O Relatório da Administração no Brasil: Peça de Informação ou de Ficção?
Autoria: Mário Allan Ferraz Mafra, Walter Lee Ness Jr.
Resumo: o trabalho teve como propósito verificar se o relatório da administração das
companhias abertas brasileiras é um importante elemento de evidenciação e um eficaz
instrumento de análise econômica e financeira das empresas, ou se é mero cumprimento de
uma formalidade legal. Foram analisados os relatórios da administração e respectivas
demonstrações financeiras do ano de 1998, de 100 companhias abertas brasileiras,
selecionadas aleatoriamente do cadastro de companhias de capital aberto da CVM – Comissão
de Valores Mobiliários, com a utilização do método de “análise de conteúdo” e a aplicação do
teste não paramétrico Wilcoxon Signed Ranks. A correlação foi examinada pelo cálculo do
Coeficiente de Correlação de Spearman entre as variáveis. A conclusão do trabalho é que,
com uma média geral de 36 pontos, em 100 pontos possíveis de serem alcançados no
atendimento aos critérios de evidenciação da CVM e da ONU, os relatórios da administração
das companhias abertas brasileiras, no exercício de 1998, se prestam quase que
exclusivamente ao mero cumprimento de uma formalidade legal. Eles ainda têm um longo
caminho a trilhar, até que possam ser considerados como um importante elemento de
divulgação voluntária das empresas brasileiras.
1
INTRODUÇÃO
1.1
O problema
Discussões acerca da qualidade e utilidade das informações prestadas pelas empresas
a um vasto conjunto de usuários, têm-se revelado bastante intensas por todo o mundo. No
Brasil, é com a Lei n.º 6.404, de 15 de dezembro de 1976, conhecida como a Lei das
Sociedades por Ações ou Lei das S/A, que essa discussão toma maior vulto. No artigo 133,
inciso I da referida Lei, vê-se que o relatório da administração sobre os negócios e principais
fatos administrativos da empresa faz parte do conjunto dos chamados “Documentos da
Administração” e representa um importante complemento às demonstrações financeiras
publicadas pelas sociedades por ações, pela característica das informações que dele devem
constar, simultaneamente históricas e preditivas. A Lei 6.385/76 dá competência à CVM para
estabelecer normas sobre o relatório da administração. Ainda que com um atraso de 11 anos, a
CVM edita em 28 de dezembro de 1987, o Parecer de Orientação CVM n.º 15, determinando
os procedimentos a serem observados pelas companhias abertas brasileiras e respectivos
auditores independentes, na elaboração e publicação das demonstrações financeiras, do
relatório da administração e do parecer de auditoria, relativos aos exercícios sociais
encerrados a partir de dezembro de 1987. Por ser descritivo e menos técnico que o restante
das demonstrações financeiras, o relatório da administração permite melhor compreensão da
empresa, por uma gama bem maior de usuários. Porém, para uma parcela significativa dos
agentes que se utilizam das demonstrações financeiras como fonte de informação, uma
questão permanece ainda não respondida: Os relatórios da administração das companhias
abertas brasileiras têm alguma serventia como elemento de divulgação voluntária? Posta de
outra forma, e considerando que os critérios da CVM e da ONU, para o relatório da
administração, propiciam o adequado e suficiente nível de evidenciação (disclosure), a
questão é: Em que extensão os relatórios da administração estão em conformidade com os
critérios de evidenciação da CVM e da ONU? Esse é o problema que o presente trabalho
procura discutir.
1.2
Objetivos (principal e secundários)
O objetivo principal desta pesquisa foi verificar se o relatório da administração das
companhias abertas brasileiras é um importante elemento de evidenciação da situação atual e
2
futura das empresas ou se é mero cumprimento de uma formalidade legal
Para que o objetivo principal possa ser atingido, necessário se faz a definição dos
seguintes objetivos secundários:
1. Criar, entre as companhias abertas brasileiras selecionadas para pesquisa, um
ranking de adequação aos critérios da CVM e da ONU para o conteúdo do relatório da
administração.
2. Apurar a distribuição de freqüência dos graus de adequação dos relatórios da
administração das companhias abertas brasileiras, em percentis que representem péssima
adequação, baixa adequação, boa adequação ou ótima adequação.
3. Verificar se há evidências suficientes para afirmar que os relatórios da
administração das companhias abertas brasileiras atendem melhor aos critérios da CVM do
que aos critérios da ONU.
4. Identificar, dentre os temas propostos pela ONU e pela CVM, quais os que
aparecem com maior e menor freqüência, nos relatórios da administração das companhias
abertas brasileiras.
5. Levando-se em conta o compromisso técnico do auditor independente com o grau
de evidenciação da empresa, constatar eventual correlação entre o porte do auditor (medido
pela quantidade de companhias abertas registradas na CVM, sob sua responsabilidade técnica)
e o desempenho do grupo de empresas por ele auditadas, no atendimento aos critérios da
CVM e da ONU para os relatórios da administração.
6. Examinar se alguns dos indicadores contábeis das companhias (como tamanho do
ativo total, tamanho do patrimônio líquido, rentabilidade e alavancagem) têm relação com o
nível de evidenciação de seus relatórios da administração, à luz dos critérios da CVM e da
ONU.
