 09 março 2013.
79
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