NULIDADES NO PROCESSO PENAL Lanker Vinícius 1. Noções: • A prescrição legal de certas formalidades busca: • Garantir às partes a participação em um processo justo. • Igualdade de condições na busca de interesses. • Afastar qualquer desmando ou arbitrariedade do Julgador. • Permitir ao julgador utilizar instrumento apto à descoberta da verdade. • Assegurar às partes a legalidade e a justiça do julgamento. • Todos os atos do processo devem obedecer a forma devida – Ato Típico. • Ato atípico – Atos do processo que não obedecem a forma devida. • Para uns é vício ou defeito que torna ineficaz o processo no todo ou em parte. • É a sanção aplicável ao processo, ou ao ato processual, realizado com inobservância da forma devida, ou em forma proibida pela lei processual. É um defeito. 2. Natureza jurídica: • A nulidade é sob um aspecto, vício e, sob outro, sanção. • Os motivos para a existência das nulidades advêm da necessidade de que a marcha processual transcorra em consonância com as formalidades exigidas para os atos processuais. 3) PRINCÍPIOS Princípio do prejuízo (art. 563). • Não existe nulidade, desde que da preterição legal não haja resultado prejuízo para uma das partes. Súmula 523 do STF • Caso o ato tenha alcançado sua finalidade principal, mesmo com desrespeito a regras procedimentais, não haverá a necessidade de declarar a sua nulidade, porque não houve prejuízo. Princípio da Causalidade: • Esse princípio dispõe que a nulidade de um ato ocasionará a nulidade de todos os atos que lhe forem decorrentes ou consequentes. • Este princípio está expressamente previsto no artigo 573, parágrafo 1°, do Código de Processo Penal: • “Os atos, cuja nulidade não tiver sido sanada, na forma dos artigos anteriores, serão renovados ou retificados. § 1o A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam consequência”. Princípio da instrumentalidade das formas: • O princípio da instrumentalidade das formas ou sistema teológico, não se declarará a nulidade de ato que não influiu na apuração da verdade e na decisão da causa (art 566 CPP) e também de ato que, mesmo praticado de forma diversa da qual prevista, atingiu sua finalidade ( art. 572, II). Princípio da convalidação: • O princípio da convalidação é inerente às nulidades relativas, e consiste na preclusão da possibilidade de requerer a decretação da ocorrência da nulidade, por inércia da parte interessada. • Referido princípio encontra guarida no artigo 572, inciso I, do Código de Processo Penal, conforme transcrição abaixo indicada: • “As nulidades previstas no art. 564, Ill, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se-ão sanadas: I – se não forem arguidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no artigo anterior”. • Em se tratando do princípio da convalidação ou sanabilidade, as nulidades relativas permitem a convalidação, ou seja, poderá o ato atípico ser aproveitado ou superado. • O modo sanável mais comum é a preclusão (ART. 572, I). Outra forma que é comum é quando o ato atinge o seu fim (ART. 572, II) (Ex. intimação) Sem embargo, há outras formas de convalidação, que podem ser destacadas em: • a)Ratificação: é o modo de se revalidar a nulidade em razão da ilegitimidade do representante da parte. Art. 568 do CPP. • b)Suprimento: segundo se extrai do art. 569 CPP, é a forma de se convalidar as omissões constantes na denúncia ou na queixa, sendo mais que a ratificação. • c)Substituição: revalidam-se nulidades da citação, intimação ou notificação, como no caso do réu processado e é citado em apenas um de seus endereços constantes, mas não é encontrado (art. 570 CPP). • Princípio da conservação: Quando a nulidade é aplicada, ela só deve alcançar o ato inválido e os que dele decorreram ou dependem como efeito, permanecendo os restantes íntegros (573, § 1º e 2°). • Princípio do interesse: Só a parte prejudicada é que pode arguir nulidade. Não se declara nulidade se a parte prejudicada não a arguir (565), tampouco dê causa ou concorra para a ocorrência da nulidade. 