1.3
Relevância do estudo
As recentes mudanças na Lei das S/A tiveram o objetivo de aumentar a governança
corporativa, por meio da maior transparência das informações e da maior participação dos
acionistas minoritários, além de adequar a Lei ao processo de harmonização das normas e
práticas contábeis mundiais. A qualidade das demonstrações financeiras das empresas
brasileiras tem sido de crucial importância para a captação de recursos internacionais, seja na
emissão de títulos de dívida, seja na venda de participações acionárias. Na administração de
carteiras, o trabalho de ALVES (1990) nos faz ver que, também aqui, as informações
contábeis são largamente empregadas pela maioria dos analistas de mercados de capitais, a
despeito do consenso, que parece haver entre os estudiosos contemporâneos, de que os preços
estabelecidos pelo livre mercado já embutem os resultados contábeis periodicamente
publicados pelas empresas de capital aberto. Conjugados, esses fatores conferem relevância a
esse estudo, cujo objetivo maior é o de colaborar para a melhoria das informações prestadas
pelas empresas brasileiras, fazendo com que o mercado acionário nacional cresça em
qualidade e quantidade.
1.4
Delimitação do estudo
Dentre os inúmeros elementos de evidenciação existentes, a presente pesquisa se ateve
ao relatório da administração e à sua capacidade de bem informar sobre as empresas. No que
se refere ao horizonte geográfico, a proposta deste estudo foi analisar o conteúdo dos
relatórios da administração de 100 companhias abertas brasileiras em situação operacional,
com ações registradas na CVM e que tenham entregue a essa autarquia as Demonstrações
Financeiras Padronizadas (DFP) - Legislação Societária do exercício sob análise. Para a
seleção das companhias abertas não houve nenhuma restrição quanto ao local de negociação
de suas ações - bolsa ou mercado de balcão. Nem mesmo se suas ações estavam sendo
negociadas ou não. A escolha das empresas teve como fonte de referência o banco de dados
3
da Comissão de Valores Mobiliários - CVM e os dados foram extraídos dos sites da Internet
www.cvm.gov.br e infoinvest.com.br. Quanto ao horizonte temporal, a análise dos relatórios
da administração se concentrou no exercício social de 1998, tido como o mais expressivo da
década de 1990, em quantidade de companhias abertas registradas na CVM (1.047 empresas).
2
REFERENCIAL TEÓRICO
2.1
Revisão da literatura existente
ANDRADE, A. (1990), dissertando sobre as preferências dos usuários dos
demonstrativos financeiros das empresas brasileiras, com relação ao uso de terminologia
descritiva versus terminologia técnica, aponta para as inúmeras dificuldades de compreensão
desses relatórios, por parte de usuários leigos em contabilidade. A partir da preocupação em
informar melhor e de forma mais abrangente, muitos pesquisadores vêm se debruçando sobre
estudos que tratam da adequação das demonstrações financeiras ao conceito de evidenciação.
Esses estudos têm procurado cobrir a totalidade das demonstrações financeiras ou
determinados demonstrativos e relatórios que as compõem. Por exemplo, o problema de que
os atuais modelos de evidenciação das informações contábeis não expressam, de forma
conveniente, a situação econômico-financeira, de desempenho operacional e de perspectivas
futuras das empresas brasileiras, é abordado por ANDRADE, E. (1999) sob o enfoque apenas
do balanço patrimonial e da demonstração do resultado do exercício. Por seu turno, a
Demonstração de Origens e Aplicações de Recursos - DOAR e a Demonstração dos Fluxos de
Caixa - DFC são, sem sombra de dúvida, os demonstrativos mais estudados recentemente,
como se constata no trabalho de AFONSO (1998). Entretanto, uma revisão preliminar da
literatura mostra que é reduzida a pesquisa do tema evidenciação, com o foco centrado no
relatório da administração e sua capacidade preditiva. Exceção feita ao trabalho de FALCÃO
(1993) que faz um estudo exploratório do relatório de administração de 92 empresas
brasileiras, referente ao exercício de 1989, vis a vis as normas sugeridas pela CVM para seu
preenchimento. Para efeito de comparação com o exercício de 1990, ele reaplica o teste de
conformidade com as normas da CVM em 43 empresas da amostra anterior. Conclui que o
índice geral de atendimento às normas da CVM foi muito baixo nos dois exercícios sob
exame, situando-se na casa dos 24,8% Esse estudo é muito semelhante ao que se propôs nesse
trabalho. Também a equipe de técnicos da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis,
Atuariais e Financeiras - FIPECAFI, órgão de apoio da Universidade de São Paulo - USP, sob
a coordenação de IUDÍCIBUS, MARTINS & GELBCKE (1991), mostra sua preocupação
com a qualidade informativa do relatório da administração, ainda no nascedouro da Lei
6.404/76, ao fazer uma análise, de abrangência nacional e internacional, das normas legais e
das práticas de evidenciação do relatório da administração, vigentes até então. Já ALMEIDA
(1988) avalia o nível de evidenciação de informações voluntárias nos relatórios anuais de
empresas industriais brasileiras, com ações cotadas em bolsa de valores, no período de 1984 a
1986, e a relação entre esse nível e o tamanho da empresa, assim como sua rentabilidade. Seu
trabalho mostra que só existe correlação significativa entre o nível de evidenciação e o
tamanho da empresa, avaliado em termos de logaritmo dos valores de ativos totais e
patrimônio líquido. ALMEIDA (1988) conclui que há um amplo espaço para as empresas
brasileiras melhorarem o conteúdo informacional de seus relatórios anuais. BEUREN (1991)
estendendo a pesquisa de ALMEIDA (1988), para o ano de 1987, constata que o nível de
evidenciação de informações voluntárias não é elevado, embora tenha aumentado em relação
ao período de 1984 a 1986, pesquisado anteriormente. SOUTO MAIOR (1994) avalia a
qualidade da evidenciação de informações obrigatórias, prestadas pelas companhias abertas
brasileiras, a partir da opinião dos analistas de investimentos, baseada na necessidade das
informações que subsidiam a implementação de seus modelos de avaliação e tomada de
4
decisão. BARROS SOUZA (1996) também se debruça sobre a análise do nível de
evidenciação das companhias abertas brasileiras, a partir de diversos enfoques, assinalando
que, no âmbito comparativo do disclosure legal ou formal entre os mercados brasileiro e
americano, há grande semelhança entre ambos os arcabouços regulatórios, embora com nível
maior de detalhamento das informações periódicas requeridas no modelo dos Estados Unidos.
