O Jo
r
try
tis
CLÍNICA
lDe
na n
AR
AL
l
l
TIG
O O RI GI N
ABSTRACT
SÍNCOPE VASOVAGAL PROVOCADO POR TRAUMA DE INFÂNCIA
In this work we present a clinical case of vaso-vagal syncope caused by a childhood trauma at the dentist. Intends to emphasize the
importance of psychological factors as triggers points of the whole process. In adults and in children is necessary to use all possible
pharmacological and non-pharmacological techniques in any dental treatment to eliminate pain in order to avoid trauma that can be
reflected in the future. It is necessary to respect the pain in childhood and understand the adult as a whole.
Keywords: síncope vasovagal, dor na infância, distúrbio de stress pós-traumático.
E
ste trabalho surgiu a propósito de um episódio de síncope
vasovagal ocorrido numa consulta de medicina dentária
e que terá tido como causa principal um trauma de infância.
Pretende-se salientar a importância dos fatores psicológicos
como possíveis desencadeadores de todo o processo. Tanto
nos tratamentos dentários de adultos como nos de crianças
é necessário utilizar as técnicas farmacológicas e não farmacológicas adequadas para eliminar a dor, a fim de se prevenir situações traumáticas que podem ter reflexos no futuro.
Introdução
“Existe atualmente o consenso de que a criança não é um
pequeno adulto: a sua imaturidade, o seu estado de dependência afetiva, o seu estádio de evolução cognitiva, (etc) são
fatores que influenciam decisivamente a capacidade de sentir e experienciar a dor¹.”
É muito complexo definir o que é a dor, quantificá-la e
explicá-la. Se tal é difícil em relação a um adulto, ainda mais
o é no que respeita às crianças.
Na consulta de medicina dentária existem vários fatores
que podem influenciar a percepção da dor, tanto no adulto,
como na criança. Tais fatores são o medo do desconhecido, o
receio do material novo (rolos de algodão, brocas, aspiradores), a fobia a agulhas, receio de ruídos novos, o receio dos
novos sabores, o cansaço associado a estar de boca aberta
muito tempo, medo da sensação da anestesia, o medo de
sentir dor, a posição de imobilidade, entre outros.
Por outro lado também se deve considerar a capacidade
do médico dentista em acalmar, tranquilizar e incutir confiança ao paciente, assim como a sua capacidade em aplicar
as técnicas corretas de eliminação da dor.
Dra. Tânia Lourenço
Licenciatura em Medicina Dentaria pela FMDUL em 2000
Monitora de Endodontia da FMDUL entre 2001/2005
Assistente convidada de Endodontia da FMDUL entre
2005/2009
Curso de Pós-Graduação em Ortodontia pela POS em
2004/2006
Curso Teórico Prático de Atualização em Endodntia Clínica (Dr Pedro Cruz)
em 2009
Curso de Implantes e Prótese sobre Implantes pelo Instituto Velasco (Dr
Rogerio Velasco) em 2014
Aluna do Mestrado Integrado em Medicina Dentaria em 2014/2015
34
O objectivo deste trabalho é sensibilizar o médico dentista
para não subestimar a dor dos pacientes qualquer que seja
a sua idade de forma a evitar traumas profundos que se
podem manter durante toda a vida.
Dor como 5º sinal vital
Pode-se definir a dor como uma experiência complexa de
perceção, essencial para a sobrevivência do indivíduo. As
pessoas que nascem com insensibilidade à dor acabam por
estar menos aptas para reagirem e se protegerem das situações de perigo. A dor é tida assim como um 5° sinal vital²,³.
É influenciada por uma série de fatores psicológicos e biológicos. Os fatores psicológicos envolvidos são:
•
•
•
•
•
•
As emoções
O contexto social e económico
O significado pessoal da dor
As crenças do indivíduo em relação à dor
As atitudes face à dor
As expectativas criadas no respeitante à dor
Estes fatores psicológicos podem iniciar, manter ou modular as manifestações físicas relacionadas com o processo doloroso, tornando assim a dor uma experiência única para cada
indivíduo4,5. Pode-se assim falar no dualismo da dor, em que
muitas vezes a dor física não é distinta da dor psicológica.