4. SISTEMAS DE NULIDADES: • a) Formalista: Rígido à tipicidade. Toda violação a prescrição legal acarreta a inviabilidade dos atos processuais (criticado por fazer prevalecer o meio sobre o fim); • b) Legalista: O ato só será nulo se a lei assim expressamente o declarar. • c) Privatista: Só se decreta a nulidade quando do ato resulta prejuízo e a parte interessada solicitar. • d) Judicial: Fica a critério do Juiz valorar o vício processual. • e) Instrumentalista: Sem a rigidez do sistema formalista, dá valor à finalidade do ato. Adota o sistema da instrumentalidade das formas. 5. INEXISTÊNCIA, NULIDADE E IRREGULARIDADE DO ATO PROCESSUAL. a) ATO INEXISTENTE. • É o ato que não tem vida. É um não ato (Carnelutti). O ato inexistente não é ato típico nem atípico. Não se cogita de nulidade de ato inexistente – prescinde de decretação judicial – não produz efeitos jurídicos. A inexistência pode ser material ou jurídica. • Inexistência material: Se o ato não foi realizado, ele não existe. Ex:. a citação de um homônimo. • Inexistência jurídica: Se o ato foi realizado, mas desprovido de elementos essenciais de sua constituição, de molde a não ter nenhum valor para o direito, ele existe materialmente, mas não tem existência jurídica . Ex. Extinção de punibilidade de agente vivo. b) ATO IRREGULAR: • É ato igualmente não previsto na lei processual, mas eficaz porque irrelevante a atipicidade. Basicamente, é aquele ato cuja imperfeição que não gera prejuízo quando o seu objetivo é atingido . c) ATO NULO: • É o ato que produz efeitos enquanto não sofrer a sanção da ineficácia. • A qualidade de defeito determina o tipo de invalidade, no sentido de que define um regime próprio de decretação. E essa qualidade depende do tipo de exigência legal que foi descumprida. • Se a exigência é imposta pela lei em função do interesse público, a situação é de nulidade absoluta. • Se a exigência é imposta pela lei no interesse da parte, há nulidade relativa. • No caso de nulidade absoluta não é possível convalidar o ato, o que é possível no caso de nulidade relativa. NULIDADES ABSOLUTAS: • São as previstas no art. 564, I, II e III, letras a, b, c, e (primeira parte), f, i, j, k, l, m, n, o e p. Para elas não há preclusão, podendo ser arguidas a qualquer tempo, ainda que haja sentença transitada em julgado, obedecida as regras dos artigos 565 a 569, que tratam de casos especiais. • Se possível, o ato nulo pode ser renovado ou retificado. NULIDADES RELATIVAS: • São as hipóteses previstas no art. 572 do CPP. Também são casos de nulidade relativa, portanto sanáveis, partes de algumas alíneas do artigo 564, III. Distinção NULIDADE ABSOLUTA RELATIVA MOMENTO QUE DEVE SER ALEGADA Qualquer Oportunidade 1° Oportunidade A PARTE PRECISA REQUERER NÃO SIM, desde que não tenha dado causa PODE SER RECONHECIDA DE OFÍCIO SIM SIM VICIO ATINGE INTERESSE PÚBLICO INTERESSE PRIVADO DEVE SER DEMONSTRADO PREJUIZO PRESUMIDO CONVALESCE NÃO SIM APÓS TRANSITO EM JULGADO PODE SER REVISTO CONVALESCEU ANULABILIDADE • A norma violada tutela interesse da parte, de forma dispositiva(não tem cominação expressa de nulidade ou não concerne às garantias essenciais das partes no contraditório – haverá preclusão). 6. ARGÜIÇÃO DE NULIDADE: • Estabelecido no artigo 571 o momento em que a parte dever arguir a nulidade relativa, o desiderato do CPP é fixar o instante em que se opera a preclusão temporal, a qual, concretizada, gera, consequentemente, o saneamento da nulidade. Oportunidade para arguição de nulidades Nos processos da competência do tribunal do júri • Na primeira preclusão. manifestação, sob pena de Nos processo dos crimes de reclusão da competência do juiz singular • a) As ocorridas até a apresentação da defesa escrita, nela devem ser arguidas; • b) As ocorridas após a defesa escrita: logo após a abertura da audiência una ou de instrução e julgamento. • c) As verificadas no curso da audiência: devem ser suscitadas imediatamente após verificadas. Nos processo de procedimento sumário • a) As ocorridas até a apresentação da defesa escrita, nela devem ser arguidas; • b) As ocorridas após a defesa escrita: logo após a abertura da audiência