Já na análise do disclosure voluntário ou informal, os resultados obtidos por BARROS
SOUZA (1996), nas pesquisas aplicadas no mercado brasileiro, levam-no a concluir que: a) os
relatórios da administração de companhias abertas brasileiras possuem pouca transparência,
quando comparados com os de empresas americanas, raramente apresentando previsões de
desempenho ou cenários prospectivos; b) houve significativo crescimento no nível de
evidenciação de informações voluntárias entre os triênios 1984-1986 e 1992-1994; c) existe
relação não-linear positiva e significante entre o nível de evidenciação de informações e o
tamanho das empresas; d) existe relação positiva entre a volatilidade dos preços das ações e o
nível de evidenciação de informações voluntárias; e) os analistas de investimentos priorizam
contatos pessoais com companhias abertas, como a principal fonte de informação e admitem
que o nível de informação privilegiada (inside information) no Brasil é elevado. Um texto de
especial interesse metodológico é o de McCONNEL, HASLEM & GIBSON (1986), em que
os autores analisam a correlação entre o desempenho das ações e as informações qualitativas
dos relatórios anuais, em especial as contidas no relatório da administração de uma amostra de
40 companhias norte-americanas, entre os anos de 1980 a 1983, utilizando-se da ferramenta
de pesquisa conhecida como análise de conteúdo (content analysis). Concluem eles que os
analistas financeiros não devem se fiar exclusivamente nas informações qualitativas dos
relatórios anuais, em especial nos comentários do presidente da companhia (President’s Letter
to Stockholders). Todavia, o descarte automático dessas informações pode resultar em perda
de importantes sinais sobre a performance futura da empresa, pois há correlação entre o
desempenho das ações e as informações qualitativas prestadas nos relatórios anuais. Não
menos importante é a pesquisa de UGUALDE (1989) que, ao analisar o grau de adequação
das informações contábeis de 7 grandes companhias abertas brasileiras aos critérios mínimos
definidos pelo Grupo de Trabalho Intergovernamental de Padrões Internacionais de
Contabilidade e Evidenciação da ONU, revela que, em alguns aspectos, as informações
daquelas empresas atendem plenamente às diretrizes de evidenciação da ONU, principalmente
no que se refere às informações quantitativas e obrigatoriamente auditadas no Brasil. Todavia,
no que concerne aos assuntos de natureza não financeira, UGUALDE (1989) constata
ausência de evidenciação, ante os padrões mínimos exigidos pela ONU, para concluir que tal
ausência deve-se à inexistência de uma clara cobrança legal dessas informações, bem como
ao não envolvimento dos auditores independentes com as informações de natureza não
financeira, contidas nos informes anuais das empresas brasileiras. Tratando dos relatórios
anuais das empresas norte-americanas, MAHONEY (1990) ressalta que eles devem fixar a
moldura estratégica, apresentar os fatos do ano e projetar o futuro, no contexto estratégico;
expor as operações, mostrando-as com textos, números e ilustrações; dar sentido à estrutura e
à filosofia financeiras; definir e atualizar os determinantes de valor de investimento; e
proporcionar pormenores fatuais e cifras suplementares vitais para a compreensão das
vantagens absolutas e relativas de investimento na empresa. Reiteradamente a CVM vem
abordando os deveres e a responsabilidade dos auditores independentes sobre a qualidade das
informações prestadas no relatório da administração, como se pode verificar no artigo 25,
inciso I, item a) da Instrução CVM n.º 308, de 14 de maio de 1999. Na Instrução CVM n.º
204, de 7 de dezembro de 1993, que altera, consolida e revoga as Instruções CVM n.º 4, de
24 de outubro de 1978, n.º 38, de 13 de setembro de 1984 e n.º 145, de 10 de maio de 1991,
a autarquia é ainda mais incisiva, ao sustentar que a responsabilidade do auditor que esteja
5
atuando no mercado de valores mobiliários não se deve limitar à emissão de parecer sobre a
fidedignidade das demonstrações financeiras auditadas. Segundo a CVM, essa
responsabilidade deve ir mais além, abrangendo outros aspectos que são também bastantes
importantes no processo de informação e de proteção ao investidor. Nesse sentido, a CVM
recomenda fortemente que os auditores independentes verifiquem a consistência das
informações e análises apresentadas no relatório da administração da entidade auditada.
2.2
Identificação do construto
Consoante MELO (1976), o termo construto (construct em inglês) tem sido
empregado para o conceito elaborado pelo pesquisador com o fito de estudar alguns dos
aspectos ou dimensões de um fenômeno, sem, contudo, pretender com ele representar de
maneira total o fenômeno/objeto estudado. O construto também pode ser compreendido como
um instrumento para tornar mensurável um determinado conceito que não se consiga medir
diretamente. Esse trabalho se apóia no construto de graus de adequação aos critérios de
evidenciação da CVM e da ONU, determinados por uma avaliação binomial do conteúdo dos
relatórios da administração. Nessa avaliação binomial, o atendimento a cada um dos critérios
da CVM e da ONU é expresso pelo número 1 (um) e o não atendimento, pelo número 0
(zero). O resultado da avaliação do conjunto dos critérios confere, ao relatório da
administração examinado, um grau de adequação numa escala que varia de 0 (zero) a 100
(cem) pontos. Essa escala é baseada na percentagem de requisitos satisfeitos. O construto aqui
definido não comporta nenhuma ponderação na pontuação dos relatórios da administração,
feita em função da maior ou menor relevância de cada um dos critérios.