Dor na Criança
“Até há relativamente pouco tempo, admitia-se que a criança e especialmente o recém-nascido e lactente, não sentiam dor, e se sentissem não recordariam. Este falso conceito associado à impossibilidade dos bebés manifestarem a
intensidade da dor sentida, contribuiu para um tratamento
inadequado ou nulo da dor, durante anos.(…)
O manejo da dor na cirurgia pediátrica tem como melhor
tratamento a prevenção do seu aparecimento(…). Por outro
lado (… ) a cirurgia pediátrica tem êxito quando uma criança
operada com sucesso, tem alta hospitalar sem traumas psicológicos que a afetam no futuro6.”
É necessário estar muito atento a cada criança e aos seus
sinais corporais (linguagem não verbal) para se perceber se
está a sentir dor ou se está assustada. Muitas delas ainda
não falam, outras não se sabem exprimir. E é muito importante saber acreditar na criança. Para esta a dor é mais do
que uma sensação; assim como no adulto, também para ela
é uma experiencia emocional, influenciada por vários fatores tais como a sua idade, a fase de desenvolvimento em
que se encontra, a compreensão da própria dor, o medo da
separação, o medo de uma atitude, o receio de ser repreendida ou excluída, o ambiente, as alterações na sua aparência
física, a restrição de atividades, as experiências anteriores,
o sexo, a cultura, as relações familiares e a condição física7.
A imaturidade neurológica, mesmo na criança prematura,
não limita a sua capacidade de sentir dor e a sua correspondente memorização8. E da mesma forma que ocorre no adulto, a dor pode levar a níveis de morbilidade aumentados no
pós-operatório, podendo mesmo levar à morte.
A maturidade anatómica e neuro química do recém-nascido, incluindo os prematuros, é suficiente para que a transmissão dos impulsos nociceptivos seja feita normalmente através
das vias aferentes, espinal medula, vias intra-espinhais até às
estruturas bulbo-mesencefálicas e cortico-subcorticais. A densidade dos receptores nociceptivos das terminações cutâneas
do recém-nascido é igual ou superior à do adulto9.
Aliás, na 30ª semana de gestação é realizada a maturação
das conexões dos nervos periféricos com o sistema nervoso
central ao nível dos cornos dorsais da medula.
No final da gestação ocorre a mielinização dos nervos
espinhais e das vias nervosas responsáveis pela transmissão
do estímulo doloroso ao neo-cortex.
À nascença, a mielinizaçao das fibras A-delta está incompleta, existindo apenas uma diminuição da velocidade de
transmissão do impulso, o que é compensado pelas distâncias inter-neuronais serem mais pequenas.
Pela 12ª semana de gestação a substancia P (neurotransmissor) é sintetizada.
Deste modo o recém-nascido possui o equipamento
necessário para a perceção da dor.
Por isto não se admite dizer que a criança não sente dor.
Escalas de Medição da Dor
Não existe uma escala rígida de resposta à dor. A Direção
Geral de Saúde elaborou a circular normativa nº 9/DGCG de
14/06/2003 onde são consideradas quatro escalas de avaliação da dor (Escala Visual analógica, Escala Numérica, Escala
Qualitativa e Escala de Faces) e respetivas regras de aplicação. Por exemplo, na Escala de Faces (Figura 1), o paciente
refere a intensidade da dor sentida de acordo com a mímica apresentada de zero a cinco, em que zero corresponde a
ausência de dor, e o cinco a dor máxima.
www.jornaldentistry.pt
OJDentistry N15.indd 34
06/02/15 13:40
Fig. 1. Escala de Faces (adaptada da circular normativa nº 9/DGCG de
14/06/2003 ).
menos um ano. A partir do momento em que se verifique
uma recuperação total da doença deve-se diminuir a dose dos
medicamentos gradualmente até à sua abolição total¹³.
A psicoterapia visa em apoiar o doente a recordar o que
aconteceu, permitir-lhe exprimir as emoções negativas e a
elaborar estratégias de ultrapassar a situação. Existem também várias formas de abordagem: hipnose, terapia cognitiva-comportamental, terapias de grupo, apoio familiar e
terapia social15.
Quantificar a Dor na Criança
Síncope Vasovagal
Se quantificar a dor num adulto é difícil, nas crianças (ou
nos deficientes) é um desafio ainda maior10,11.
Por este motivo a Direção Geral da Saúde emitiu também a
norma número 014/2010 de 14/12/21010 que cita normas de
orientação na avaliação da dor na criança , dividindo em vários
grupos: recém-nascidos, menores de 4 anos ou crianças sem
capacidade de falar, entre os 4-6 anos e dos 6 aos 18 anos .