una ou de instrução e julgamento. • c) As verificadas no curso da audiência: devem ser suscitadas imediatamente após verificadas. • Nulidade ocorrida após a pronúncia. • Logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes, na abertura da sessão do Tribunal do Júri. Art. 463 CPP • As ocorridas na audiências ou sessões de tribunal. • Imediatamente após a ocorrência, devendo a parte pedir para que o juiz consigne a impugnação ou protesto no termo de audiência ou na ata da sessão. • Depois da decisão final. • No recurso ou no Tribunal, depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes. 7. EFEITOS: • Havendo nulidade absoluta ou nulidade relativa não sanada, deve o juiz fazer com que o ato seja novamente praticado ou corrigido (art. 573). 8. NULIDADES EM ESPÉCIE (ART. 564): Nulidade por incompetência do juiz (564, I): • A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios (567, 1ª parte). Apesar da disposição legal, em se tratando de incompetência absoluta (ratione materiae e ratione personae), a nulidade pode ser alegada a qualquer momento e anula o processo desde o início. • Já a incompetência, sendo relativa (em razão do local), não tendo havido a sua arguição por meio de exceção no prazo da defesa prévia, matéria(art. 108 do CPP). ocorre a preclusão da Nulidade por suspeição do juiz (564, I): • A suspeição do juiz torna absolutamente nulos os atos por ele praticados, não incidindo os arts. 566 e 567. As causas de suspeição estão contidas no art. 254 do CPP. • Nulidade por suborno do juiz (564, I): O suborno diz respeito à infidelidade do juiz no processo. Ilegitimidade de parte (564, II): • É absoluta quando se trata de ilegitimidade ad causam (legitimidade para agir numa demanda judicial, trata-se de instituto de direito material , seja ordinária (exercício pelo próprio titular do direito) ou extraordinária (Terceiro que postula em nome próprio na defesa de direito alheio). • Sendo ad processum (capacidade de estar em juízo), a ilegitimidade pode ser sanada por ratificação (art. 568). Logo, é relativa. Nulidade por falta de fórmulas ou termos do processo (564, III): A palavra fórmula está empregada como regra e a termo, como ato. a) Ausência de denúncia, de queixa ou de representação. • A ausência da portaria ou do auto de prisão em flagrante, a que se refere a alínea “a” do inciso III, não mais acarreta a nulidade, pois, com a Constituição de 1988, todo e qualquer processo só pode ter início com a provocação por meio de denúncia ou queixa. b) Ausência do exame de corpo de delito • Nos crimes que deixam vestígios (delicta factis permanentis), ressalvada a hipótese de prova indireta (art. 167 do CPP), mediante prova testemunhal. Relativa a nulidade no caso de não obedecer o procedimento adequado do exame. c) Ausência de nomeação de defensor • Ausência de nomeação de defensor ao réu (art. 261 CPP) presente e de curador ao menor de 18 anos. Quanto à ausência de nomeação de curador ao menor de idade, o enunciado da súmula 352 do STF esvaziou esse comando normativo. Merece registro, aqui, a Súmula 523 do STF: “No Processo Penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”. d) Intervenção do Ministério Público • Ausência de intervenção do Ministério Público em todos os atos. No processo penal, diferentemente do processo civil, na audiência devem estar presentes, sempre, o representante do Ministério Público e o advogado, o defensor dativo ou ad hoc do acusado. Nulidade depende da ação penal. Se for pública incondicionada será absoluta. e) Citação do réu e Prazos • Ausência de citação do réu para ver-se processar, do seu interrogatório, quando possível realizá-lo, e dos prazos para o autor e o réu. Sanciona-se, aqui, a quebra dos princípios da ampla defesa e do contraditório, que no processo penal são mais efetivos do que no processo civil. O art. 572 deixa expresso que apenas as nulidades previstas na segunda parte da alínea “e” do inciso III do art. 564 é que são relativas. f) Decisão de pronúncia • A ausência da decisão de pronúncia, do libelo (não existe lei 11689/08) e a