2.3
Hipóteses testadas
Aos objetivos secundários nos. 1, 2 e 4, citados na seção 1.2, não se aplicam hipóteses
a testar. Tendo em mente o objetivo secundário n.º. 3 desse estudo, a primeira hipótese a que
se procura dar sustentação é a de que o relatório da administração das companhias abertas
atende melhor aos critérios da CVM que aos critérios da ONU, por conta da proximidade e do
poder regulatório da CVM sobre as companhias nacionais. A segunda hipótese, relacionada
ao objetivo secundário n.º. 5, é a de que as empresas cujos auditores são de maior porte
(medido pela quantidade de companhias abertas registradas na CVM em 22 de março de
1999, sob sua responsabilidade técnica), apresentam os melhores graus de adequação aos
critérios da CVM e da ONU para o relatório da administração. As demais hipóteses,
relacionadas ao objetivo secundário n.º. 6, são as de que as empresas com ativo total,
patrimônio líquido ou rentabilidade maior e com maior endividamento sobre o patrimônio
líquido (alavancagem financeira), obtêm os melhores graus de adequação aos critérios da
CVM e da ONU para os relatórios de administração. Essas hipóteses se apóiam no senso
comum de que empresas de maior porte e mais alavancadas tenham necessidade de prestar
informações mais detalhadas a seus acionistas e credores.
3
METODOLOGIA
3.1
Coleta e tratamento dos dados
Os dados foram coletados por meio de pesquisa bibliográfica (para a fundamentação
teórica e pesquisa na Internet (para a seleção das empresas a serem analisadas). Das 1.043
companhias abertas, registradas na CVM em 22 de março de 1999, data da obtenção do
cadastro, foram expurgadas 95 empresas em fase pré-operacional (código de situação CVM
1), 16 empresas concordatárias (código de situação CVM 3), 5 empresas falidas (código de
situação CVM 4), 14 empresas em liqüidação extrajudicial (código de situação CVM 5), 3
empresas paralisadas (código de situação CVM 6), 3 empresas liqüidadas (código de situação
CVM 7) e 147 empresas em situação não definida (código de situação CVM 8). Com essa
primeira triagem, restaram para a pesquisa 760 empresas em fase operacional (código de
6
situação CVM 2). Destas 760 companhias abertas brasileiras em fase operacional foram
expurgadas 5 empresas que, em 22/03/99, só possuíam registro na CVM para ações
resgatáveis (tipo de papel CVM 2), 63 empresas que só possuíam registro na CVM para
debêntures simples (tipo de papel CVM 3), 13 empresas que só possuíam registro na CVM
para debêntures conversíveis (tipo de papel CVM 4) e 1 empresa que só possuía registro na
CVM para bônus de subscrição (tipo de papel CVM 6). Dessa segunda e última triagem,
restaram para a pesquisa 678 empresas em fase operacional (código de situação CVM 2) e
com ações simples (tipo de papel CVM 6), registradas na CVM em 22/03/99. As triagens
efetuadas procuraram garantir uma amostra que, pelo menos em tese, não contemplasse a
inclusão de empresas que mantêm registro na CVM com propósitos outros, que não o de
efetivamente inserir-se no mercado acionário. As 678 companhias abertas que passaram pelo
duplo processo de triagem foram então classificadas por setor, para que delas se pudesse
retirar uma amostra aleatória e estratificada, de tamanho n = 100. Com a utilização de parte da
tabela de números randômicos do Apêndice B de SINCICH (1995), efetuou-se a seleção
aleatória de 100 empresas, distribuídas por 21 setores de atividade. Selecionadas as 100 (cem)
companhias abertas brasileiras, seus respectivos relatórios da administração para o exercício
findo em 1998 foram obtidos por download, dos sites www.infoinvest.com.br e
www.cvm.gov.br na Internet. As informações contidas nos relatórios da administração das
empresas selecionadas foram objeto de análise de conteúdo (content analysis), para a
identificação da adequação aos critérios da CVM e da ONU e para a conseqüente
classificação por pontos. Nesta pesquisa, a análise de conteúdo foi efetuada por meio da
impressão dos relatórios da administração das companhias 100 selecionadas, sua leitura
completa e a conseqüente aposição, parágrafo por parágrafo, do número referente ao critério
obedecido (critério da CVM na margem esquerda de cada relatório; critérios da ONU, na
margem direita). Com essa análise preliminar objetivou-se transformar os dados qualitativos
dos relatórios da administração em dados quantitativos que pudessem ser trabalhados no
software Statistical Package for the Social Sciences - SPSS, versão 8.0. Na apuração do
ranking de adequação de conteúdo, foram calculados os pontos percentuais alcançados pelos
relatórios da administração de cada companhia examinada, no atendimento aos critérios de
evidenciação da CVM e ONU. Essa pontuação alimentou o software SPSS 8.0, que gerou as
estatísticas descritivas, as medidas de posicionamento central, o histograma de distribuição de
freqüência das pontuações médias obtidas e os demais testes estatísticos. Os quartis 25%,
50%, 75% e 100% foram adotados como limites máximos da péssima, da baixa, da boa e da
ótima adequação aos critérios de evidenciação estabelecidos para o relatório da administração,
pela CVM e pela ONU. Nos testes de hipóteses, o nível de significância (P-value) máximo
para a rejeição da hipótese nula foi definido em 0,05, o que significa dizer que os testes
estatísticos não paramétricos desta pesquisa têm intervalos de confiança de 95%. Para o
exame da primeira hipótese - a de que os relatórios da administração das companhias abertas
brasileiras atendem melhor aos critérios da CVM que aos critérios da ONU, por conta da
proximidade e do poder regulatório da autarquia brasileira sobre as companhias abertas
nacionais - foi aplicado o teste não paramétrico Wilcoxon Signed Ranks Test. Esse teste é uma
medida de posicionamento relativo, cujo objetivo é verificar se os dois conjuntos de índices
(CVM e ONU) alcançados pelos relatórios da administração examinados são semelhantes ou
se a curva de um dos conjuntos se posiciona mais a direita da curva do outro, no gráfico de
distribuição de freqüência, denotando diferenças na adequação aos critérios da CVM e da
ONU. A segunda hipótese - a de que existe correlação positiva entre o porte do auditor e o
desempenho verificado pelo grupo de empresas por ele auditado, no atendimento aos critérios
da CVM e da ONU para os relatórios da administração - foi examinada pelo cálculo do
coeficiente de Spearman (Spearman’s Rank Correlation Coefficient) entre as variáveis. Para
7
as hipóteses de que as empresas com ativo total, patrimônio líquido ou rentabilidade maior e
com maior endividamento sobre o patrimônio líquido (alavancagem) tendem a obter os
melhores graus de adequação aos critérios da CVM e da ONU para os relatórios de
administração, foram aplicados testes de correlação entre as variáveis. Foi testada a correlação
de cada um dos indicadores, com a pontuação média obtida nos critérios CVM e ONU, para
cada uma das empresas da amostra.