Também denominado como síncope vaso-depressor tratase do desmaio vulgar e é normalmente um processo benigno (se bem que as vezes possa por em risco a vida do paciente) e autolimitado, que se observa com frequência.
A síncope é um termo genérico que define a perda de consciência súbita e transitória devido a uma isquémia cerebral.
A consciência recupera-se normalmente espontaneamente
em pouco tempo e o paciente após o episódio parece totalmente recuperado. Mas qualquer perda de consciência, ainda
que breve, produz sempre alterações fisiológicas na vítima.
É responsável por 1 a 6% de todas as admissões hospitalares. 30% das pessoas têm uma síncope ao longo da sua vida
e em mais de 40% existe recidiva.
Aparece como a situação de urgência mais frequente no
gabinete dentário e pode ocorrer em qualquer fase do tratamento: durante a extração de dentes, durante a realização de técnicas cirúrgicas, durante a injeção dos anestésicos
locais, entre outras situações.
Pode ser secundária a fatores cardíacos (arritmia cardíaca
ou cardiopatia obstrutiva) mas tem como causa mais frequente a alteração reflexa ou resposta mediada pelo sistema nevoso autónomo que controla a pressão arterial e a
frequência cardíaca.
Existem fatores de risco psicológicos e não psicológicos.
Os fatores de risco psicológicos são o medo, a ansiedade, o
stress emocional, a dor, sobretudo a inesperada, ver sangue
ou outro tipo de material cirúrgico. Os fatores não psicológicos são: sentar-se em posição vertical ou estar de pé, fome
produzida pela dieta ou por jejum (falta de aporte de glicose
ao cérebro), cansaço, má condição física, ambiente húmido
ou quente com muita gente, ser do sexo masculino e idade
entre os 16 e os 35 anos16.
Na consulta de medicina dentária, os fatores precipitantes
mais comuns são de origem psicológica.
A síncope é agrupada em três fases: pré-sincope, síncope
e pós-sincope (Figura 2).
Trauma de Infância: Distúrbio de Stress
Pós-Traumático (DSPT)
O Distúrbio de Stress Pós- Traumático (DSPT) é considerado uma entidade clínica desde 1980. Neste distúrbio o indivíduo vivencia ou testemunha um acontecimento traumático que representa uma ameaça para a sua vida ou para a sua
segurança ou de outros. Na altura a pessoa sente um medo
intenso, desespero ou terror. Depois do ocorrido, o indivíduo pode reviver o acontecimento através de memórias ou
sonhos dolorosos e recorrentes, pode agir como se o acontecimento estivesse a acontecer, ou pode evitar ao máximo
situações que lhe façam lembrar o ocorrido. Podem existir
sinais de agitação que não se verificavam antes do trauma
acontecer (irritabilidade, insónias, dificuldade de concentração, resposta exagerada ao imprevisível)¹².
Quando as manifestações clinicas existem há menos de
três meses é considerado agudo, se for há mais de três
meses é considerado crónico.
O clinico deve ter em atenção a altura em que o acontecimento ocorreu pois uma situação pode parecer ameaçadora
numa determinada fase da vida do indivíduo e noutra não.
Apesar de muitas pessoas sofrerem acontecimentos traumáticos ao longo da vida, apenas 10 a 15% de toda a população desenvolve posteriormente um DSPT. Assim a exposição
ao trauma é uma condição necessária mas não suficiente
para desencadear esta doença¹³.
O tratamento do Distúrbio de Stress Pós-Traumático envolve terapia cognitiva e farmacológica. Dependendo da história do indivíduo pode-se aplicar apenas um tipo de tratamento ou os dois. A longo prazo a terapia cognitiva
apresenta melhores resultados14.
O tratamento psicofarmacológico tem como objetivo melhorar os períodos de sono, de ansiedade ou de depressão. Quanto maior for a reatividade e o grau de perturbação da pessoa
mais necessita deste tipo de fármacos. A terapêutica farmacológica correta deve manter-se durante um período de pelo
Fig. 2. As três fases da síncope.
Na pré-síncope o paciente em pé sente calor no pescoço
e na cara. Fica pálido ou cinzento claro, sente suores frios
(principalmente na zona anterior do corpo) e/ou náuseas. O
pulso arterial é baixo, a frequência cardíaca aumenta. Com
o continuar do processo verifica-se dilatação pupilar, hiperpneia, frio nas extremidades (mãos e pés), diminuição abrupta da tensão arterial (hipotensão) e da frequência cardíaca
(bradicardia). A visão fica turva, existe sensação de enjoo.
