A nova classe média vai às compras 18 KPMG Business Magazine Cenário é positivo para o varejo, mas empresas precisam entender o perfil do novo consumidor Nos últimos anos o mercado consumidor brasileiro experimentou uma expansão surpreendente. Pelo menos 32 milhões de pessoas ascenderam à classe média em uma década. E, acredita-se, outras 35 milhões subirão na escala social até 2014. Não é sempre que o setor varejista se depara com um panorama tão propício. Esse cenário aponta para profundas transformações, que podem representar grandes oportunidades. Ou riscos, para as companhias que não estiverem preparadas para o acirramento da disputa por novas e maiores fatias de mercado. “Tão importante quanto sair na frente é entender a transição e o perfil do novo consumidor, para atender às suas expectativas” , explica Carlos Pires, sócio-líder da área de Consumer Markets da KPMG no Brasil. Outra questão relevante é o interesse de players globais. O estudo Turning global risk into opportunity: key priorities for consumer company CFOs, realizado pela KPMG International, coloca o país em terceiro lugar na lista dos mercados que apresentam maiores perspectivas de crescimento. Mercado registra tendência de sofisticação do consumo “A atratividade brasileira se mantém, apesar da crise internacional. E setores como os de alimentos, bebidas, supermercados e shopping centers, além de segmentos importantes na área de serviços (como educação e saúde), vislumbram grandes perspectivas pela frente” , aponta. De fato, há estimativas de que, nos próximos dez anos, o brasileiro passe a gastar pelo menos 55% mais com consumo, com fortes reflexos na cesta de produtos. Boa parcela da população ainda se enquadra no padrão de consumo básico – que gasta a maior parte da renda com alimentação. “Mas a tendência é de sofisticação. Os gastos com lazer e diversão, além de novas tecnologias para comunicação, devem aumentar” , afirma. KPMG Business Magazine 19 Novos hábitos A mudança nos hábitos de consumo reflete a alteração no perfil dos consumidores brasileiros – que está mais diversificado. O aumento da expectativa de vida criou um mercado para pessoas que antes não consumiam tanto. Os idosos demandam mais serviços específicos, sejam eles de saúde ou de lazer, e exigem ser bem atendidos. Multinacionais apostam na rápida recuperação da economia da região Os jovens da classe média emergente estudaram mais que os pais, têm maior acesso à informação e estão ávidos por comprar. Mas não desenvolveram familiaridade com poupança ou planejamento financeiro. Não à-toa são eles os mais endividados – tanto no cartão de crédito quanto no cheque especial, as duas modalidades de crédito mais caras do país. Na avaliação de Carlos Pires, esse cenário cria um ciclo difícil de ser quebrado: o endividamento acima do recomendado leva à inadimplência, que, ao crescer, faz com que os bancos aumentem as exigências para concessão de crédito. “Com isso, os juros bancários sobem e, para que recuem, seria preciso que a taxa de poupança do país aumentasse, o que não tem se registrado nos últimos anos, apesar da expansão econômica e do aumento da renda da população” , avalia Carlos Pires. O nível de poupança do brasileiro em relação ao PIB é de apenas 4,5%, similar ao dos norte-americanos (4,6%), mas muito aquém dos 30% dos indianos e dos 22% dos chineses. O sócio da KPMG avalia que as taxas de juros continuam altas, apesar da queda na taxa Selic e das recentes movimentações pela redução de juros promovidas pelo Banco Central e por bancos estatais e privados. Além disso, o mercado de private equity ainda é relativamente pequeno, já que os fundos fazem negócios com recursos próprios, modelo muito diferente do adotado por países da Europa e pelos Estados Unidos. “Diante disso, é preciso muita confiança e certeza de retorno para investir no Brasil, que tem sido, de certa maneira, beneficiado também pela queda de confiança dos investidores em outros países, realidade provocada pela atual crise mundial” , analisa Carlos Pires. Várias multinacionais que cobiçam o mercado consumidor brasileiro já prospectam oportunidades no país, com a perspectiva de recuperação mais rápida da economia na América Latina, em geral, e no Brasil, em particular. Para elas, o recado é um só: o mercado de consumo do Brasil é rico, mas difícil. “A complexidade da tributação e o tamanho da carga de impostos são os maiores desafios. O país precisa de uma reforma tributária e fiscal muito bem planejada e estruturada” , diz o sócio da KPMG. Ele lembra, ainda, os problemas de logística, os altos custos do transporte e a inflação nos salários. “É certo que a taxa de desemprego está baixa, mas a inflação salarial já causou um apagão de mão de obra nas cidades” , conclui. 20 KPMG Business Magazine De qualquer forma, a questão para as empresas do setor varejista não é se devem ou não investir, mas se estão de fato totalmente preparadas para atender ao ávido novo consumidor brasileiro. A pesquisa A pesquisa Turning global risk into opportunity: key priorities for consumer company CFOs envolveu entrevistas com 350 CFOs do varejo, alimentos, bebidas e bens de consumo em todo o mundo. Entre eles, 28 executivos brasileiros. Brasil é terceiro mercado com maiores perspectivas de crescimento O estudo aponta o Brasil como o terceiro mercado com maiores perspectivas de crescimento nos próximos dois anos. Em uma lista de 18 países, o país ficou com 19,1% das indicações, à frente do bloco Reino Unido/Leste Europeu (15,9%) e da Índia (14,6%), mas atrás de Estados Unidos/Canadá (43,6%) e da China (23,6%). O estudo mostra que, mesmo esperando queda de receita em 2012, quatro em dez executivos financeiros das principais empresas globais de consumo planejam investir em novos mercados, inovação de produtos e mobile commerce (com o uso de dispositivos móveis, como smartphones, pelos consumidores) para ampliar a participação de mercado. KPMG Business Magazine 21 Dois terços dos respondentes estão aumentando o orçamento para preparar a expansão rumo a novos mercados. E mais de 80% acreditam que o sucesso de suas empresas, a longo prazo, será impulsionado pelas vendas para a nova classe média dos mercados emergentes. A inovação de produtos lidera as estratégias de crescimento adotadas: mais de 40% das companhias deverão adaptar os produtos desenvolvidos para o mercado local visando a atender as necessidades de outras regiões. As empresas europeias, porém, estão mais propensas a vender seus produtos inalterados em outros mercados, adaptando somente os rótulos, embalagens e/ou instruções. Muitas empresas apostam em tecnologias móveis Mais de um terço dos pesquisados utilizarão as tecnologias móveis para maximizar as vendas, superando tanto a internet como o e-commerce. O gerenciamento de relacionamentos com clientes (CRM) ocupou a segunda posição entre as alternativas com maior probabilidade de afetar as vendas positivamente. Em suas estratégias globais, 82% dos brasileiros consideram que o uso das tecnologias digitais será fundamental para que suas empresas atinjam os clientes, contra 72% da média global do estudo. Leia a pesquisa A íntegra do estudo Turning global risk into opportunity: key priorities for consumer company CFOs, realizado pela KPMG International, pode ser acessada em https://www.kpmg.com/Global/en/IssuesAndInsights/ ArticlesPublications/Documents/consumer-company-cfo-priorities.pdf 22 KPMG Business Magazine