3.3
Limitações do método
No que se refere ao tipo de pesquisa, as limitações são dadas pelo escasso referencial
teórico existente sobre o relatório da administração. Quanto ao universo amostral existem
restrições de natureza metodológica, face à concentração do mercado acionário brasileiro.
Para contornar essa restrição, optou-se pela amostragem aleatória estratificada, cujos estratos
procuram reproduzir a distribuição de freqüência populacional. A principal restrição à
amostra da pesquisa é a não inclusão de um “filtro” que viesse a expurgar companhias abertas
(holdings, principalmente), cuja a totalidade ou a quase totalidade das ações estivesse em
mãos de um pequeno grupo de acionistas e que, além disso, não tivessem operações efetivas
em seu mercado principal de atuação. Empresas desse tipo, tidas como “empresas de papel”,
não estão comprometidas em bem informar ao público externo sobre seus negócios, o que cria
um certo viés negativo na amostra. Com relação à coleta de dados, não foram detectadas
limitações relevantes. Sobre o tratamento de dados, a maior fragilidade reside na utilização da
análise de conteúdo, como base para a geração de dados quantitativos, a serem analisados
estatisticamente. HOLSTI (1969) pontua que alguns teóricos são céticos em relação à
robustez dos testes que combinam análise de conteúdo com tratamento estatístico.
HENDRICKSEN (1970), abordando como os conceitos de materialidade e relevância
invadem a área da evidenciação, também manifesta sua preocupação com a dificuldade em se
avaliar a informação qualitativa. No seu entendimento, tal avaliação envolve vários
julgamentos extremamente subjetivos, sendo muito difícil estabelecer o “ponto de corte” em
que uma consideração não quantificável deixa de ser importante no processo decisório, a
ponto de justificar a omissão de sua evidenciação. Para garantir maior robustez aos testes
estatísticos desta pesquisa, foram adotadas técnicas não paramétricas de apuração de
correlações e de medidas de posicionamento relativo, ainda que as curvas de distribuição de
freqüência dos graus de adequação aos critérios da CVM e ONU, para a amostra das 100
empresas selecionadas, tenham apresentado perfis normais. O peso igual, dado a cada um dos
critérios de evidenciação, na apuração dos níveis de adequação também é uma limitação ao
tratamento dos dados. Ainda com relação a limitações no tratamento dos dados, é mister citar
que os critérios de evidenciação (principalmente os da ONU) estão apresentados de forma
agregada. Não foram analisadas a inclusão ou não de todos os sub-itens de um determinado
critério, como por exemplo, o critério da ONU intitulado “assuntos de trabalho e emprego”,
que inclui os sub-itens “relações de trabalho”, “treinamento”, “bem-estar”, “segurança” e
“demonstração de valor adicionado”. No tratamento dos dados desta pesquisa, bastou que um
desses sub-itens fosse reportado, para o critério ser considerado como atendido.
4
RESULTADOS
4.1
Resultado da apuração de um ranking de adequação aos critérios da
CVM e da ONU para o conteúdo do relatório da administração, entre as companhias
abertas brasileiras selecionadas para pesquisa.
A Cia. Energética de Minas Gerais - CEMIG recebeu a melhor pontuação média - 85
pontos - sendo 100 pontos nos critérios da CVM e 71 nos da ONU, o que demonstra excelente
grau de adequação, principalmente às normas brasileiras de evidenciação do relatório da
administração. Em contrapartida, 5 empresas sequer alcançaram 1 ponto de adequação, tanto
8
nos critérios da ONU, quanto nos critérios da CVM, o que demonstra um preocupante descaso
ou desconhecimento das normas.
Esses são os “conteúdos integrais” de alguns dos relatórios da administração das
companhias que obtiveram zero de pontuação, no atendimento aos critérios de evidenciação
da CVM e da ONU: “A Administração Superior (sic) da companhia submete à apreciação de
Vossas Senhorias as Demonstrações Contábeis com o Parecer dos Auditores Independentes,
relativas ao Exercício Social encerrado em 31 de dezembro de 1998.” (00723-4, Master
Indústria Plástica Cearense S/A, p.1). “Senhores Acionistas: em cumprimento às
determinações legais e estatutárias, submetemos à apreciação de V. S., o Balanço
Patrimônial (sic), as Demonstrações do Resultado do exercicio (sic), Mutações do
Patrimonio (sic) Liquido (sic), correspondentes aos exercicios (sic) encerrados em 31 de
dezembro de 1998 e 1997, ao tempo em que colocamo-nos à disposição de V. S. para
quaisquer esclarecimento (sic) que julgarem necessários.” (01025-1, Nova Aliança S/A, p.