Se se verifica perda de consciência entra-se no quadro de
síncope propriamente dito.
O tratamento consiste em interromper-se a intervenção,
colocar o paciente em posição de supinação com as pernas
elevadas, realizar movimentos musculares para ajudar o
retorno da circulação sanguínea. Se for necessário deve-se
administrar oxigénio; pode-se ainda romper uma ampola de
amoníaco aromático para ajudar a recuperar a respiração.
Pode-se prosseguir com o tratamento desde que exista acordo entre o médico e o paciente, ou então adiar o tratamento.
Os sinais clínicos da síncope são inconsciência, respiração
irregular, rouca mas que pode ser tranquila, débil ou praticamente impercetível, podendo cessar por completo (ataque respiratório ou apneia). As pupilas dilatam-se (o paciente fica com aspeto de morto). É frequente verificarem-se
movimentos convulsivos dos músculos das pernas, mãos e
face. O cérebro fica hipóxico em períodos de 10 segundos.
A bradicardia mantém-se. Verificam-se episódios graves de
assistolia ventricular completa. A tensão arterial é muito baixa (30/15 mm Hg) e difícil de registar assim como é difícil de
medir o pulso. Verifica-se relaxamento muscular generalizado produzindo obstrução da via aérea parcial ou completa.
Pode existir incontinência fecal.
A duração da síncope será extremamente breve se se colocar o paciente imediatamente em posição de supinação (de
breves segundos a alguns minutos). Depois devem-se seguir
os passos de tratamento de qualquer doente inconsciente.
Se não houver uma recuperação imediata dever-se-á chamar sempre a equipa de emergências médicas.
No período de pós-síncope (recuperação) verifica-se se
existe palidez, enjoos, debilidade e/ou suores. Pode existir
persistência dos sintomas até 24 horas após o episódio e um
período curto de confusão mental ou desorientação. Pode
existir aumento da tensão arterial e da frequência cardíaca.
Caso Clínico
Paciente do sexo feminino, com 35 anos de idade, saudável, dirigiu-se à consulta de medicina dentaria no dia
26/10/2012 por volta do meio-dia, para realizar a última
sessão de endodontia (obturação dos canais) do dente 1.7.
As duas primeiras sessões do tratamento tinham corrido
sem complicações. A terceira e última sessão do tratamento foi realizada sem anestesia. A paciente sentiu uma dor
muito ligeira que foi suficiente para provocar aceleração do
ritmo cardíaco e recordar uma situação traumática de dor
ocorrida na infância que nunca tinha sido comunicada ao
médico dentista.
www.jornaldentistry.pt
OJDentistry N15.indd 35
35
06/02/15 13:40
CLÍNICA
Entretanto a paciente estava deitada e foi colocada na
posição sentada para tirar o RX. Quando se voltou a colocar a
paciente na posição de supinação, iniciou-se o seguinte quadro: a face tornou-se arroxeada, os olhos ficaram revirados,
e foi emitido um ruido gutural. A paciente ficou inconsciente, deixou de respirar, estava completamente imóvel, e com
aspeto de morta.
A médica dentista manteve a paciente deitada na cadeira,
colocou a sua cabeça em hiperextensão, fez uma compressão torácica e passado alguns segundos a paciente voltou
ao seu estado normal, enquanto a assistente dentária ligava
para o 112. O tempo total de duração deste episódio foi de
cerca de 3 minutos.
Nenhuma equipa de emergências médicas foi mobilizada
para a clínica pois a vítima não se encontrava inconsciente
no momento em que se realizou o contacto telefónico.
Após o episódio descrito a paciente apresentava-se bem
disposta, e não se recordava de nada. O tratamento foi interrompido, tendo sido terminado após a apresentação de um
relatório médico pormenorizado atestando a inexistência de
qualquer contra-indicação do foro cardíaco ou neurológico que
impedissem a continuação dos tratamentos. Foi confirmado o
diagnóstico de Distúrbio de Stress Pós-Traumático, algo que a
paciente sabia mas não revelou à médica dentista. A médica
assistente receitou um ansiolítico que a paciente tomou antes
da consulta e o tratamento foi terminado (com anestesia)
sem qualquer tipo de complicação a assinalar.