entrega de sua cópia ao acusado. Caso a pronúncia não tipifique a conduta do acusado, também se entende que há nulidade, o mesmo ocorrendo quando ela ingressa no mérito. • g) intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo tribunal do júri, quando a lei não permitir o julgamento à revelia (Relativa) • h) a intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, nos termos estabelecidos pela lei (Relativa) • i) quórum mínimo de 15 jurados. Têm de comparecer, no entanto, no mínimo, dos vinte e cinco jurados (art. 462), quinze (art. 463), sob pena de adiamento da audiência. Se, ainda assim, o julgamento for realizado, ocorre a nulidade absoluta. (Recusas motivadas e imotivadas). • j) conselho de sentença em número legal e sua incomunicabilidade. O número legal do conselho de sentença é de sete pessoas (art. 467). Não pode ser mais, nem menos. k) Quesitos e as respostas. • Os quesitos devem constar do processo, formulados em proposições simples, a fim de que os jurados compreendam o conteúdo (súmula 156 do STF). As respostas também devem constar do processo, para se saber, realmente, o que decidiu o conselho de sentença. Art. 483 CPP. A inversão da ordem também provoca nulidade absoluta. (súmula 162 do STF). l) acusação e a defesa, na sessão do julgamento. • Observe-se que o dispositivo se refere à sessão do julgamento, tratando, portanto, especificamente do Tribunal do Júri. Em se tratando da acusação, o que não se admite é a ausência física do representante do Ministério Público. De outro lado, quanto à defesa, o preceito torna cogente não só a presença física do advogado, como também que ele seja, em essência, defendido. (Sumula 523 do STF) (art. 497, V). • ausência da sentença. Tourinho Filho diz que a lei se refere, nesse caso, à inexistência jurídica, o que equivale à própria inexistência material. • recurso de ofício. Não ocorre nulidade para o processo a sua ausência, pois a única consequência e impedir a constituição da coisa julgada. • intimação das sentenças e despachos dos quais caiba recurso. (Fere contraditório e ampla defesa. Art. 370,§1° e Sumula 155 STF. • p) ausência de quórum legal dos tribunais. Aberta qualquer sessão de julgamento, a primeira verificação a ser feita, pelo presidente, é quanto à existência do mínimo legal dos membros. • Nulidade por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato (564, IV): É essencial a formalidade quando faz parte do ato, que não existe ou pelo menos não produz efeito sem ela. Ex.: Denuncia não descreve todos os elementos da figura típica. • Acidental: Inobservância causa nulidade do ato devendo ser demonstrado o prejuízo. Ex.: Vício na prisão em flagrante. • “Parágrafo Único: Ocorrerá, ainda, a nulidade por deficiência dos quesitos ou das suas respostas, e contradição entre elas.” • Súmula 162 do STF: “ É absoluta a nulidade do julgamento pelo júri, quando os quesitos da defesa não precedem aos das circunstâncias agravantes” Nulidade derivada • São nulos todos os atos concomitantes, posteriores ou mesmo anteriores ao ato viciado. Tem sido entendido que o princípio que rege as nulidades derivadas está diretamente ligado ao princípio que rege as provas ilícitas por derivação. Aplica-se a teoria dos frutos da árvore envenenada, anulando-se todos os atos processuais subsequentes realizados em decorrência dos elementos colhidos com a prova impugnada. 10. Inquérito Policial: • É pacífico o entendimento de que o IP não pode ser declarado nulo, até porque não se trata de processo e não está jungido a nenhum procedimento definido pela lei. Acontece, no entanto, que algumas peças que o compõe podem ser declaradas nulas, como é caso do auto de prisão em flagrante. Os atos defeituosos do inquérito são passíveis de decretação de nulidade? • Nessa senda, parece acertado o entendimento de Aury Lopes Júnior, no sentido de que a única forma de sanar um ato defeituoso do inquérito é repetindo o referido ato no processo. Em isso não ocorrendo, não só aquela diligência é nula como também contaminará a sentença que valorar este ato de investigação nulo.