1). “Submetemos à apreciação de V.Sas., as demonstrações financeiras e o parecer dos
auditores independentes, referentes aos exercícios findos em 31 de dezembro de 1998 e de
1997.” (01209-2, Peixe S/A, p.1).
Algumas outras pérolas do descuido, da desinformação, do auto-elogio ou do exagero,
contidas em alguns dos relatórios examinados, merecem também ser reportadas, como
exemplos a não serem seguidos: “No exercício anterior efetuamos uma reavaliação parcial
da Nitriflex em função da desativação da unidade de Resinas que foi desativada (sic) (...)”
(00771-4, Brampac S/A, p. 1, grifo nosso). “O cenário exposto acima, aliado ao momento de
encerramento das demonstrações contábeis, evidenciam (sic) que a Companhia será
competitiva em termos de resultados e eficiência ao nível que necessita para consolidação de
sua posição no mercado em que atua.” (01218-1, CTM Citrus S/A, grifo nosso). “Não houve
nenhum fato administrativo marcante durante o exercício de 1998.” (01228-9, Eurolease S/A
Arrendamento Mercantil). “A cada dia, tomamos uma nova atitude, para melhor guiar nossos
negócios, numa visão de longo prazo, consolidando experiências e conhecimentos, e
crescendo sobre bases sólidas.” (00453-7, Grazziotin S/A, p.3). “Foco na micro-gestão,
buscando permanente redução de custos, melhoria da qualidade, eficiência e utilização da
capacidade produtiva e gerenciamento obsessivo do caixa e do capital de giro.” (01341-2,
Petropar S/A, p. 6, grifo nosso).
4.2
Resultado da apuração da distribuição de freqüência dos graus de
adequação dos relatórios da administração das companhias abertas brasileiras.
A média geral de pontuação obtida pelos relatórios da administração de 1998 das 100
companhias sob teste foi de 35,63 pontos em 100 pontos possíveis de serem alcançados, com
desvio padrão de 17,91 pontos. A moda foi de 25 pontos e a mediana, 34,5 pontos. O
histograma e o quadro de distribuição de freqüência demonstraram que 30 empresas
obtiveram pontuação entre 0 e 25 pontos (péssima adequação); 46 empresas ficaram entre 26
e 50 pontos (baixa adequação); 23 empresas conquistaram entre 51 e 75 pontos (boa
adequação) e somente 1 empresa obteve pontuação superior a 75 pontos (ótima adequação). É
digno de registro o fato de que 67 empresas em 100 tiveram seus relatórios da administração
classificados como de baixa ou péssima adequação aos critérios da CVM. E que 85 das 100
empresas tiveram seus relatórios da administração classificados como de baixa ou péssima
adequação aos critérios da ONU. O maior percentual de não aderência aos critérios da ONU
está analisado com mais profundidade e rigor estatístico na seção 4.3 a seguir.
4.3
Resultado do teste Wilcoxon Signed Ranks para a verificação de melhor
adequação aos critérios da CVM ou da ONU.
CARVER & NASH (2000) definem o teste estatístico Wilcoxon Signed Ranks como a
versão não paramétrica do teste t para par casado. Em particular, utiliza-se esse teste quando
9
se tem repetidas medidas de uma mesma amostra de uma população, cuja curva de
distribuição de freqüência não é necessariamente normal. Sendo uma medida de
posicionamento relativo, o Wilcoxon Signed Ranks foi aqui utilizado para verificar se os dois
conjuntos de graus (CVM e ONU), alcançados pelos relatórios da administração examinados,
eram semelhantes ou se o histograma de distribuição de freqüência de um dos conjuntos se
posicionava mais a direita do que o do outro conjunto, denotando maior adequação aos
critérios de uma entidade sobre os da outra. Sejam “GRAUCVM” e “GRAUONU” as curvas
de distribuição de freqüência da população das 1.043 companhias abertas brasileiras que se
adequam aos critérios da CVM e da ONU, respectivamente. A hipótese a que pretende dar
sustentação (Ha) é a de que os relatórios da administração das companhias abertas brasileiras
se adequam melhor aos critérios da CVM, que aos da ONU. A hipótese nula para esse teste
(H0) é a de que não há diferença na adequação aos critérios. Negative Ranks foram apontados
para as 74 empresas que obtiveram menores graus nos critérios de adequação da ONU, em
comparação com os critérios da CVM. Positive Ranks foram apontados para as 18
companhias abertas brasileiras que alcançaram maiores graus nos critérios da ONU, em
comparação com os critérios da CVM. Houve 8 empresas com os mesmos graus alcançados
(Ties), tanto nos critérios da ONU, quanto nos da CVM. Note-se que a soma dos graus (Sum
of Ranks) da CVM foi de 3.789, contra 489 da soma dos graus da ONU. O teste Wilcoxon
Signed Rank para a diferença entre “GRAUONU” e “GRAUCVM”, convertido a um z-score,
foi igual a -6,429, com um P-value de significância (Asymp.Sig 2-tailed) próximo de zero
(exatos 0,000000002, se o resultado for estendido para 9 casas decimais).
4.4
Resultado da identificação dos temas que aparecem com maior e com
menor freqüência, nos relatórios da administração das companhias examinadas.