Discussão
Existem vários fatores que isolada ou conjuntamente contribuíram para toda a situação atrás descrita. Eles são:
1) HIPOGLICÉMIA
A paciente encontrava-se há cerca de 6 horas sem comer
com o agravante de ter realizado exercício físico, acentuando o quadro de hipoglicémia17. Este é um fator de risco de
síncope.
2) ALTERAÇÃO DE POSIÇÃO
A alteração de posição para se tirar a radiografia também
provocou alterações fisiológicas que podem ter contribuído
para o quadro clínico atrás descrito.
3) DOR EM ENDODONTIA
A paciente estava a ser submetida a um tratamento
endodôntico de um molar superior.
A perceção dos pacientes em geral acerca deste tipo de
tratamento é negativa devido à sua associação com a dor,
antes, durante e após o tratamento, como demonstrou a
Associação Americana de Endodontia18. São considerados os
tratamentos dentários mais dolorosos19.
Relativamente à ansiedade o tratamento endodôntico e a
cirurgia oral encontram-se na mesma categoria19. A ansiedade que o tratamento provoca está muitas vezes relacionada
com a expectativa da dor.
Os pacientes com níveis mais elevados de ansiedade con-
36
sideraram os procedimentos mais indesejáveis a punção
para a anestesia e a sensação de limas a serem colocadas e
manuseadas no canal20,21,22.
Num estudo orientado por Peretz e colaboradores em
199818 concluiu que as mulheres demonstram significativamente maiores resultados na DAS (Dental Anxiety Scale) do
que os homens, apesar de que outros autores demonstraram resultados semelhantes20,21.
O fato de se fornecer informação positiva sobre o tratamento de canal ao paciente pode diminuir o medo da dor²³.
Por outro lado, um paciente calmo faz com que o médico
dentista trabalhe melhor e evite terminar o tratamento o
mais rápido possível²³.
No caso clínico descrito, o fato de não se ter dado anestesia e de se tratar de um tratamento endodôntico pode ter
contribuído para acentuar a contribuição dos fatores psicológicos no desenrolar da situação.
Uma emergência é algo que surge sem se estar à espera. Pode acontecer ao paciente, ao seu acompanhante, à
auxiliar e ao pessoal que trabalha na clínica, ou mesmo ao
próprio médico. Apesar de as situações de risco vital não
serem comuns na prática clínica de medicina dentária diária
existem fatores que podem aumentar a sua frequência: os
avanços terapêuticos, o maior número de pessoas de idade
que procura tratamentos e a crescente utilização de fármacos na consulta.
Perante um completo sistema de avaliação física e de uma
história clínica detalhada, e aplicando técnicas corretas para
evitar provocar situações de stress, tendo especial atenção
às crianças e a doentes mais ansiosos, 90% de todas as situações de urgência que implicam risco de vida podem ser
evitadas16.
A hipótese de alergia à anestesia foi retirada pois no dia
em que ocorreu a síncope não foi administrada anestesia.
4) TRAUMA DE INFÂNCIA
A leve sensação de dor ativou memórias de uma situação
traumática na infância (extração do dente 46 aos 10 anos de
idade) que desencadeou o QSPT.
Conclusão
5) INFORMAÇÃO OCULTADA
Houve informação que foi ocultada pela paciente. Já tinha
tido a sensação de desmaio noutras consultas com outros
colegas (era a primeira consulta com a médica em questão)
e suspeitava-se de alergia à anestesia, não estando nada
registado na ficha da paciente. A médica de clínica geral já
tinha diagnosticado o Quadro de Stress Pós-Traumático e avisado a paciente que esta situação podia conduzir à morte.
Toda esta informação não tinha sido comunicada.
Segundo Malamed(1994)16, “quando se está preparado
para uma urgência, esta deixa de existir”.
Deste modo a médica dentista podia estar mais atenta
e preparada para esta situação . Por exemplo nunca teria
corrido o risco de causar dor e de efetuar o tratamento sem
anestesia.
Todo o quadro clínico atrás descrito resultou de um conjunto de factores: hipoglicémia, mudança da posição da
cadeira, tipo de tratamento realizado (tratamento endodôntico) e um trauma de infância.
O médico dentista tem que estar muito atento, considerar
o paciente como um todo e não subvalorizar as queixas e
outros sinais deste, independentemente da sua idade.