A descrição dos negócios, produtos e serviços foi o tema mais freqüente nos relatórios
da administração das companhias sob exame, quando a ótica foi a dos critérios da CVM (91%
dos relatórios analisados mencionavam esse tema). Pela ótica da ONU, o tema mais freqüente
foi a análise dos resultados e eventuais efeitos significativos, ocasionados por fatores
internos ou externos (83% dos relatórios mencionavam esse assunto). Sendo, de certa forma,
assuntos relacionados, pode-se concluir que as empresas brasileiras têm especial apreço por
analisar, dentro do relatório da administração, a conjuntura sócio-econômica e seu impacto
sobre seus negócios, produtos e serviços. Por outro lado, a menção a atividades de pesquisa e
desenvolvimento foi a de menor ocorrência (14% dos relatórios), nos critérios da CVM.
Informações sobre a estrutura organizacional, declaração ou opinião do presidente da
empresa e informações detalhadas sobre os diretores, incluindo suas participações na
empresa, como recomenda a ONU, praticamente não foram objeto de evidenciação nos
relatórios da administração das companhias selecionadas. No primeiro caso, a falta de hábito
das empresas brasileiras em investir em pesquisa e desenvolvimento explica, de certa forma, a
não menção ao tema. No segundo caso, embora algumas empresas tenham, pelo menos, citado
os nomes dos diretores no final do relatório da administração (o que não foi considerado como
atendimento ao critério), o fornecimento de detalhes sobre o funcionamento e a estrutura
organizacional e societária da empresa parece ser ainda um tema tabu para a maioria das
administrações das companhias abertas brasileiras. A falta de uma declaração ou opinião do
presidente da empresa parece também ser uma questão cultural do brasileiro, talvez porque
esse tipo de atitude soe, equivocadamente, aos nossos ouvidos como autopromoção não
cabível à pessoa do presidente de uma grande companhia. Preocupação semelhante às de
algumas empresas norte-americanas, analisadas por MAHONEY (1990), com a “revelação
excessiva, promocional e exageradamente pessoal de seus relatórios anuais”.
4.5
Resultado do teste Spearman’s Rank Correlation Coefficient para a
verificação de ocorrência de correlação entre o porte do auditor e o desempenho
10
verificado pelo grupo de empresas por ele auditado.
A terceira hipótese - a de que existe correlação positiva entre o porte do auditor e o
desempenho verificado pelo grupo de empresas por ele auditado, no atendimento aos critérios
da CVM e da ONU para os relatórios da administração - foi examinada pelo cálculo do
coeficiente de Spearman (Spearman’s Rank Correlation Coefficient) entre as variáveis. O
coeficiente de correlação de Spearman (rS ou ρ, Spearman’s Rank Correlation Coefficient,
segundo SINCICH (1995), ou Spearman’s Rank Order Correlation, de acordo com CARVER
& NASH (2000) ) é a versão não paramétrica do coeficiente de correlação de Pearson (r) e
foi utilizado nesta pesquisa de forma a dar mais robustez aos testes baseados em análise de
conteúdo, cujas limitações já foram tratadas na seção 3.3. Ele é útil para o teste de correlação
linear entre a variável porte do auditor [PORTE] e a variável grau médio obtido pela empresa,
nos critérios CVM e ONU [GRAUMED]. O coeficiente de Spearman (Spearman’s rho)
apurado entre as duas variáveis [PORTE e GRAUMED] foi de 0,3374, com um P-value de
significância (Sig 2-tailed) de 0,0735. Pode-se interpretar esse resultado como indicativo de
uma pequena correlação positiva entre as variáveis. Todavia, essa correlação positiva é tênue
demais para se afirmar que o porte do auditor influencia no desempenho do grupo de
empresas por ele auditadas, quando o assunto é o atendimento aos critérios da CVM e da
ONU para os relatórios da administração.
4.6
Resultado do teste Spearman’s Rank Correlation Coefficient para o exame
de correlação entre alguns indicadores contábeis da empresa e o nível de evidenciação
de seu relatório da administração, à luz dos critérios da CVM e da ONU.
O coeficiente de Spearman (Spearman’s rho) apurado entre as variáveis “grau médio
de adequação aos critérios CVM e ONU (GRAUMED)” e “ativo total (ATITOT)” foi de
0,4751, com um P-value de significância (Sig 2-tailed) próximo de zero. Da mesma forma, o
Spearman’s rho apurado entre as variáveis GRAUMED e “patrimônio líquido (PATLIQ)” foi
de 0,4971, com um P-value de significância (Sig 2-tailed) também próximo de zero. Fica
caracterizada, portanto, uma significante correlação positiva entre o tamanho do ativo total e o
nível de evidenciação do relatório da administração, quando analisados sob os critérios da
CVM e da ONU. Também o tamanho do patrimônio líquido está forte e positivamente
correlacionado com a qualidade informativa do relatório da administração das empresas
examinadas. Esses resultados já haviam sido constatados por vários pesquisadores, que
previamente se dedicaram ao estudo da evidenciação (disclosure), como CHOW & WONGBOREN (1987), COOKE (1989, 1992), LANG & LUNDHOLM (1993), WALLACE &
NASSER (1995), ZARZESKI (1996), BARROS SOUZA (1996), ALMEIDA (1998) e LOW
(1998). O mesmo não se pode dizer da relação entre o nível de evidenciação do relatório da
administração e a rentabilidade e o nível de alavancagem das empresas sob exame. No
primeiro caso, o Spearman’s rho apurado entre as variáveis GRAUMED e “rentabilidade
(RENTAB)” foi de 0,1559, com um P-value de significância (Sig 2-tailed) de 0,1214. Esses
índices não permitem concluir sobre a ocorrência de correlação entre a rentabilidade das
empresas examinadas e seus graus de adequação aos critérios da CVM e da ONU para os
relatórios da administração. No segundo caso, com um Spearman’s rho entre as variáveis
GRAUMED e “alavancagem (ALAVANCA)” de -0,0385 e um P-value de significância de
0,7035, também não há como afirmar que as empresas com maior endividamento obtêm os
melhores ou os piores graus de adequação aos critérios da CVM e da ONU para seus
relatórios da administração. Desta feita, pelo menos no que se refere ao relatório da
administração, não foi possível confirmar as teses de ZARZESKI (1996), CHOW & WONGBOREN (1987) e LOW (1998) que indicam haver uma associação positiva entre a qualidade
da evidenciação das demonstrações contábeis das empresas e seus índices de alavancagem.
11
5
CONCLUSÕES
Os resultados do presente trabalho permitem algumas conclusões subsidiárias. A
primeira conclusão a que se chega é a de que os relatórios da administração das companhias
abertas brasileiras se adequam melhor às normas de evidenciação da CVM do que às da ONU,
embora ambas sejam bastantes semelhantes. Essa conclusão é de especial importância, na
medida em que reflete o respeito das companhias abertas brasileiras ao poder normativo da
CVM. De forma diferente da conclusão de UGUALDE (1989), que credita o baixo nível de
evidenciação à inexistência de uma clara cobrança legal dessas informações, esta pesquisa
permitiu constatar que a CVM possui o adequado aparato legal e normativo para atacar o
problema. Fica a impressão de que o que está a fazer falta é uma reedição da íntegra do
Parecer de Orientação CVM No. 15/87, e não somente a ratificação de seus termos, como o
que foi feito com os Pareceres de Orientação CVM Nos. 17/89 e 18/90, pois as empresas
demonstram não conhecer o texto original do referido diploma normativo de 1987, que tratava
dos critérios de evidenciação do relatório da administração. Não emerge desse estudo a
constatação da necessidade de novas e penosas reformas legislativas ou normativas para que a
evidenciação - em especial a dos relatórios da administração - melhore de nível. A segunda
conclusão subsidiária é a de que a análise da conjuntura econômica e de seu impacto sobre os
negócios corporativos, cujo detalhamento também é feito em seus relatórios da administração,
constitui-se no tema predileto das companhias abertas brasileiras. No extremo oposto
encontram-se as informações sobre a estrutura organizacional, a opinião do presidente e as
informações detalhadas sobre dirigentes, incluindo suas participações acionárias na
companhia. Esses temas raramente são abordados nos relatórios da administração das
companhias abertas brasileiras. A terceira conclusão, ainda de caráter subsidiário, é a de que
não há evidências suficientemente fortes para se afirmar que, sendo maior a firma de auditoria
independente contratada pela companhia aberta, melhor será a evidenciação de seu relatório
da administração. Essa conclusão preliminar do trabalho corrobora a tese de UGUALDE
(1989) sobre o não envolvimento dos auditores independentes com as informações de
natureza não financeira, contidas nos informes anuais das empresas brasileiras. De fato,
constatou-se que a mesma firma de auditoria independente, seja ela grande ou pequena, audita
companhias com péssimos e com excelentes relatórios da administração. Seria recomendável
que os comitês técnicos de todas as firmas de auditoria independente, atuantes no Brasil,
dessem maior importância à qualidade da evidenciação do relatório da administração que,
embora sem fazer parte explícita das demonstrações contábeis, é legalmente um dos
Documentos da Administração que precisam ser apresentados aos acionistas. Para o público
leigo, que desconhece quem é o responsável pela informação, a má qualidade do relatório da
administração depõe indistintamente contra a administração e contra os auditores externos da
companhia. A quarta e última conclusão subsidiária é a de que há forte correlação positiva
entre o tamanho do ativo total e do patrimônio líquido das companhias abertas brasileiras e os
graus de adequação aos critérios da CVM e da ONU. Em contrapartida, não se pode afirmar
que existe correlação de qualquer espécie entre aqueles graus de adequação e os indicadores
de rentabilidade e de alavancagem do grupo de empresas examinado.
Finalmente, levando-se em conta que 67% dos relatórios da administração foram
classificados como de baixa ou péssima adequação aos critérios da CVM, que 85% deles
foram classificados como de baixa ou péssima adequação aos critérios da ONU, e que a média
geral alcançada foi de aproximadamente 36 pontos em 100 pontos possíveis, a principal
conclusão do trabalho é a de que a qualidade dos relatórios da administração das companhias
abertas brasileiras, publicados no exercício de 1998, é muito ruim. Esses documentos, no
Brasil, têm se prestado, quase que exclusivamente, ao mero cumprimento de uma formalidade
legal, tal qual concluíram WHITE, SONDHI & FRIED (1994) ao verificar que, no passado
12
recente, as exigências da SEC sobre o MD&A – Management Discussion and Analysis eram
cumpridas de forma mecânica pela maioria das companhias norte-americanas, fazendo com
que aquela comissão aumentasse a ênfase de seus pronunciamentos e exigências em prol de
uma melhor evidenciação. Portanto, os relatórios da administração das companhias abertas
brasileiras ainda têm um longo caminho a trilhar, até que possam ser considerados como um
importante elemento de divulgação (disclosure ou evidenciação) voluntária das empresas.
6
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7 - ANEXOS
Todos os anexos, com a relação das companhias selecionadas para a pesquisa, os
critérios de evidenciação (disclosure) da CVM e da ONU, o detalhamento dos testes e outras
informações complementares, estão disponíveis com o autores.
Download

O Relatório da Administração no Brasil: Peça de Informação ou de