Dialogar com o paciente e perceber o seu estado de ansiedade não é perca de tempo mas sim um meio de se obter
informações valiosas que podem permitir alcançar uma
melhor qualidade e sucesso nos tratamentos dentários.
Registar tudo por escrito é fundamental assim como pedir
para que o paciente assine os dados declarados.
É importante que toda a equipa médica faça cursos de
atualização em emergências-médicas com regularidade.
A psicoterapia pode ser uma das formas de se ultrapassar
traumas criados na infância. O médico dentista deve estar
sensibilizado para tal e encaminhar o paciente para esta
possibilidade terapêutica. n
Bibliografia
1. Reis, L. L. A dor cronica na criança. In: A.B. Joao Gomes-Pedro. Dor na criança e no jovem .
14. Spielberger, E. i.-C.Encyclopedia of Applied Psychology vol 2. Elsevier Academic
2.
3.
4.
15. Pedder, D. B. Principios e Prática das psicoterapias (1ª ediçao ed.). Lisboa: CLIMEPSI
5.
6.
7.
8.
9.
Lisboa: Permanyer Portugal 1997.p. 169-175.
Seidel HM, B. J. Mosby’s Guide to Physical Examination. Mosby. 2006
Walid MS, D. S. The Fifth Vital Sign – What Does it Mean? Pain Practice,2008. 8: 417.
Leonardo Berini Aytes, C. G. Anestesia Odontologica.2 ed. Madrid: Edition Avancs MedicoDentales, S.L; 2001.
Wall, P. Dor a Ciencia do Sofrimento.Porto: Ambar Complexo Industrial Grafico,S.A.1999.
Gonçalves, M. Manejo da dor em cirurgia pediatrica.In: A. B. Joao Gomes-Pedro, Dor na
criança e no jovem.1997.
Ferrao, M. R.. Dor na criança. Intervençoes de enfermagem. In: A. B. Joao Gomes-Pedro,
Dor na criança e no jovem. Lisboa: Permanyer Portugal.1997.p.183-188
Santos, H. G. Anestesicos Locais. In: A.B.J. Gomes-Pedro, Dor na crianaça e no jovem.
Lisboa: Permanyer Portugal.1997. p.141-152.
Gabriela, C. Tecnicas de medicaçao corporal: a massagem do bebe. In: A. B. Joao GomesPedro. Lisboa: Permanyer Portugal.1997.p.177-181.
Joao Gomes-Pedro, A. B. Dor na criança e no jovem. Lisboa: Permanyer Portugal.1997.
Romao, J. Controlo da dor em medicina dentaria. Perspetiva medica. Saude orl Saude
geral. In: Caderno do Congresso.Congresso Ordem dos Medicos Dentistas. 2013.p. 50.
Kazdin, A. E Encyclopedi of Psychology. Oxford University Press.2000.p23-35.
Serra, A. V. O stress na vida de todos os dias. Coimbra: GC -Grafica de Coimbra lda.1999.
Press.2004.
Editores.1997.
16. Malamed, S. F. Urgencias Medicas en la Consulta de Odontologia. 4 ed.Madrid: Mosby/
Doyma Libros.1994.
17. Jr., B. P. Metabolismo Celular e Exercício Físico. Aspectos Bioquímicos e Nutricionais.
Brasil: Phorte Editora.2004.
18. Peretz B, M. (1998). Dental anxiety among patients undergoing endodontic treatmemt.
J Endod Jun. 24(6), 435-7.
19. Wong M, L. W. A comparison of anxiety levelsmassociated with root canal therapy and
oral surgery treatment. J Endod Sep. 1991. 17(9), 461-5.
20. LeClaire AJ, S. A. Endodontic fear survey. J Endod, Nov. 1998. 14(11), 260-4.
21. Liddell A,D. Gender and age differences in attitudes to dental pain and dental control.
Community Dental Oral Epidemiol Aug. 1997. 25(4), 314-8.
10.
11.
22. Rolim, A. S. Dor associada ao Tratamento Endodontico. In: Mestrado Integrado em
12.
13.
23.
Medicina Dentaria [dissertação]. Universidade de Lisboa -Faculdade de Medicina
Dentaria; 2012.
Wijk AJ van, H. J. Reducing fear of pain associated with endodontic therapy. Int Endod J.
Maio. 2006.39(5), 384-8.
www.jornaldentistry.pt
OJDentistry N15.indd 36
06/02/15 13:41
Download

clinica - O JornalDentistry